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Política econômica, fiscal e monetária:

uma breve abordagem

06/06/2005 às 00:00
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No dizer de ADAM SMITH (1986:169), "A economia política, considerada como ramo da ciência do estadista ou legislador, propõe dois objetivos distintos: primeiro, proporcionar uma renda abundante, ou subsistência para o povo, ou, mais propriamente, permitir-lhe proporcionar uma tal renda ou subsistência para ele mesmo; e segundo, suprir o estado, ou comunidade, com uma renda suficiente para os serviços públicos. Propõe-se a enriquecer o povo e o soberano", este último, hodiernamente, visto como o próprio Estado.

Mas, "O que faz a riqueza de um país?", pergunta LEO HUBERMAN, autor da magistral "História da riqueza do homem" (1986:118). E o próprio ADAM SMITH (que dispensa apresentações), na obra supra citada, responde que "Um país rico, do mesmo modo que um homem rico, supõe-se que seja um país onde há abundância de dinheiro". Na esteira, assevera SMITH, "Que a riqueza consista no dinheiro, ou no ouro e na prata, é uma noção popular que naturalmente origina-se da dupla função do dinheiro, como instrumento do comércio e como medida do valor. Em conseqüência, quando temos o dinheiro, podemos mais rapidamente obter o que quer que precisemos. O grande afazer, sempre descobrimos, é conseguir dinheiro."

Dinheiro, como expressa DE PLÁCIDO E SILVA (2002:268), deriva do "latim denarius (deni, ‘cada dez’) e designava, entre os romanos, certa moeda de prata, que valia 10 asses, passando depois a distinguir, genericamente, toda espécie de moeda, circulante no comércio, servindo de troca das coisas que se recebem em seu lugar. É, assim, o principal elemento na circulação das riquezas, usado como mediador entre todas as operações mercantis. E, possuindo conceito equivalente à moeda, se indica medida de valor, é indispensável à execução de tais trocas, promotoras da mobilização das riquezas."

Ora, se, como visto até então, o bem-estar e o conforto dependem da produção e da mobilização de riqueza, se esta consiste no dinheiro farto, e se este tem um conceito equivalente à noção de moeda (vale dizer, são sinônimos), então, não restam dúvidas de que ela, a moeda, é essencial e imprescindível à vida das pessoas e do próprio Estado. Há muito o escambo perdeu a primazia para a própria moeda quanto às trocas pertinentes às necessidades e aos desejos, não obstante o inegável avanço que tal prática representou para a humanidade.

Todavia, como explica JUAREZ RIZZIERI (In MANUAL DE ECONOMIA:1996, 25), "o puro escambo se realiza sob tão grandes desvantagens, que não seria mais concebível sua utilização e sua consecução sem a introdução do uso da moeda. Em quase todas as culturas, os homens não trocam mercadorias, mas vendem uma delas por moeda e, então, usam a moeda para comprar as mercadorias que desejam."

Destarte, como exprime DENNIS ROBERTSON (1969:02), "É aconselhável chegarmos, desde logo, à compreensão daquilo que se entende por moeda," quanto às suas funções e às suas características. E sem abdicar, evidentemente, de promover a devida relação que há entre tais entendimento e conceituação e o papel que o Estado representa na política monetária, correlação esta, fim precípuo desta dissertação.

Segundo ANDRÉ FRANCO MONTORO JR. (In MANUAL DE ECONOMIA:1996, 277), "Usa-se o termo moeda para algo geralmente aceito em troca de bens e serviços. Em outra palavras, moeda é um instrumento ou objeto que, pelo fato de ser aceito pela população em troca de bens e serviços, passa a ser usado como meio de troca. Pode-se entender o que seja moeda a partir das funções que ela desempenha. Em geral, as moedas têm várias funções, de tal forma que o bom desempenho de uma particular moeda é medido e estudado em relação ao cumprimento destas funções. As principais funções são as seguintes: I – um meio ou instrumento de troca; II – reserva de valor; III – unidade de conta ou denominador comum de valor; IV – padrão para pagamentos diferidos (adiados/retardados)."

GILBERTO BERCOVICI (CEU/Direito Constitucional/2003. Apontamentos) enumera as seguintes características da moeda: I – convertibilidade; II – curso forçado (Estado impõe seu uso por meio de lei); III – poder liberatório, no sentido de liberação de obrigações.

No mesmo diapasão, completando o raciocínio, GREMAUD, VASCONCELOS, TONETO JR. (2002:217ss.) explicam que "Para desempenhar suas funções, as moedas devem apresentar algumas características que são essenciais. Características físicas e econômicas são necessárias ao desempenho das funções meio de troca, reserva de valor, unidade de conta e pagamentos diferidos. Quanto às características econômicas, são os seguintes atributos: custo de estocagem e custo de transação negligenciáveis (aproximadamente nulo). O trigo, por exemplo, tem reduzidas chances de se tornar moeda em uma economia desenvolvida porque o seu custo de estocagem não é desprezível e seu custo de transporte ao mercado (custo de transação) pode ser elevado." Na seqüência, os mesmos autores lecionam que "A moeda deve possuir determinadas características físicas. Deve ser divisível, durável, difícil de falsificar, manuseável e transportável."

