O comércio eletrônico e o amparo do consumidor no direito brasileiro

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28/05/2018 às 00:47
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9. DA GARANTIA LEGAL 

Em busca de garantir ao consumidor a qualidade, eficiência e durabilidade de um produto, o Código de Defesa do Consumidor traz em média três modalidades de garantia, sendo elas: a legal, a contratual e a estendida. 

A garantia legal está expressa no CDC e independe de previsão contratual, é garantida pela lei. Dessa forma, o consumidor terá 30 (trinta) dias para reclamar sobre o fornecimento de serviço ou produtos não duráveis, ou 90 (noventa) dias para reclamar sobre o fornecimento de serviço ou produtos duráveis. Este é o prazo que o Código garante ao consumidor para reclamar ao fornecedor pelos vícios apresentados no produto ou serviço prestado. 

É considerável apontar o vício oculto, trazido pelo Código de Defesa do Consumidor em seu art. 26, §3º, “Tratando-se de vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no momento em que ficar evidenciado o defeito”. 

De acordo com o art. 18 do CDC, o fornecedor e o fabricante tem o prazo de 30 (trinta) dias, a partir da reclamação, para sanar o problema do produto ou serviço. Passado esse prazo, o consumidor pode exigir um produto parecido, a restituição imediata do valor pago, o abatimento proporcional do preço ou a reexecução do serviço. Contudo, o período de um mês não deve ser considerado em caso de se tratar de produto essencial com defeito, nesse caso a troca deve ser imediata, por exemplo, no caso de uma geladeira. 

Todas as possibilidades acima citadas podem ser utilizadas pelo consumidor caso o vício seja irreparável. Neste caso, o consumidor pode reclamar diretamente ao fornecedor ou aos órgãos de defesa e proteção ao consumidor. Importante ressaltar que o Projeto de Lei 1599/99 traz a possibilidade de o consumidor fazer a reclamação ao fornecedor por meio de e-mail. 

O CDC também estabelece que o consumidor pode reclamar sobre o defeito ao fabricante ou à loja onde comprou a mercadoria, conforme preferir, visto que, ambos têm responsabilidade solidária em sanar o problema. 


10. DO DIREITO DE ARREPENDIMENTO                   

A maioria dos consumidores crê que haja previsão do direito de arrependimento para qualquer relação de consumo, no entanto, cabem algumas ressalvas, por não se harmonizar completamente à realidade, para compreender é preciso recorrer ao art. 49 do CDC.

Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.

Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados. (BRASIL, CDC, 1990).

No referido artigo, deve-se atentar a dois institutos específicos, que uma vez não respeitados, não viabilizam tal direito. O primeiro instituto a ser identificado é a exigência de que os contratos de consumo tenham sido realizados fora do estabelecimento comercial, como por exemplo, as compras feitas pela internet, telefone, etc., este instituto protege as compras realizadas fora do âmbito do estabelecimento comercial, pelo fato de que este não tem possibilidades de observar o produto ou serviço, e em razão disso, corre risco de ser surpreendido com a entrega de produto diverso do que foi pedido. O segundo requisito imposto pela lei é o prazo para o consumidor arrepender-se, qual seja, sete dias a partir da conclusão do contrato de consumo ou do recebimento do produto ou serviço, conhecido como prazo de reflexão (RODRIGUES et al., 2018).

Cabe salientar, que o ônus vinculado ao direito de arrependimento, deve ser custeado pelo fornecedor, o qual assumiu os riscos de sua atividade econômica, sendo assim, os gastos realizados pelo consumidor devem ser devolvidos, devidamente ajustados pelos índices oficiais, ou seja, tem-se aqui o direito de reembolso previsto no art. 51, II, in verbis: 

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

[...] 

II - Subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, nos casos previstos neste código. (BRASIL, CDC, 1990).

