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Avaliação de empresas em apuração de haveres judiciais

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17/08/2020 às 12:00
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Sinopse: O artigo apresenta os principais métodos de avaliação de empresas, com ênfase nos processos aplicáveis a apuração de haveres judiciais, em que se processa a resolução de sociedade em relação a um ou mais sócios. É apresentada a avaliação pelo método contábil com suas limitações. Em seguida são apresentados os fundamentos da avaliação por fluxo de caixa descontado, tanto o fluxo de caixa livre para os sócios, quanto o fluxo de caixa livre para a empresa. São apresentados o Balanço de Determinação em seus principais fundamentos, conceitos e metodologia de ajustes. É apresentado um breve relato sobre os intangíveis, inclusive o goodwill. O Balanço de Determinação, como ficará demonstrado, supera a maioria das limitações da contabilidade societária, podendo ser melhorado se apurado juntamente com os métodos de avaliação utilizados nas negociações de fusões e aquisições. A conclusão é de que, também na apuração de haveres, não existe melhor método, mas sim aquele que mais se adapta a realidade da empresa a ser avaliada, com intuito de buscar solucionar, de modo mais justo possível, o litígio objeto da avaliação. O balanço de determinação avalia os ativos líquidos individualmente ao valor de mercado, enquanto o fluxo de caixa descontado pode avaliar o conjunto patrimonial como um todo, revelando a efetiva capacidade de geração de lucros.

Palavras-chave: Avaliação de Empresas. Apuração de Haveres. Balanço de Determinação. Fluxo de Caixa Descontado.


1 INTRODUÇÃO

Entre as várias possibilidades e formas de avaliação de sociedades, há aquela desenvolvida em processos judiciais, em que é exigida a apuração de haveres consubstanciada em laudo pericial contábil, o qual é elaborado por perito em contabilidade por determinação judicial.

Resolução societária em função da retirada ou do falecimento, de um ou mais sócios, é a antiga dissolução parcial de sociedades. O termo resolução de sociedades foi criado pelo novo Código Civil de Brasileiro de 2002.

A definição do quanto vale uma participação societária na apuração de haveres judiciais, no caso de resolução da sociedade em relação a um ou mais sócios ou acionistas, é uma tarefa complexa que envolve uma série de decisões subjetivas.

O sócio que se retira ou os herdeiros do sócio falecido, ao requerer sua parte na sociedade, tendem a superavaliar o valor da empresa; em contrapartida, quem permanece, procura subavaliá-la. Sá (2007, p. 15) elucida bem a situação: “há sempre uma ‘discrepância’ constatável entre o que se informa ter e o que na realidade um empreendimento tem”.

Para auxiliar o Juízo na tarefa de apurar o justo valor dos haveres devidos ao sócio retirante, ou aos herdeiros do sócio falecido, surge a figura do Perito-Contador, que supre a falta de conhecimento especializado do magistrado, advogados e partes litigantes.

Para a execução desta, tarefa é exigido conhecimento técnico e científico de quem irá avaliar uma participação societária, razão pela qual somente peritos bem preparados devem ser convocados para este labor.

A tarefa de avaliar um ativo gera inúmeros questionamentos e discordância quanto à metodologia adequada, a avaliação de uma empresa em um processo judicial, composta de inúmeros ativos, onde concorrem interesses via de regra conflitantes, o que torna a tarefa, ainda, mais complexa e delicada.

Este artigo visa dar uma visão sobre procedimentos para avaliação do patrimônio de empresas no curso de demandas judiciais, dentre os vários modelos e métodos que a doutrina apresenta, principalmente, via balanço de determinação ou fluxo de caixa descontado.


2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 RESOLUÇÃO SOCIETÁRIA

A resolução da sociedade em relação a um sócio ou mais sócios, de acordo com Hoog (2005, p. 168), “é uma decisão, deliberação, ou a capacidade de resolver o direito de um sócio em relação ao conjunto da sociedade”, que ocorre pela apuração dos seus haveres, é a antiga dissolução parcial de sociedade, tratada nos artigos 1.030 e 1.085 do Código Civil. “Capacidade de resolver, liquidar, pagar, pôr termo ao valor dos haveres do sócio que se despende voluntária ou compulsoriamente”.

