A (in)compatibilidade da elisão fiscal como ferramenta para o planejamento tributário

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A elisão fiscal é prática realizada pelo contribuinte que busca o menor ônus tributário incidente em sua atividade. Segundo a doutrina, as práticas elisivas podem ocorrer de três formas: uma induzida pela lei; garantida pela lei; e em condutas não proibidas pela lei.

RESUMO: O planejamento tributário serve para organizar a atividade econômica em consonância com a redução dos custos com tributos, e assim, proteger os contribuintes dos ferrenhos ataques do fisco. Ocorre que o Parágrafo Único do art. 166, do Código Tributário Nacional prevê Norma Geral Antielisiva. Deste modo, indaga-se: A redação do Parágrafo Único do art. 116 do CTN configura norma Antielisiva, prevendo impactos e restrições sobre o Planejamento Tributário das Pessoas Físicas e Jurídicas? Tal dispositivo é compatível com o texto legal do Código Tributário Nacional e com a ordem constitucional vigente? Sobre a temática, a doutrina diferencia a evasão e a elisão fiscal. A evasão fiscal seria o resultado de uma ação dolosa, ilícita, com o intuito de impedir ou retardar o conhecimento da ocorrência do fato gerador de um tributo e a elisão fiscal, por outro lado, é a atividade lícita na qual se busca alternativas que levem a uma menor carga tributária. Sendo assim, diante dos princípios, aspectos constitucionais e dispositivos legais referentes ao Sistema Tributário Nacional conclui-se que a redação do parágrafo único do artigo 116 do CTN prevê norma anti-evasiva e não antielisiva, não impactando e restringindo a possibilidade de planejamento tributário pelas pessoas físicas e jurídicas, através da prática de Elisão Fiscal.  Ademais, qualquer restrição à prática da Elisão Fiscal configura violação aos preceitos constitucionais e legais, referentes ao Sistema Tributário Nacional.

Palavras-chave: elisão; evasão; fisco.


INTRODUÇÃO 

O presente trabalho monográfico tem como objetivo analisar a (in)compatibilidade da elisão fiscal com o ordenamento jurídico legal e constitucional vigentes, como ferramenta para o planejamento tributário, face a previsão da Norma Geral Antielisiva prevista no art. 116, parágrafo único do Código Tributário Nacional.

A presente pesquisa se justifica no sentido de diferenciar a Evasão e a Elisão Fiscal. A Evasão Fiscal consiste no resultado de uma ação dolosa, ilícita, com o intuito de impedir ou retardar o conhecimento da ocorrência do fato gerador de um tributo, com o emprego de fraude, sonegação ou simulação; A elisão fiscal, por outro lado consiste na atividade lícita em que se buscam alternativas que levem a uma menor carga tributária.

Destarte, a Lei Complementar 104/2001 incluiu um parágrafo único ao artigo 116 do Código Tributário Nacional (CTN) a fim de frear o planejamento tributário, de forma que os contribuintes arcassem com a carga tributária, sem que houvesse atenuantes na incidência.

Nesse diapasão, cumpre ressaltar o questionamento direcionador e fomentador da pesquisa: A redação do Parágrafo Único do art. 116 do CTN configura norma Antielisiva, prevendo impactos e restrições sobre o Planejamento Tributário das Pessoas Físicas e Jurídicas? Tal dispositivo é compatível com o texto legal do Código Tributário Nacional e com a ordem constitucional vigente?

Tal dispositivo introduz no ordenamento jurídico brasileiro a chamada norma geral Antielisiva. Todavia, a referida norma pende de regulamentação. A própria LC 104/01 prevê a edição de uma lei ordinária como condição de sua aplicação.


1 EVASÃO FISCAL X ELISÃO FISCAL: novos limites do planejamento tributário 

1.1 Evasão Fiscal 

Segundo entendimento de Juqueira (2010) a evasão fiscal, diferente da elisão, se dá pela prática que infringe as normas vigentes, ou seja, corresponde à sonegação ou fraude por parte do contribuinte, é um ato que busca economia de maneira ilícita na carga tributária. Assim, na evasão fiscal a ilegitimidade ocorre no ato do fato gerador e também após sua ocorrência, objetivando reduzir ou até mesmo ocultar a obrigação tributária.

