O princípio da proporcionalidade no direito penal constitucional

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03/09/2018 às 09:19
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Cuida-se da aplicação do princípio da proporcionalidade no direito penal constitucional, correlacionando as dimensões da necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito com os institutos jurídicos penais.

RESUMO: O artigo discute a aplicação do Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal correlacionando as dimensões do referido princípio com os institutos jurídicos penais, utilizando-se da metodologia jurídico-teórica e raciocínio hipotético-dedutivo, de modo a conseguir sistematizar a aplicação do referido princípio. Inicia-se assim com a definição do princípio da Proporcionalidade pela doutrina de Robert Alexy. Adiante utilizou-se da doutrina do Ministro do STF Luís Roberto Barroso para delimitar as três dimensões do Princípio da Proporcionalidade, quais sejam a necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito. Assentadas tais premissas discutiu-se a imprescindibilidade da aplicação do Princípio da Proporcionalidade em matéria penal como fundamento de legitimidade, parâmetro hermenêutico, meio de correção das vicissitudes do sistema penal, fator de integração e sistematicidade do sistema penal. Assim, defendeu-se que a dimensão da necessidade está intimamente ligada com a característica de ultima ratio do sistema penal, de modo que é o fundamento que confere legitimidade a definição de bens jurídicos penais. Na dimensão da adequação asseverou-se que o legislador no momento da criação do tipo penal deve fazer um juízo de ponderação entre a tipificação da conduta e o fim de prevenção que deve buscar a pena criminal. Ademais, a dimensão da adequação impõe ao hermeneuta constitucional a tarefa de afastar a tipicidade das condutas cujas penas, a partir de um juízo de ponderação se revelem inadequadas a atingir os fins de prevenção. Por fim, a dimensão da proporcionalidade em sentido estrito serve como meio de sistematizar e garantir a integridade e unidade do Direito Penal. Concluiu-se, ao final, que o Princípio da Proporcionalidade é fundamento de todo o Direito Penal, conferindo legitimidade, sistematicidade, racionalidade e cientificidade ao Direito Penal de modo que a sistematização da aplicação do referido princípio em seara penal é imprescindível.

Palavras - chave: Princípio da Proporcionalidade. Direito Penal. Legitimidade. Fator de Integração.

 RESUMEN:El artículo discute discute la aplicación del Principio de la proporcionalidad en el Derecho penal correlacionando las dimensiones de dicho principio con los institutos jurídicos penales utilizando la metodología jurídico-teórica y el razonamiento hipotético-deductivo para poder sistematizar la aplicación de dicho principio. Se inicia así con la definición del principio de la proporcionalidad por la doctrina de Robert Alexy. En adelante se utilizó la doctrina del Ministro del STF Luís Roberto Barroso para delimitar las tres dimensiones del Principio de la Proporcionalidad, cuáles son la necesidad, adecuación y proporcionalidad en sentido estricto. Asentadas tales premissas se discutió la imprescindibilidade de la aplicación del Principio de la Proporcionalidad en materia penal como, fundamento de legitimidad, parámetro hermenêutico, medio de corrección de las vicissitudes del sistema penal, factor de integración y sistematicidade del sistema penal. Así, se defendió que la dimensión de la necessidad está íntimamente ligada con la característica de última ratio del sistema penal de modo que es el fundamento que confiere legitimidad la definición de bienes jurídicos penales. En la dimensión de la adecuación se aseveró que el legislador en el momento de la creación del tipo penal debe hacer un juicio de ponderación entre la tipificación de la conducta y el fin de prevención que debe buscar la pena criminal. Además, la dimensión de la adecuación impone al hermeneuta constitucional la tarea de apartar la tipicidad de las conductas cuyas penas a partir de un juicio de ponderación resulten inadecuadas a alcanzar los fines de prevención. Por último, la dimensión de la proporcionalidad en sentido estricto sirve como medio de sistematizar y garantizar la integridad y unidad del Derecho Penal. Se concluyó al final que el Principio de la Proporcionalidad es fundamento de todo el Derecho Penal, otorgando legitimidad, sistematicidad, racionalidad y cientificidad al Derecho Penal, de modo que la sistematización de la aplicación del referido principio en quilla penal es imprescindible para eliminar los subjetivismos y la selectividad del sistema penal conferiendo racionalidad a la aplicación.