Sendo assim, da inteligência das idéias logo atrás encadeadas e, ainda de acordo com GREMAUD, VASCONCELOS, TONETO JR., tem-se que, "quando uma moeda possui as características físicas e econômicas que são imprescindíveis e essenciais (tal como denotado), pode-se dizer que ela está apta e que está habilitada a desempenhar as suas funções."

Acerca da moeda, vale registrar, a título de curiosidade, como descreve SANTOS TRIGUEIRO (1987:19), que, "Geralmente se tira este vocábulo do latim moneta, epíteto da deusa Juno. As moedas eram cunhadas no templo de Juno Moneta em Roma. Segundo Cícero e Ovídio, o epíteto provém do verbo monere, "avisar", alegando que foi dado à ela por ter avisado aos romanos um tremor de terra."

Feitas as devidas alusões às funções e às características da moeda, cumpre, pois, enveredar para a questão ligada ao papel do Estado na política monetária, não sem antes trazer à lume algumas considerações acerca de temas afins e interligados, v.g., a própria noção de economia e de política.

Com VASCONCELOS, TROSTER (1998:20), tem-se que "a palavra economia vem do grego oikos (casa) e nomos (norma, lei). Seria a ‘administração da casa’, que pode ser generalizada como a ‘administração da coisa pública’." Destarte, conforme os mesmos, a "Economia pode ser definida como a ciência social que estuda o modo pela qual os homens decidem empregar recursos escassos, a fim de produzir diferentes bens e serviços e atender às necessidades de consumo. Assim, é uma ciência social, já que objetiva atender às necessidades humanas. Mas depende de restrições físicas, devido à escassez de recursos ou fatores de produção (mão-de-obra, capital, terra, matérias-primas)."

Resta claro, portanto, que, se os recursos são escassos e se o emprego destes é restrito devido à própria escassez, então é mister que a escolha, entre as alternativas que se apresentam no sentido do atendimento das necessidades de toda ordem, seja adequada, ou no mínimo, a ‘menos pior’. Logo, se há a necessidade de escolhas (decisões) sobre o que e quanto, como e para quem produzir, isto numa visão geral, então se está diante dos traços elementares da política econômica.

GREMAUD, VASCONCELOS, TONETO JR. (2002:190) definem a "política econômica como a intervenção do governo na economia com o objetivo de manter elevados níveis de emprego e elevadas taxas de crescimento econômico com estabilidade de preços. As principais formas de política econômica são a política fiscal e a política monetária. Por política fiscal, entende-se a atuação do governo no que diz respeito à arrecadação de impostos e aos gastos. Por política monetária, entende-se a atuação do Banco Central para definir as condições de liquidez da economia: quantidade ofertada de moeda, nível de taxa de juros entre outros."

A assertiva supra delineada é ratificada por YEDA CRUSIUS (1985:157), a qual descreve que "a política monetária, que implica o controle da quantidade de moeda na economia, é o segundo instrumento fundamental posto à disposição do governo para controlar a economia (a política fiscal é o primeiro). Quando os indivíduos possuem mais moedas, eles tendem a gastar mais. Em contrapartida, se a quantidade de moeda diminui, a demanda agregada tenderá a cair; através do controle da quantidade de moeda, as autoridades monetárias podem influenciar a economia."

Segundo MANUEL ENRIQUEZ GARCIA (In MANUAL DE ECONOMIA:1996, 311), "O Banco Central do Brasil é o órgão executor da política monetária, além de exercer a regulamentação e a fiscalização de todas as atividades de intermediação financeira no País. Dentre as suas atribuições, destacam-se: a) emissão de moeda; b) o recebimento dos depósitos obrigatórios dos bancos comerciais e dos depósitos voluntários das instituições financeiras em geral; c) a realização de operações de redesconto de liquidez e seletivo; d) as operações de open market (mercado aberto); e) o controle do crédito e das taxas de juros; f) a fiscalização das instituições financeiras e a concessão da autorização para o seu funcionamento; g) a administração das reservas cambiais do País."

Como visto, o Banco Central (BC) atua na regulação da oferta da moeda e é quem exerce a política monetária, a qual é um dos mecanismos essenciais da política econômica, a qual, por sua vez, se confunde, sem embargo, com a própria atuação do governo em faces às suas decisões concernentes ao adequado funcionamento dos ‘meandros’ da economia.

Logo, seja qual for a forma de organização do Banco Central, não há que se cogitar em dissociá-lo inteiramente do Governo. Aliás, no Brasil, cabe ao Presidente da República nomear, com a devida chancela do Senado, o presidente e os diretores do Banco Central, tal como dispõe o art. 84, inc. XIV, da Constituição. Ora, é sabido que o Presidente é o chefe de Estado e é o chefe de Governo e que, nestas condições, é um dos principais detentores do poder de escolha, vale dizer, da opção por este ou por aquele caminho traçado por ele em conjunto com sua respectiva equipe ministerial. Nas questões que envolvem a política econômica, inclusive.

