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Direito criminal na recuperação de empresas e falência.

Lei nº 11.101/05

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09/05/2005 às 00:00
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PARTE II

DO PROCEDIMENTO PENAL

            Sumário: 1. Considerações iniciais. 2. Juízo Competente. 3. Crimes de ação pública incondicionada. Assistente da acusação. 4. O Ministério Público e a opinio delicti. O fim do inquérito judicial. 6. Os procedimentos aplicáveis. Rito Sumário dos Crimes apenados com detenção. Juizado Especial Criminal. Crítica. 7. A decisão de recebimento da denúncia. 8. A suspensão condicional do processo. 9. A prisão preventiva. 9.1. Cautela Judicial. 9.2. Momento processual. Na esfera cível. Na esfera penal. 10. A inabilitação para o exercício do comércio. 11. A Reabilitação.

            1. Considerações iniciais. Publicada em 09 de fevereiro de 2.005, entrará em vigor cento e vinte dias após, ou seja, no dia 09 de junho de 2005. A LFC (Decreto-Lei 7661/45) continuará sendo aplicada aos processos de falência e concordata ajuizados anteriormente à vigência do diploma em comento (LFRE, art. 192).

            Segundo o art. 200 ficam revogados a LFC e os arts. 503 a 512 do Código de Processo Penal – relativos ao rito dos crimes falimentares –. Em seu lugar, o legislador entendeu mais conveniente a adoção do rito sumário dos crimes apenados com detenção (CPP, arts. 531 a 540), obviamente visando processo e julgamento mais céleres com maior rapidez na prestação jurisdicional. Pouco importa seja o crime próprio ou impróprio, presente a condição objetiva de punibilidade, autoriza-se o processo e julgamento perante o juízo da recuperação/falência ou criminal. (12)

            2. Juízo Competente. Abordamos acima (I, 4) acerca da inconstitucionalidade do art. 183 da LREF. Independentemente da posição assumida, emerge claro do diploma legal que a intenção do legislador foi fixar duas instâncias judiciais distintas para a solução dos conflitos derivados do processo de recuperação ou de falência do empresário devedor. Pretendeu que a Justiça Criminal fosse competente para processar e julgar os crimes em espécie e conexos. Como já visto, o Tribunal de Justiça de São Paulo, através de seu órgão especial, considerou a norma inconstitucional, tanto que editou Resolução dando competência para as Varas privativas de Recuperação e de Falências para processo e julgamento das questões cíveis e criminais, conduzindo, inexorável e igualmente, por via reflexa, as Varas Cíveis do Estado ao processo e julgamento dos crimes falimentares. Com a devida vênia, entendemos que o juiz cível deveria se cingir às questões correlatas, eis que não é afeito às questões criminais e à evolução pela qual tem passado a área criminal, em especial após a Constituição Federal de 1.988. Como chamou a atenção Guilherme de Souza Nucci, ao sustentar que os processos criminais deveriam ficar nas varas criminais, que são especializadas: "muitas são as decisões condenatórias proferidas no juízo cível, ao cuidar dos delitos falimentares, extremamente sucintas, sem apego ao devido processo legal e olvidando princípios fundamentais de direito penal". (13)

            3. Crimes de ação pública incondicionada. Assistente da acusação. A ação penal relativa aos crimes falimentares continua sendo pública incondicionada (art. 184, caput). O Promotor de Justiça é o único legitimado a acionar o devedor, o falido e os que de algum modo cooperaram para a prática de crime falimentar próprio ou impróprio. De sua desídia, caberá a queixa-crime subsidiária promovida pelo administrador judicial ou por qualquer credor habilitado (art. 184, parágrafo único). Fica superada a dúvida que suscitava a redação do parágrafo único do art. 108 da LFC, sobre a possibilidade de ação subsidiária mesmo quando o MP opinasse pelo arquivamento.

            O ofendido ou ofendidos, vitimados pelos danos financeiros do crime falimentar, pode(m) se habilitar como assistente(s) da acusação. Conquanto o instituto da assistência não esteja previsto no diploma atual, a aplicação subsidiária do Código de Processo Penal autoriza esta interpretação (14). No entanto, na esteira das críticas e da preocupação externada por Cezar Roberto Bitencourt (15), havendo um grande número de credores interessados em figurar ao lado do órgão acusatório no afã de punir o(s) acusado(s) e obter resultados que minimizem seus prejuízos financeiros, competirá ao magistrado administrar caso a caso, evitando tumulto processual pelo excesso de assistentes.