No dicionário Aurélio, a palavra evasão tem a mesma significação de desviar, evitar, escapar, fugir e eludir (evitar ou escapar com destreza; furtar-se com habilidade ou astúcia).

Dessa forma evasão é considerada como utilização de procedimentos que violem diretamente a lei ou o regulamento fiscal, como forma de diminuir o peso da tributação.

Leão (1997, p. 145) explica:

Desde o momento em que foi criada a espécie imposto – palavra que já traz, implicitamente, o particípio passado do verbo impor, significando “admitido à força”, “mandado” e “obrigado”, restringindo dessa forma, o movimento de liberdade do cidadão – deve ter surgido, possivelmente, a conduta de resistência ao pagamento do tributo, por ser ele considerado, pela grande maioria, fruto de desigualdade, privilégio e injustiça. A palavra em si, pela própria natureza, é um desestímulo ao seu cumprimento, tornando motivo de antipatia por parte do contribuinte que não se conforma, de imediato, em dar uma parte de seu patrimônio financeiro para o Estado, ainda mais quando, em geral, desconhece onde e como será o recurso aplicado. Surgiu, destarte, a evasão, fenômeno que remonta a longos anos e que sempre existiu em todos os países do mundo e que, certamente, continuará a existir.

Marins (2001) comenta que a evasão é caracterizada pela ausência do contribuinte em transferir ou pagar integralmente ao Fisco uma parcela do tributo devido, através de atitudes que sabe não serem lícitas.

Conforme Marins (2001, p. 30) comenta:

A evasão tributária é a economia ilícita ou fraudulenta de tributos porque sua realização passa necessariamente pelo incumprimento de regras de conduta tributária ou pela utilização de fraudes. A transgressão às regras tributárias caracteriza a evasão.

Assim, considera-se a evasão fiscal uma forma de economia fiscal na qual se é realizada após a incidência do fato gerador do tributo, desconsiderando a legislação tributária e que tem como finalidade a redução e a ocultação de uma obrigação já existente para o fisco (MARINS, 2001).

Nogueira (1990, p.201) complementa o entendimento:

Observe-se bem que a sonegação somente pode ocorrer em relação a fato gerador já realizado. O que na verdade é „sonegado‟, escondido, é o conhecimento ao fisco da realização do fato gerador, da sua natureza ou das suas circunstâncias materiais ou das condições pessoais de contribuinte. Somente depois de realizado o fato gerador é que pode nascer objetivamente a obrigação e ser subjetivamente atribuída a alguém. Não pode cometer sonegação quem não chegue a realizar o fato gerador, porque somente com ele nasce a obrigação.

No caso da evasão fiscal, este atinge duplamente a economia do país. Nessa caso, pelo fato de arrecadar aquém do previsto,  e consequentemente prejudicando o andamento e o desenvolvimento da economia, e depois por tornar-se arma de concorrência, de certa forma desleal, entre as empresas, pois a informalidade de algumas empresas pode arruinar o restante das empresas do ramo (JUNQUEIRA, 2010).

Seguindo esta linha de raciocínio, Huck (1997, p. 57) descreve:

Se o objetivo declarado da elisão é a busca de uma economia tributária, estruturando-se o negócio de forma aparentemente legal, havendo uma preocupação do agente em cercar seu negócio com um véu de licitude, na evasão, por outro lado, supõe-se que o agente está informado de que foge ao imposto pelo caminho do ilícito e da fraude. Na evasão, o contribuinte procura maximizar seu ganho ou vantagem, contrapondo-os numa relação custo / benefício com o risco que corre. Nesse processo, o indivíduo analisa o nível de ganhos que obterá com o não pagamento ou pagamento a menor do imposto, jogando-o contra o maior ou menor risco de essa operação vir a ser detectada pelo Fisco. O risco, no caso, é representado pelo custo que poderá incorrer com penalidades e multas decorrentes de uma eventual autuação fiscal. Não seria exagero acrescentar-se a esse custo a insegurança psicológica inerente aos que em sã consciência violam a lei.

