Guarda compartilhada: as vantagens

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2. REFLEXÕES: GUARDA COMPARTILHADA

Neste capítulo, será abordado o conceito, os tipos de guardas, a guarda em outros países e, em especial, a guarda compartilhada. Como já foi mencionado no capítulo anterior, a guarda compartilhada surgiu na década de 60. Esta modalidade de guarda emergiu para suprir as necessidades no direito de família, com a intenção de ambos os genitores compartilharem os deveres e obrigações em relação aos filhos, permitindo assim que a família se mantenha unida sem desavenças após a ruptura do casal conjugal.

2.1. Guarda: Conceito

"Guarda" deriva do alemão "wargem", do inglês "warden" e do francês "garde", podendo ser interpretada de forma genérica para expressar vigilância, proteção e segurança. Trata-se de um direito-dever que os pais, ou um dos pais, estão incumbidos de exercer em favor dos filhos. Simone Roberta Fontes (2009, p. 35).

Assim, guarda compartilhada é um dos meios para continuar a relação dos pais quevivem separados para exercerem juntos a responsabilidade de prestar assistência material emoral dos filhos.Fontes apud Grisard define que a guarda´` um dever natural e originário dos paisque consiste na convivência com seus filhos´´ previsto no art. 1634, II, do CC e é opressuposto que possibilita o exercício de todas as funções patenas.Diante disso a guarda compartilhada é um conjunto de deveres e obrigações que oordenamento jurídico impõe aos pais em relação aos filhos, visa também o direito do pai dedesfrutar da convivência do filho.O entendimento no sentido jurídico para Ana Maria Milano Silva, é o ato ouefeito de guardar e resguardar o filho enquanto menor, de manter vigilância no exercício de sua custódia e de representá-lo quando impúbere ou, se púbere, de assisti-lo, agirconjuntamente com ele em situações ocorrentes. (2008.p 39).

Deste modo, a guarda compartilhada permite aos pais viverem em aproximação dos filhos, visando sempre o bem-estar da criança, no sentido de protegê-la e dar toda a assistência necessária. Para Eduardo de Oliveira Leite:

O direito de guarda, exercido pelos pais em relação aos filhos, é antes um dever deassistência material e moral do que uma prerrogativa. Acarreta obrigação dos paisrelativamente à sobrevivência física e psíquica dos filhos. Embora o Código Civiltenha privilegiado a noção de direito, Estatuto da Criança e do Adolescente imprimiu nova característica ao instituto, favorecendo a idéia de dever, em favor dosmenores. (Leite. 1997.p 193).

Com as mudanças no comportamento familiar, foram surgindo novas realidades jurídicas, buscando sempre inovações para atender ao convívio familiar diante de conflitos e assegurar o melhor interesse da criança. Ana Maria Milano entende que a questão da guarda evolui conforme as novas realidades civis foram surgindo e foi sendo regulada através de várias legislações específicas, como o Código dos Menores, a Lei do Divórcio, e o Estatuto da Criança e do Adolescente, pela especial circunstância de ter de colocar como prioridade os interesses do menor, em consonância com seus direitos fundamentais destacados no artigo 227 da Constituição Federal de 1988, direito à vida, à saúde, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, e à convivência familiar e comunitária (2008, p. 46).

Portanto, hoje a lei busca garantir o melhor interesse da criança, analisando todas as possibilidades de atender às dificuldades trazidas pela convivência familiar. Com análise de exatamente o que a lei deseja expressar como interesse do menor, explica Eduardo de Oliveira Leite:

O interesse do menor serve, primeiramente, de critério de controle, isto é, de instrumento que permite vigiar o exercício da autoridade parental sem questionar a existência dos direitos dos pais. Assim, na família unida, o interesse presumido da criança é de ser educado por seus pais; mas se um deles abusa ou usa indevidamente suas prerrogativas, o mesmo critério permitirá retirar, ou controlar mais de perto, o exercício daquele direito. O interesse do menor é utilizado, de outro lado, como critério de solução, no sentido de que, em caso de divórcio, por exemplo, a atribuição da autoridade parental e do exercício de suas prerrogativas pelos pais depende da apreciação feita pelo juiz do interesse do menor (Leite, 1997, p. 195).