Hoog (2007) destaca que a resolução em relação a um sócio ou mais sócios, é um mecanismo diferente da dissolução, pois assegura a preservação da empresa. Em razão do interesse social da conservação do empreendimento econômico, viável ou próspero, o Código Civil, no inciso IV, art. 1.033, consagrou o princípio da preservação das empresas, pois as Sociedades Limitadas Simples e Empresárias podem permanecer até 180 dias com apenas um sócio.

2.2 APURAÇÃO DE HAVERES

Proceder na apuração de haveres significa buscar o montante do patrimônio líquido que cabe ao interessado em função de sua participação no capital social. Pela definição de Ornelas (2001, p. 23), apuração de haveres é:

Procedimento judicial ordenado pelo magistrado, desenvolvido por perito em contabilidade, que tem por meta a avaliação das quotas societárias, ou seja, a mensuração da participação societária de sócio dissidente, excluído, ou pré-morto em sociedades contratuais.

Ornelas (2001), alerta, ainda, para que a apuração de haveres em favor do sócio retirante ou dos herdeiros do sócio falecido seja apurada de forma mais ampla possível, pois os herdeiros têm direito ao reembolso da parcela que lhes cabe da riqueza societária gerada e acumulada até o momento do evento, à medida que o sócio pré-morto contribuiu com seu capital e, inclusive, esforço intelectual para a formação do patrimônio societário, do mesmo modo, o sócio dissidente ou excluído.

2.3  AVALIAÇÃO DE EMPRESAS

A avaliação de uma empresa é um processo complexo que, embora todos os métodos sejam quantitativos, envolve premissas subjacentes à sua aplicação, que estão sujeitas a critérios subjetivos, onde a quantidade e qualidade das informações utilizadas e o tempo despendido em compreender a empresa a ser avaliada, são condições fundamentais para a elaboração de um bom trabalho.

Sá (2007, p. 33) diz que não existe realidade absoluta em avaliações monetárias de riquezas e destaca: “as avaliações patrimoniais são expressas em valores monetários, e estes possuem como fator inerente a relatividades”.

A avaliação de empresas dentro do processo de negociações de fusões e aquisições tem por objetivo a fixação de um preço referencial para a tomada de decisão, com isto, diminuindo fatores de ordem emocional e especulativos. Damodaran (1997, p. 9) ensina que quaisquer percepções que o avaliador trouxer ao processo de avaliação acabarão por se incorporar ao valor da empresa, influenciando sob a ótica de uma das partes envolvidas ou sendo neutro, além de influenciar por suas preferências e valores.

Falcini (1995, p. 15) esclarece esta questão com precisão quando diz:

Uma avaliação econômica, ao contrário do que possa parecer, não é uma fixação concreta de um preço ou valor específico de um bem, mas é uma estimativa de base, uma tentativa de estabelecer, dentro de uma faixa, um valor referencial de tendência, em torno do qual atuarão as forças de mercado.

De igual forma na apuração de haveres em processos judiciais, de acordo com Perez & Famá (2003), o processo de avaliação não visa a fixação de um “preço” para a sociedade, mas sim, a busca de um valor justo, que reflita com propriedade as características e os diferenciais da empresa avaliada.

Martins (2001, p.264) enfatiza com precisão: “O valor de uma empresa depende primordialmente dos benefícios líquidos que se poderá extrair no presente e no futuro”, e adverte:

Ninguém venderia uma empresa em funcionamento por menos do que obteria se a fechasse; e ninguém cerraria as portas de uma empresa se ela pudesse ser vendida por valor melhor em pleno funcionamento. Logo o valor econômico de uma empresa é dado pelo maior dos montantes alcançados, nessas duas alternativas: em liquidação ou em marcha.

Martins (2001), ao definir Ativo, considera que os ativos, em termos contábeis, precisam ser fundamentados economicamente como agentes que proporcionam resultados econômicos. Neste enfoque, é secundário o valor de aquisição dos agentes, mesmo porque as entidades não adquirem, por exemplo, máquinas para vendê-las enquanto tal, mas o que resulta das máquinas: os produtos fabricados ou serviços por elas prestados.

Não existe um modelo avaliatório considerado melhor ou mais adequado para o uso em um cenário específico, que dependerá da variedade de características da empresa que está sendo avaliada, tempo e recursos que são gastos desnecessariamente para tentar fazer com que ativos se encaixem em um modelo de avaliação pré-especificado. (DAMODARAN, 1997, p. 302).

