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Consórcios públicos:

comentários ao art. 2º da Lei nº 11.107/2005

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Desapropriações e Servidões.

            Já o texto do inciso II do art. 2º da Lei de Consórcios, revela outros meios de que podem se valer os consórcios públicos, nos termos do contrato de consórcio de direito público, como os de promover desapropriações e instituir servidões nos termos de declaração de utilidade ou necessidade pública, ou interesse social, realizada pelo Poder Público.


Desapropriação.

            Desapropriação é o instituto, ou seja, o conjunto de normas, que disciplina a cessão ao domínio público, compulsória e mediante justa indenização, de propriedade pertencente a um particular. (15)

            Para De Plácido e Silva, desapropriação indica o ato, emanado do poder público, em virtude do qual declara desafetado (desclassificado) ou resolvido o domínio particular ou privado sobre um imóvel, a fim de que, a seguir, por uma cessão compulsória, o senhor dele o transfira para o domínio público. (16)

            O autor do Rio de Janeiro, Diogo de Figueiredo Moreira Neto, comenta em seu manual o processo de intervenção do Estado na propriedade e intervenção econômica, ou seja, expõe quais seriam os instrumentos jurídicos de que dispõe o mesmo para intervir administrativamente na propriedade privada.

            Tratando especificamente da intervenção do Estado na propriedade, de natureza instrumental do Estado, explica que:

            "A desapropriação é um instrumento de intervenção no domínio privado destinado a substituir o objeto do domínio que apresente interesse público, por seu equivalente em dinheiro. Sua aplicação é, assim, diversificadíssima: vêmo-la na função de polícia, na desapropriação de aparelhos, mecanismos ou suas patentes, cujo uso possa oferecer risco à sociedade; vêmo-la no campo dos serviços públicos, ao se decidir pela encampação de serviços concdedidos; vêmo-la atuar no ordenamento econômico, se o Estado monopolizar certa atividade de interesse econômico geral; vêmo-la atuar no ordenamento social, se o Estado pretender desapropriar áreas para solução de problemas urbanísticos ou agrários; vêmo-la servir às atividades de fomento público, para a preservação de bens do patrimônio histórico, artístico, paisagístico e cultural do País". (17)


Servidão administrativa.

            Segundo DE PLÁCIDO E SILVA, servidão vem do latim servitudo, de servus (sujeito, submetido, dependente), com o sentido de sujeição, escravidão, submissão ou subordinação, revela o significado de uma obrigação, de um encargo, de um dever, a que se acha sujeita determinada pessoa.

            No sentido jurídico, servidão representaria o encargo ou o ônus estabelecido sobre um outro imóvel, pertencente a um outro proprietário. O encargo ou ônus a que se sujeita o imóvel alheio, em favor de outrem, constitui para este um direito real que lhe assegura o uso e o gozo da serventia, que se constitui em servidão. Segundo o art. 1.378 do novo Código Civil, a servidão proporciona utilidade para o prédio dominante, e grava o prédio serviente, que pertence a diverso dono, e constitui-se mediante declaração expressa dos proprietários, ou por testamento, e subseqüente registro no Cartório de Registro de Imóveis.

            "A servidão é o direito de se utilizar alguém de coisas que não lhe pertencem. É ter direito sobre a serventia de outrem. (...) A servidão, conforme é a regra, tem por objeto a prática de atos materiais, que somente se cumprem sobre uma coisa corpórea. Várias são as espécies de servidão, consoante são as utilidades, ou as serventias que se asseguram ao senhor do prédio dominante. Segundo a localização dos prédios, dizem-se urbanas ou rurais, sendo convencionais, ou legais. Conforme sua natureza, especializam-se em de aquedutos, de escoamento, de ar e luz, aérea, de estilicídio, aparentes, contínuas e descontínuas, etc". (18)

            Para HOUAISS, servidão é o estado ou condição de servo ou de escravo; serventia. É o estado de escravidão, de dependência de uma pessoa, inteiramente submetida a outra; sujeição, dependência; perda da independência nacional ou política. Juridicamente é o encargo imposto em qualquer prédio em proveito ou serviço de outro prédio pertencente a um outro dono ou a utilidade de passagem ou direito que alguma propriedade ou terceiros têm à serventia através de prédios e terras alheias. (19)

            Diogo de Figueiredo Moreira Neto expressa que a servidão administrativa é admitida genericamente no art. 5º, inciso XXIII ( a propriedade atenderá a sua função social), e, implicitamente, no inciso XXIV ( a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição) da Constituição Federal. O seu conceito de servidão administrativa é o seguinte:

            "...intervenção ordinatória e concreta do Estado na propriedade privada, parcialmente expropriatória, impositiva de ônus real de uso público, onerosa, permanente, não executória e de execução delegável". (20)

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            Em se tratando de realização de serviços ou obras públicas demoradas, desenvolveu-se a figura da servidão administrativa que viria a ser a contrapartida pública da servidão predial privada, estabelecida no Código Civil, caracterizada esta pela instituição de um ônus real de uso sobre a propriedade.

            O ato iniciador do processo administrativo para a instituição da servidão administrativa deve declarar o imóvel serviente e estabelecer a razão da imposição, além da indenização, caso seja cabível, ao proprietário do prédio sacrificado.

            Se não houver diminuição da utilidade econômica do imóvel, em razão da servidão imposta, nada haverá a indenizar e será esta gratuita.

            Na espécie onerosa, por sua vez, após o ato declaratório do Estado, deve ser paga a indenização. Em sendo feita assim, a servidão será consensual, acaso o proprietário aceite e concorde com o valor oferecido pelo poder público.

