Um outro olhar: qual polícia?

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4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Nos dias atuais o terrorismo imposto pela mídia à sociedade moderna eleva o estresse, conseqüentemente à sensação de insegurança aumenta e verificamos o surgimento de uma consciência imposta à necessidade de reação do povo.

Caracteriza-se pela constatação de que os valores morais e sua aceitação não são iguais para todos, embora os controladores da mídia exponham todos os dias as mensagens que produzem o medo e insegurança, insistindo em manter sobre controle as classes subalternas. Este, por sua vez, advém do conjunto de recursos materiais e simbólicos de que a sociedade dispõe para assegurar o comportamento de seus membros.

O procedimento de controle instalado pelas elites brasileiras tem início desde a época de nossa colonização. O escravo sofria toda sorte de crueldades, contando com a omissão dos agentes públicos à época. “A chamada da busca da identidade negra na retórica dos movimentos negros não parece mais perturbar a classe dominante brasileira”. (MUNANGA, 1985).

Controle significa ato, efeito ou poder de controlar; domínio, governo, fiscalização exercida sobre as atividades de pessoas, órgãos, departamentos, ou sobre produtos, etc., para que tais atividades, ou produtos, não se desviem das normas preestabelecidas (FERREIRA, 1999, p.546).

A comunidade estabelece controles no seu dia a dia, quando os jovens acordam e se dirigem à escola e encontram desde os primeiros momentos uma série de situações que os induzem a seguir as normas estabelecidas pela sociedade familiar. São normas silenciosas, mas seguidas por seus pais, avós, bisavós, e assim por diante. Esse controle vem desde a proibição da mulher votar, fumar, dirigir, trabalhar etc, dentre outras. Surge então o desejo de transgredir e avançar contra as normas, como são silenciosas e não há um código pré-estabelecido para sua tradução literal. Os jovens por sua natureza clássica de desafiadores do sistema vêem na oportunidade de repelir o que lhes são impostos como dogmas, iniciam a vida às vezes desvirtuando-se do que é “politicamente correto”. Neste ínterim são capazes de ações transgressoras que causam dano à comunidade que vive e ascendem aos ganhos advindos de sua conduta desviante.

Nas classes originárias dos aglomerados urbanos, onde a falta do Estado no suprir de suas necessidades, vem na rebeldia de seus rebentos atentarem contra o sistema vigente e sofrem as conseqüências do mecanismo de controle, ou seja, a atuação dos operadores de segurança pública84. Muitos irão se perverter em pequenos criminosos a promoverem-se nas comunidades. Serão vistos ostentando armas e “poder”. Enquanto estão no orbe dos aglomerados, não se fala em controle do Estado. A sociedade não importa quando o trabalhador é alijado de seu direito de defesa contra a marginalidade instalada em seu local de “descanso” ou onde se encontra com seus familiares para convívio dominical. Todavia, quando suas ações começam a alcançar as minorias dominantes, em seus condomínios fechados, então, a classe dominante libera os mecanismos de controle para exercerem com eficiência a repressão. A conduta desviante não pode afetar os feudos existentes. A penalização aos autores das condutas desviantes se verifica de forma ágil e cruelmente.

Reativamente a sociedade aciona os mecanismos de defesas que se encontram sobre controle nos quartéis, nas delegacias de polícia e nos porões do judiciário. Surge o discurso fácil da reação e não agrada a ninguém a arrogância do “delinqüente” que insurge para incomodar o sistema. São estabelecidas novas normas de condutas, inicialmente incorporadas pelos transeuntes sociais. A polícia sai à rua executando os atos esperados de repressão cinematográfica que serão exibidos em cadeia nacional com chamadas espetaculares, cada um no seu papel a mídia, transmite e o controle se faz presente, sutilmente de forma sublimar. O exemplo servirá para inibir aos pretensos atores da violência urbana.

Baratta (2002) adiciona que as instituições do controle formal, atuando-nos diversos níveis da organização da Justiça Penal (Legislador, Polícia, Ministério Público, Juízes e Órgãos de Execução Penal) não representam nem tutelam interesses comuns a todos os cidadãos, e sim, interesses de grupos minoritários socialmente privilegiados. Por outro lado, reafirma que o Sistema Penal é altamente seletivo, seja no que diz respeito à proteção dos direitos humanos, dos bens e interesses sociais, seja em relação ao processo de criminalização (incriminalização e descriminalização), seja no que tange ao recrutamento da clientela, o que fortifica a ilação de que o sistema punitivo é absolutamente inadequado para atuar de maneira útil e saudável na sociedade, conforme é sempre declarado no discurso oficial.