            4. O Ministério Público e a opinio delicti. O fim do inquérito judicial. Tanto o art. 186, quanto o 187, trazem momentos processuais do processo de recuperação ou falimentar, nos quais o órgão ministerial precisa estar atento para a provável prática de crime falimentar.

            a) A previsão do art. 186 e seu parágrafo (16), diz respeito a processo falimentar propriamente dito. Uma das muitas tarefas do administrador judicial, na falência, vem assentada no art. 22, alínea "e", e consiste em apresentar, em quarenta dias, contado da assinatura do termo de compromisso, relatório sobre as causas e circunstâncias que conduziram à situação de falência, no qual apontará a responsabilidade civil e penal dos envolvidos. Esta exposição circunstanciada tem como esteio laudo pericial contábil sobre a escrituração do devedor. Em face dos argumentos expendidos pelo administrador judicial, o MP pode concluir pela existência de crime pré ou pós-falimentar e crimes conexos.

            b) A previsão do art. 187 é mais abrangente (17), pois alcança, também, a recuperação judicial. Prolatada sentença concessiva de recuperação judicial ou declaratória de falência, o membro do parquet será intimado pessoalmente de seus termos. Vislumbrando a ocorrência de crime, poderá, valendo-se do complexo probatório documental acostado ao feito cível, de plano, ajuizar a ação penal competente. Caso as provas sejam insuficientes para a formação de sua opinio delicti, requisitará a instauração de inquérito policial para complemento do acervo.

            No diploma anterior, o síndico opinava pela instauração de inquérito e acompanhava-o passo a passo. Entendemos que, hoje, ainda pode opinar, mas a decisão é ministerial.

            Criticam muitos a adoção do inquérito policial e o abandono do inquérito judicial, presidido pelo juiz cível, mais afeito às questões falitárias, sob o fundamento de que a polícia civil é despreparada material e tecnicamente e mal consegue dar cabo do acervo que possui, certamente não terá êxito neste novo mister. Malgrado a crítica, entendemos que o legislador falitário agiu corretamente. O juiz civil ou penal não deve exercer função investigativa. A função anômala de presidir o inquérito judicial, apesar de justificável, deve ser abolida de nosso ordenamento, já que o magistrado inquisidor será o destinatário da ação penal a ser instaurada. O inquérito judicial tinha natureza inquisitória, mas o falido podia discutir o mérito das imputações, de sorte que sempre se criava o contraditório e, conseqüentemente, um vínculo entre o juiz e a causa, formando-se um obstáculo natural à imparcialidade, prejudicial à isenção e regular prestação jurisdicional. Defendemos que a mudança é salutar, cabendo à polícia se aparelhar e aperfeiçoar suas atribuições, compatibilizando-as com a nova tarefa.

            5. A denúncia. "Art. 187 (...). Parágrafo primeiro - O prazo para oferecimento da denúncia regula-se pelo artigo 46 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, salvo se o Ministério Público, estando o réu solto ou afiançado, decidir aguardar a apresentação da exposição circunstanciada de que trata o artigo 186 desta Lei, devendo, em seguida, oferecer a denúncia em 15 (quinze) dias".

            A denúncia, via de regra, virá instruída com a exposição circunstanciada oferecida pelo administrador judicial, acompanhada da perícia contábil. Equivale dizer, o promotor de justiça aguardará e se louvará do relatório e da prova técnica para oferecer a denúncia. Raramente se valerá de outra fonte probatória como a investigação policial, em inquérito, para complementação do complexo probante, pelo menos até que a polícia esteja equipada e possa dar-lhe melhor guarida.

            Com ou sem inquérito policial e não sendo o caso de apensamento (arquivamento), o representante do MP oferecerá denúncia contra quem de direito pelo(s) crime(s) falimentar(es) e conexo(s), se houver. Caso o falido e/ou administradores estiverem presos preventivamente em decorrência da sentença declaratória de falência (LREF, art. 99, VII), o prazo para oferecimento da denúncia será de 5 dias; se solto ou afiançado, o prazo será de 15 dias (CPP, art. 46).

            Discordando o juiz do pedido de apensamento (arquivamento), fará uso do princípio da devolução, aplicando o disposto no art. 28 do Código de Processo Penal, a fim de que o chefe da instituição, o Procurador Geral de Justiça, afira o pleito do promotor de primeiro grau, mantendo o pedido arquivamento, denunciando ou nomeando outro para denunciar.