Nota-se que a evasão é considerada como um comportamento ilegal do contribuinte, na qual pratica fraude, simulação ou de qualquer outro meio com o propósito de supressão ou redução da carga tributária. Tal conduta se dá de forma desonesta, geralmente forjando a irrealidade para se livrar dos encargos tributários, que em nenhum momento é amparado pela legislação vigente, nem representa lacunas da lei, caracterizando assim a evasão fiscal (MARTINS, 2006).

Martins (2006) explica que para se caracterizar a evasão, pode se perceber pela ausência na emissão do documento fiscal (NF) na venda de uma mercadoria, ou seja, quando existir a ocultação do fato gerador por não emitir a NF. Isto porque, o fato gerador é a venda ocorrida e, assim, o contribuinte é obrigado a produzir a emissão da NF, o que cria para ele a obrigação do pagamento do tributo.

Dessa forma, a evasão fiscal pode ser culposa, pelo não pagamento do tributo, ou dolosa, que é sempre ilícita e configura-se crime e fraude, sonegação, conluio (MARTINS, 2006).

No entanto, Martins (2006) comenta que nas infrações culposas, percebe-se que o contribuinte não teve a intenção de praticar o ato, mas o exerce de forma negligente, imprudente ou imperita. As formas de evasão que constituem crimes fiscais estão definidas nos artigos 71, 72 e 73 da Lei 4.502/64, e serão apresentados e conceituados a seguir

O ocultamento do fato gerador por parte do contribuinte com a intenção de não pagar o tributo devido constitui sonegação fiscal, portanto, um crime contra a ordem tributária (MARTINS, 2006).

Martins (2006, p. 247) afirma que a sonegação:

É toda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar, total ou parcialmente, o conhecimento por parte da autoridade fazendária: (1) da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, sua natureza ou circunstâncias materiais; (2) das condições pessoais do contribuinte, suscetíveis de afetar a obrigação tributária principal ou o crédito tributário correspondente.

Martins (2006) assim entende que sonegação é toda e qualquer forma dolosa de impedir, por parte ou inteira a ocorrência do fato gerador. Sendo que, havendo omissão nas informações pessoais do contribuinte que gere reflexos na obrigação, tributação também se configura crime de sonegação.

Para Marins (2001) a venda de mercadorias sem nota é fato consumado para configurar a sonegação fiscal, uma vez que existe o fato gerador, mas que torna-se desconhecido pela autoridade fiscal em virtude da ausência da emissão do documento fiscal, que comprove a venda.

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No que diz respeito ao planejamento tributário, este não se aplica no caso de venda de mercadorias sem nota. Isto porque, a economia tributária gerada pelo não pagamento na venda de mercadorias sem nota é um crime previsto em lei. Pois para que não aconteça o fato gerador se denomina planejamento tributário. Ocorre que no caso da não emissão da nota fiscal existe a ocorrência do fato gerador (venda), mas que não é documentada pela empresa para evitar o pagamento do imposto.

Sendo assim, fraude vem a ser qualquer crime ou ato ilegal para o lucro daquele que se utiliza de alguma ilusão praticada na vítima como seu método principal (MARINS, 2001).

Segundo art.72 da Lei 4.502/64:

Fraude é toda ação ou omissão dolosa que tenda a impedir ou retardar, total ou parcialmente, a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, ou a excluir ou modificar suas características essenciais de modo a reduzir o montante do imposto devido, ou a evitar ou diferir seu pagamento.

Ocorre que na fraude, há falsificação de dados pelo contribuinte ou este insere elementos incorretos nos livros ou documentos fiscais visando não pagar o tributo ou pagar valor inferior ao devido.