2.2. Tipos de Guarda

Com o vínculo matrimonial ou a união estável e a decorrência da maternidade e paternidade, surge o primeiro modelo de guarda, conhecido, segundo Luiz Felipe Lyrio Peres (2003, p. 10-11), como guarda comum ou originária, que não é judicial, mas sim natural, em que ambos os cônjuges exercem plenamente todos os poderes inerentes do pátrio poder, consequentemente a guarda, não existindo, portanto, a figura do não guardião.

Com a união da família, nasce a guarda judicial, na qual a guarda será deferida de acordo com a norma que melhor atenda ao interesse do menor, podendo dessa maneira o magistrado seguir cinco direções na sua decisão final, quais sejam: optar pela guarda única, compartilhada, alternada, dividida ou negação.

De acordo com Luiz Felipe Lyrio Peres,

Com a interposição de um processo de guarda/separação/divórcio, e o surgimento deuma “disputa” pela posse do menor o juiz antes de decidir o mérito da ação, é obrigado a determinar a guarda provisória para um dos cônjuges/parceiros, essa aqual não pode ser considerada um modelo de guarda, mas sim uma situação momentânea em que o menor está, uma vez que quando a ação for julgado no seu mérito, ocorrerá a guarda definitiva, que também não é um modelo de guarda, porque a guarda definitiva terá que adotar um dos cinco modelos de guarda pós ruptura conjugal: guarda única, compartilhada ou alternada, dividida (PERES, 2003, p. 11).

No Brasil, antes da aprovação da lei sobre guarda compartilhada, predominava a guarda única, exclusiva de um dos genitores, o qual detém a guarda física, que é a de quem possui a proximidade diária do filho, e a guarda jurídica, que é de quem dirige e decide as questões do menor. A guarda única é um sistema onde a criança só terá contato com os pais nos dias e horários fixados, nesse sistema a criança não pode compartilhar a presença com um dos pais por muito tempo, pois os horários são fixos.

A guarda alternada é diferenciada, pois raramente é concedida e ocorre geralmente por escolha de ambos os genitores ou de ambas as partes interessadas. Para Simone Roberta Fontes, esta modalidade se caracteriza por períodos de tempo pré-determinados, que podem ser anuais, semestrais, mensais, ou mesmo uma repartição organizada no dia-a-dia (2009, p. 43).

A guarda alternada não tem continuidade do lar, pois se caracteriza por períodos pré-determinados, conforme Simone Roberta Fontes (2009, p. 44). Esta modalidade de guarda foi proibida na França, em 1984, e no Brasil não é prevista essa modalidade de guarda, pois é considerada prejudicial aos hábitos e à formação do menor.

A guarda dividida é uma modalidade de guarda em que o menor tem residência fixa, recebendo visitas do pai ou mãe que não tem a guarda. Para Waldyr Grisard Filho:

este sistema tem efeito destrutivo sobrerelacionamento entre pais e filhos. (...) é o sistema de visitas que tem efeito destrutivo sobre o relacionamento entrepais e filhos, uma vez que propicia o afastamento entre eles, lento e gradual, atédesaparecer. Ocorrem encontros e repetidas separações. São os próprios pais quecontestam e procuram novos meios de garantir uma maior e mais comprometidaparticipação na vida dos filhos depois de finda a sociedade conjugal. (GRISARD, 2002, p. 108).

A guarda existente é a nidação, também conhecida como aninhamento, na qual os filhos residem em um único lar enquanto os pais se revezam, mudando-se para a casa onde vivem as crianças. Esta modalidade não é muito utilizada. Simone Roberta Fontes conceitua a guarda compartilhada:

A guarda compartilhada ou conjunta é um dos meios de exercício da autoridadeparental, para os pais que desejam continuar a relação entre pais e filhos, quando fragmentada a família. É um chamamento aos pais que vivem separados para exercerem conjuntamente esta responsabilidade. (2009, p. 36).

Assim, a guarda compartilhada significa dar continuidade ao convívio da criança com os pais, assegurando o desenvolvimento por ambas as partes e dividindo a responsabilidade de ambos os genitores em relação à proteção dos filhos, sempre priorizando o melhor interesse da criança.

2.3. Guarda Compartilhada

No artigo 1583, §1º do Código Civil, segunda parte, encontra-se o seguinte conceito:

“compreende-se por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e oexercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns”.

