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Aspectos constitucionais da nova Cofins à luz da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal

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11/05/2005 às 00:00
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5 CONCLUSÃO

            É da essência do regime jurídico específico da contribuição para a Seguridade Social a sua destinação constitucional. Não a destinação legal do produto da arrecadação, mas o vínculo estabelecido pela própria Constituição entre a contribuição e o sistema de seguridade social, como instrumento de seu financiamento direto pela sociedade, na figura do contribuinte.

            As contribuições, ao contrário dos impostos, funcionam como sustentáculos dos encargos paralelos da administração pública direta, fazendo valer sua verdadeira função, que é nitidamente parafiscal.

            A destinação específica da contribuição social não se confunde com a referibilidade ao contribuinte e nem com o usuário do benefício da Seguridade. O contribuinte pode ou não utilizar os serviços da Seguridade, dependendo da ocorrência de determinados eventos, entretanto existem situações em que o beneficiário da Seguridade jamais contribuiu e ainda assim usufrui os benefícios.

            As contribuições em geral obedecem ao princípio da anterioridade, entretanto as contribuições da seguridade social seguem uma anterioridade diferenciada, que é a denominada anterioridade nonagésimal, ou seja, entre a criação ou majoração da contribuição e sua cobrança deve haver um interregno de noventa dias.

            A anterioridade permite o planejamento tributário, evitando-se o inconveniente da insegurança jurídica referente ao montante do ônus que deverá ser suportado pelo contribuinte. Seria a materialização do princípio da não-surpresa.

            A irretroatividade no caso das contribuições sociais é princípio absoluto, não podendo ser jamais desobedecido, dado que a lei em matéria tributária regula sempre fatos ocorridos no futuro, sendo vedada tributar fatos pretéritos.

            A sistemática não-cumulativa da COFINS apesar de ter sido instituída sob o fito de desonerar a cadeia produtiva, o que era uma luta de muitos contribuintes, deve ser analisada com certa desconfiança, pois, em alguns casos, isso tem representado um efetivo aumento na carga tributária.

            O legislador ao vedar o direito ao crédito do contribuinte como o fez em algumas situações que deveriam dar direito ao crédito, como no caso das despesas administrativas e de vendas, acabou majorando a carga tributária, pois o contribuinte é obrigado a manter esses gastos para realizar sua atividade operacional, e não seria justo não ter direito ao crédito sobre esses valores.

            O custo tributário desses aumentos acaba sendo suportado pelo consumidor final, pois dentro da cadeia produtiva é ele que arca com o ônus dessas modificações.

            A COFINS é constitucional porque foi instituída por lei materialmente ordinária, por ser expresso o texto constitucional ao permitir a sua criação como contribuição social proveniente da competência originária da União, e por não estar vedada sua cumulatividade. O princípio da não- cumulatividade se aplica apenas os tributos de competência residual da União.

            A COFINS não está sujeita às limitações prevista para os impostos acerca da proibição da mesma base de cálculo, dado que se trata de uma contribuição social, por isso é que não há vedação para que tenha a mesma base de cálculo do IPI, do ICMS, ou mesmo do PIS, pois ambas contribuições foram previstas pela Constituição, não prevalecendo à alegação de bitributação ou de bis in idem.

            Não pode haver distinção dos conceitos para efeito da cobrança das contribuições sociais do sujeito passivo, devendo ser considerado o empregador em potencial de maneira semelhante ao empregador efetivo, fazendo com que ambos suportem o ônus do pagamento da COFINS.

            A seguridade social deve ser financiada por todos os membros da sociedade, conforme disposição constitucional, logo não se deve restringir o conceito de faturamento como base de cálculo da COFINS, o correto seria amplia-lo para abarcar o maior número de contribuintes, fazendo com que o ônus fosse suportado efetivamente por todos. Neste tocante o Supremo Tribunal Federal ainda não se pronunciou estando pendente julgamento de Recurso Extraordinário.

            A própria Constituição autoriza que haja um desvio da destinação da COFINS, pois excetua que somente a contribuição sobre folha de salário e a contribuição do trabalhador devem ser efetivamente destinadas ao custeio dos benefícios da previdência social. Fazendo com que a receita auferida com a arrecadação da referida contribuição seja utilizada para outro fim que não o previsto na sua origem.

            Para encerrar este trabalho não poderia deixar de comentar sobre a atual realidade brasileira, onde há um consenso geral, sobre a necessidade de uma urgente reforma tributária. É fato concreto que, pelo menos no discurso, todos concordam com isso, e as justificativas são as mais variadas possíveis: a carga tributária está se tornando insuportável, as regras são muito complexas, inviabiliza ou inibe novos investimentos, etc.