Dentro dos vários métodos de avaliação de empresas existentes e reconhecidos, para se avaliar uma empresa pode se destacar: contábil e fluxo de caixa descontado (FCD), que serão tratados neste artigo, embora se reconheça grande utilização dos métodos de avaliação por múltiplos ou avaliação relativa, EVA (Economic Value Added – Valor Econômico Adicionado) e Opções.

Os métodos apresentados não são substitutos uns dos outros, mas complementares entre si, pois cada um deles atende a determinados objetivos e análises, devendo o Perito, sempre que possível, utilizá-los em conjunto e não isoladamente, sendo a integração dos métodos absolutamente viável em teoria e na prática, como demonstra Martins (2001), ao afirmar que todos os métodos buscam evidenciar o mesmo objeto: de forma geral, o patrimônio, e de forma específica e final, o caixa.

2.3.1. Método de avaliação contábil ou Book Value:

Modelo que propõe determinar o valor de uma empresa pelos números contábeis, por um ponto de vista estático, que não contempla a possível evolução da empresa no futuro, com o conceito de valor do dinheiro no tempo, além de não guardar relação com o valor patrimonial de mercado.

A inadequada, ou pouca, ou até mesmo a falta de escrituração contábil de fatos patrimoniais, por interferência da legislação tributária ou societária, conduz, em princípio, a inutilidade do modelo contábil para avaliação de uma empresa.

A inutilidade do balanço patrimonial, para avaliação de uma empresa, é reconhecida por vários doutrinadores, entre eles Sá (1994, p. 122), que às vezes troca a inutilidade por falsidade. Outro autor, Vaz (1993, p. 78), que trata o balanço patrimonial como deficiente, ensina “que a contabilidade, tal como é feita no Brasil, é deficiente e não espelha a real situação do valor do conjunto empresarial”.

De acordo com o Pronunciamento Conceitual Básico – Estrutura Conceitual para Elaboração e Divulgação de Relatório Contábil-Financeiro (CPC 00), os relatórios contábil-financeiros tem como objetivo fornecer informações contábil-financeiras sobre a entidade, mas não são elaborados para se chegar ao valor da entidade que reporta a informação; a rigor, fornecem informação para auxiliar usuários da informação a estimarem o valor da entidade que reporta a informação.

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O grande descompasso existente entre a Contabilidade tradicional e o processo avaliatório de sociedades que considera o valor econômico dos ativos, enquanto aquela está subordinada aos princípios tradicionais de contabilidade, é ressaltado por Ornelas (2001, p. 35).

As principais dificuldades da utilização do método contábil são:

- As demonstrações contábeis são baseadas em custos históricos, não atribuindo aos ativos seus valores correntes;

- O Balanço Patrimonial resume em uma mesma data valores presentes (saldo de caixa), valores futuros (valores a receber) e valores passados (estoques, valor original de aquisição);

- A contabilização de acordo com o princípio de competência, associada com os conceitos da realização de receitas e da confrontação de despesas, torna a contabilidade desbalanceada com relação a alguns direcionadores de valor como o conceito do valor do dinheiro no tempo e do risco associado;

- Existem várias operações que não são registradas nas demonstrações contábeis, que são muito relevantes para apuração do valor econômico de uma empresa, como operações de arrendamento mercantil, derivativos, garantias oferecidas, etc;

- Não apresenta a mais ou menos-valia ambiental ou social;

- Ativos intangíveis, de valores relevantes, não são registrados nas demonstrações tradicionais, tais como: goodwill, relacionados a marketing, relacionados a clientes, relacionados às artes, baseados em contrato e baseados em tecnologia.

2.3.2 Avaliação por Fluxo de Caixa Descontado (FCD)

A avaliação por fluxo de caixa descontado está fundamentada no conceito de que o valor de uma empresa está diretamente relacionado aos fluxos de caixa futuros que ela irá produzir, ou seja, a capacidade de geração de riqueza futura, considerando um grau de risco de seus ativos. A essência desta metodologia consiste em projetar futuros fluxos de caixa operacionais e trazê-los a valor presente por uma taxa de desconto apropriada, que mensure o risco inerente a estes fluxos e o custo de oportunidade dos capitais (Perez & Famá, 2003).

Damodaran (2002) defendeu que "o valor de um ativo decorre de sua capacidade de geração de fluxos de caixa" e explica (2002, p. 214) "o valor de uma empresa é o valor presente de seus fluxos de caixa previstos ao longo de sua vida". No mesmo sentido, Iudícibus (1997, p. 124), argumenta que ativos são recursos controlados pela entidade, capazes de gerar fluxos de caixa.