O segundo fundamento Minimalista, enriquecido pelas lições de Baratta (2002) aprofunda a concepção de que é preciso limitar o Direito Penal que está a serviço de grupos minoritários, tornando-o mínimo, porque a pena, representada em sua manifestação mais drástica pelo Sistema Penitenciário, é uma violência institucional que limitam direitos e reprime necessidades fundamentais das pessoas, mediante a ação legal ou ilegal de servidores do poder, legítima ou ilegitimamente investidos na função.

Atualmente, o Brasil passa por momentos de angústia nacional. Os governantes diante de sua ineficácia no enfrentamento do crime atuam num paradoxo da criação da “sensação de segurança” a ser transferida para a sociedade, e desta forma espera-se que os cidadãos retornem a sua vida cotidiana sem, contudo assimilar e compreender a pouca ou quase nenhuma assistência na condução e contenção da violência que sofre. A propaganda alcança seu objetivo ao desviar a atenção para assuntos diversos, causando assim a funesta sensação de segurança. Ao contrário, se investisse o recurso que pagarão pela propaganda, na reeducação da população, orientando e promovendo a reinserção social dos “excluídos”, através da assistência social, haveria uma chance de transformação do estágio situacional da segurança pública.

A segurança também tem uma proposta para a sociedade que envolve a mídia, que é apresentar os resultados de suas operações, tornando o processo transparente. Mas quem detém o poder da mídia? Alguns clãs que exercem através da censura branca o controle da pobreza.

Como medida de controle da criminalidade, o Estado opta pelo recrudescimento das penas, redução da maioridade penal sob a utópica ilusão de que conseguirá reduzir a prática dos delitos. Da mesma forma, a propositura da pena de morte surge como se fosse à luz no fim do túnel. Não há estudos que determinem quais as causas de aumento da violência. Ninguém investe na educação sensatamente, apenas surgem programas com objetivo eleitoral ou “Leis de Ocasião”.

4.2 ESTADO PRIVADO

Atualmente verifica-se a ocorrência de um fenômeno que a primeira vista parece novidade, mas, no passado também existia e não assustava em razão das características das condições em que o homem vivia. Trata-se da segurança particular e/ou milícias particulares. Hoje se denomina “empresa de segurança privada”, explorada como um negócio comum85. São milhares de vigilantes, em sua maioria sob o comando de empresários, militar da reserva ou autoridade policial aposentado, tendo como característica marcante à formação de seus homens, o Estado os formou anteriormente. Em sua maioria são policiais aposentados e alguns da ativa que fazem do bico os complementos da renda necessária ao sustento de sua prole. Enquanto isso, o Estado não consegue atender a demanda dos casos do resto da população que sofre a ação delituosa. Não há intervenção dos órgãos de segurança por falta de contingente capaz de chegar a tempo hábil para reprimir e/ou prevenir ou identificar o autor do delito. Por quê? As pesquisas demonstram que não há interesse real, faltam meios que habilitem a atuação dos operadores da segurança enquanto empenhados na sua função pública, todavia, constatou-se que ao contrário, quando o interesse privado custeia os custos, aparecem diversos profissionais, bem intencionados, na proposta de “servir e proteger” quem pode pagar86. Esta triste realidade é conseqüência das “políticas” adotadas e contínuo desmantelamento da segurança pública em nosso país.

Fato recente quando a atuação da Polícia Federal alcançou pessoas distintas da sociedade, discretamente começaram as críticas veladas até de autoridades que “incomodados com a utilização das algemas”, iniciaram discussões na mídia, sob o argumento de estarem defendendo os direitos fundamentais etc., mas a impressão que se tem é que tais argumentos visam proteger da ação policial aqueles que fazem parte das elites dominantes. Ora, não há retórica pior, afinal “você sabe quem você está prendendo”, assim, segue o discurso fácil do casuísmo legal.

Recentemente, a autoridade máxima de nosso país disse à mídia que: os monitoramentos telefônicos da Polícia Federal precisam passar pelo crivo do Ministério Público Federal, representando a sua fala o mesmo que controle de quem a instituição pode monitorar e quem não deverá fazê-lo. Máxima vênia, senhor presidente, a Constituição Federal não admite provas ilícitas – art. 5º, LVI, estabelecendo a presunção de inocência – art. 5º, LVII, bem como o sigilo de correspondência e de comunicação – art.5º, XII, desta forma87, os procedimentos serão autorizados pelo judiciário, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, sobre segredo de justiça, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer. A Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996, regulamenta o inciso XII, parte final do artigo 5º da Constituição Federal, determinando que a interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instruções processual penal, será autorizada pelo Juiz após explanação demonstrando a existência de indícios razoáveis de autoria ou participação em infração penal dos transgressores e a provável participação de quem se investiga.