No caso do conluio, segundo o art. 73 da Lei 4.502/64, “é o ajuste doloso, ou seja, com intenção, que duas ou mais pessoas aturais ou jurídicas realizam visando a sonegação ou a fraude”. Assim, diante disso, há a vontade de duas ou mais pessoas de não informar, por exemplo, renda em um negócio jurídico, para não haver a respectiva tributação (JUNQUEIRA, 2010).

Junqueira (2010) explica que as pessoas envolvidas no conluio praticam um crime, pois juntas enganam o fisco, de forma a omitirem informações relevantes para a constituição do crédito tributário, com intenção de não pagar ou diminuir o valor do tributo.

Oliveira (2005) cometa que na declaração do imposto de renda da pessoa que aluga um imóvel deve-se constar os valores e para quem foi pago estes valores. No entanto, na declaração da pessoa que recebe este aluguel deve constar o rendimento. Se os dois envolvidos omitirem esta informação, estão praticando o conluio, portanto, sujeitos às penalidades cabíveis.

Diante de todas as formas de sonegação de impostos existe a venda sem nota; venda com meia nota; venda com calçamento de nota; duplicidade na numeração da nota fiscal; compra de notas fiscais; passivo fictício ou saldo negativo de caixa; acréscimo patrimonial a descoberto (do sócio); deixar de recolher tributos descontados de terceiros; saldo de caixa elevado; distribuição disfarçada de lucros (OLIVEIRA, 2005).

Junqueira (2010) comenta que a Lei 8.137/90, em seus art. 1º e 2º define os crimes de sonegação fiscal, mas também as penas aplicáveis quando do seu não cumprimento, facilitando ao legislador alcançar as mais diversas formas conhecidas de se efetuar a sonegação fiscal, com o objetivo de impedir o comportamento, através do desestímulo e da repressão, daqueles que buscam o descumprimento das obrigações tributárias.

De acordo com seu art. 1º, constitui crime contra a ordem tributária, suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:

Omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias; Fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal; Falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável; Elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato; Negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação. A pena prevista para esses tipos de crime é de 2 (dois) a 5 (cinco) anos de reclusão, e multa.

Na descrição do art. 2º, trata sobre crimes da mesma natureza, cuja pena prevista é de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos de reclusão e multa.

Fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo; deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos; exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição como incentivo fiscal; deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento; utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública.

No entanto, Andrade (2006), comenta que as condutas descritas na Lei 8.137/90, serão puníveis se forem praticadas com dolo, no caso em que o sujeito ativo da conduta descrita na norma penal agir com a intenção de produzir o resultado previsto na referida norma, ou no caso dele assumir o risco de produzi-lo. Isto porque, os crimes contra a ordem tributária são crimes materiais que exigem produção de um resultado. Ocorre que a lei não pune pelo fato de não haver apenas o recolhimento de tributo, mas a ausência desse recolhimento pelos meios fraudulentos para supressão ou redução do tributo devido. 

1.2 Elisão Fiscal - por lacuna x elisão por previsão

No caso da elisão fiscal esta se compara a economia lícita de tributos, no ato do cumprimento da obrigação tributária. Sendo que a palavra elisão é origem do latim “elisione”, e significa ato ou efeito de elidir, eliminar, suprir. É uma maneira de prover economia seguindo o disposto a lei (FURTADO, 2009).

Furtado (2009) comenta que para o contribuinte, a elisão fiscal é considerada um instrumento essencial na economia fiscal. Tendo em vista que o planejamento tributário está ligado com a elisão, ou seja, uma forma de reduzir o montante ou retardar o pagamento do tributo por atos ou omissões lícitos do sujeito passivo, anteriores à ocorrência do fato gerador. Portanto, elisão fiscal é definida como a economia tributária lícita.

