INTRODUÇÃO
A Constituição Federal atribuiu ao direito de descanso status de direito fundamental, garantindo ao trabalhador que se recupere fisicamente e psicologicamente do cansaço e fadiga ocasionada pelo exercício do labor. Por isso, a doutrina e jurisprudência entendem que o direito à desconexão é inerente à dignidade da pessoa humana.
Porém, embora o trabalhador não esteja no seu local de trabalho, durante seu período de descanso ele pode estar à disposição de seu empregador.
Com a evolução tecnológica ficou muito mais fácil diminuir as distâncias e por isso o trabalhador está sujeito a invasões no seu período de descanso por parte do empregador, pois pode permanecer à disposição por meio de e-mails, telefone, mensagens, dentre outros meios tecnológicos. Dessa maneira, o trabalhador não se “desliga” de sua função e o período de descanso é prejudicado.
DIREITO À DESCONEXÃO
O direito à desconexão é um direito fundamental, pois tem influência direta sobre a saúde, higiene e segurança do trabalho.
Por isso a Constituição Federal garantiu aos trabalhadores uma jornada de trabalho que fosse adequada ao sistema do corpo humano, buscando evitar o cansaço em excesso, problemas físicos e psicológicos, bem como garantiu o direito ao descanso para que o trabalhador possa recuperar sua energia.
O artigo 7° da Constituição Federal trouxe esses direitos ao trabalhador, vejamos:
Constituição Federal.
Artigo 7°: São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
(...) XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;
(...) XV - repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos;
(...) XVII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;
(...) XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;(...)
Todavia, o direito à desconexão também encontra amparo constitucional no artigo 6°, que trata dos direitos sociais, garantindo a todos brasileiros o direito à saúde e lazer.
O trabalhador, ao ser contratado, traz consigo bens jurídicos tais como a vida e saúde que devem ser protegidos pelo empregador, através da adoção das medidas previstas em lei acerca da proteção do trabalhador (BARROS, 2007).
Com a evolução tecnológica há alguns tipos de serviços que podem ser prestados diretamente da residência do trabalhador ou fora do estabelecimento/vigilância do empregador, tendo este total controle sobre as ações de empregado durante a execução dos serviços.
Esse tipo de serviço é chamado de teletrabalho ou trabalho à distância. É importante ressaltar que a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) não distingue o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, à distância ou realizado no domicílio do empregado, restando caracterizada a relação de emprego caso os pressupostos para tanto estejam presentes, conforme artigo 6°.
Desta forma, o direito à desconexão é, sobretudo, o direito que a lei conferiu ao trabalhador de usufruir dos descansos sem ter, desta forma, qualquer contato com o trabalho.
Vejamos um julgado nesse sentido:
RECURSO ORDINÁRIO. DIREITO DO TRABALHO. INTERVALO INTRAJORNADA.
Na doutrina de Jorge Luiz Souto Maior, os períodos de repouso são, tipicamente, a expressão do direito à desconexão do trabalho. Por isto, no que se refere a estes períodos, há de se ter em mente que descanso é pausa no trabalho e, portanto, somente será cumprido, devidamente, quando haja a desvinculação plena do trabalho (in Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, Campinas, n. 23,/2003). Assim, quando apenas havia períodos de aguardo de chamados, e não pausas regulamentares, ao longo da jornada, devida a paga das horas de intervalo. Recurso provido.
(TRT 6° R. RO - RO 132600652009506 PE 0132600-65.2009.5.06.0005 – 1ª T – Rel. Desa. Dinah Figueiredo Bernardo – Dje 05.10.2010) (grifo nosso)
Assim, entende-se que durante o período de descanso se o trabalhador tiver que responder e-mails, telefonemas, mensagens de texto, devem ser computadas como hora trabalhada, pois o empregado não teve a oportunidade de desvincular-se totalmente do trabalho, conforme preconizado pela legislação trabalhista.
A lei prevê diversos períodos de descanso para o empregado, com o intuito de preservar sua saúde física e mental.
Na legislação trabalhista existem os intervalos intrajornada e interjornada.