Será então permitida a autoridade policial à execução dos atos que propiciarão a gravação, podendo requisitar o auxílio aos serviços e técnicos especializados às concessionários de serviços públicos, em seguida, providenciará a transcrição em auto circunstanciado, sempre com prévia ciência do Ministério Público, que poderá acompanhá-la, se entender necessário. Ao final, o juiz competente terá o resumo das operações realizadas, e ao término das diligências, a prova colhida permanecerá em segredo de justiça. Havendo ação penal, será possibilitada ao defensor, a análise de toda a prova colhida para exercer a sua defesa. Ora, máxima vênia, então se alcançou quem não deveria? Como fica o princípio constitucional em que todos são iguais perante a lei? Qual a indignação?

Se os investigados fossem membros das comunidades excluídas, dos aglomerados etc., então a polícia federal poderia monitorar e agir. Ou seja, voltamos à pergunta: qual inimigo? 88 Qual Polícia?

Um parêntese para entender a “hipocrisia dominante”. Quando as informações dos dados cadastrais, principalmente a identificação do titular de linha telefônica, celular ou fixa, se é correntista de referida conta bancária, normalmente o nome e o CPF são apresentados juntamente com o possível número da conta corrente, ou seja, a necessidade premente de identificar e ou confirmar a existência daquele dado, compreenda-se, não se consultou movimentação financeira, se houve conversação, ou seja, não há violação de nenhum dado etc., a negativa das instituições em fornecer às informações solicitadas, sob o argumento legal, da necessidade da ordem judicial é prima facie corretíssima.

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Saliente-se, contudo, que os dados solicitados surgiram durante as investigações criminais que poderão ser feitas nos casos de identificação dos autores e ou partícipes de seqüestro, tráfico de drogas, roubo de carga, tráfico de seres humanos, lavagem de dinheiro, contrabando etc., estando na posse de referida informação, estas serão apresentadas e solicitadas pela autoridade policial, no curso do inquérito policial ao juiz prevento, destinatário de toda persecução penal, após análise dos autos encaminhará ao ministério público para manifestação, e, somente depois, concederá ou não, o monitoramento telefônico ou a quebra do sigilo bancário, supervisionando a correta aplicação da lei, determinando o sigilo do procedimento – comumente as instituições respondem que os dados estão preservados constitucionalmente e serão fornecidos através da autorização judicial, e assim não informam.

No entanto, em total desrespeito às regras da Carta Magma, “quem se dispuser a pagar os valores cobrados”, poderá através da Internet, portanto, ter um serviço “publico” que garante o acesso a informações cadastrais de qualquer cidadão, sem autorização judicial como se vê:

Consulta completa on-line, R$ 14, 90, (por consulta), através do CPF ou CNPJ a quantidade de protestos, cheques sem fundos, pendências e restrições financeiras, dívidas vencidas, ações judiciais, falências e concordata, participação em empresa falida; telefone(s) por CPF mostra até 3 telefone(s)com endereço de instalação; endereço(s) por CPF/CNPJ, endereços relacionados à pessoa ou empresa, veículos, através do CPF/CNPJ ou os dados do veículos através da placa, Renavam e outros; Riskscoring Empresarial. Sistema disponível 24 horas por dia em todo Brasil. 89

Adiante, as regras das consultas explicam como e quais os dados serão fornecidos com os respectivos valores:

Consultas disponibilizadas pela Internet: a consulta completa utiliza o mais atual sistema da Serasa para acesso instantâneo através do CPF ou CNPJ ao maior banco de dados do gênero no Brasil, que reúne, com exclusiva cobertura nacional, informações sobre a quantidade de: protestos, cheques sem fundos, pendências e restrições financeiras, dívidas vencidas, ações judiciais (Executivas, de Busca e Apreensão e de Execução Fiscal da Justiça Federal), falências e concordatas, participação em empresa falida, registro de consultas. Além das informações citadas, o sistema informa se disponível: para pessoa física: grafias do nome, grafias semelhantes com outro CPF, participações societárias, telefones e endereços alternativos relacionados à pessoa; para pessoa jurídica: endereço, natureza jurídica, informações comerciais (última compra, maior compra e maior acúmulo), quadro societário e se os sócios possuem restrições se disponível R$ 14,90 (por consulta).