O FCD é uma tecnologia científica contábil que tem por objetivo a mensuração monetária do saldo de caixa em um longo período de tempo a valor presente por uma taxa de desconto, assim o valor de qualquer ativo é o valor presente dos fluxos de caixa futuros dele esperados.

O conceito de ativo contribui com esse entendimento. Ativo é um recurso: (a) controlado pela entidade como resultado de eventos passados; e (b) do qual se espera que resultem benefícios econômicos futuros para a entidade. Assim, se não houver a expectativa de contribuição futura, de forma direta ou indireta, ao caixa da empresa, não existe o ativo.

Para Martins (2001, p. 275), "entre os modelos apresentados, o fluxo de caixa é tido como aquele que melhor revela a efetiva capacidade de geração de riqueza de determinado empreendimento", sendo este o indicativo do mercado, pois o FCD pode ser considerado a metodologia mundialmente mais utilizada na precificação de empresas e ativos em processos de fusões e aquisições.

Há dois caminhos para se mensurar o FCD, um para obter o Fluxo de Caixa Livre para o Sócio (Free Cash Flow to Equity - FCFE), outro para se obter o Fluxo de Caixa Livre para a Empresa (Free Cash Flow For The Firm - FCFF).

2.3.2.1 Fluxos de Caixa Livre para os Sócios (Free Cash Flow to Equity – FCFE)

Os FCFE representam os fluxos de caixa remanescentes após o cumprimento de todas as obrigações financeiras, o que inclui o pagamento de juros e do principal, bem como os pagamentos dos ativos:

Assim, o fluxo de caixa livre do acionista pode ser obtido através da seguinte fórmula:

Tabela 1: Fórmula de obtenção do fluxo de caixa livre dos acionistas

            (+) Lucro líquido do exercício

            (+) Depreciação

            (-) Desembolsos de capital

            (-) Variação do capital de giro

            (-) Amortização da dívida

            (+) Novas emissões de dívida

            (=) FCFE (Fluxo de caixa livre dos acionistas)

Fonte: Schmidt, Santos e Fernandes (2006, p. 100).

O Fluxo de Caixa Livre para os Sócios também é chamado de Fluxo de Caixa do Capital Próprio.

2.3.2.2 Fluxos de Caixa Livre para a Empresa (Free Cash Flow For The Firm - FCFF)

O valor da empresa é obtido descontando-se fluxos de caixa esperados para a empresa, ou seja, os fluxos de caixa residuais após a realização de todas as despesas operacionais e impostos, mas antes do pagamento das dívidas, pelo custo médio ponderado de capital (Weighted Average Cost of Capital - WACC).

O FCFF é o montante de recursos que pode ser extraído da empresa sem que seu valor seja reduzido, ou seja, é o valor do rendimento mensal ou anual que a empresa pode fornecer continuada e naturalmente aos provedores de seu capital (MARTELANC; PASIN e CAVALCANTE, 2005, p. 23).

O processo de estimativa do FCFF consiste em projetar lucro operacional e a partir dele, mediante ajustes, estimar o fluxo de caixa. Esse lucro operacional é aquele que a empresa teria se não possuísse nenhuma dívida, exceto aquelas de curto prazo utilizadas para cobrir desajustes de caixa, provenientes de sazonalidade do negócio. Dessa forma, o FCFF pode ser obtido através da seguinte fórmula:

Tabela 2 - Fórmula de obtenção do fluxo de caixa livre para a empresa.

            (+) Receitas líquidas de vendas

            (- ) Custos das vendas

            (- ) Despesas operacionais

            (=) EBIT

            (+) Ajustes das despesas operacionais que não provocam saídas de caixa

            (=) EBITDA

            (- ) Imposto de Renda / Contribuição Social

            (=) Geração de Caixa Operacional

            (+) Depreciação

            (- ) Investimentos ou desenvestimentos

            (=) FCFF (Fluxo de caixa livre para a empresa)

Fonte: Adaptado de Martins (2001, p. 281).

Onde:

EBIT: Earmings Before Interest and Taxes, em português: LAJIR: Lucro antes de juros e impostos.

EBITDA: Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation, and Amortization, em português: LAJIDA: Lucro Antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amortização.

