Para combater a roubalheira nos bancos públicos, na posse dos novos presidentes do Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e BNDES, Bolsonaro disse: “Todos os nossos atos terão que ser abertos ao público.”. O presidente pediu “transparência acima de tudo” e avisou que “os amigos do rei” não terão mais acesso facilitado aos bancos.
Prometeu ainda abrir a caixa do BNDES e de outros órgãos: “Tudo será divulgado, com nome e sobrenome, além de denúncia para o TCU e a PF.”.
Se retroagir no tempo e voltar ao princípio do século 19, vai encontrar D. João VI metendo a mão em toda grana do Banco do Brasil, para levar para Portugal. Exemplo histórico de patrimonialismo estatal, que é a confusão entre os bens públicos e os privados.
Que fique bem claro: qualquer medida, dentro da lei e pautada pela ética, contra a máfia do patrimonialismo, não interessa quem seja o investigado ou acusado, vai contar com meu apoio na Câmara dos Deputados (a partir de 1/2/19). Serei um parlamentar a mais nessa luta anti-máfia. Mas não terei bandido de estimação. A lei tem que valer para todos, isto é, “erga omnes”. Lei e Ordem acima de todos e Ética Humanista acima de tudo. Vamos nessa direção.
Eis um exemplo de patrimonialismo no setor bancário: na Operação Cui Bono o Ministério Público Federal (em 2018) denunciou por corrupção e lavagem de dinheiro várias empresas (Marfrig, Bertin, J&F, holding dona da JBS, Eldorado Celulose, Grupo BR Vias, da Gol, e Oeste Sul Empreendimentos Imobiliários) assim como dezoito pessoas (Cunha, Geddel, Henrique Alves, Funaro, Cleto, dentre outros) por fraudes (de R$ 3 bilhões) em empréstimos da Caixa Econômica Federal, incluindo aí o FI-FGTS (fundo do trabalhador).
Crimes ocorridos entre 2011 e 2015, durante a gestão do PT (Dilma), mas o patrimonialismo estatal não foi invenção dele. É da nossa história. Geddel, Cunha e Cleto estão presos.
Essa específica máfia do patrimonialismo (que confunde os bens públicos com os bens privados ou que busca enriquecer criminosamente ou indevidamente seus patrimônios privados com o dinheiro ou o poder público) contava com quatro núcleos: empresarial (Mercado, que pagava propinas, geralmente de 3%), agentes públicos (Estado, que as recebia), grupo político (Estado, que faturava uma parte) e operadores financeiros (Mercado, que cobravam suas taxas). Sem a aprovação do grupo político os empréstimos não saíam.
Paulo Guedes, ministro da Economia, enfatizou: “Vamos acabar com falcatruas; o povo brasileiro cansou de ver corrupção no uso das funções públicas para enriquecimento privado.”.
“Piratas privados, burocratas corruptos e criaturas do pântano político se associaram contra o povo brasileiro” (Paulo Guedes). Essa é a essência das máfias do patrimonialismo estatal-empresarial: gente do Estado se junta com gente do Mercado para juntos roubarem a nação.
Enfatizando: quando a roubalheira resultante da confusão entre o público e o privado se dá exclusivamente dentro do Estado, chama-se patrimonialismo estatal. Quando a rapinagem envolve agentes públicos e privados, chama-se patrimonialismo estatal-empresarial.
É completamente equivocada, na verdade, uma verdadeira aberração, a ideia de que a roubalheira patrimonialista seja exclusiva dos agentes públicos (dos estamentos burocráticos, como dizia Faoro; dos funcionários “patrimonialistas”, como afirmava Sérgio Buarque de Holanda; do “jeitinho” do povo, como diz Roberto DaMatta; dos políticos, como se divulga na mídia em geral).
Dela com frequência participa também gente muito graúda do Mercado (econômico e financeiro). Trata-se, portanto, normalmente, de uma roubalheira público-privada. Esse é o patrimonialismo estatal-empresarial.
Se o Estado brasileiro é excessivo, intervencionista, gastador, uma monstruosidade estatizante, isso muito se deve também aos setores bandidos do Mercado que, para fugirem do capitalismo competitivo, se valem das suas relações, das suas amizades, dos seus acessos privilegiados ao poder político para se enriquecerem com o poder ou com o dinheiro público.
Por que abrir a caixa preta dos bancos públicos (Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e BNDES)?
Porque o crédito público subvencionado (dinheiro barato e escasso) constitui um dos campos preferenciais das máfias do patrimonialismo, que enlaçam setores bandidos das elites do poder que comandam o Estado e o Mercado, que se dão o “direito” de saquear, roubar, pilhar, corromper e contar com privilégios perversos, em prejuízo da população e sem nenhum tipo de prestação de contas, ou seja, impunemente.
Uma operação pente fino nesses bancos é muito bem-vinda. Por força da “velha ordem patrimonialista”, que confunde a coisa pública com os bens privados, os amigos do “rei” sempre tiveram acesso privilegiado ao dinheiro público subsidiado, sem nenhum tipo de transparência (e, muitas vezes, sem nenhum tipo de garantia). Os calotes, por isso mesmo, são frequentes.
Os partidos políticos, cartelizados, seja de esquerda, de centro ou de direita, sempre fizeram loteamento dos cargos mais importantes nesses bancos, escolhendo pessoas dispostas a gerenciar os esquemas de favoritismos. A novidade no Brasil é que um ex-presidente do Banco do Brasil está na cadeia. Antes da ruptura do mensalão e da Lava Jato isso era impensável.
A roubalheira patrimonialista no Brasil (que normalmente une setores bandidos do Estado e do Mercado) não é uma atividade criminosa ou perversa isolada. A máfia do patrimonialismo (uso do dinheiro ou do poder público para o enriquecimento privado ilegal ou privilegiado) não tem ideologia na hora da acumulação de capital (reúne gente de esquerda, de centro ou de direita) e faz parte da história do Brasil (qualquer que seja a época).
A máquina de crédito do Estado cumpre seu papel incentivador na maioria das vezes, mas também é usurpada pelas máfias que atuam nesse setor. Associações perversas (entre bandidos do Estado com bandidos do Mercado) já causaram muito prejuízo para a população. Um exemplo paradigmático disso aconteceu no tempo dos favorecimentos descarados aos “campeões nacionais” (Eike Batista, JBS, Odebrecht e por aí vai).