Para entendimento de Fabretti (2005, p. 153), veja-se:

A economia tributária resultante da adoção da alternativa legal menos onerosa ou lacuna da lei denomina-se Elisão Fiscal. A elisão fiscal é legítima e lícita, pois é alcançada por escolha feita de acordo com o ordenamento jurídico, adotando-se a alternativa legal menos onerosa ou utilizando-se de lacunas da lei.

No que diz respeito às lacunas da lei, Fabretti (2005, p. 153) menciona a prática quando se fala em legislação:

Embora parte significativa da doutrina não admita que possam existir lacunas na lei, não se pode esquecer que a legislação tributária brasileira é casuística, haja vista a torrencial edição e reedição de medidas provisórias, a boa técnica legislativa recomenda que a lei seja genérica, cabendo à interpretação aplicá-las aos casos concretos. Por mais que a norma procure discriminar e abranger todos os casos possíveis, sempre surgirão novos casos além dos previstos.

Dessa forma, Fabretti (2005) comenta que elisão é o ato de aproveitar as chamadas brechas da lei, que por falta de conhecimento ou motivo diverso foi aplicada pelo legislador, de forma que os contribuintes possam se aproveitar da situação e com isso reduzirem os valores a serem recolhidos aos cofres públicos.

Amaral (2002, p.49) entende da seguinte forma:

A elisão fiscal é um conjunto de procedimentos previstos em lei ou não vedados por ela que visam diminuir o pagamento de tributos. O contribuinte tem o direito de estruturar o seu negócio da maneira que melhor lhe pareça, procurando a diminuição dos custos de seu empreendimento, inclusive dos impostos. Se a forma celebrada é jurídica e lícita, a fazenda pública deve respeitá-la.

No entanto, Marins (2002, p. 31) complementa:

A adoção pelo contribuinte de condutas lícitas que tenham por finalidade diminuir, evitar ou retardar o pagamento do tributo é considerada como prática elisiva. Dá-se através de expedientes, omissivos ou comissivos, que evitam licitamente a prática do fato imponível da obrigação tributária.

Marins (2002) comenta que a conduta do contribuinte pode ser um fazer ou um deixar de fazer, desde que ambas sejam condutas lícitas, sendo assim, estarão amparadas pelo direito e serão consideradas válidas.

Explica Carvalho (2004, p.90):

Um particular que celebra um negócio jurídico de forma que não seja tributado ou que seja tributado de maneira menos onerosa não pratica qualquer ilícito. Atua dentro do campo da licitude, pois escolhe, dentre vários caminhos, aquele que lhe é menos custoso. Trata-se apenas de um planejamento tributário feito licitamente, no intuito de diminuir os custos daquele particular, seja pessoa física ou jurídica. É dever do bom administrador adotar medidas menos onerosas na condução de seus negócios, o que repercute inclusive na incrementação de sua produção ou melhoria na prestação de seus serviços. Tal fato apenas contribui para uma maior oferta de empregos como também para um impulso na economia local, regional ou nacional.

Carvalho (2004) comenta que a elisão fiscal é praticada pelos administradores da empresa antes de ocorrer o fato gerador da obrigação tributária, não ocasionando a incidência tributária e, portanto, não existindo a necessidade do pagamento do tributo.

Seguindo essa linha de entendimento Souza (1998, p.174), define que:

O único critério seguro (para distinguir a fraude da elisão) é verificar se os atos praticados pelo contribuinte para evitar, retardar ou reduzir o pagamento de um tributo foram praticados antes ou depois da ocorrência do respectivo fato gerador: na primeira hipótese, trata-se de elisão, na segunda trata-se de fraude fiscal.

Interessante notar o momento para se classificar como elisão, pois a mesma ocorre antes da concretização do fato gerador, na qual corresponde ao pagamento do tributo e surge apenas quando o crédito tributário a favor do Estado é identificado. A não ocorrência do fato gerador implicará na impossibilidade do pagamento do tributo. Assim, se o contribuinte estiver utilizando de atos lícitos na lacuna da lei, não estará cometendo práticas fraudulentas (CARVALHO, 2004).