A diferença fundamental entre o FCFF e o FCFE é que este último considera os efeitos do financiamento efetuado com capital de terceiros (MARTINS, 2001, p. 282).

2.3.2.3 Horizonte de Projeção e  Valor Residual

De acordo com Martelanc, Pasin e Cavalcante (2005, p. 43), “a definição do horizonte de projeção dos fluxos de caixa não influencia o valor de uma empresa”, entretanto os autores alertam: se o horizonte projetado “for menor do que o período de crescimento acelerado da organização e se o valor residual for calculado antes da estabilização de seus lucros e de seu fluxo de caixa, a empresa estará sendo subavaliada”.

A doutrina e a experiência prática tem demonstrado que a maioria das avaliações recomenda períodos de projeção entre 5 (cinco) e 10 (dez) anos.

Valor residual da empresa ou também conhecido como valor da perpetuidade, é o fluxo de caixa não coberto pelo período de projeção, ou seja, após o período de projeção é calculado o valor residual.

2.3.2.4 Taxa de Desconto e Cálculo do Custo de Capital

Uma das maiores dificuldades para se avaliar por fluxos de caixa a valor presente é definir a taxa de desconto. Segundo Perez & Famá (2003), “a taxa a ser utilizada para descontar os fluxos de caixa a valor presente deve ser aquela que melhor reflita o custo de oportunidade e os riscos destes fluxos”, representado pelo custo médio ponderado de capital (WACC – Weighted Average Cost of Capital), “que é o custo das diferentes espécies de financiamento utilizados pela entidade”, segundo Schmidt, Santos e Fernandes (2006, p. 12).

O WACC pode ser calculado pela seguinte fórmula:

WACC = Kpl [PL¸(PL + D)] + Kd [D¸(PL + D)]

Onde:

            Kpl = custo do patrimônio líquido

            Kd = custo da dívida após impostos

            PL = patrimônio líquido a valor de mercado

            D   = dívida a valor de mercado

2.4 AVALIAÇÃO DE EMPRESAS EM PROCESSOS JUDICIAIS

2.4.1 Balanço de Determinação

De acordo com o Superior Tribunal Federal (STF), em Súmula no 265, “Na apuração de haveres, não prevalece o balanço não aprovado pelo sócio falecido ou que se retirou”, o que impõe ao perito em contabilidade, segundo Ornelas (2001, p. 77), “a necessidade de, inexistindo, proceder ao levantamento de balanço patrimonial para a data do evento”, balanço este denominado no meio jurídico de balanço de determinação, denominação criada por Osmida Inoccente (ESTRELA, 1960, p. 144) e de uso corrente nos Tribunais.

O balanço de determinação é um balanço patrimonial especialmente elaborado para fins judiciais por perito contábil, a partir dos registros contábeis, que não afeta a contabilidade da empresa, com objetivo de determinar o montante dos haveres que cabe ao sócio que se retira ou aos herdeiros do sócio falecido.

No direito positivo brasileiro está previsto como balanço especial, conforme diz o art. 1.031 do Código Civil:

Art. 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado.

Partindo das demonstrações contábeis da sociedade avaliada disponíveis, o perito-contador elabora o balanço de determinação ou especial em obediência às determinações judiciais que comandam a resolução de sociedade, procedendo a ajustes técnicos e avaliatórios extracontábeis, de modo que os elementos patrimoniais reflitam os respectivos valores líquidos de realização na data do evento (ORNELAS, 2001).

Os procedimentos de ajustes técnicos referidos são feitos com intuito de reduzir o descompasso existente entre a contabilidade tradicional e o valor econômico da sociedade, buscando com isto, a real situação do valor do conjunto empresarial.

Também, igualmente importante considerar que, para se apurar a situação patrimonial real, é necessário a avaliação dos “ativos ou passivos ocultos, não evidenciados, no balanço tradicional”, como ensina Hoog (2007, p. 144). Ativos ocultos tais como: base negativa para o cálculo do imposto de renda, leasing, marcas e intangíveis; passivos ocultos: provisão para contingências trabalhistas, fiscais ou ambientais.

Ornelas (2001, p. 158) complementa nesse mesmo sentido, é necessária, ainda, a verificação de demandas judiciais em curso contra a empresa e da empresa contra terceiros, e estimação de possíveis reflexos no patrimônio a ser avaliado.

A metodologia utilizada na elaboração do balanço de determinação está prevista no CPC 00 – Estrutura Conceitual para Elaboração e Apresentação das Demonstrações Contábeis, que aponta dois comandos avaliatórios importantes para o trabalho pericial.