Palabras clave: Principio de proporcionalidad. Legitimidad. La consistencia. Factor de Integración.

SUMÁRIO:1 INTRODUÇÃO ;  2 O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE;3 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE EM MATÉRIA PENAL ; 4 DIMENSÃO DA NECESSIDADE E DO BEM JURÍDICO PENAL ; 5 DIMENSÃO DA ADEQUAÇÃO E O FIM DA PENA; 6 PROPORCIONALIDADE EM SENTIDO ESTRITO; 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS; REFERÊNCIAS. 


1 INTRODUÇÃO

O artigo cuida da aplicação do Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal Constitucional correlacionando as dimensões da necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito com os institutos jurídicos penais.

O tema tem como justificativa a busca em conferir racionalidade à aplicação do Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal controlando a seletividade do sistema penal e o subjetivismo do intérprete.

Ademais, a aplicação do Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal ganhou destaque com a convocação dos interessados pela Ministra Rosa Weber do STF para participar da audiência pública que discutirá a Arguição de Descumprimento Fundamental - ADPF nº 442/2017 que teve como tema a descriminalização ou não da interrupção da gravidez até a 12ª semana de gestação. Veja que a decisão da Ministra ressalta o caráter sensível da matéria e a necessidade de diálogo do Poder Judiciário com a sociedade. Nesse sentido:

A discussão que ora se coloca para apreciação e deliberação desse Supremo Tribunal Federal, com efeito, é um dos temas jurídicos mais sensíveis e delicado, enquanto envolve razões de ordem ética, moral, religiosa, saúde pública e tutela de direitos fundamentais individuais. A experiência jurisdicional comparada demonstra essa realidade. Assim, a complexidade da controvérsia constitucional, bem como o papel de construtor da razão pública que legitima a atuação da jurisdição constitucional na tutela de direitos fundamentais, justifica a convocação de audiência pública, como técnica processual necessária, a teor do art. 6º, §1º, da Lei n. 9.882/99, e dos arts. 13, XVII, e 154, III, parágrafo único, ambos do RISTF. (BRASIL, 2017, p. 7)

Poderia se dizer que o tema abordado visando a sistematização da aplicação do Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal é intencionalmente novo, haja vista que para conseguir evoluir é necessário ter audácia intelectual, o verdadeiro cientista deve criar e não apenas repetir. Nesse sentido veja a afirmação de Popper: “Eu sou partidário da audácia intelectual. Nós não podemos ser intelectualmente covardes e ao mesmo tempo buscar a verdade. Aquele que busca a verdade deve ousar ser sábio – ele deve ousar ser um revolucionário no campo do pensamento” (POPPER, 2004, p. 91).

O objetivo geral perseguido no trabalho é sistematizar a aplicação do Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal com o intuito de construir um Direito Penal Constitucional, notadamente no contexto dos denominados crimes sem vítimas como: porte de drogas para uso próprio art. 28 da Lei 11.343/2006 e o crime de manter casa de prostituição (art. 229 do Código Penal). Ademais, discutirá os crimes nos quais a criminalização se revela suscetível de produzir mais vítimas, como o aborto.

Assim, perpassará pelos objetivos específicos de definir os contornos do referido princípio e correlacionar cada dimensão do princípio da proporcionalidade aos institutos jurídicos penais.