            No entanto, a tão almejada reforma tributária não é muito fácil de ser feita, pois todos concordam com ela, desde que não sejam prejudicados, tais como: O Governo Federal não pode abrir mão de receita; Os Governos Estaduais e Municipais só pensam em aumentar a sua receita; as empresas que pagam muito querem uma racionalização e redução; as empresas que pagam pouco ou nada pagam não querem suportar uma tributação ou uma elevação; a pessoa física quer e precisa de uma urgente correção na tabela de "imposto de renda" e por aí vai.

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            Agora, uma coisa é certa, como está não pode ficar. O assunto tem que ser exaustivamente discutido, com a participação efetiva de toda a sociedade, e isto já começa a ocorrer. A imprensa tem dado um espaço muito grande para o assunto e, de maneira geral, todos tem se mobilizado.

            Não se pode mais continuar com esse emaranhado de regras tributárias. Só o assunto que tratamos no presente trabalho, COFINS, acrescido do PIS que tem regras semelhantes, tiveram 56 normas editadas desde 2.002, sendo 7 leis, 3 medidas provisórias, 10 decretos, 17 instruções normativas e 19 normas (entre atos declaratórios e normas de execução), segundo o Jornal Valor Econômico de 19.10.2004, pg. A10.

            No início do presente trabalho, incluímos um excerto de um texto de Adam Smith, da obra "A Riqueza das Nações" que assim diz: "O imposto que cada indivíduo é obrigado a pagar deve ser fixo e não arbitrário. A data de recolhimento, a forma de recolhimento, a soma a pagar, devem ser claras e evidentes para o contribuinte e para qualquer outra pessoa".

            A obra de Adam Smith "A Riqueza das Nações" é de 1776. Parece que nossas regras relativas ao tema desenvolvido: "COFINS" e ainda o nosso atual sistema tributário brasileiro, têm muito que aprender e aplicar, buscando os ensinamentos de Adam Smith, que ocorreram há muitos e muitos anos.


REFERÊNCIAS

            AMARO, Luciano. Curso de Direito Tributário. 5.ª ed. São Paulo: Editora Saraiva. 2002

            BALEEIRO. Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 9ª ed. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1977.

            BRASIL. Constituição Federal de 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.

            BRASIL. Lei Complementar nº 7, de 1970. Regulamenta a instituição do Pis devido por empresas privadas.

            BRASIL. Lei n. Complementar nº 70 de 1991. Institui a Cofins devida pelas pessoas jurídicas em substituição ao antigo Finsocial.

            BRASIL. Lei nº 9718 de 27.11.1998. Unificou as bases de cálculo do Pis e da Cofins a partir de fevereiro de 1999.

            BRASIL. Lei nº 10.637 de 30.12.2002. Institui o Pis não cumulativo a partir de dezembro de 2002.

            BRASIL. Lei nº 10.833 de 29.12.2003. Institui a Cofins na cumulativa a partir de fevereiro de 2004.

            BRASIL. Lei nº 10.865 de 30.04.2004. Trouxe alterações no Pis e na Cofins.

            CAIS, Cleide Previtalli. O Processo Tributário. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,1993.

            CANTO, Gilberto Ulhoa et alii. Contribuições, in Caderno de Pesquisas Tributárias. São Paulo: Resenha Tributária, nº 17.

            CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 10.ª ed. São Paulo: Editora Malheiros.1997.

            CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 1995.

            COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Controle de Constitucionalidade das Leis e do Poder de Tributar na Constituição de 1988. Del Rey: Belo Horizonte, 1993.

            DERZI, Misabel. Contribuições in Revista de Direito Tributário. São Paulo, nº 48.

            FANUCHI, Fabio. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 4ªed. São Paulo: Resenha Tributária, 1984.

            GASPAR, Walter. Mil perguntas de Direito Tributário. 7ª ed. Ed. Lúmen Iures: Rio de Janeiro. 1999.

            HORVATH JÚNIOR, Miguel. Direito Previdenciário. 3ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2003.

            MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 19ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001.

            MARTINEZ, Wladimir Novaes. Princípios de direito previdenciário. 3ªed. São Paulo: LTR, 1995.

            MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000.

            ______ Prestação de serviços públicos e Administração indireta. Revista dos Tribunais, 2ª ed. 1979.

            MORAES, Bernardo Ribeiro de. Compêndio de Direito Tributário. 2ª ed. Vol. I. Forense: Rio de Janeiro, 1993.

            NEVES. Luis Fernando de Souza. COFINS- Contribuição Social sobre o faturamento- L.C. 70/91. São Paulo: Max Limonad. 1997.

            SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito Tributário. São Paulo: Editora Siciliano Jurídico, 2004.


