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Definição de cargo técnico ou científico para fins de acumulação de cargos públicos

Resumo:


  • A Constituição Federal de 1988 estabelece, em seu artigo 37, XVI, a vedação à acumulação remunerada de cargos públicos, com exceções específicas que permitem a acumulação de dois cargos de professor, de um cargo de professor com outro técnico ou científico, e de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde com profissões regulamentadas.

  • O entendimento jurídico atual considera que cargos técnicos ou científicos para fins de acumulação de cargos públicos são aqueles que exigem conhecimentos específicos e habilitação de grau universitário ou profissionalizante de segundo grau, excluindo atividades meramente burocráticas ou de caráter repetitivo sem formação específica.

  • Críticas ao entendimento jurisprudencial apontam que a definição de cargo técnico ou científico não deveria se limitar à exigência de formação superior ou técnica, mas considerar a capacidade e qualificação do servidor, principalmente quando aprovado em concurso público e havendo compatibilidade de horários para o exercício de ambos os cargos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Análise e crítica acerca do entendimento dos tribunais superiores no que tange à definição de cargo técnico ou científico.

O Capítulo VII da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 inaugura a temática da Administração Pública no texto constitucional e, em seu art. 37, XVI, assim estabelece:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(...)

XVI - é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

a) a de dois cargos de professor; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

b) a de um cargo de professor com outro técnico ou científico; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 34, de 2001)

Ao realizar a leitura do dispositivo constitucional acima transcrito em consonância com toda a estrutura da Carta Magna de 1988 e em harmonia com o espírito de proteção ao interesse público supremo e indisponível, percebe-se que o legislador constituinte originário e reformador se preocupou em limitar o quantitativo de vínculos do agente público com o Estado, sob pena de prejudicar a adequada prestação do serviço público.

Dito de outra forma, ainda que a pessoa possua capacidade técnica para o exercício de “n” cargos ou funções públicas, esta atuação deve tomar como limite as balizas impostas pelo art. 37, XVI ,como forma de garantir a qualidade do serviço posto à disposição da sociedade. Assim, tem-se que a regra é a proibição de acumulação de cargos públicos, cuja exceção está prevista no dispositivo constitucional acima transcrito.

A alínea “a” do dispositivo supramencionado não rende muitas discussões no âmbito doutrinário ou jurisprudencial. No máximo é possível identificar certo debate sobre a real função do cargo de professor, se a atividade de diretor pode se confundir com a do magistério, nada que cause longos debates no campo da hermenêutica constitucional.

A alínea “c”, por sua vez, gerou certa incompreensão ao se questionar se o cargo privativo de profissional da saúde do âmbito militar poderia ser cumulado com outro do âmbito civil. O Superior Tribunal de Justiça deu fim ao debate ao certificar que é possível a referida acumulação, desde que o servidor público não desempenhe as funções tipicamente exigidas para a atividade castrense, mas atribuições inerentes a profissões de civis (STJ 6ª Turma. AgRg no RMS 23.736/TO, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 21/05/2013 e STJ 5ª Turma. RMS 28.059/RO, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 04/10/2012).

Enfim, a alínea “b”, objeto do presente debate, originou um embate no campo jurisprudencial acerca da definição do que seria “cargo técnico ou científico”.

No RMS 42392/AC, o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento no sentido de que cargo técnico, para fins de acumulação de cargos públicos, é aquele que requer conhecimento específico na área de atuação profissional, com habilitação específica de grau universitário ou profissionalizante de 2º grau. Eis a ementa do julgado:

ADMINISTRATIVO. ACUMULAÇÃO ILÍCITA DE APOSENTADORIAS. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. PROFESSOR E TÉCNICO EM POLÍTICAS CULTURAIS. IMPOSSIBILIDADE.

1. Conforme consignado pela Corte local, está "evidenciada a impossibilidade de cumulação das aposentadorias outrora percebidas pelo impetrante. uma vez que o cargo de técnico em assuntos culturais não possui natureza técnica, pois não demanda formação profissional específica para o respectivo exercício".

2. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, cargo técnico é aquele que requer conhecimento específico na área de atuação do profissional, com habilitação específica de grau universitário ou profissionalizante de 2º grau.