O trabalho utilizará da metodologia jurídico-teórica e raciocínio hipotético-dedutivo com técnicas de pesquisa bibliográfica, às leis, decretos, doutrina e jurisprudência sobre a temática.  Assim, será abordada a posição de diversos juristas nacionais e estrangeiros, tais como Jorge Figueiredo Dias, Cezar Roberto Bitencourt, Rogério Greco, Robert Alexy, Luís Roberto Barroso, de modo construir uma sistematização fundamentada do Princípio da Proporcionalidade em âmbito penal.

Desse modo, iniciará abordando a definição do princípio da proporcionalidade e suas dimensões da necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito.

 No segundo tópico discorrerá o problema da aplicação e sistematização da aplicação do Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal e quais os contornos da aplicação do referido princípio. Ademais, o referido tópico abordará ainda as duas facetas do Princípio da Proporcionalidade: a proibição do excesso e a vedação à proteção deficiente.

Nos capítulos seguintes discorrerá sobre a dimensão da necessidade na tipicidade penal, a dimensão da adequação e as teorias do fim da pena e, por fim, a dimensão da proporcionalidade em sentido estrito, de modo a construir um Direito Penal de viés Constitucional.

Ao final buscará conferir cientificidade à sistematização da aplicação do Princípio da Proporcionalidade elaborando uma tese que fixe os parâmetros constitucionais de aplicação do Princípio da Proporcionalidade em matéria penal de modo a controlar a seletividade do sistema penal. 


2 O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

A construção e sistematização do Princípio da Proporcionalidade teve como um dos principais percussores o jurista alemão Robert Alexy através das suas obras Direito e Razão Prática e Teoria dos Direitos Fundamentais.

O jurista alemão dissertando sobre a tensão na aplicação de princípios explicava que os princípios eram mandados de otimização que, ao contrário das regras, somente diziam que algo devia ser realizado na maior medida do possível, ou seja, os princípios podem ser cumpridos em diferentes graus, mas as regras só podem ser cumpridas ou não, jamais graduadas sua aplicação. Nesse sentido veja a lição de Alexy:

[...] Princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes. Portanto, os princípios são mandados de otimização, que estão caracterizados pelo fato de que podem ser cumpridos em diferentes graus, e que a medida devida de seu cumprimento não só depende das possibilidades reais, como também das jurídicas (...). De outro lado, as regras são normas que só podem ser cumpridas ou não. Se uma regra é válida, então deve-se fazer exatamente o que ela exige, nem mais nem menos. Portanto, as regras contêm determinações no âmbito do fático e juridicamente possível” (ALEXY, 1993 b, p. 86-87).

Alexy (1993) em sua obra distingue regras de princípios, entendendo que as primeiras continham uma determinação no âmbito das “possibilidades fáticas e jurídicas, assim, duas regras em conflito não podem ser simultaneamente válidas, salvo uma cláusula interpretativo-argumentativa de exceção em uma delas” (Alexy, 1993 b: 88); já os princípios seriam razões prima facie, razão pela qual, em caso de colisão ambos não deixariam de ser válidos apesar de prevalência de um deles no caso concreto. Veja a lição do jurista alemão:

[...] não contêm mandados definitivos, mas somente prima facie. Do fato que um princípio valha para um caso não se infere que o que o princípio requer deste caso valha como resultado definitivo. Os princípios apresentam razões que podem ser ultrapassadas por outras razões opostas (...). Totalmente distinto é o caso das regras. Como as regras exigem que se faça exatamente como nelas se ordena, contêm uma determinação do âmbito das possibilidades jurídicas e fáticas” (Alexy, 1993b: 99.) [...] “Quando dois princípios entram em colisão (...), um dos dois princípios tem que ceder ante o outro. Mas isto não significa declarar inválido o princípio que não teve curso, nem que haja de se introduzir no princípio que não teve curso uma cláusula de exceção. Ao contrário, o que acontece é que, sob certas circunstâncias, um dos princípios precede ao outro. Sob outras condições, a questão da precedência pode ser solucionada de forma inversa” (ALEXY, 1993 b, p. 89).

