INTRODUÇÃO
A Carta Magna de 1988 estabeleceu como principio basilar do jogo democrático, bem como valor a ser concretizado por todo o ordenamento jurídico brasileiro, a idéia de normalidade e preservação de legitimidade de todo o processo eleitoral.
Estabeleceu, para isso, o dever de proteção do jogo democrático eleitoral de todo abuso de poder econômico, de modo a preservar a lisura e equilibro do pleito. Definiu ainda outros princípios a nortearem todo o processo.
A proteção contra o poderio econômico concentrado se mostra adequado frente à necessidade de assegurar isonomia entre aqueles que concorrem, garantindo que o resultado do processo eleitoral seja a expressão mais pura e verdadeira da vontade popular, de modo a não maculá-lo. É de imprescindível importância frente a garantir a concretização da cidadania, do pluralismo político e dos princípios democrático, republicano, da isonomia política dos cidadãos e da igualdade de chances entre os partidos políticos.
Em um país onde existe um regime democrático com ampla liberdade aos cidadãos para que se candidatem a cargos públicos e que o financiamento não é exclusivamente realizado por meio de fundos públicos, o tema financiamento eleitoral tem importância fundamental.
Nesse sentido o Supremo Tribunal Federal julgou procedente, em março de 2018, a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.394, oriundo do Distrito Federal, impetrado pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, para declarar a inconstitucionalidade da expressão “sem individualização dos doadores”, constante da parte final do § 12 do art. 28 da Lei nº 9.504/1997, que foi acrescentado pela Lei 13.165/2015.
Nessa toada o presente trabalho analisa a proibição de doações anônimas a candidatos com o fim de financiar campanhas eleitorais, a luz da recente decisão da colenda Corte Constitucional brasileira.
A metodologia aplicada ao presente trabalho foi à pesquisa bibliográfica mediante acesso às obras de grandes doutrinadores do direito brasileiro que abordam o tema referido, bem como a legislação pertinente ao assunto. Imprescindível é a consulta a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.394, oriundo do Distrito Federal, impetrado pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, julgado em março de 2018 pelo Supremo Tribunal Federal.
Outra fonte indispensável diz respeito à jurisprudência do sistema jurídico que vigora no Brasil. As decisões jurisprudenciais tornam públicas, e de ação, a face prática do assunto que ora se aborda, explicitando como os operadores do direito entendem, decidem e aplicam o que é pertinente ao tema.
FINANCIAMENTO ANÔNIMO DE CAMPANHA ELEITORAL
O princípio republicano basilar, qual seja a transparência, proíbe que haja situações ocultas ou anônimas que venham a interferir no funcionamento estatal. Imperiosamente, analisando sobre a ótica do processo democrático eleitoral é inadmissível que haja obscuridade e omissões com fim de esconder ou privar os cidadãos de acesso a dados e atos.
A divulgação dos doadores, bem como dos destinatários, além, claro, do montante a ser doado, é medida de garantia de acesso aos eleitores/cidadãos, de modo a poder exercer o controle social e poder fiscalizatório, bem como garantir o equilíbrio e a lisura de todo o pleito eleitoral.
O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil ajuizou, perante o Supremo Tribunal Federal, Ação Direta de Inconstitucionalidade contra dispositivo incluído pela Lei nº 13.165/2015, alterando a Lei Geral das Eleições, Lei nº 9.504/1997, que prevê a possibilidade de “doações ocultas” de pessoas físicas a candidatos, sem que os nomes dos doadores fiquem registrados na prestação de contas.
Em março de 2018 o plenário do STF julgou procedente a referida Ação Direta de Inconstitucionalidade e declarou inconstitucional tal forma, meio e/ou modo de doação. Vejamos:
[...] Declarar a inconstitucionalidade da expressão “sem individualização dos doadores”, constante da parte final do § 12 do art. 28 da Lei nº 9.504/97, acrescentado pela Lei 13.165/2015. Essa parte final do dispositivo suprime a transparência do processo eleitoral, frustra o exercício da fiscalização pela Justiça Eleitoral e impede que o eleitor exerça, com pleno esclarecimento, seu direito de escolha dos representantes políticos. Isso viola os princípios republicano e democrático (art. 1º, da CF/88), além de representar afronta aos postulados da moralidade e d transparência.
