A Lei de Falências e o Mecanismo Empresarial da Recuperação Extrajudicial

18/08/2018 às 19:28
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Explana-se o instituto da recuperação extrajudicial que consiste em uma ferramenta privada de negociação das dívidas empresariais realizado entre o devedor e seus credores.

1. INTRODUÇÃO

Em face das funções desempenhadas modernamente, a empresa torna-se relevante não apenas sob o ponto de vista privado, mas mediante o aspecto social, visando não somente atender aos interesses do empresário como também aos interesses disseminados no seio da sociedade. Dessa forma, percebe-se que a empresa é ao mesmo tempo fonte geradora de riquezas ao empresário e proporcionadora de empregos, arrecadação de tributos e de produção e circulação de bens e serviços.

Devido a tal relevância que possui a empresa, tem-se por escopo preservá-la. A nova lei de falências, Lei nº 11.101/2005, trouxe consigo institutos inovadores que possibilitam a conservação da empresa que se encontra diante de situações de crise econômico-financeira. Dentre esses institutos está o da recuperação extrajudicial, abordado pela citada lei em seus artigos 161 a 167.

A recuperação extrajudicial consiste numa ferramenta privada de negociação das dívidas empresariais realizado entre o devedor e seus credores, de forma que o devedor deverá cumprir os requisitos estabelecidos em lei para assim poder utilizar-se do referido instituto, cuja principal finalidade é manter preservada a entidade empresarial.

Destarte, o presente trabalho tem por objetivo abordar o instituto da recuperação extrajudicial, mencionando os aspectos e pormenores que o constituem, os requisitos, as espécies da homologação, a forma como se apresenta tal mecanismo empresarial, tendo por base principal o dispositivo legal da Lei de Falências e Recuperação de Empresas (Lei n º 11.101/2005).


2. A RECUPERAÇÃO EXTRAJUDICIAL

A recuperação extrajudicial proporciona, nos termos da lei, a negociação das obrigações empresariais diretamente entre o devedor e seus credores, de modo a buscar a harmonização das dívidas pretendendo-se, assim, a preservação da empresa. As relações jurídicas empresariais tornam-se, dessa maneira, facultativas para efeito de tutela jurisdicional, por meio da recuperação extrajudicial:

Dessa forma, a recuperação extrajudicial estimula a aproximação dos credores ao devedor para preventivamente evitar-se a quebra, instaurando-se acordos extrajudiciais que serão objeto de homologação judicial. Finalmente, com a adoção do instituto da recuperação extrajudicial, o legislador cria um mecanismo informal para que credores e devedor busquem um resultado ao menos satisfatório como forma de prevenção da unidade produtiva.[1]

Os artigos 161 a 167 da Lei nº 11.101/2005 tratam da ferramenta da recuperação extrajudicial, abordando requisitos, espécies de homologação, procedimento, efeitos.

2.1. Requisitos

Com base no artigo 161 da Lei nº 11.101/2005, o devedor legitimado para requerer a recuperação extrajudicial deve preencher as mesmas condições para a recuperação judicial mencionadas no artigo 48 da mesma lei, de forma que o referido devedor deve exercer atividade empresarial regularmente por mais de dois anos, além de atender concomitantemente aos seguintes requisitos:

  1. Não ter sido declarado falido, e caso tenha sido, que as obrigações decorrentes da falência estejam extintas por sentença transitada em julgado;
  2. Não houver no prazo inferior a cinco anos obtido concessão de recuperação judicial;
  3. Não houver no prazo inferior a oito anos obtido concessão de recuperação judicial baseado em plano especial (esse plano refere-se à recuperação de microempresas e empresas de pequeno porte);
  4. Não houver sido condenado, ou não ter como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes falimentares.

Cabe ressaltar, além das mencionadas condições, a impossibilidade por parte do devedor de requerer a homologação de plano de recuperação extrajudicial nas hipóteses em que pender pedido de recuperação judicial ou mesmo a obtenção há menos de dois anos de plano de recuperação judicial ou extrajudicial.

Com base no parágrafo único do aludido artigo, além do devedor, são legitimados para demandar a recuperação extrajudicial o cônjuge sobrevivente, o herdeiro do devedor, o inventariante ou o sócio remanescente.

Além dos requisitos referentes à legitimação, a lei impõe restrições acerca dos créditos sujeitos ao mecanismo de recuperação extrajudicial, conforme se observa no artigo 161, § 1º da LFRE, sendo exclusos:

a) créditos de natureza tributária;

b) créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidente de trabalho;

c) créditos decorrentes do direito de propriedade, previstos no art. 49, § 3º, da LFRE;

d) adiantamento de contrato de câmbio para exportação, previsto no art. 86, II, da LFRE.[2]

Observa-se, assim, que não são todos os créditos submetidos ao plano de recuperação extrajudicial, óbice estabelecido pela legislação.

2.2. Espécies de homologação

A Lei nº 11.101/2005 traz duas espécies de homologação do plano de recuperação extrajudicial, a saber: a homologação facultativa a homologação obrigatória.

2.2.1 Homologação facultativa

Tratada no artigo 162, essa espécie possibilita ao devedor requerer em juízo a homologação do plano de recuperação extrajudicial, expondo juntamente uma justificativa plausível e o documento que contenha os termos e condições, com as devidas assinaturas dos credores que a ele aderiram.