Ainda na seara jurídica, indubitavelmente de melhor domínio acadêmico que os aspectos ligados ao campo da economia, não há como o Governo não atuar na política econômica nacional. Todo o Título VII – Da Ordem Econômica e Financeira (arts. 170 a 181), do Texto Supremo, prescreve comandos acerca da matéria. Destarte, é preceito fundamental expresso na Constituição que "Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado." (art. 174, caput, da Carta Política).

Traz-se outros dispositivos constitucionais à baila, visto que são pertinentes à sistematização imprimida nesta dissertação. O art. 164 determina que "A competência da União para emitir moeda será exercida exclusivamente pelo Banco Central." No art. 48, incisos XIII e XIV, está expresso que cabe ao Congresso, com a sanção do Presidente, dispor sobre matéria financeira, cambial, monetária, instituições financeiras, moeda, seus limites de emissão e montante da dívida mobiliária federal.

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Por fim, restringindo-se somente ao âmbito normativo constitucional, destaca-se o inciso I, do art. 24, da Carta, que delega competência concorrente à União, aos Estados e ao DF para legislar sobre o Direito Econômico, institucionalizando, definitivamente, a sua condição como ramo do direito.

Diante do considerável cabedal de informações, conceitos e idéias concatenadas no decorrer desta digressão, resta nítido que o Estado é o principal condutor da Economia do País. Como responsável pela formulação e pela implementação de políticas públicas, a política econômica, inclusive, o Estado não pode abster-se de atuar no sentido de buscar o bem-estar da sociedade.

Se a política econômica tem como um dos seus pilares a política monetária e se os recursos que dão lastro à emissão de moedas são escassos, então deve o Estado promover e estimular a produção e a mobilização de riquezas. Deste modo, o trabalho do Banco Central será sobremaneira facilitado, até porque, no Brasil dos dias de hoje é perceptível a grande influência exercida pelo ‘capital especulativo’, volátil, de pouca densidade e praticamente inacessível à imensa maioria dos brasileiros, ávidos por terem ‘moedas’ à sua disposição.

Um governo consciente e atento às necessidades da população e do próprio Estado, e uma economia pautada pelo estímulo à produção e à mobilização de riquezas em face a uma política econômica condizente com estas exigências é o primeiro passo no sentido do desenvolvimento do País. O segundo passo seria, ao ver, uma política fiscal racional, vale dizer uma tributação sem o efeito confiscatório como a que está em prática já há algum tempo no Brasil.

E o terceiro passo, sem exclusão de outros, é a própria atuação do Banco Central como executor da política monetária (espécie do gênero política econômica) que o Governo estabelecer (se possível, com juros baixos), na direção da consolidação da moeda em vista às suas funções, como instrumento de troca, principalmente. Troca por comida, por remédios, por habitação, por transporte, por bens, por....

Sendo assim, tem-se a impressão de que os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, expressos nos incisos I, II, III e IV, do art. 3.º, da Constituição Federal, poderiam vir a ser atingidos em sua plenitude. Agindo do modo apregoado nesta perfunctória conclusão, certamente o Governo traria alento e esperança ao povo brasileiro, especialmente aos mais necessitados.

Por derradeiro (permita-se o tom relativamente sarcástico e com uma ponta de ironia), crê-se que seria deveras interessante o uso da ‘característica da divisibilidade da moeda’. Ora, ‘Dividi-la’ de forma mais eqüitativa, i. é, sem a colossal concentração de renda que há no Brasil, permitiria, sem nenhum titubeio na afirmação, que o povo tivesse renda suficiente para a sua subsistência, tal como proclamado por ADAM SMITH, quando de sua abordagem sobre economia política.

E, certamente, parafraseando LEO HUBERMAN (1986:292), haveria menos "pobreza em meio à abundância", haja vista o imenso potencial (agrícola, industrial, tecnológico, de trabalho, etc.) que tem o Brasil, com seus mais de oito milhões de quilômetros quadrados e, ainda, um ‘gigante adormecido’.


BIBLIOGRAFIA

CRUSIUS, Yeda. CRUSIUS, Carlos Augusto. Introdução à Economia. São Paulo: Makron Books, 1985. 560p.

DILLARD, Dudley. A Teoria Econômica de John Maynard Keynes. Teoria de uma economia monetária. 7.ª ed. São Paulo: Livraria Pioneira, 1993. 338p.

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FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio. Novo Aurélio Século XXI. O Dicionário da Língua Portuguesa. 3.ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. 2128p.

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MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. São Paulo: Atlas, 2002. 2925p.

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TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2002. 942p.

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Sobre o autor
Marco Aurélio Paganella

membro do Escritório Fernando, Nagao, Cardone, Alvarez Jr. & Advogados.Bacharel em Direito pela UNISA - Universidade de Santo Amaro/SP. Especialista em Direito Constitucional e em Direito Tributário pelo IICS/CEU - Instituto Internacional de Ciências Sociais/Centro de Extensão Universitária/SP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PAGANELLA, Marco Aurélio. Política econômica, fiscal e monetária:: uma breve abordagem. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 701, 6 jun. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6815. Acesso em: 2 nov. 2024.

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