Como visto, o direito de arrependimento é perfeitamente aplicável ao comércio eletrônico, desde que, respeitados os requisitos acima citados. 

“DIREITO DO CONSUMIDOR. COMPRA DE PASSAGEM AÉREA PELA INTERNET. APLICAÇÃO DO ART. 49 DO CDC. DIREITO DE ARREPENDIMENTO. PRAZO DE REFLEXÃO. MULTA INDEVIDA. RECURSO PROVIDO. 1. A FACULDADE DE DESISTIR DAS COMPRAS REALIZADAS FORA DO ESTABELECIMENTO DO FORNECEDOR, PREVISTA NO ART. 49 DO CDC, APLICA-SE AOS CONTRATOS DE TRANSPORTE AÉREO DE PASSAGEIROS, FORMALIZADOS ATRAVÉS DA INTERNET, NO SÍTIO ELETRÔNICO DA COMPANHIA. PRECEDENTES. 2. INDEVIDA A COBRANÇA DE MULTA PELO EXERCÍCIO DO DIREITO DE ARREPENDIMENTO NO PRAZO DE REFLEXÃO LEGALMENTE ASSEGURADO AO CONSUMIDOR. 3. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJ-DF - ACJ: 20130111143480 DF 0114348-08.2013.8.07.0001, Relator: LUIS MARTIUS HOLANDA BEZERRA JUNIOR, Data de Julgamento: 04/02/2014, 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Publicação: Publicado no DJE : 18/03/2014 . Pág.: 390)”


11. DESCUMPRIMENTO DE PRAZO 

As negociações via e-commerce podem causar algumas inseguranças por parte dos consumidores, entre as mais preocupantes está o efetivo envio do produto, bem como o prazo para recebimento do mesmo, pois muito do que se presencia nessas negociações são os atrasos nos prazos de entrega. Como forma de proteção ao consumidor digital lhe é assegurado o direito de receber os produtos e os serviços próprios e adequados ao consumo, sem qualquer vício ou defeito, em conformidade com as características informadas, o preço divulgado e o prazo acordado com o fornecedor quando da aquisição nos sites de comércio eletrônico (MOTA, 2018).

O descumprimento de prazos causa enorme frustração ao consumidor, devido a isso, alguns estados brasileiros criaram normas para assegurar à implantação da entrega de forma agendada, minimizando assim, problemas enfrentados pelos consumidores. Como exemplo temos o Estado de São Paulo que editou a Lei n. 13.747/2009, cuja redação original, estabelecia: “Ficam os fornecedores de bens e serviços localizados no Estado obrigados a fixar data e turno para realização dos serviços ou entrega dos produtos aos consumidores” (SETTE, 2013).

Assim sendo, em 02 de fevereiro de 2013, foi editada a Lei n. 14.951/2013, que alterou o artigo 1º da Lei n. 13.747/2009, o qual passou a vigorar da seguinte forma: “Ficam os fornecedores de bens e serviços localizados no Estado obrigados a fixar data e turno para realização dos serviços ou entrega dos produtos aos consumidores, sem qualquer ônus adicional aos consumidores”.

Segundo Maria Eugênia Reis Finkelstein:

Em se tratando de comércio eletrônico, a oferta nada mais é do que as informações sobre os preços, condições de pagamento, prazos de entrega que aparecem na tela do computador do consumidor quando este acessa o site de comércio eletrônico, sendo que extrema atenção deve ser dada às condições veiculadas no site. [...] 

Neste sentido, as seguintes providências devem ser tomadas pelo site voltado ao comércio eletrônico: (i) disponibilização de informações objetivas e precisas, evitando interpretação ambígua; (ii) análise cuidadosa de ofertas que serão veiculadas; e (iii) constante revisão e atualização do conteúdo do site (VIANA, 2010). 

“AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. COMPRA PELA INTERNET. PRAZO PARA A ENTREGA NÃO CUMPRIDO. CANCELAMENTO DA COMPRA. DESCONTO DAS PRESTAÇÕES INDEVIDAMENTE LANÇADAS NAS FATURAS DE CARTÃO DE CRÉDITO DO AUTOR. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. APLICAÇÃO DO ART. 42, CAPUT, DO CDC. DANO MORAL CARACTERIZADO. QUANTUM MANTIDO. O quantum outorgado na sentença, qual seja, o de R$ 2.500,00 não merece majoração. Isto porque foi fixado dentro dos parâmetros utilizados pelas Turmas Recursais em casos análogos, levando em consideração a condição socioeconômica das partes e os princípios da racionalidade e da... (TJ-RS - Recurso Cível: 71003496361 RS, Relator: Marta Borges Ortiz, Data de Julgamento: 26/07/2012, Primeira Turma Recursal Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 31/07/2012)”


12. OUTRAS PROIBIÇÕES

Devido a fácil troca de dados e informações em ascensão na internet, fornecedores tem facilmente contato com seus consumidores e potenciais consumidores, forçando compras através da prestação de serviços ou entregas de produtos que consumidores não solicitaram, infelizmente uma prática comum, tanto que o CDC prevê algumas proibições para proteger o consumidor, mas especificamente em seu art. 39, in verbis:

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Art. 39 É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

[…]III - enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço. (BRASIL, CDC, 1990).

Rizzato Nunes (2013, p. 45), analisa essa prática abusiva da seguinte maneira:

A norma é taxativa em proibir o envio ou a entrega ao consumidor sem que este tenha previamente solicitado qualquer produto ou serviço. O parágrafo único sanciona a violação à proibição, dispondo que o produto e o serviço enviado ou entregue sem solicitação tornem-se gratuitos, equiparando-se às conhecidas “amostras grátis” que os fornecedores utilizam para promover seus produtos e serviços.  

E diante desse contexto, é nítido que qualquer produto ou serviço só deve ser fornecido mediante solicitação do consumidor.  O fornecedor de produto ou serviço deve dar prévia informação sobre as despesas de remessa do produto, além de não executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do consumidor, como também não cobrar quantia indevida, que uma vez paga, deverá ser devolvida em dobro corrigida monetariamente e com juros.

Tal sanção é necessária e apropriada, porém não é suficiente para solucionar os problemas em determinados casos. Um exemplo claro se dá, quando o fornecedor envia à residência do consumidor um livro, um ingresso para um show, um perfume, dentre outros produtos e presta alguns serviços, aplica-se plenamente a equiparação a “amostra grátis” do parágrafo único do art. 39, CDC. O incômodo maior decorre de quando se trata de determinados serviços, de modo que o envio viola gravemente os direitos do consumidor, podendo causar severos danos. Conforme se vê, o Poder Judiciário brasileiro prevê a sanção e coíbe essa prática, condenando, o fornecedor que pratica essa conduta abusiva, ao pagamento de danos morais ao consumidor ofendido. 

“PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE TELEFONIA MÓVEL SERVIÇO DE INTERNET NÃO REQUISITADO E/OU CONTRATADO TARIFA INDEVIDA AMOSTRA GRÁTIS - CDC, ARTIGO 39, III E PARÁGRAFO ÚNICO - AÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO PROCEDENTE E RECURSO NÃO PROVIDO. Considera-se amostra grátis o serviço oferecido pela concessionária de telefonia quando não requerido pelo consumidor ou objeto do contrato, não obstante dele tenha utilizado. DANOS MORAIS PESSOA JURÍDICA NECESSIDADE DE PROVA. A pessoa jurídica pode sofrer dano moral, no entanto, não se tratando de danos presumíveis, demandavam prova específica. (TJ-SP - APL: 09196243020128260506 SP 0919624-30.2012.8.26.0506, Relator: Clóvis Castelo, Data de Julgamento: 30/06/2014, 35ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 30/06/2014)”

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