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Desjudicialização: conciliação e mediação no novo Código de Processo Civil

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26/07/2018 às 15:00
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2 – COM O ADVENTO DO NCPC

O estímulo aos métodos consensuais de solução de conflitos no novo CPC tem como objetivo, além de solucionar o grande problema da progressiva demanda jurisdicional, uma transformação da sociedade que passa de uma cultura do litígio para uma cultura do consenso, ou seja, cultura da paz social.

 Sendo assim, uma cultura baseada no consenso, deve ser construída enaltecendo a composição entre as partes nas resoluções dos conflitos. No entanto, como todo processo de mudança é comum haver resistência, que com toda certeza vão exigir adaptações de todos os operadores do direito. Os advogados, por exemplo, estão absolutamente acostumados a litigiosidade e por essa razão é natural haver resistência.

O próprio ensino jurídico estimula essa cultura do litígio, uma vez que formam profissionais para um método heterocompositivo, que busca uma solução sempre por via judicial dos conflitos

Desta forma é certo que o processo de migração de uma cultura para outra exige de todos os operadores do direito, primeiramente uma modificação de mentalidade.

Depreende-se, que a difusão dos meios consensuais de solução de conflitos, conciliação e mediação, em todo o Judiciário tem um papel fundamental nessa mudança de cultura.

A cultura do consenso ou da paz social enseja estimular os meios consensuais de solução de conflitos, no intuito de produzir a pacificação social, uma vez que na solução consensual de conflitos não existe vencedores e perdedores, e sim, um processo no qual ambas as partes saem vencedoras, como esclarece BACELLAR (2011, p. 32-33):

A verdadeira justiça só se alcança quando os casos “se solucionam” mediante consenso. Não se alcança a paz resolvendo só parcela do problema (controvérsia); o que se busca é a pacificação social do conflito com a solução de todas as questões que envolvam o relacionamento entre os interessados. Com a implementação de um modelo mediacional, complementar e consensual de solução dos conflitos, o Estado estará mais próximo da pacificação social e da harmonia entra as pessoas.

Nota-se que conflitos envolvendo as mais diversas áreas do direito civil, previdenciário, trabalhista e até societário já têm sido exauridas por meio da conciliação, bem como, verifica-se a aplicação da mediação no Judiciário. Um reflexo positivo dessa afirmação é a Lei da Mediação nº 13.140/2015, e o amplo incentivo aos meios consensuais de solução de conflitos no novo Código de Processo Civil.

Pode-se verificar que a reforma do Código de Processo Civil instituída pela Lei nº 13.105/2015, absorveu a necessidade de mudança de cultura do litígio pra o consenso, ao incorporar as ambições do CNJ pelo estímulo da "Cultura de Paz", fazendo grande inovação ao preferir os meios consensuais de resolução de conflitos, conciliação e mediação, como solução dos litígios.

2.1 INOVAÇÕES

O novo Código de Processo Civil foi desenvolvido, com estímulo claro aos meios consensuais de solução de conflitos, que almejam a garantia de uma prestação jurisdicional mais justa, no sentido de solucionar o problema do acesso à justiça e não menos importante a progressiva demanda de processos ante um aparelho judiciário ineficiente para atendê-la.

Nas palavras de THEODORO JÚNIOR (2015, p.73):

É, destarte, uma regulamentação nova, compromissada com a instrumentalidade, adequada à realização plena e efetiva do direito material em jogo no litígio, singela, clara, transparente e segura quanto ao procedimento o que se pode esperar de um novo Código, que seja superior às vaidades do tecnicismo e que seja concebido com firmeza, objetividade e coerência com o programa moderno do processo justo, que, enfim, os órgãos encarregados da prestação jurisdicional se preparem, convenientemente, para pô-lo em prática, com fidelidade à letra, ao espírito e aos propósitos da reforma.