Nota-se que diante da junção de ambos os critérios (cronológico e licitude dos meios) que se verifica a distinção entre os atos que correspondem à elisão fiscal e aqueles que traduzem uma prática ilícita (evasão fiscal).

Sobre o assunto, Coelho (2001, p. 04) comenta:

Tanto na evasão comissiva ilícita como na elisão fiscal existe uma ação do contribuinte, intencional, com o objetivo de não pagar ou pagar tributo a menor. As diferencia: (a) a natureza dos meios empregados. Na evasão ilícita os meios são sempre ilícitos (haverá fraude ou simulação de fato, documento ou ato jurídico. Quando mais de um agente participar dar-se-á o conluio). Na elisão os meios são sempre lícitos porque não vedados pelo legislador; (b) também, o momento da utilização desses meios. Na evasão ilícita a distorção da realidade ocorre no momento em que ocorre o fato jurígeno-tributário(fato gerador) ou após sua ocorrência. Na elisão, a utilização dos meios ocorre antes da realização do fato jurígeno-tributário, ou como aventa Sampaio Dória, antes que se exteriorize a hipótese de incidência tributária, pois, opcionalmente, o negócio revestirá a forma jurídica alternativa não descrita na lei como pressuposto de incidência ou pelo menos revestirá a forma menos onerosa.

Desse entendimento, esclarece Huck (1997, p. 32), identificando os conceitos de elisão e evasão fiscal, sem confundi-los:

A elisão fiscal, como obra da criatividade e engenho dos planejadores tributários, aspira a uma condição de legalidade que a distinga da evasão. Entretanto, é muito tênue a linha divisória existente entre elas, não faltando quem já tenha sugerido uma análise conjunta dos dois institutos devido a seu notável grau de semelhança, muitas vezes de complementaridade, e, sobretudo pelo impacto análogo que causam nos sistemas tributários modernos. É certo que a análise e o enquadramento dos conceitos variam profundamente no cenário mundial, de país para país, dependendo das leis internas e dos tratados internacionais existentes, como também diferem em função de ideologias políticas com que são analisados. Um planejamento tributário pode ser legal em determinado país e ilegal em outro. Certas legislações consideram como fraude a simples frustração do objetivo da lei tributária, ainda que o agente se tenha utilizado de formas legais em seu ato ou negócio. Não seria exagero afirmar que a elisão distingue-se da evasão tão-somente por uma questão de tempo. Essa diferença é posta não no sentido de que a fuga ou redução do imposto teria uma outra característica se ocorrida antes ou depois da ocorrência do fato imponível, como antes já comentado, mas sim por uma questão de tempo histórico, pois um planejamento tributário específico, em certo momento, pode ser considerado como elisão fiscal, segundo um sistema tributário nacional e, sendo detectado e identificado pelas autoridades fiscais, passa a ser por elas expressamente proibido, transformando-se, desse ponto em diante.

Sendo assim, Junqueira (2010) explica que há duas espécies de elisão fiscal, uma decorrente da própria lei, onde, o próprio dispositivo legal permite ou até mesmo induz a economia de tributos. Existe uma vontade clara e consciente do legislador de dar ao contribuinte determinados benefícios fiscais. Os incentivos fiscais são exemplos típicos de elisão induzida por lei, uma vez que o próprio texto legal dá aos seus destinatários determinados benefícios.

E a outra espécie é aquela que resulta de lacunas e brechas existentes na própria lei, onde, o contribuinte opta por configurar seus negócios de tal forma que se harmonize com um menor ônus tributário, utilizando-se de elementos que a lei não proíbe ou que possibilitem evitar o fato gerador de determinado tributo com elementos da própria lei (JUNQUEIRA, 2010). 

1.3 A elisão fiscal como ferramenta para o planejamento tributário diante da norma antielisiva, ilicitude dos meios e análise ao artigo 116 da CTN 

Nova inclusão no Código Tributário Nacional (CTN), pela Lei Complementar nº. 104/2001 dar-se o nome de norma antielisão, que se trata de tributar por via ficcional o que antes não era tributado.