Nesse sentido, a guarda compartilhada vem com a ideia de convivência familiar, que é um dos mais importantes direitos das crianças e adolescentes. Portanto, pretende equilibrar os papéis de ambos os genitores em decisões importantes, havendo uma participação em igualdade de direitos e deveres sobre os filhos. Contudo, o sistema jurídico busca reduzir as desavenças entre os pais. Para o jurista Waldyr Grisard Filho:

A guarda compartilhada possibilita manter intacta a vida cotidiana dos filhos dodivórcio, dando continuidade ao relacionamento próximo e amoroso com os dois genitores, sem exigir que os filhos optem por um deles . (Grisard, 2002.p. 172).

Nessa dinâmica, Lucas Hayne Dantas Barreto

[...] também identificada por guarda conjunta (joint custody, no direito anglo-saxão), entende-se um sistema onde os filhos de pais separados permanecem sob aautoridade equivalente de ambos os genitores, que vêm a tomar em conjunto, decisões importantes quanto ao seu bem estar, educação e criação. É tal espécie deguarda um dos meios de exercício da autoridade parental, quando fragmentada afamília, buscando-se assemelhar as relações pai/filho e mãe/filho que naturalmentetendem a modificar-se nesta situação às relações mantidas antes da dissolução daconvivência, o tanto quanto possível (BARRETO, 2003, p. 2).

Nesse sentido, a guarda compartilhada possibilita manter o contato com os pais separados, assegurando ao menor e ao adolescente a convivência familiar, sem distinção entre os direitos de ambos os genitores. Assim, permite conceder o equilíbrio dos papéis parentais, em uma cultura que tende a formar uma sociedade. Essa igualdade de direitos se estende no que diz respeito ao exercício do poder parental, que é exercido em igualdade de condições pelo pai ou pela mãe, não importando se estão separados ou não. Cumpre esclarecer que a guarda compartilhada não se trata apenas de estabelecer o princípio da igualdade entre homem e mulher.

Para Simone Roberta Fontes,

O que leva em consideração é a JUSTIÇA, pois tanto o homem, pai, a mulher, mãe, devem ter seus direitos e deveres em relação aos filhos para que estes sejambeneficiados mesmo numa situação difícil, a qual é a de ruptura familiar, pois pormais consensual ou amigável que seja, há a ruptura de um vínculo existente, de umaconvivência, há uma mudança nos hábitos, nos costumes o que causa dor esofrimento para todas as partes, sendo os filhos mais prejudicados. (2009.p. 97).

Como bem coloca o ilustre Waldyr Grisard Filho,

Este modelo, priorizando o melhor interesse dos filhos e a igualdade dos gêneros noexercício da parentalidade, é uma resposta mais eficaz à continuidade das relaçõesda criança com seus dois pais na família dissociada, semelhantemente a uma família intacta. É um chamamento dos pais que vivem separados para exerceremconjuntamente a autoridade parental, como faziam na constância da união conjugal, ou de fato (GRISARD FILHO, 2002, p. 7).

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Portanto, com o advento da lei 11.698 de 2008, prevaleceu a responsabilidade em relação aos filhos. Compartilhar a guarda de um filho é garantir que ele terá pais igualmente engajados no atendimento aos deveres inerentes ao poder da família, garantindo ao menor mais segurança, melhor desenvolvimento e formando assim uma convivência parental sadia e harmoniosa que acarreta o melhor interesse da criança.

Com análise, explica Simone Roberta Fontes.

A guarda compartilhada diminui a angústia produzida pelo sentimento de perda dogenitor que não detém a guarda tal como ocorre co freqüência na guarda exclusiva. Ajuda a diminuir os sentimentos de rejeição causados nos filhos e proporciona-lhes aconvivência com os papéis paternos e materno, livre de conflitos, facilitando oprocesso de socialização e identificação. (FONTES. 2009. p. 85).

Contudo, a lei tem como finalidade proteger o melhor interesse da criança e do adolescente, assegurando direitos fundamentais como à vida, à saúde, à educação, ao lazer, à dignidade, à liberdade, à convivência familiar e, por fim, à alimentação. É importante destacar que, mesmo na guarda compartilhada, continua valendo a obrigação da pensão alimentícia. Conforme observou o Juiz Arnaldo Camanho: "A obrigação de sustentar o filho continua existindo". No entanto, os valores poderão ser revistos diante do aumento ou redução das despesas dos responsáveis (2008).