Consta o conceito de valor realizável, valor de realização ou de liquidação:

Os ativos são mantidos pelos montantes em caixa ou equivalentes de caixa que poderiam ser obtidos pela sua venda em forma ordenada. Os passivos são mantidos pelos seus montantes de liquidação, isto é, pelos montantes em caixa ou equivalentes de caixa, não descontados, que se espera serão pagos para liquidar as correspondentes obrigações no curso normal das operações.

Na norma citada, consta valor presente:

Os ativos são mantidos pelo valor presente, descontado, dos fluxos futuros de entradas líquidas de caixa que se espera seja gerado pelo item no curso normal das operações. Os passivos são mantidos pelo valor presente, descontado, dos fluxos futuros de saídas líquidas de caixa que se espera serão necessários para liquidar o passivo no curso normal das operações.

Assim, estamos diante de avaliação patrimonial a valores de saída, no caso, a valores de mercado, enquanto a contabilidade tradicional, de sociedades em continuidade, em geral, levam em consideração a avaliação patrimonial a valores de entrada, no caso, a valores históricos.

Por isso, é necessário proceder a ajustes técnicos e avaliatórios nas demonstrações contábeis, como procedido a seguir.

2.4.1.1 Avaliação dos itens monetários

São aqueles valores a receber ou a pagar liquidáveis com numerário, que de acordo com Schmidt, Santos e Fernandes (2006, p. 19), “são as contas contábeis que sofrem o impacto da variação geral de preços no período”.

Recomendamos os seguintes procedimentos para ajustar os itens monetários:

  • Disponibilidades:

a) Saldos em caixa e contas correntes: correspondem ao seu próprio valor;

b) Moeda estrangeira: convertida pela taxa de câmbio (venda) correspondente, na data base;

c) Aplicações financeiras: somatória do valor originalmente aplicado e dos rendimentos líquidos proporcionais até a data base;

d) Outros ativos financeiros: valor de mercado na data base, menos despesas de realização.

  •  Créditos: direitos e títulos de crédito serão avaliados a valor presente na data base, considerando os ajustes de atualização monetária, variação cambial e outros contratuais, excluindo-se os créditos já vencidos. Nesta hipótese, os encargos por inadimplência serão calculados até a data-base.

As provisões para perdas ou riscos de créditos são constituídas com base em estimativas de seus prováveis valores de realizações.

  • Obrigações: são calculadas a valor presente na data-base. As vencidas são acrescidas dos encargos de inadimplência contratados.
  • Provisões correntes: são examinadas as existentes e realizados os ajustes técnicos necessários para que os valores estejam refletidos com propriedade as responsabilidades até a data-base.
2.4.1.2 Avaliação dos itens não monetários

Schmidt, Santos e Fernandes (2006, p. 19) ensinam que itens não monetários “são as contas contábeis que não sofrem o impacto da variação geral de preços no período”, ajustadas da seguinte forma:

  • Estoques: são avaliados a valor de mercado, ou seja, pelo preço à vista ou seu equivalente na data-base, deduzido das despesas de realização, não sendo considerados os estoques obsoletos ou inservíveis, que devem ser baixados.
  • Despesas Antecipadas: as despesas antecipadas são avaliadas pelo valor aplicado atualizado monetariamente, respeitado o principio da competência.
  • Investimentos: participações em empresas controladas ou coligadas são avaliadas pelo valor de mercado do patrimônio líquido na data-base, e transferidos via equivalência patrimonial.
  • Imobilizado: são avaliados a preços de mercado. Muitas vezes a avaliação de alguns itens que compõe o ativo imobilizado requer a realização de perícias avaliatórias de engenharia.
  • Diferido: São avaliados com base no custo de aplicação ou investimento, deduzidos das respectivas amortizações até a data base.
  • Contingências: todas as contingências ativas e passivas conhecidas, originárias de todos os campos jurídicos devem ser consideradas.
  • Goodwill e demais intangíveis: o valor do goodwill não adquirido e dos demais intangíveis existentes são avaliados.

Como resultado dos cálculos descritos acima, apura-se o valor do patrimônio líquido ajustado pela diferença entre ativo e passivo a valor de mercado ou valor corrente.