            Ainda que seja redundante, dispõe a LREF, em seu art. 187, § 2º que "Em qualquer fase processual, surgindo indícios da prática dos crimes previstos nesta Lei, o juiz da falência ou da recuperação judicial ou da recuperação extrajudicial cientificará o Ministério Público". Ora, o juiz é o dominus processus e dentre seus poderes anômalos, estão o de requisitar inquérito policial e levar diretamente ao Ministério Público a notitia criminis. Como leciona Mirabete "o juiz que tenha a notícia da prática de um crime que se apura mediante ação pública incondicionada deve comunicar o fato ao Ministério Público (art. 40 do CPP) ou requisitar diretamente a instauração do inquérito policial". (18)

            Caso o juiz rejeite a denúncia oferecida, admite-se o recurso em sentido estrito, consoante art. 581, I, do CPP.

            6. Os procedimentos aplicáveis. Rito Sumário dos Crimes apenados com detenção. Juizado Especial Criminal. Crítica. Segundo o art. 185 da LREF "Recebida a denúncia ou a queixa, observar-se-á o rito previsto nos artigos 531 a 540 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal". Foi adotado o rito sumário dos crimes apenados com detenção para processo e julgamento mais célere e, conseqüentemente, maior rapidez na prestação jurisdicional. (19)

            Contudo, deslembrou-se o legislador falimentar que o rito sumário vem contido nos arts. 538 e 539 do CPP, porquanto os arts. 531 a 537 restaram revogados tacitamente pelo texto constitucional quando o constituinte conferiu legitimidade exclusiva ao MP para ajuizar ação penal em crimes de ação pública (CF, art. 129, I). Assim, a seqüência de atos ordenados deve obedecer ao disposto nos arts. 538 e 539 do diploma processual penal. São nove tipos penais, dos quais, oito crimes punidos com reclusão e apenas um apenado com detenção.

            O legislador não cooperou com a melhoria da área criminal. Ao contrário, desprezou sugestões atualizadas e moldadas a um processo penal moderno e comprometidas com princípios constitucionais correlatos. Na verdade, fez ouvidos moucos à área criminal, focado que estava na preservação da empresa ao optar pelo rito mencionado. (20)

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            Assim, os crimes punidos com reclusão previstos nos arts. 168 usque 177 devem seguir o rito sumário com número máximo de testemunhas igual a cinco.

            O encadeamento de atos que segue o disposto no art. 539 do CPP, é o seguinte:

            1) Oferecimento da denúncia ou queixa. 2) Recebimento da denúncia ou queixa, em que o Juiz, designa data para o interrogatório do réu e determina sua citação, bem como notifica o MP ou querelante. Após o recebimento da inicial, pode(m) o(s) assistente(s) da acusação se habilitar. 3) Interrogatório do réu. Caso citado não comparece, será decretada sua revelia. 4) Defesa prévia, com requerimento de diligências e rol de testemunhas, até o número de cinco. 5) Audiência das testemunhas arroladas pela acusação. 6) Despacho saneador, após sanar as nulidades, se houver, o juiz designa data de audiência de julgamento para inquirição das testemunhas de defesa, debates e julgamento. No despacho, ordena a intimação das testemunhas de defesa e das partes. 7) Audiência de julgamento. Inquiridas as testemunhas de defesa, a palavra é dada às partes para alegações orais, pelo tempo de vinte minutos, prorrogáveis por mais dez, seguindo-se a sentença oral. Caso o magistrado não se sinta habilitado a proferir a sentença em audiência, pode ordenar que os autos lhe venham conclusos e no prazo de cinco dias sentenciará.

            Já, o crime de omissão dos documentos contábeis obrigatórios, punido com detenção de um a dois anos e multa, é infração de menor potencial ofensivo, em face da derrogação do art. 61 da Lei 9099/95 provocada pela redação do art. 2º, parágrafo único, da Lei 10.259/01 que instituiu os Juizados Federais no Brasil, razão pela qual o rito adotável é o estatuído naquela, com os institutos despenalizadores pertinentes (composição civil de danos – se for o caso –, transação penal e sursis processual), admitindo-se até cinco testemunhas.

            Em conseqüência, a despeito da previsão legal, temos dois ritos aplicáveis às infrações previstas na nova Lei de Falências: a) o sumário dos crimes apenados com detenção fica destinado aos crimes punidos com reclusão; e b) o rito dos Juizados Criminais destina-se, unicamente, para o crime do art. 178.