3. É possível verificar que o cargo ocupado pelo recorrente, "Técnico em Políticas Culturais", exige apenas nível médio (fl. 50, e-STJ), não se enquadrando, portanto, na definição acima.

4. Recurso Ordinário não provido. (RMS 42.392/AC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/02/2015, DJe 19/03/2015)

Adentrando ainda mais no tema, o Supremo Tribunal Federal definiu que os cargos que impliquem a prática de atividades meramente burocráticas, de caráter repetitivo e que não exijam formação específica não podem ser considerados como cargos técnicos, não se enquadrando no conceito constitucional. Prosseguiu afirmando que não se deve observar apenas a nomenclatura do cargo ocupado para concluir pela impossibilidade de sua acumulação com o cargo de professor, devendo-se analisar as atribuições inerentes ao cargo para afastar qualquer incerteza quanto à sua natureza (STF. 1ª Turma. RMS 28497/DF, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o acórdão Min. Cármen Lúcia, julgado em 20/5/2014. Info 747).

Coube à Ministra Laurita Vaz, no RMS 28.644/AP, definir cargo científico nos seguintes termos: "é o conjunto de atribuições cuja execução tem por finalidade a investigação coordenada e sistematizada de fatos, predominantemente de especulação, visando a ampliar o conhecimento humano.".

Assim, tem-se como consolidado o entendimento no sentido de que, para que seja possível a acumulação de um cargo técnico ou científico com um de professor, é indispensável que aquele seja um cargo que exija nível superior ou curso profissionalizante de 2º grau, não se admitindo que implique na prática de atividades meramente burocráticas, de caráter repetitivo e que não exija formação específica. Esse é o posicionamento que deve ser considerado para as provas objetivas e discursivas.

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Finda a explanação acerca do que seria cargo técnico ou científico para fins de acumulação de cargos públicos, inicio uma breve crítica acerca do entendimento jurisprudencial.

Conforme dito no início do presente texto, a intenção do constituinte originário e reformador ao limitar a acumulação de cargos públicos era proteger a eficiência do serviço público, de forma que uma única pessoa, por mais capacitada que fosse, não pudesse acumular inúmeras atribuições, sob pena de prejudicar a qualidade do serviço prestado.

Ora, tomando como base essa mens legislatoris, não se pode limitar a definição de cargo técnico ou científico para apenas aqueles que exijam curso superior ou profissionalizante de 2º grau. Ao entender dessa forma, os tribunais superiores estão desqualificando o cargo técnico cuja atribuição é meramente burocrática, como se tal função retirasse as qualidades do servidor que o ocupa.

É preciso ter em mente que, para ocupar um cargo público de professor, o pretendente deve se submeter a concurso público de provas e títulos, obter aprovação e, a depender de sua classificação, ser convocado a tomar posse. Uma vez aprovado, nomeado e havendo compatibilidade de horários, de pouco importaria a natureza do cargo técnico ocupado pelo servidor, vez que os atributos para ser professor foram devidamente apurados no certame do qual participou.

Assim, a título de exemplo, um servidor público ocupante do cargo de técnico judiciário (nível médio) em algum Tribunal de Justiça que exerça atividade meramente administrativa, se aprovado em concurso para o magistério público, estaria impedido de assumir o cargo de professor, vez que o cargo de técnico judiciário não se enquadraria no conceito estabelecido pelo STJ e STF, ao passo que um analista judiciário (nível superior) que exerça as mesmas atribuições estaria apto a acumular os dois cargos.

Por fim, é preciso relembrar que o entendimento consolidado no âmbito do STJ e do STF deve ser adotado sem ressalvas em provas objetivas e subjetivas. A crítica aqui estabelecida pode ser explanada em eventuais provas orais que provoquem o candidato a explanar o tema de forma mais aprofundada, sempre deixando claro o conhecimento acerca da jurisprudência atual.

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Sobre o autor
Rafael Kriek Lucena Cavalcanti

Procurador do Município de Goiânia, Especialista em Direito Constitucional, Ex-Técnico Judiciário do TJDFT e Graduado em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco - UNICAP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAVALCANTI, Rafael Kriek Lucena. Definição de cargo técnico ou científico para fins de acumulação de cargos públicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5958, 24 out. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/65194. Acesso em: 22 dez. 2024.

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