STF. Plenário. ADI 5394/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 22/03/2018.
Importante é tal decisão, pois caso aceita as chamadas doações ocultas elas poderiam ser repassadas a candidatos sem a demonstração da origem dos recursos, o que violaria o princípio da transparência e o da moralidade, além de favorecer a práticas corruptivas, dificultando o rastreamento das doações eleitorais.
Vale destacar que antes da inclusão do §12 ao art. 28 da Lei nº 9.504/1997, o Tribunal Superior Eleitoral já havia editado resolução para exigir a individualização bem como a identificação dos doadores por ocasião das prestações de contas. Posteriormente a tal ato deliberado pelo TSE veio à novidade legislativa introduzida pela Lei nº 13.165/2015, permitindo a “doação oculta”, o que se percebeu como verdadeira afronta e com propósito de contrariar tal determinação do TSE.
A perversa influência do poderio econômico sobre o processo democrático eleitoral é inegável. Mais que isso, é uma afronta a legitimidade do sistema representativo. Exatamente nesse sentido foi que em 17 de setembro de 2015, em outra Ação Direta de Inconstitucionalidade, a de nº 4.650/DF, o Supremo Tribunal Federal deliberou, baseado nos recentes escândalos de corrupção, originados também em doações de campanhas eleitorais, por proibir doações de pessoas jurídicas a campanhas eleitorais.
A democracia bem como todo o sistema representativo pressupõe liberdade na formação da vontade política do Estado e livre concorrência entre partidos e escolha entre os cidadãos.
O princípio republicano e constitucional se sustenta, entre outros meios, pelas diversas formas de representação política dos vários pontos de vista ideológicos presentes na sociedade nos processos de produção de leis e das demais decisões jurídico-políticas, bem como pela participação popular. Para isso, obviamente, é imprescindível que os eleitores tenham acesso à realidade financeira das campanhas eleitorais e conheçam os apoiadores de cada candidato.
CONCLUSÃO
É imprescindível um sistema transparente de arrecadação de recursos para fins de campanha eleitoral. A transparência é um princípio a serviço do jogo democrático, trazendo a possibilidade de se averiguar vícios que maculem a integridade do processo eleitoral.
O aprimoramento de todo o sistema representativo exige que o a transparência seja a base do financiamento eleitoral bem como a de seus métodos e protocolos de atuação, para se garantir a legitimidade do processo político. Daí a essencialidade de se estabelecer um sistema eficaz de controle destinado a conferir visibilidade às doações eleitorais, tornando-as transparentes e acessíveis ao conhecimento geral.
A identificação da origem das doações, bem como dos doadores e, ainda, de quem vai receber tais montantes, é medida de maior necessidade para fins de exercício do poder fiscalizatório e do controle social, permitindo averiguar o respeito aos limites estabelecidos e se as doações provêm de fontes lícitas.
A atual realidade brasileira nos permite entender a necessidade de transparência das doações eleitorais, bem como de aceitar e interpretar como correta a decisão proferida pela colenda Corte Constitucional. Um dos maiores escândalos de corrupção em nossa país, hoje acompanhado pela televisão, internet e afins, originou-se pelo poderio econômico, pela vontade de burlar o sistema político-eleitoral e a manutenção de pares nos mais altos cargos da República. Nos tempos atuais é impossível admitir e aceitar doações ocultas, com fins omitir informações de cidadãos/eleitores.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>. Acessado em: 03 de junho de 2018.
________. Lei nº 9.504, de 15 de julho de 1965 Institui o Código eleitoral. Disponível < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9504.htm>Acessado em: 03 de junho de 2018.
________. Lei nº 4.737, de 30 de setembro de 1997. Lei Geral das Eleições. Disponível < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4737.htm>Acessado em: 03 de junho de 2018.
________. Lei nº 13.165, de 29 de setembro de 2015. Disponível < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13165.htm> Acessado em: 03 de junho de 2018.
________. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.394 – DF. Plenário. Relator Min. Alexandre de Moraes. Julgado em 22 de março de 2018. Disponível em <http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletro nico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=4860251>. Acessado em: 02 de junho de 2018.
________. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.650 – DF. Plenário. Relator Min. Luiz Fux. Julgado em 17 de setembro de 2015. Disponível em < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID= 10329542>. Acessado em: 02 de junho de 2018.