            Crítica. Com a devida vênia, sustentamos que, ad minimum, deveria ser adotado o rito ordinário dos crimes apenados com reclusão previsto no CPP aos novéis crimes punidos com reclusão. Até porque, para piorar, a previsão da LREF contraria a tradição processual penal brasileira, segundo a qual três (eram quatro) categorias de crimes – funcionais, contra a honra e contra a propriedade imaterial – mereceram rito específico no CPP. A estes ritos, nos quais se incluíam os crimes falimentares como quarta categoria, atendida uma medida específica prévia – defesa preliminar, audiência de reconciliação e perícia –, passa-se ao rito dos crimes punidos com reclusão, propiciando, claramente, maior amplitude de defesa. Quanto aos falimentares, revogado o rito especial do CPP, foi preconizado rito mais célere que reduz as possibilidades de defesa.

            7. A decisão de recebimento da denúncia. Outra conseqüência relevante de que o crime falimentar perdeu as especificidades ante a adoção do rito sumário e revogação do procedimento especial do CPP é que não mais se cogita da fundamentação para o recebimento da denúncia. Assim, como já largamente decidido pelos tribunais pátrios em relação aos demais tipos penais, o juízo competente limitar-se-á a proferir decisão interlocutória simples que prescinde de fundamentação, não se aplicando a ela os ditames do art. 93, IX, da Constituição da República. (21)

            8. A suspensão condicional do processo. Somente os crimes de exercício ilegal de atividade, punido com reclusão, de um a quatro anos, e multa, e de omissão dos documentos contábeis obrigatórios, punido com detenção de um a dois anos e multa, admitem o sursis processual. Instituto despenalizador criado pelo art. 89, da Lei 9099/95, que permite a extinção da punibilidade sem a imposição de pena privativa de liberdade. Ao denunciar, o representante ministerial oferece, em sua cota introdutória, proposta de suspensão. Recebida a denúncia, o juiz designa audiência de suspensão ou interrogatório. Citado, o réu comparecendo acompanhado de defensor e aceitando ambos as condições propostas, suspende-se o feito e o prazo prescricional, passando-se ao período de prova mediante fiscalização do cumprimento das condições impostas em autos apartados. Ultrapassado este período, sem sobressaltos, será extinta a punibilidade do acusado. Esta é a regra geral.

            Se o MP, malgrado presentes os requisitos legais, negar-se a oferecer a proposta, deverá o magistrado, entendendo que é caso de concessão do benefício, remeter os autos ao PGJ para os fins do art. 28 do CPP, nos termos da Súmula 696 do STF.

            Se o réu não aceitar a proposta de suspensão, será interrogado, seguindo-se os demais atos processuais do rito sumário.

            Divide-se a doutrina quanto ao recurso cabível contra a decisão que concede o sursis processual, apelação ou recurso em sentido estrito. Os que se posicionam pela apelação fundam-se na impossibilidade do recurso em sentido estrito em sede de Juizados Especiais Criminais. Contudo, as mais recentes decisões dos tribunais pendem para o recurso em sentido estrito, advertindo para a possibilidade de aplicação subsidiária do CPP, consoante permissivo do art. 92 da Lei 9099/95. Neste sentido: STJ (RESP 296343-MG; RESP 260217-SP; RESP 246085-SP; RESP 164387-RJ; REVJMG 146/465, RT 762/583, JSTJ 2/384).

            9. A prisão preventiva. A prisão preventiva é a base e o eixo norteador de todas as prisões cautelares. E é uma cautelar típica porque congrega pressupostos e características imprescindíveis à privação da liberdade durante o inquérito policial ou processo. A medida vem prevista nos artigos 311 a 316 do diploma processual penal, nos quais se podem entrever seus pressupostos autorizadores: a) o fumus boni juris; b) o periculum in mora; e, c) natureza da infração. Aqueles atrelados ao artigo 312 (22) e o último ao artigo 313. (23)

            a) Fumus boni juris: Como toda providência cautelar, também a prisão preventiva exige a presença do fumus boni juris (24), consistente na prova da materialidade (existência do crime) e indícios suficientes de autoria. A prova do fato retrata a materialidade. Nos crimes que deixam vestígios, o laudo pericial quadra com exatidão a ofensa ao bem jurídico tutelado (vida, saúde, patrimônio etc.) e transmite certeza à sua existência material. Nos crimes falimentares, a perícia contábil será o embasamento seguro do magistrado em face do decreto prisional a ser externado.