Nesse mesmo sentido, oportuno o entendimento de SILVA e TARTUCE (2013, p.3):

Nesse contexto reformador, papel de destaque foi dado aos meios consensuais, que passaram a ser vistos definitivamente como formas possíveis de realização de Justiça, sobretudo como resposta ao enorme número de conflitos judicializados. Aliás, não são raras as vezes em que se realça o enfoque quantitativo dos meios consensuais em detrimento do enfoque qualitativo

O legislador foi muito sensível em reconhecer a necessidade de mudança do diploma processual civil, por um que objetiva uma composição amigável. MÜLLER (2015, p.1089) destaca que o legislador absorveu a ideia do CNJ, adotando os meios consensuais como um dos pilares no novo Código de Processo Civil:

Um dos pilares do Código de Processo Civil de 2015 é o de estimular a solução consensual de conflitos, como se observa de norma inserta em capítulo que dispõe a respeito das normas fundamentais do processo (§ 2º do art. 3º). Esta verdadeira orientação e política pública vem na esteira da Resolução 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça, que tratou de fixar aportes mais modernos a respeito dos meios alternativos para a solução de controvérsias. Cada um dos meios alternativos (negociação, conciliação, mediação, dentre outros) são portas de acesso à justiça, sem exclusão dos demais canais de pacificação de conflitos, daí a razão de se defender como política pública a implantação do denominado Sistema Multiportas.

Destaca-se, que a conciliação foi amplamente difundida e houve a institucionalização da mediação como um novo e eficaz meio de se alcançar a pacificação social. A matéria da conciliação e da mediação está positivada no Novo Código de Processo Civil (NCPC), nos artigos 165 a 175, e traz os princípios da conciliação e mediação e o registro dos profissionais, obrigando os tribunais a criarem setores de conciliação e mediação destinados a estimular a autocomposição e definirem a atuação dos conciliadores e mediadores.

O amplo incentivo a autocomposição e a importante necessidade de se implementar uma cultura de pacificação tem destaque logo no parágrafo 3º de seu artigo 3, da Lei 13.105/2015 que afirma que :

A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.

O código dispõe de disciplina inteira dedicada aos institutos da mediação e da conciliação na Seção V, Capítulo III, Título IV, do Livro III (Dos Sujeitos do Processo) que merece ser detalhadamente abordada.

Destaca THEODORO JÚNIOR (2015, p.51): 

A valorização do papel da mediação e da conciliação dentro da atividade jurisdicional se faz presente de maneira mais expressiva no Novo Código de Processo Civil, que, além de prevê-las como instrumentos de pacificação do litígio, cuida de incluir nos quadros dos órgãos auxiliares da justiça servidores especializados para o desempenho dessa função especial e até mesmo de disciplinar a forma de sua atuação em juízo (arts. 165 a 175).

Assim, nos termos do artigo 165:

Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição.

Destaca-se, também, que ficou bem acertado o papel do conciliador e do mediador nos parágrafos § 2º e § 3º do artigo 165.

Já artigo 166 determina os princípios que regem a conciliação e a mediação e destaca a observância da aplicação de técnicas negociais, da confidencialidade e da livre autonomia dos interessados nos procedimentos. O caput dispõe que as técnicas devem ser pautadas pelos princípios da independência, imparcialidade, confidencialidade, oralidade, da informalidade, decisão informada e autonomia das vontades das partes envolvidas. O § 1º aborda que a confidencialidade abarca as informações produzidas no curso do procedimento, que não poderão ser utilizadas para fins diversos. No § 2º é assevera que o conciliador e o mediador, assim como os membros de sua equipe, não poderão divulgar os fatos oriundos da conciliação ou da mediação, em razão do dever do sigilo. Já o § 3º dispõe que para proporcionar uma ambiente favorável à conciliação e mediaão é autorizado a aplicação de técnicas de negociação. Por derradeiro, o § 4º dispõe que a mediação e a conciliação deve respeitar a livre autonomia das partes, inclusive no que diz respeito à definição das regras procedimentais.

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O artigo 167 dispõe da inscrição dos conciliadores, mediadores e câmaras privadas de conciliação e mediação, junto aos tribunais. Destaca-se nesse artigo o § 5º que traz impedimento do exercício da advocacia nos juízos onde o profissional atuar como mediador ou conciliador, e o § 6º que trata da possibilidade de os tribunais criarem um quadro próprio de conciliadores e mediadores por meio de concurso público.

O artigo 168 cuida de alertar sobre a  liberdade de escolha do conciliador ou mediador, pelas partes envolvidas, bem como do local de realização do ato.

Nas palavras de KEPPEN (2005, p.38):

Promovem a liberdade das próprias partes escolherem a melhor, aumentando com isso a possibilidade de um agir consciente, o qual estimula o conhecimento, a responsabilidade, a urbanidade, ou seja, os comportamentos socialmente desejáveis que o direito tutela.