2.2.2. Homologação obrigatória

Abordada no artigo 163, essa espécie possibilita ao credor requerer a homologação do plano de recuperação extrajudicial, a qual obriga todos os credores por ele abrangidos, com a condição de ser assinado por credores que representem mais de três quintos de todos os créditos de cada espécie por ele abrangidos. Desse modo, obriga-se ao plano de recuperação extrajudicial determinado grupo de crédito, desde que os credores que representem acima de três quintos dos créditos o tenham aderido, conforme menciona Perin Junior:

Assim, o legislador criou mecanismos que impõe aos demais credores de determinada faixa de créditos (p. ex., créditos quirografários), a sua adesão forçada ao plano recuperatório, posto que seus pares, em percentual superior correspondente a 3/5 dos créditos, aderiram espontaneamente ao plano.[3]

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Vale explicitar que, apesar de ser obrigatória, tal tipo de homologação é obstada aos créditos tratados no § 1º do artigo 161, da LFRE.

2.3. Procedimento

O artigo 164 destaca o procedimento a ser seguido para a validade formal do plano de recuperação extrajudicial. O referido artigo menciona que após o recebimento do pedido de homologação do plano de recuperação extrajudicial, o juiz ordenará a publicação de edital no órgão oficial e em jornal de grande circulação nacional ou do local da sede e das filiais do devedor com a convocação de todos os credores do devedor para apresentação de suas eventuais impugnações ao plano as quais deverão ser dadas no prazo de trinta dias contado da publicação do edital, devendo, além disso, o devedor comprovar o envio de carta a todos os credores sujeitos ao plano, domiciliados ou sediados país, informando a distribuição do pedido, as condições do plano e o prazo para impugnação.

As impugnações propostas pelos credores são apresentadas exaustivamente no rol do § 3º, do art. 164, sendo elas:

I - não preenchimento do percentual mínimo previsto no caput do art. 163 desta Lei;

II - prática de qualquer dos atos previstos no inciso III do art. 94 ou do art. 130 desta Lei, ou descumprimento de requisito previsto nesta Lei;

III - descumprimento de qualquer outra exigência legal.[4]

Apresentadas as impugnações, o devedor terá o prazo de cinco dias para manifestar-se sobre elas.  Ao término desse prazo, os autos serão conclusos imediatamente ao juiz para apreciação de eventuais impugnações e decidirá no prazo de cinco dias sobre o plano de recuperação extrajudicial, homologando-o ou não. Da sentença que homologatória cabe apelação.

Não sendo homologado o plano recuperatório, o devedor poderá seguindo os requisitos impostos pela lei, apresentar novo pedido de homologação de plano de recuperação extrajudicial.

2.4. Efeitos

Os efeitos do plano de recuperação extrajudicial são produzidos após a sua homologação judicial, no entanto, há a possibilidade excepcional dos efeitos serem dados antes da homologação, desde que exclusivamente em relação à alteração do valor ou da forma de pagamento dos credores signatários. Porém na hipótese de rejeição do plano pelo juiz, os efeitos dados antes da homologação perdem validade, sendo devolvido aos credores signatários o direito de exigir seus créditos nas condições originais, deduzidos os valores efetivamente pagos.

 A LFRE aborda, ainda, a não suspensão de direitos, ações e execuções, nem a impossibilidade do pedido de decretação de falência pelos credores não participantes do plano de recuperação extrajudicial em face do pedido de homologação do mesmo, sendo importante destacar que após a distribuição do pedido de homologação do plano, não haverá a possibilidade de desistência de adesão por parte dos credores, salvo com o consentimento expresso dos demais signatários.


3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Encontrando-se em situações de crise econômico-financeiras, a empresa dos tempos contemporâneos é beneficiada com institutos que têm por objetivo preservá-la. A preservação da entidade empresarial é dada devido aos fatores desempenhados por tal instituição na dimensão social, contribuidora, sob diversos ângulos, para o desenvolvimento e progressão da sociedade.

Em face disso, a Lei de Falências e Recuperação de Empresas consolidou tal perspectiva, embasada pela instituição de mecanismos recuperatórios, entre os quais foi destacado no presente trabalho o instituto da recuperação extrajudicial.

A recuperação extrajudicial é dada assim como ferramenta empresarial de manutenção das dívidas ocorrida diretamente entre o devedor e seus credores, seguindo sempre as exigências legais.

Os aspectos regulados pela Lei nº 11.101/2005 trazem critérios acerca de requisitos, procedimento, efeitos da ferramenta recuperatória extrajudicial, todos mencionados no atual trabalho de modo a contemplar satisfatoriamente os pormenores vislumbrados pela adoção desse instituto, asseverando sempre por escopo principal a conservação da empresa com as devidas regularizações das obrigações existentes, não acarretando, dessa maneira, a conseqüência mais gravosa, ou seja, a falência.


REFERÊNCIAS

PERIN JUNIOR, Ecio. Curso de direito falimentar e recuperação de empresas. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

BRASIL. Lei nº 11.101, de  9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em: 6 maio 2013.

MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: falência e recuperação de empresas. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2012. v. 4.

ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de falência e recuperação de empresa. 26 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.


Notas

[1] PERIN JUNIOR, Ecio. Curso de direito falimentar e recuperação de empresas               . 4 ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 384.

[2] PERIN JUNIOR, op. cit., p. 385

[3] Ibidem, p. 386.

[4] BRASIL. Lei nº 11.101, de  9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em: 6 maio 2013.

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