            b) Periculum in mora ou periculum libertatis: O segundo pressuposto das cautelares, o periculum in mora, vem tipificado na situação de necessidade descrita no artigo 312, in medio, do Código de Processo Penal, que retrata probabilidade de perigo e justifica a custódia do agente para a garantia da ordem pública ou econômica, por conveniência da instrução criminal e para assegurar aplicação da lei penal. É imperativa a custódia do falido, porquanto em liberdade porá em risco a tranqüilidade dos credores. Já decidiu o STJ, nos autos do HC 19.804/SC, em 21/03/2002, que "A prisão preventiva do falido ou de seu representante legal pode ser decretada quando houver provas que demonstrem a prática de crime falimentar, como garantia da ordem pública por conveniência da instrução criminal, sem que isso importe em ofensa a dispositivo constitucional".

            c) Natureza da infração: O último pressuposto a ser considerado e que admite a medida constritiva está no artigo 313 e incisos do Código de Processo Penal. Abarca, prioritariamente, crimes dolosos: punidos com reclusão; punidos com detenção, quando se apurar que o indiciado é vadio ou, havendo dúvida sobre a sua identidade, não fornecer ou não indicar elementos para esclarecê-la; se o réu tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no parágrafo único do artigo 46 (atual art. 64, inc. I) do Código Penal.

            Presentes os demais requisitos, fundamentalmente, admitir-se-á a prisão preventiva do falido ou seu representante legal quando se tratar de crime falimentar punido com reclusão, podendo ser agregado mais um fator negativo, se o mesmo for reincidente em crime doloso.

            9.1 - Cautela Judicial. Sem os requisitos legais, não se decreta a prisão preventiva do falido. O magistrado deve ter sempre presente que a violação do direito de liberdade, que atinge a dignidade da pessoa humana, necessita de fundamentação serena quanto ao fato ou fatos imputados. O decisum há de conter dados concretos, não bastando meras referências ao texto legal. Por fim, o juiz deve apoiar-se em dados objetivos, com base em sua experiência comum, mas a base deve ser sólida, provada. Resguardada esta cautela, a prisão preventiva deverá ser decretada.

            9.2 - Momento processual. Na esfera cível. Prevê o art. 99, VII, da LREF que ao prolatar a sentença declaratória de falência do devedor, o juiz, dentre outras determinações poderá "ordenar a prisão preventiva do falido ou de seus administradores quando requerida com fundamento em provas da prática de crime definido nesta Lei". Interessante observar que o decreto prisional em apreço tem como pressuposto pedido prévio do órgão acusatório. Somente o membro do parquet tem legitimidade para requerer a custódia do devedor. Já foi visto que uma das funções do administrador judicial consiste em "apresentar, no prazo de 40 (quarenta) dias, contado da assinatura do termo de compromisso, prorrogável por igual período, relatório sobre as causas e circunstâncias que conduziram à situação de falência, no qual apontará a responsabilidade civil e penal dos envolvidos, observado o disposto no art. 186 desta Lei" (LREF, art. 22, e). No § 4º deste dispositivo, vem a determinação de que se for apontada responsabilidade penal de qualquer dos envolvidos, o "Ministério Público será intimado para tomar conhecimento de seu teor". Deste quadro, podemos concluir que o administrador pode opinar sobre a prisão, contudo a legitimidade para postular perante o juiz será do órgão acusador. Obviamente, o pedido de prisão deverá estar lastreado em fatos palpáveis demonstrativos de que a custódia do falido e/ou co-responsáveis pela provável quebra é imprescindível.

            Na esfera penal. De outra parte, se houver inquérito policial ou ação penal em curso e sobrevir um dos motivos autorizadores da prisão cautelar, pode o magistrado decretar de ofício ou a requerimento do representante do Ministério Público, do querelante ou por representação da autoridade policial.