2.5  ATIVOS INTANGÍVEIS EM APURAÇÃO DE HAVERES

De acordo com o inciso IV do art. 179 da Lei 6.404/76 serão classificados no intangível “os direitos que tenham por objeto bens incorpóreos destinados à manutenção da companhia ou exercidos com essa finalidade, inclusive o fundo de comércio adquirido”. Esta redação foi incluída pela Lei n° 11.638/2007. Na contabilidade societária não é possível contabilizar ativos intangíveis gerados internamente.

Segundo o Pronunciamento Técnico CPC 04 – Ativo Intangível, norma que defini o tratamento contábil dos ativos intangíveis, conceitua Ativo Intangível como um ativo não monetário identificável sem substância física. Pelo CPC 04, um ativo intangível deve ser reconhecido apenas se:

(a) for provável que os benefícios econômicos futuros esperados atribuíveis ao ativo serão gerados em favor da entidade; e

(b) o custo do ativo possa ser mensurado com confiabilidade.

Um ativo satisfaz o critério de identificação, em termos de definição de um ativo intangível, quando:

(a) for separável, ou seja, puder ser separado da entidade e vendido, transferido, licenciado, alugado ou trocado, individualmente ou junto com um contrato, ativo ou passivo relacionado, independente da intenção de uso pela entidade; ou

(b) resultar de direitos contratuais ou outros direitos legais, independentemente de tais direitos serem transferíveis ou separáveis da entidade ou de outros direitos e obrigações.

De acordo com o CPC 04: “O ágio derivado da expectativa de rentabilidade futura (goodwill) gerado internamente não deve ser reconhecido como ativo”. A falta de identificação de todos os intangíveis na contabilidade societária traz dificuldades na confecção do balanço de determinação, distancia o valor patrimonial contábil da avaliação ao real valor da empresa.

As significativas divergências entre os valores contábeis e os valores negociados, nos processos de combinação de negócios, têm motivado atenção especial ao tema dos intangíveis (SANTOS; et al, 2007).

De acordo com os mesmos autores, O Statement of Financial Accounting Standards (SFAS) no 141, emitido em junho de 2001, (FASB, 2001), “é a primeira norma contábil, em termos mundiais, a definir com exatidão as principais espécies de ativos intangíveis”, bem como, de acordo com os mesmos, determinou o registro separadamente do goodwill.

Os ativos intangíveis, de acordo com o FASB, podem ser classificados em cinco grupos principais, além do goodwill: intangíveis relacionados a marketing, intangíveis relacionados a clientes, intangíveis relacionados às artes, intangíveis baseados em contratos e intangíveis baseados em tecnologia.

2.5.1. Goodwill em apuração de haveres

Goodwill, no campo jurídico, é denominado de fundo de comércio ou aviamento, como é tratado no Código Civil (art. 1.187), denominação está decorrente de influência do Código Civil Italiano, o qual foi utilizado como referente ao nosso Código.

De acordo com Hoog (2007, p. 115), com o Código Civil de 2002 desapareceu as expressões fundo de comércio e empresa comercial, ficando em seu lugar as terminologias fundo empresarial e sociedade empresária, bem como alterou a morfologia genética das sociedades, teoria de atos de comércio para empresa.

O ágil não é sinônimo de goodwill, para Hoog (2007, p. 118), “o goodwill é o excesso de lucros, enquanto o ágil representa o quantum alguém está disposto a pagar por algo”, esclarecendo, ainda, que ágio ou deságio são frutos da habilidade de negociação ou o resultado da lei da oferta e da procura.

Sá (2007, p. 157) considera o aviamento como “valor excedente em relação ao patrimônio líquido registrado contabilmente”, e condiciona a sua formação a três fatores fundamentais e imprescindíveis:

  1. Probabilidade concreta ou confiabilidade de qualidade futura de um super-rédito competente para ensejar valor maior ao Capital próprio;
  2. Riscos inerentes sobre a fonte supridora dos super-réditos e
  3. Reconhecimento da aludida maior valia em um mercado que inspire ou motive terceiros a pagar por ela.

Quanto à capacidade dos lucros se perdurar, Sá (2007, p. 165) alerta: “não é o fato de uma empresa auferir bons lucros durante certos períodos passados que garante que os terá sempre nas mesmas condições”.

De acordo com Schmidt e Santos, goodwill (2002, p. 153) representa “um conceito similar nas normas brasileiras avaliados pelo método a equivalência patrimonial com fundamento econômico em expectativa de lucros futuros”.