Para Maria Milano Silva:

O compartilhamento de todas as responsabilidades sobre o filho e não só afinanceira evita sentimentos de injustiça e revolta por parte dos genitores, bem comonão sobrecarrega apenas um deles. Está comprovado que a guarda compartilhada portambém revelar certa equidade na forma como as despesas com filhos são divididas, apresenta elevada taxa deles. Além desse aspecto, a guarda compartilhada da mesmaforma estimula a cooperação entre os pais, o que acaba por beneficiar os filhos jáque tende a diminuir, ao longo do tempo, os conflitos por questões financeiras, aomesmo tempo que traz grande satisfação ao pai por se sentir participante da vida dascrianças. (2008.p. 128).

2.4 Guarda Compartilhada: Inglaterra e França

A guarda compartilhada surgiu no common law do direito inglês na década de sessenta. Assim acrescenta Simone Roberta Fontes, que no Direito Inglês busca-se distribuir igualmente, entre os genitores, as responsabilidades perante os filhos, cabendo à mãe os cuidados diários com os filhos e ao pai o poder de dirigir conjuntamente a vida dos menores (2009, p. 25).

Segundo os estudos do professor Eduardo de Oliveira Leite:

(...) na Inglaterra o pai sempre foi considerado proprietário de seus filhos, logo, emcaso de conflito, a guarda lhe era necessariamente concedida. Somente no séculoXIX, o Parlamento inglês modificou o princípio e atribuiu à mãe a prerrogativa deobter a guarda de seus filhos e, a partir de então, a prerrogativa exclusiva do paipassou a ser atenuada pelo poder discricionários dos tribunais.Pelo fato da guardaconferir ao seu titular poderes muito amplos sobre a pessoa do filho, a perda dessedireito do pai se revelou injusta e os Tribunais procuram minorar os efeitos de não –atribuição, através da split order (isto é, guarda compartilhada) que nada mais é, senão, um fracionamento do exercício do direito de guarda entre ambos osgenitores.Enquanto a mãe se encarrega dos cuidados cotidianos da criança, care andcontrol (cuidado e controle ), ao pai retorna o poder de dirigir a vida domenor. (LEITE, 1997, p. 266).

Dessa maneira, de acordo com Luiz Felipe Lyrio Peres (2003, p. 14), “as decisões dos tribunais ingleses passaram a beneficiar sempre o interesse do menor e a igualdade parental, abolindo definitivamente a expressão direito de visita, possibilitando assim maior contato entre pai/mãe e filho”.

Tal instituto aos poucos foi ganhando repercussão na Europa, e aproximadamente no ano de 1976, conforme Luiz Felipe Lyrio Peres (2003, p. 14), foi profundamente assimilada pelo direito francês, com a mesma intenção da guarda compartilhada criada no direito inglês, ou seja, dirimir os malefícios que a guarda única provoca para os cônjuges e seus filhos.

Dessa forma, “o ordenamento jurídico francês, após a introdução da Lei 87.570, ratificou o posicionamento dos tribunais, passando a mencionar que todos os direitos inerentes dos pais sobre seus filhos irão continuar após o divórcio”.

Segundo Luiz Felipe Lyrio Peres (2003, p. 14), tomando como contexto a convivência familiar, a guarda compartilhada é um fato social e jurídico.

O fato social determina a criação e imposição de uma norma jurídica. Consideramos que a aprovação de tantas mudanças significativas no Direito de Família é consequência de valores sociais que determinaram, dentre várias questões familiares, a elevação da guarda compartilhada ao amparo legal e social. Consideramos que o convívio familiar determina a existência desse tipo de guarda, justificando-a através das relações afetivas baseadas nas experiências vivenciadas no dia a dia. Contudo, a guarda compartilhada proporciona muitas vantagens, como evitar os conflitos entre os pais, sempre olhando o melhor interesse do menor. Além disso, o filho poderá conviver com ambos os genitores, sendo que os pais poderão dividir as mesmas responsabilidades com os filhos.

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Sobre as autoras
Anna Carolynna de Oliveira Ribeiro

aluna no curso de Direito Ulbra Iles

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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