A execução de ofício e a prescrição intercorrente na reforma trabalhista

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03/09/2018 às 22:40
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9. Proibição da execução de ofício e prescrição intercorrente: uma frustrante combinação

Diversos autores, mesmo antes da reforma trabalhista, já questionavam a dificuldade de satisfação do crédito obreiro no âmbito da justiça laboral. Por exemplo, Schiavi (2014, p. 964) enfatiza que muitos credores trabalhistas, mesmo tendo um título executivo judicial, enfrentam verdadeiro calvário para ver seu crédito satisfeito. Isso pelo fato de que muitos executados, mesmo tendo patrimônio para saldarem suas dívidas, preferem “apostar na burocracia processual e deixar para adimplir o crédito somente quando se esgotar a última forma de impugnação.”. O autor ressalta que “neste triste cenário, a cada dia mais o Processo do Trabalho carece de instrumentos processuais eficazes que lhe façam realizar a promessa da efetividade da legislação social.”

Percebe-se que a reforma trabalhista veio de encontro ao clamor do escritor supracitado, já que avanços, conquistas históricas e institutos jurídicos eficazes à execução foram retirados do Direito Processual do Trabalho, tornando mais dificultosa a garantia de direitos dos trabalhadores, facilitando a fraude à execução e a protelação processual. Em muitos casos, ela inviabilizará o recebimento de créditos dos trabalhadores.

Afirma Rodrigues (2017, p. 317), assim como Schiavi, que, mesmo com a antiga possibilidade de execução trabalhista de ofício, o recebimento dos créditos obreiros pelos exequentes já era difícil, seja pela inexistência de bens patrimoniais no devedor, seja “pelas artimanhas levianas criadas pelos executados para se furtarem ao adimplemento das suas dívidas”. O autor assegura que, “com a transferência da obrigação exclusivamente para as partes, com toda certeza o número de execuções frustradas aumentará ainda mais.”.

Por fim, Rodrigues (2017, p. 318) ainda chama a atenção para o fato de não haver justificativa jurídica para se fazer distinção entre o exequente que exerce a capacidade postulatória pessoalmente (“jus postulandi”) e aquele que a exerce por meio de mandato outorgado a um advogado, uma vez que o crédito que se busca satisfazer, em ambos os casos, é da mesma natureza alimentar.

Para Delgado & Delgado (2017, p. 51), “a nova lei gera diversos incidentes processuais novos que, em seu conjunto, comprometerão o princípio constitucional da eficiência, da celeridade e da efetividade da prestação jurisdicional.”

Antes mesmo de aprovada, a Lei nº 13.467 de 2017, Teixeira (2017) também criticou as alterações concernentes à proibição da execução de ofício, alegando que, mesmo não havendo alterações nos direitos trabalhistas previstos na Constituição Federal, para nada servirão se, ao executá-los, desaparecerem na névoa da legislação branda.

Destarte, a prescrição intercorrente não é incompatível com o processo do trabalho, porém, combinada com a proibição da execução de ofício, ela se torna, recorrendo-se aos ditos populares, a "cereja do bolo" de um sistema tendente à ineficácia das execuções e à frustração do recebimento do crédito obreiro, quase sempre pautado em direitos constitucionais fundamentais lesionados e já reconhecidos pelo Estado em sentença transitada em julgado.

Caso o exequente e seu advogado não sejam capazes de realizar uma investigação patrimonial contra o devedor e, como é muito comum na prática forense, não tenham conhecimento da existência e da utilidade das inúmeras e poderosas ferramentas disponíveis ao juízo para tal finalidade, ficarão impossibilitados de promover a execução, ficando fatalmente sujeitos ao decurso do prazo prescricional, que culminará na extinção da obrigação de pagar fixada no édito condenatório e inviabilizará, em definitivo, a prestação jurisdicional.


10. Conclusão

Ante todo o estudado, pode-se concluir, com relação aos pontos da reforma trabalhista analisados, que a nova redação dada pela Lei nº 13.467 de 13 de Julho de 2017 ao artigo 878 da Consolidação das Leis do Trabalho não guarda consonância com os princípios gerais do direito e com os princípios específicos do direito processual.

Configura retrocesso social a proibição imposta aos magistrados e Tribunais do Trabalho para que não impulsionem de ofício as execuções trabalhistas cujos exequentes são assistidos por advogados, com afronta direta ao princípio da equidade e ao princípio da efetividade na prestação jurisdicional, previstos no Art. 5º caput e inc. LXXVIII da Constituição Federal.

Ademais, a referida proibição é afronta ao princípio do impulso oficial já consolidado na legislação pátria, como se pode observar no Art. 2º, no Art. 139, inc. IV do Código de Processo Civil de 2015 e no Art. 765 da Consolidação das Leis do Trabalho.

Por outra perspectiva, o Art. 878 da Consolidação das Leis do Trabalho é incompatível com o Art. 114, VIII, da Constituição Federal, que prevê a competência da Justiça do Trabalho de executar de ofício as contribuições previdenciárias decorrentes das sentenças, uma vez que não se figura razoável perseguir o crédito tributário acessório sem antes satisfazer o crédito obreiro principal, privilegiado por sua própria natureza.

A prescrição intercorrente, por sua vez, mostrou-se compatível com o processo do trabalho, sendo a prescrição um direito que deve ser assegurado ao devedor, ainda que em durante o curso do processo judicial, seja pela sua segurança jurídica, seja pelos motivos sociais e econômicos de permitir-lhe a recuperação financeira e, quando pessoa física, garantir-lhe o direito à dignidade como pessoa humana.

Porém, apesar de o instituto da prescrição intercorrente encontrar-se amparado pelos princípios da razoabilidade e proporcionalidade e ser compatível com o ordenamento jurídico e com o processo do trabalho, ao associar-se à proibição aos magistrados de impulsionarem a execução “ex officio”, contribui a um sistema tendente à ineficácia das execuções e à frustração do recebimento do crédito obreiro.

Isso devido ao fato de que, uma vez dificultado o processo executório e transferida toda sua responsabilidade à parte exequente, por vezes hipossuficiente na relação processual, o prazo prescricional será fácil e fatalmente alcançado, inviabilizando, em definitivo, a prestação jurisdicional.

Para solução da problemática jurídica abordada no presente artigo, espera-se que os Tribunais, por meio do controle de constitucionalidade, afastem a nova redação do Art. 878 da Consolidação das Leis do Trabalho ou, por meio da hermenêutica jurídica, deem a ele interpretação sistemática, sociológica e extensiva, afastando sua aplicabilidade da literalidade gramatical para que a prestação jurisdicional atenda aos anseios da sociedade de celeridade e efetividade. Caso contrário, mais e mais se ouvirá de frustrados jurisdicionados o antigo bordão incansavelmente repetido pelos corredores dos prédios da justiça brasileira: “ganhei, mas não levei!”.


REFERÊNCIAS

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Sobre o autor
Lucas de Souza Rodrigues

Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Projeção, Taguatinga - Distrito Federal. Técnico Judiciário no Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região. Atualmente, exerce função comissionada de Assistente de Juiz no Gabinete dos Juízes da 4ª Vara do Trabalho de Taguatinga-DF. Pós-graduando em Direito do Trabalho pela UDF - Universidade do Distrito Federal / Universidade Cruzeiro do Sul.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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