O conflito de princípios, segundo Alexy (1993), ocorre na dimensão do peso, ou seja, refere-se a quais dos “interesses abstratamente no mesmo nível possui maior peso no caso concreto” (ALEXY, 1993b. p. 90).

Nas regras, por sua vez, o conflito se dá na dimensão da validade de modo que, será resolvido pelos critérios tradicionais do conflito aparente de normas, quais sejam: critério cronológico – lei posterior revoga lei anterior; critério da especialidade – lei especial revoga lei geral no caso concreto; critério hierárquico – lei superior revoga lei inferior.

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Na ponderação de princípios Alexy criou a denominada Lei de Colisão que pode ser definida como: “as condições sob as quais um princípio precede a outro constituem o suporte fático de uma regra que expressa a consequência jurídica do princípio precedente” (ALEXY, 1993 b, p. 194).

Desse modo, a ponderação busca a efetivação de direitos fundamentais quando estamos diante de conflitos de princípios através do sopesamento para verificar qual princípio deve prevalecer no caso concreto sem, contudo, aniquilar o outro princípio.

O Princípio da Proporcionalidade segundo o Ministro do Supremo Tribunal Federal Barroso (2018, p. 168) apresenta três dimensões, quais sejam, da necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito.

Pela dimensão da adequação deve-se verificar se a medida adotada é a que melhor atende aos fins constitucionais, ou seja, se a medida escolhida, dentre aquelas que no caso concreto poderiam ter sido aplicadas foi a que melhor atendeu aos imperativos de um Estado Democrático de Direito.

A necessidade impõe ao jurista que se adote no caso de conflitos de direitos fundamentais a medida, dentre as aptas a atender aos fins do Estado, que cause o menor prejuízo a coletividade, ou seja, implica em saber se a medida adotada é efetivamente necessária.

A dimensão da proporcionalidade em sentido estrito, por sua vez, se efetiva através da ponderação entre as vantagens e desvantagens em prevalecer um ou outro direito fundamental. Nesse sentido veja um excerto acerca do princípio da proporcionalidade ou razoabilidade extraído da obra do Ministro Barroso (2018):

Em resumo sumário, o princípio da razoabilidade permite ao Judiciário invalidar atos legislativos ou administrativos quando: a) não haja adequação entre o fim perseguido e o instrumento empregado (adequação); b) a medida não seja exigível ou necessária, havendo meio alternativo menos gravoso para chegar ao mesmo resultado (necessidade/vedação do excesso); c) não haja proporcionalidade em sentido estrito, ou seja, o que se perde com a medida é de maior relevo do que aquilo que se ganha (proporcionalidade em sentido estrito) (BARROSO, 2018, p. 168).

Ante o exposto, o Princípio da Proporcionalidade de matriz alemã notadamente fruto do trabalho de Robert Alexy aplica-se no caso de conflitos de princípios, que são mandados de otimização, ou seja, são aplicados na maior medida do possível, razão pela qual de plena aplicabilidade na seara penal, que cuida da preservação de bens jurídicos com a imposição de penas que sacrificam outros direitos fundamentais.

Assim, fixadas as premissas e os contornos gerais sobre o Princípio da Proporcionalidade será abordado no tópico seguinte a aplicação do referido princípio no âmbito penal de modo a conferir racionalidade e sistematicidade a aplicação.

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Sobre o autor
Sanges Morais

Advogado militante; Graduado em Direito pela PUC MINAS; Pós-graduando em Direito Penal pela Faculdade Internacional Signorelli; Pós-graduando em Direito Processual pela PUC MINAS; Destaque Acadêmico PUC MINAS curso de Direito 2º semestre 2012; Destaque Acadêmico PUC MINAS curso de Direito 1º semestre 2013; Destaque Acadêmico PUC MINAS curso de Direito 1º semestre 2014; Destaque Acadêmico PUC MINAS curso de Direito 2º semestre 2014; Estagiário na Turma Recursal dos Juizados Especial Federal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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