Os intervalos intrajornada são aqueles realizados dentro da jornada de trabalho.
O artigo 71 da CLT traz um exemplo deste tipo de intervalo:
Art. 71 - Em qualquer trabalho contínuo, cuja duração exceda de 6 (seis) horas, é obrigatória a concessão de um intervalo para repouso ou alimentação, o qual será, no mínimo, de 1 (uma) hora e, salvo acordo escrito ou contrato coletivo em contrário, não poderá exceder de 2 (duas) horas.
§ 1º - Não excedendo de 6 (seis) horas o trabalho, será, entretanto, obrigatório um intervalo de 15 (quinze) minutos quando a duração ultrapassar 4 (quatro) horas.
Desta forma, o empregado que trabalha menos de 04 (quatro) horas diárias não possui direito à repouso intrajornada.
Se a jornada de trabalho for entre 04 (quatro) e 06 (seis) horas diárias o empregado terá direito a 15 (quinze) minutos de descanso.
Todavia, caso a jornada de trabalho seja de 06 (seis) a 08 (oito) horas diárias o trabalhador terá direito a descanso de 01 (uma) a 02 (duas) horas de descanso para alimentação e repouso.
Ressalta-se que:
Contudo, caso o trabalhador tenha que permanecer com aparelho celular, BIP ou outro meio à disposição do trabalhador durante seu período de descanso, à espera de algum chamado ou emergência, ocorre a figura jurídica denominada sobreaviso.
A jornada de sobreaviso é prevista na CLT no artigo 244:
Art. 244 - As estradas de ferro poderão ter empregados extranumerários, de sobreaviso e de prontidão, para executarem serviços imprevistos ou para substituições de outros empregados que faltem à escala organizada.
(..) § 2º - Considera-se de "sobreaviso" o empregado efetivo, que permanecer em sua própria casa, aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço. Cada escala de "sobreaviso" será, no máximo, de 24 horas. As horas de "sobreaviso", para todos os efeitos, serão contadas à razão de 1/3 do salário normal. (grifo nosso)
Agora vejamos o conceito de sobreaviso trazido pela doutrina:
O sobreaviso caracteriza-se pelo fato de o empregado ficar em sua casa (e não em outro local) aguardando ser chamado para o serviço. Permanece em estado de expectativa durante seu descando, aguardando ser chamado a qualquer momento. Não tem o empregado condições de assumir compromissos pois pode ser chamado de imediato, comprometendo até seus afazeres familiares, pessoais ou até seu lazer (MARTINS, 2003, p. 502).
Posto isto, o empregado tem direito a adicional durante as horas que permanecer de sobreaviso, pois tem seu descanso condicionado ao chamamento ou não do empregador ao local de trabalho. Além do mais, não pode usufruir de seu período de descanso conforme sua conveniência ou vontade, restringindo seus afazeres já que tem compromisso perante o empregador. As horas de sobreaviso serão remuneradas com 1/3 do salário do empregado.
O Tribunal Superior do Trabalho sumulou o entendimento de o simples uso de aparelho de comunicação não caracteriza o sobreaviso:
Súmula nº 428 - Sobreaviso - Uso de Aparelho de Intercomunicação - Convocação para o Serviço. O uso de aparelho de intercomunicação, a exemplo de BIP, “pager” ou aparelho celular, pelo empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço.
Para tanto, para que haja a caracterização de sobreaviso é necessária uma escala, onde o empregado esteja ciente de que está à disposição do empregador e não apenas que o empregado porte aparelho de comunicação. Todavia, caso não seja o dia de sua escala, mas mesmo assim o empregador efetue chamados de serviços, esse período deve ser caracterizado como sobreaviso.
REFERÊNCIAS
BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 3 ed. Ver. E ampl. São Paulo: Ltr, 2007.
BRASIL. Consolidação das Leis Trabalhistas, Decreto-lei n° 5.452 de 01 de maio de 1943. Brasília: Senado Federal.
BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil (1988). Brasília, DF: Senado Federal.
MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 17 ed. São Paulo: Atlas, 2003.