O artigo 169 traz a previsão legal de remuneração dos conciliadores e mediadores, com exceção dos casos constantes no artigo 167, §6º. No entanto o § 1º deixa clara a possibilidade do trabalho ser realizado de forma voluntária. O § 2º assevera que as câmaras privadas deverão suportar um percentual de audiências não remuneradas determinado pelos tribunais, com o intuito de atender aos processos em que foi deferida a gratuidade da justiça, como uma forma de contrapartida de seu credenciamento.

O artigo 170 trata dos casos de impedimento, em que o profissional conciliador ou mediador devem comunicar imediatamente, e assevera que de preferência por meio eletrônico o impedimento. Logo após, devem realizar a devolução os autos ao juiz do processo ou ao coordenador do centro judiciário de solução de conflitos, que providenciará nova distribuição. Caso o impedimento for apurado e arguido quando o procedimento já foi iniciado, a atividade deverá ser imediatamente interrompida. Desta forma este artigo trata da imparcialidade dos conciliadores e mediadores.

O artigo 171 dispõe sobre a garantia de permanência no conflito, dos conciliadores e mediadores, em caso de impossibilidade temporária de exercer a função. Neste caso, devem informar ao centro de solução de conflitos, vinculada ao tribunal, para que não ocorra nova distribuição ate o exaurimento do impossibilidade.

No artigo 172 o legislador trouxe um impedimento pelo prazo de um ano, contado última audiência em que atuou como conciliador ou mediador, de patrocinar as partes que nessa derradeira audiência de se encontravam.

Conforme assevera o artigo 173 será excluído do cadastro de conciliadores e mediadores aquele que: agir com dolo ou culpa na condução da conciliação ou da mediação sob sua responsabilidade; atuar em procedimento de mediação ou conciliação, apesar de estar impedido ou suspeito. O § 1º dispõe que esses casos serão analisados em processo administrativo e o § 2º dispõe que o juiz do processo deve verificar a atuação inadequada do profissional mediador ou conciliador, inclusive podendo suspender suas atividades por até 180 (cento e oitenta) dias.

No artigo 174, o Código deixa claro que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios podem criar câmaras de conciliação e mediação para estabelecer a solução consensual de conflitos no âmbito administrativo, dirimindo conflitos entre seus órgãos e até mesmo realizar a celebração de termo de ajustamento de conduta, quando a lei permitir.

O artigo 175 dispõe que todas as disposições desta Seção também integram as outras formas de conciliação ou mediação extrajudiciais vinculadas aos tribunais.

Mais a frente, o inciso VII do artigo 319 dispõe sobre uma inovação quanto aos requisitos da petição inicial, qual seja a deverá a informação do autor optar ou não pela realização de audiência de conciliação ou mediação. Importantíssimo esse dispositivo, no sentido de ratificar a plena difusão desses meios consensuais de solução de conflitos, colocando como requisito da petição inicial.

Por conseguinte, outro ponto a salientar diz respeito à obrigatoriedade de citação do réu, para comparecer a audiência de conciliação e mediação, em primeiríssimo lugar e não para oferecer contestação de imediato. Este procedimento respeita o disposto no artigo 334 do CPC. O caput dispõe que preenchidos todos os requisitos da petição inicial, o juiz designará audiência de conciliação ou  mediação com antecedência mínima de trinta dias, sendo o réu citado com pelo menos vinte dias de antecedência.  Vale destacar que nos termos do § 8º  o não comparecimento injustificado das partes envolvidas na audiência de conciliação ou mediação é considerado grave ato que atenta contra a dignidade da justiça, passível de multa de até dois por cento do valor da causa.

Por fim, o artigo 359 dispõe que instalada a audiência de instrução e julgamento, deverá ser realizada uma nova tentativa de conciliação das partes pelo juiz, mesmo que as partes envolvidas já tenham frustrada a audiência de conciliação e mediação prévia. Constitui assim, uma nova oportunidade que as partes envolvidas têm de alcançar uma solução consensual do conflito, antes do julgamento do mérito pelo juiz.                       

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Sobre o autor
Rodrigo da Paixão Pacheco

Advogado. Membro das Comissões de Direito do Consumidor, Família e Sucessões e Advocacia Jovem, da OAB seccional Goiás. Mestrando em Serviço Social pela PUC Goiás. Possui graduação em Direito e Administração PUC Goiás. Pós graduando em Direito Civil e Processo Civil e Direito Penal e Processo Penal pela UCAM/RJ.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PACHECO, Rodrigo Paixão. Desjudicialização: conciliação e mediação no novo Código de Processo Civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5503, 26 jul. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/67836. Acesso em: 24 abr. 2024.

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