            10. A inabilitação para o exercício do comércio. O art. 181 estabelece os seguintes efeitos da condenação penal: I – inabilitação para o exercício de atividade empresarial; II – o impedimento para o exercício de cargo ou função em conselho de administração, diretoria ou gerência das sociedades sujeitas à Lei de Falências; III – impossibilidade de gerir empresa por mandato ou por gestão de negócio. Estes efeitos não são automáticos, devendo ser declarados motivadamente na sentença, pois perdurarão por cinco anos após a extinção da punibilidade, salvo se anteriormente foi o condenado beneficiado por reabilitação criminal. Lembre-se que transitada em julgado a sentença penal condenatória, deve o juiz determinar notificação ao Registro Público de Empresas para que tome as providências cabíveis de molde a impedir novo registro em nome dos inabilitados.

            11. A Reabilitação. Tecnicamente é possível a inabilitação e conseqüente reabilitação do devedor em recuperação judicial, pois o escopo da lei é a preservação da empresa e sua função social. Na prática, contudo, cremos que somente o falido (e demais pessoas envolvidas na quebra) chegará a ser considerado inabilitado para o exercício do comércio e sofrerá as demais conseqüências de uma sentença penal condenatória definitiva.

            A reabilitação no direito empresarial tem feição híbrida: civil e penal.

            A reabilitação civil, em não ocorrendo crime falimentar, fica a critério do juiz da falência.

            Já, a reabilitação criminal é da alçada do juiz da condenação (que fora de São Paulo, em regra, é o juiz criminal). Vimos que a inabilitação para a atividade empresarial é efeito da condenação e somente se torna efetiva após o trânsito em julgado da sentença penal. Seu prazo de duração (5 anos) começa a fluir do dia que extinguir a punibilidade (leia-se "pena") do sentenciado, ou seja, da data de cumprimento da pena imposta.

            Foi previdente o legislador ao estabelecer que se o condenado receber a benesse da reabilitação penal antes de expirado o prazo de cinco anos, prepondera aquela. Assim, se o condenado conseguir antes sua reabilitação penal, poderá voltar ao exercício da atividade empresarial, cargo ou função em conselho de administração, diretoria ou gerência das sociedades sujeitas a LREF e gerir empresa por mandato ou por gestão de negócio.

            Contudo, para conseguir a reabilitação penal, deverá o condenado comprovar o ressarcimento do dano causado pelo(s) crime(s) falimentar(es) (CP, art. 94, III). Em outras palavras, deverá ter extinguido suas obrigações e comprová-las perante o juízo da condenação. Merece elogios o legislador, pois amarrou a volta à atividade empresarial à solução dos débitos pendentes com a massa de credores. Não é por outra razão que, para punir o empresário criminoso, determina se aguarde o decurso do prazo de 10 (dez) anos, contados do encerramento da falência, para pleitear a extinção de suas obrigações (art. 158, IV); se não foi condenado criminalmente, exige somente 5 (cinco) anos (art. 158, III).

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Sobre o autor
Jayme Walmer de Freitas

Professor da Escola Paulista da Magistratura e de Pós-Graduação no COGEAE da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Coordenador do 7º Curso de Pós Graduação "Lato Sensu" - Especialização em Direito Processual Penal, da Escola Paulista da Magistratura. Autor das obras Prisão Cautelar no Direito Brasileiro (3ª edição), OAB – 2ª Fase – Área Penal e Penal Especial, na Coleção SOS – Sínteses Organizadas Saraiva vol. 14, pela Editora Saraiva, além de coordenador da Coleção OAB – 2ª Fase, pela mesma Editora. Coautor do Código de Processo Penal Comentado, pela mesma Editora. Colaborador em Legislação Criminal Especial, vol. 6, coordenada por Luiz Flávio Gomes e Rogério Sanches Cunha, pela Editora Revista dos Tribunais. Colaborador em o Tratado Luso-Brasileiro da Dignidade Humana, coordenada por Jorge Miranda e Marco Antonio Marques da Silva, pela Editora Quartier Latin. Colaborador em o Direito Imobiliário Brasileiro, coordenada por Alexandre Guerra e Marcelo Benacchio, pela Editora Quartier Latin. Autor de artigos jurídicos publicados em revistas especializadas e nos diversos sites jurídicos nacionais. Foi Coordenador Pedagógico e professor de Processo Penal, Penal Geral e Especial, por 14 anos, no Curso Triumphus – Preparatório para Carreiras Jurídicas e Exame de OAB, em Sorocaba. Juiz criminal em Sorocaba/SP, mestre e doutor em Processo Penal pela PUC/SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FREITAS, Jayme Walmer. Direito criminal na recuperação de empresas e falência.: Lei nº 11.101/05. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 673, 9 mai. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6692. Acesso em: 22 nov. 2024.

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