Para os mesmos autores, o goodwill é o mais intangível dos intangíveis, sendo sua definição, natureza e características um dos temas mais controvertidos da teoria contábil, pelo fato de que seu valor está “intimamente relacionado a outros intangíveis, existindo uma tênue linha que o separa dos outros intangíveis” (SCHMIDT; SANTOS, 2002, p. 37).

Segundo Ornelas (2001, p. 131), “a questão está na avaliação individual dos ativos e de toda a sociedade, o que vale dizer que a soma das partes não é igual ao todo”, o que levou Monore (1986, p. 61), a considerar o que denominou de goodwill sinergístico, concluindo que:

Ocorrendo sinergia positiva, o valor da empresa seria sempre maior que a soma dos valores econômicos de todos os ativos utilizados, sem exceção. Assim, se o contador fosse omninsciente, o goodwill seria atribuível à sinergia da organização, um conceito muito útil para avaliação do comportamento da empresa e suas potencialidades.

De acordo com Martins (2001): “goodwill pode ser considerado como o resíduo existente entre a soma dos itens patrimoniais mensurados individualmente e o valor global da empresa”.

Neiva (1999, p. 19) complementa:

Se o valor total da empresa excede a soma dos valores dos ativos avaliados separadamente, este excesso deve representar o valor de todos os fatores positivos que tornam a empresa mais valorizada (considerada como um todo) que a soma dos ativos específicos.

Diante destes conceitos, goodwill pode ser considerado como um excesso de valor em um processo de avaliação individual de cada ativo líquido, sendo um dos grandes inconvenientes da mensuração do goodwill reside exatamente na dificuldade de estabelecimento de seu valor, pois não há consenso entre os analistas na adoção de determinada metodologia.

Assim, esse modelo avaliatório, baseado no goodwill utiliza uma abordagem mista: avaliam estaticamente os ativos de uma empresa (avaliação contábil) e, por outro lado, procuram quantificar o valor que a empresa poderá gerar no futuro, ou seja, combina o valor dos ativos líquidos com ganho de capital proveniente do valor de futuros lucros (MULLER & TELO, 2003).

Desta forma, podemos conceituar goodwill como o resíduo positivo entre o valor de mercado e o valor identificável de uma empresa. Assim, quanto mais ativos líquidos forem identificados, inclusive intangíveis, menor será o goodwill.

Considerando que o patrimônio líquido consignado no balanço de determinação, antes da apuração do goodwill, já reflete o valor econômico de cada um dos elementos patrimoniais da sociedade avalianda na data base do evento, sancionado pelo mercado, para finalizar o processo avaliatório, é necessário mensurar se o todo patrimonial é superior ao somatório dos valores individuais daqueles elementos, ou seja, resta constatar a existência ou não do chamado efeito sinérgico, originário da combinação dos elementos patrimoniais entre si. (ORNELAS, 2001, p. 141).

Se considerarmos o que dizem Matelanc, Pasin e Cavalcante (2005, p. 6), quando se avalia uma empresa pelo método de fluxo de caixa futuros (FCD), o valor dos intangíveis, incluindo o goodwill, “já está contemplado e incluso”, pois, segundo os Autores, “os ativos intangíveis e a marca contribuem para a geração de lucros e fluxos de caixa futuros”.

Assim, via balanço de determinação e pelo método de fluxo de caixa descontado, de forma complementar entre si, pode se avaliar uma empresa, em uma demanda judicial, consignando o valor patrimonial de mercado de cada ativo, bem como o valor dos intangíveis, incluindo o goodwill, retratando fielmente o potencial desta, com isto, se aproximando do valor justo, que é o principal objetivo do trabalho pericial de avaliação de empresas.

É imperioso frisar, ainda, a necessidade de considerar, no cálculo do goodwill, situações especiais como: retirada de um sócio atuante, técnico com alto conceito profissional ou de um sócio que denigre a imagem da empresa (PAULO; et al., 2006).

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Sobre o autor
Carlos Martins

Contador, atua como Perito-Contábil há mais de 20 anos, em processos cíveis e trabalhistas, inclusive em avaliação de empresas para apuração de haveres. Cadastro Nacional de Peritos Contábeis nº 6250. E-mail: [email protected]

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINS, Carlos. Avaliação de empresas em apuração de haveres judiciais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6256, 17 ago. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/66741. Acesso em: 21 nov. 2024.

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