No que diz respeito à natureza da norma antielisiva não se confunde com a da simulação, uma vez que a desconsideração efetuada é decorrente da nulidade do ato ou do negócio jurídico simulado, que ocultou um ato ou negócio jurídico real (CARVALHO, 2010).

Dessa forma, Carvalho (2010) desconsidera o simulado e tributa-se o real. Tem assim o propósito de anular a falsidade não tipificada tributariamente resultando na realidade tipificada, com os seus consectários tributários próprios.

Perante a elisão, Oliveira (2006) diz que uma vez que inexiste negócio simulado, se este for desconsiderado não se desvela qualquer negócio real, tipificado e que era oculto. Resume-se ao expediente da "requalificação", criando um fato imponível não praticado ou mesmo intencionado.

Assim, a cláusula antielisiva deve obedecer as normas estipuladas no princípio da legalidade, com todas as limitações destacadas nessa incidência. Sendo que para entendimento de Martins (2001) a tipificação da antielisão não se dá somente pela regra de procedimento, mas também como descrição de um fato jurídico para o qual se atribuem conseqüências materiais.

Dessa forma, Martins (2001) complementa dizendo que a princípio toda regulação da elisão deve conter na sua descrição uma conduta conteúdo econômico à qual se atrela uma conseqüência. Uma vez que, àquele que praticar negócios jurídicos, ou mesmo atos, com o fito de elidir o fato gerador, se torna passível de sofrer conseqüências fiscais, sendo esse o escopo do arcabouço legal trazido pela inovação de tipo tributário criado.

Como normas, se descreve o parágrafo único do art. 116 do CTN se mostra pouco proveitosa para servir como cláusula antielisão, dada a sua generalidade (COELHO, 2006).

Percebe-se a existência de norma geral antielisão (como é o art. 116, § único do CTN) sendo considerada pouco eficiente diante de sua generalidade e margem para ser interpretada. Sendo que a elisão fiscal será inteiramente combatida com a observância de tipos específicos, objetivos, completos, direcionados para uma determinada conduta (COELHO, 2006).

Diante da análise da cláusula geral, Amaro (2006) diz que o propósito é de que o sujeito passivo renuncie a adotar práticas elisivas, de modo a renunciar à escolha entre as práticas civis lícitas que se afigurem mais econômicas ao seu dia-a-dia comercial. Visa combater aquele planejamento tributário criado pelo contribuinte exatamente para tornar mais racional e por consequentemente econômica perante sua vida fiscal.

Amaro (2006) ainda informa que sua distinção pelos critérios demonstrados no auxílio dessa hermenêutica, sendo a licitude ou ilicitude do ato ou negócio jurídico praticado. Pois demonstra que as tipificações do dolo, da fraude e da simulação no regime do Código Civil finalizam necessariamente práticas de ilícitos civis, e, portanto a "dissimulação" do parágrafo único do art. 116 do CTN tem como elemento nuclear a ilicitude e a nulidade dos atos ou negócios praticados.

Dessa forma, não se verifica na elisão ilícito civil ou penal, não há sequer ilícito tributário, pois o CTN não prescreve qualquer espécie de penalidade para a prática da forma elisiva (AMARO, 2006).

No comento de Moreira (2003)[1] comenta que a licitude dos meios utilizados diz respeito ao aspecto do tempo, uma vez que se devem demonstrar os atos praticados pelo contribuinte diante do ordenamento jurídico em vigor.

Moreira (2003, p. 05)[2] complementa: 

Licitude dos meios utilizados: consoante mencionado, juntamente ao aspecto temporal deve-se analisar a acordância ou não dos atos praticados pelo contribuinte com o ordenamento jurídico vigente. Na elisão fiscal são utilizados meios sempre lícitos, ao passo que na evasão empregam-se meios ilegítimos, como a fraude, sonegação e simulação. Diante dos princípios da legalidade e especificidade conceitual fechada, informadores do direito tributário brasileiro, será lícita toda conduta que busque a economia de impostos, desde que não vedada pelo legislador. É interessante notar que os conceitos internacionais de elisão (tax avoidance) e evasão (tax evasion) baseiam-se estritamente na legitimidade dos meios utilizados para o não pagamento de tributos.