            Caso não seja aceita a indenização oferecida pelo poder público, o mesmo procederá a imposição da servidão administrativa, acertando o valor judicial prévio do valor disputado. O processo utilizado será o de desapropriação, previsto pelo Decreto-Lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941, mesmo no tocante à imissão provisória na posse do bem serviente.

            Lembra Moreira Neto que o uso público da servidão administrativa destina-se à utilização de interesse público, pelo Estado, ou por seus agentes delegados.

            E conclui: "A servidão administrativa, uma vez constituída por ato administrativo, admite delegação de sua execução, podendo o delegatário de serviços públicos promover, como substituto processual, o competente processo judiciário". (21)


Dispensa de licitação.

            O texto do inciso III determina poder haver contratação pela administração direta ou indireta dos entes da Federação consorciados, dispensada a licitação. Deve aqui ser lembrado o texto do inciso II e que juntos, ficariam com a seguinte redação:

            "II – nos termos do contrato de consórcio de direito público, promover desapropriações e instituir servidões nos termos de declaração de utilidade ou necessidade pública, ou interesse social, realizada pelo Poder Público; e III – ser contratado pela administração direta ou indireta dos entes da Federação consorciados, dispensada a licitação".

            O texto da lei dispensa a licitação para a contratação pelas administrações direta e indireta do consórcio justamente pelo fato do mesmo ser de natureza pública.


Poderes de administração.

            § 2o Os consórcios públicos poderão emitir documentos de cobrança e exercer atividades de arrecadação de tarifas e outros preços públicos pela prestação de serviços ou pelo uso ou outorga de uso de bens públicos por eles administrados ou, mediante autorização específica, pelo ente da Federação consorciado.


Concessão de obras ou serviços púbicos.

            § 3o Os consórcios públicos poderão outorgar concessão, permissão ou autorização de obras ou serviços públicos mediante autorização prevista no contrato de consórcio público, que deverá indicar de forma específica o objeto da concessão, permissão ou autorização e as condições a que deverá atender, observada a legislação de normas gerais em vigor.

            A previsão de concessão, autorização ou permissão de obras ou serviços públicos mantém a linha seguida pelo Estado brasileiro de contar com a "ajuda" dos particulares na prestação de obras ou serviços públicos adequados.


Notas

            1

SILVA, José Afonso. Curso de Direito constitucional Positivo, apud MORAES, Direito Constitucional, São Paulo: Atlas, 2004, p.290.

            2

MORAES, Alexandre de, "Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional",4ª edição, São Paulo: Atlas, 2004, p.690.

            3

Idem.

            4

ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes, "Competências na Constituição de 1988", 2ª edição, São Paulo: Atlas, 2000, P.138.

            5

MORAES, Direito Constitucional, São Paulo: Atlas, 2004, pp. 299 e segs.

            6

MORAES Direito...(2004:300).

            7

HOUAISS "Dicionário Eletrônico da Língua Portuguesa", verbete "convênio".

            8

DE PLÁCIDO E SILVA "Vocabulário Jurídico", nº 517, 18ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2001, verbete "convênio".

            9

GRAU, Eros Roberto. "Enciclopédia Saraiva de Direito", v. 20, p. 379.

            10

CRETELLA JR, José. "Tratado de Direito Administratrivo", v. III,RJ/SP: Forense, 1967, pp. 13-18.

            11

(1967:15).

            12

Idem.

            13

(1967:16).

            14

(1967:17-18).

            15

HOUAISS, Dicionário Eletrônico da Língua Portuguesa.

            16

DE PLÁCIDO E SILVA, Vocabulário Jurídico, nº 517, 18ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2001.

            17

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. "Curso de Direito Administrativo", 12ª edição – 2ª tiragem, Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 360.

            18

DE PLÁCIDO E SILVA, Vocabulário Jurídico, nº 517, 18ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2001.

            19

Dicionário Eletrônico HOUAISS da Língua Portuguesa.

            20

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. "Curso de Direito Administrativo", ob. cit. Ant. p. 368.

            21

(2002:368).

Bibliografia:

            ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes, "Competências na Constituição de 1988", 2ª edição, São Paulo: Atlas, 2000; CRETELLA JR, José. "Tratado de Direito Administratrivo", v. III,RJ/SP: Forense, 1967; DE PLÁCIDO E SILVA, Vocabulário Jurídico, nº 517, 18ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2001; GRAU, Eros Roberto. "Enciclopédia Saraiva de Direito", v. 20; HOUAISS "Dicionário Eletrônico da Língua Portuguesa"; MORAES, Alexandre de, "Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional",4ª edição, São Paulo: Atlas, 2004; _________.Direito Constitucional, São Paulo: Atlas, 2004; MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. "Curso de Direito Administrativo", 12ª edição – 2ª tiragem, Rio de Janeiro: Forense, 2002.

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Sobre o autor
Francisco de Salles Almeida Mafra Filho

advogado parecerista, professor da graduação e da pós-graduação do UNIVAG, FJP, UCAM e Faculdades Afirmativo, professor da Escola de Governo do Estado de Mato Grosso, doutor em Direito Administrativo pela UFMG

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MAFRA FILHO, Francisco Salles Almeida. Consórcios públicos:: comentários ao art. 2º da Lei nº 11.107/2005. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 694, 30 mai. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6802. Acesso em: 22 nov. 2024.

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Título original: "Comentários ao art. 2º da Lei de Consórcios Públicos".

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