NOTAS

            1

COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Controle de Constitucionalidade das Leis e do Poder de Tributar na Constituição de 1988. Del Rey: Belo Horizonte, 1993. p.225

            2

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 1995. p.16

            3

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 1995. p.20

            4

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 19ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001.p.51

            5

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 1995. p.57

            6

DERZI, Misabel. Contribuições in Revista de Direito Tributário. São Paulo, nº 48 p.223

            7

os adeptos da corrente bipartite são Pontes de Miranda e Alfredo Augusto Becker.

            8

Os defensores da corrente tripartite são Geraldo Ataliba, Paulo de Barros, Roque Carraza, Sacha Calmon, dentre outros.

            9

Essa corrente encontra aceitação apenas por Fabio Fanuchi e Bernardo Ribeiro de Moraes.

            10

A divisão qüinqüipartida é defendida por Ives Gandra, Hugo de Brito e Barbosa Nogueira.

            11

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003.p. 85

            12

O art. 149caput da Constituição Federal prevê que as contribuições sociais devem obedecer ao art. 150I e III, que se referem as limitações do poder de tributar, especialmente a legalidade e a irretroatividade.

            13

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Prestação de serviços públicos e Administração indireta. Revista dos Tribunais, 2ª ed. 1979. p.19.

            14

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 19ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001.p.353

            15

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 19ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001.p.355

            16

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 19ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001.p.356

            17

Art. 149 §1° da Constituição Federal dispõe: "Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, de sistema de previdência e assistência social."

            18

CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 10.ª ed. São Paulo: Editora Malheiros. 1997. p. 247.

            19

NEVES. Luis Fernando de Souza. COFINS- Contribuição Social sobre o faturamento- L.C. 70/91. São Paulo: Max Limonad. 1997. p.74.

            20

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 1995. p.150.

            21

NEVES. Luis Fernando de Souza. COFINS- Contribuição Social sobre o faturamento- L.C. 70/91. São Paulo: Max Limonad. 1997. p.84-85.

            22

MARTINEZ, Wladimir Novaes. Princípios de direito previdenciário. 3ªed. São Paulo: LTR, 1995. p.80.

            23

Art. 2º: "A contribuição de que trata o artigo anterior será de dois por cento e incidirá sobre o faturamento mensal, assim considerado a receita bruta das vendas de mercadorias, de mercadorias e serviços e de serviço de qualquer natureza."

            24

Art. 195, I, b) a receita ou faturamento.

            25

Apud. HORVATH JÚNIOR, Miguel. Direito Previdenciário. 3ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2003.p 268.

            26

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 19ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 36.

            27

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003.p.111.

            28

A nomenclatura noventalidade é utilizada por Roque Antônio Carrazza.

            29

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003.p.125-126.

            30

Art. 56 da ADCT: " Até que a lei disponha sobre o art. 195, I, a arrecadação decorrente de, no mínimo, cinco dos seis décimos percentuais correspondentes à alíquota da contribuição de que trata o Dec.- lei 1.940, de 25 de maio de 1982, alterada pelo Dec.-lei 2.049, de 1º de agosto de 1983, pelo Decreto 91.236, de 8 de maio de 1985, e pela Lei 7.611, de 8 de julho de 1987, passa a integrar a receita da seguridade social, ressalvados, exclusivamente no exercício de1988, os compromissos assumidos com programas e projetos em andamento."

            31

Ação Declaratória de Constitucionalidade nº1-1 Distrito Federal, de 1º de dezembro de 1993. p.136.

            32

Art. 195: "A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições: I- do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; b) a receita ou o faturamento; c) o lucro."

            33

Art. 195 §4º: " A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I"

            34

Art. 154, I: "A União poderá instituir: I- mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição."

            35

Ação Declaratória de Constitucionalidade nº1-1 Distrito Federal, de 1º de dezembro de 1993. p. 123-124.

            36

Recurso Extraordinário 146.733-SP

            37

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

            38

RE 150.164-1

            39

Ação Declaratória de Constitucionalidade nº1-1 Distrito Federal, de 1º de dezembro de 1993. p. 111

            40

CANTO, Gilberto Ulhoa et alii. Contribuições, in Caderno de Pesquisas Tributárias. São Paulo: Resenha Tributária, nº 17. p. 68.

            41

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p.291.

            42

AI 318.429- AgR/PR publicado no DJ 22.02.2002 fls. 25

            43

RE 364.215/ PR

            44

RE 150.164-1

            45

ADC 1-1 DF, fls. 47.

            46

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000.p.8
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Sobre o autor
Amauri Sebastião Niehues

superintendente comercial do Banco do Brasil S.A., administrador, bacharelando em Direito pela Faculdade de Direito de Curitiba (PR)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NIEHUES, Amauri Sebastião. Aspectos constitucionais da nova Cofins à luz da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 675, 11 mai. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6703. Acesso em: 16 abr. 2024.

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