A elisão por não se constituir em causa de nulidade negocial, não corrompe ou macula o ato ou negócio jurídico em sua substância civil ou comercial, mas tão-somente enseja a desconsideração administrativa que é causa para a adoção de uma ficção jurídica que exala efeitos tributários (MOREIRA, 2003)[3].

Moreira (2003)[4] comenta que mesmo que a elisão seja enquadrada no regime de abuso de forma do Código Civil de 2002, ainda assim não passa de mero ato ilícito gerador de responsabilidade civil, não gera nulidades jamais.

A compreensão da norma antielisão se de acordo com o parágrafo único do art. 116 do CTN. Dispõe o parágrafo único do 116 que:

A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.

Para a assimilação do referido comando legal, é necessário proceder em estudo do texto da lei, assim sugerido por Martins (2001, p. 134):

a)  regra formal ou de estrutura (ou regra de competência administrativa): faculta-se à autoridade administrativa desconsiderar atos ou negócios jurídicos;

b) regra material: o contribuinte que praticar atos ou negócios jurídicos com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária poderá sofrer a desconsideração desses atos;

ci) regra de aplicabilidade normativa (regra de instituição e regulamentação): somente com observância dos procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária poderá ser promovida a desconsideração pela autoridade administrativa dos atos ou negócios jurídicos praticados pelo contribuinte.

Martins (2001) diz que se atribui a competência formal para a autoridade administrativa, sendo que tipifica a conduta do contribuinte considerada elisiva e fixa-se requisitos de aplicabilidade normativa para seu próprio texto, demonstrando que a norma contém, tendo-se em um único texto, três distintos tipos de regras: regra formal, regra material e regra de aplicabilidade normativa.

Sendo que no aspecto formal fica claro que o texto complementar amplia as prerrogativas de autotutela da Administração Tributária, uma vez que a competência fiscalizatória e declaratória adiciona competência para desconsiderar atos e negócios praticados pelo contribuinte (MOREIRA, 2003).

Para Moreira (2003) as condutas preveem novas hipóteses comportamentais às quais atribui consequências administrativas e materiais de natureza tributária.

Assim, segundo entendimento de Borges (2001) o Estado antes de assumir o ato negocial no tipo tributário busca seu verdadeiro intento econômico, uma vez que, diante da importância da consideração econômica, especialmente no campo dos impostos, tendo-se em vista que esses instrumentos de captação de riqueza, que incidem quase sempre sobre fatos econômicos por meio de categorias jurídicas, podem estar sendo distorcidos ou mal utilizados como pretensões de reduzir ou elidir tributações legítimas. Assim, a consideração econômica poderá, em certos casos, demonstrar a finalidade autêntica de dispositivos e impedir abusos.

Para Malkowskvl (2000, p. 65) o método da interpretação econômica é perfeitamente adequado ao princípio da legalidade em matéria de fato gerador e assim demonstra:

Em Direito Tributário, autoriza-se o intéprete, quando o contribuinte comete um abuso de forma jurídica, a desenvolver considerações econômicas para a interpretação da lei tributária e o enquadramento do caso concreto em face do comando resultante não só da realidade do texto legislativo, mas também do seu espírito da mens ou retio legis.

Nota-se que para alguns doutrinadores o discurso diante do princípio da isonomia pregado pelo ente arrecadador, no sentido de contribuintes em igualdade de condições arcarem com igual parcela de tributo, muitas vezes é revelado como ilusório, pois o mercado se preocupa antes de tudo com custos. A redução de capital disponível gera desemprego, desigualdade, ao contrário dos argumentos travados pelo Estado.

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