A consulta de cheques utiliza o sistema ACHEI-Recheque criado pela Serasa, uma das maiores empresas do mundo em análises e informações para decisões de crédito. Essa consulta retorna através do CPF ou CNPJ a quantidade de cheques sem fundos, e caso seja informado os dados do cheque, o sistema informa também se consta no banco de dados como sustado, cancelado, roubado ou extraviado (se disponível), R$ 0,99 (por consulta).

A consulta de pendências utiliza o sistema PEFIN criado pela Serasa. Essa consulta retorna através do CPF ou CNPJ a quantidade de pendências informadas por usuários do sistema (lojas e bancos) R$ 2,20.

A consulta de cheques junto com pendências utiliza o sistema ACHEI-Recheque mais PEFIN criado pela Serasa. Essa consulta retorna através do CPF ou CNPJ a quantidade de cheques sem fundos, quantidade de *pendências* informadas por usuários do sistema (lojas e bancos) e caso seja informado os dados do cheque, o sistema informa também se consta no banco de dados como sustado, cancelado, roubado ou extraviado (se disponível) R$ 2,90(por consulta).

Consulta através do CPF ou CNPJ a quantidade de protestos que constam na base de dados da *Serasa. R$ 9,90 (por consulta).

Mostra até 3 telefone(s) com endereço de instalação relacionados ao CPF informado. É possível que nenhum número seja listado caso estejam bloqueados para divulgação, porém a consulta será cobrada normalmente, R$ 0,75(por consulta).

Mostra endereços e telefones alternativos que possam estar relacionados à pessoa ou empresa. O sistema consulta informações fornecidas por usuários do sistema da Serasa (lojas e bancos). É possível que em alguns casos, nada seja retornado ou que a informação não esteja necessariamente relacionada à pessoa ou empresa consultada, porém a consulta será cobrada normalmente, R$ 6,90 (por consulta).

Mostra o endereço de instalação do telefone. (Somente telefones fixos). É possível que o endereço não apareça caso o telefone esteja bloqueado para divulgação, porém a consulta será cobrada normalmente, R$ 0,75 (por consulta).

Lista: através do CPF ou CNPJ, retorna os dados básicos de até 12 veículos relacionados. Caso existam mais de 12 veículos nenhumas informações será retornada, porém a consulta será cobrada normalmente. Dados: Através da Placa, Renavam, Chassi, Número do Motor ou Número da Caixa de Câmbio, retorna os dados completos do veículo e se possui Alarme/B.O. de Roubo ou Furto, se disponível, R$ 14,90 (por consulta).

Detalhe de anotações: esta consulta pode ser utilizada como complemento da consulta Completa, pois retorna até 99 ocorrências das anotações de Protestos, Ações judiciais, Falências e concordatas, Participação em empresa falida, Restrições e Pendências financeiras, Cheques sem fundos (detalha somente a quantidade de ocorrências por bancos) e Dívidas vencidas, R$ 14,90 (por consulta).

O Credit Riskscoring® Serasa é uma avançada ferramenta estatística, baseada em informações cadastrais e comportamentais da empresa e dos sócios, que classifica instantaneamente e de forma objetiva o risco de crédito de quase a totalidade das empresas brasileiras. Indica a probabilidade da empresa consultada apresentar ocorrências negativas em um horizonte de seis meses. Resultante da combinação de avançadas tecnologias de crédito e de modelagem estatística de dados, o Credit Riskscoring® Serasa baseia-se em informações continuamente atualizadas, definindo a pontuação indicativa do risco de inadimplência, em uma escala de 1 a 1.000 (quanto maior melhor), R$ 39,90 (por consulta). Valores válidos até 31/12/2007 90.

É isto que precisa mudar. A incoerência nas ações da sociedade é que provocam as incontestáveis manifestações de repúdio às políticas existentes. Se houver pagamento pelos serviços, pode-se obter qualquer informação independente de ordem judicial, e pasme, qualquer pessoa, inclusive os infratores etc.

A resposta à pergunta “qual polícia?” Deverá ser respondida sob a ótica de quais tipos penais serão necessários para assegurar a punição de todos transgressores, inclusive os de “colarinho branco”. Quais as novas regras para ação dos operadores de segurança pública, e quem poderá ser apenado? Todos serão iguais perante a lei?91 Observa-se claramente que algumas categorias não pretendem criar leis que lhe assegurem a igualdade, excluem-se das regras criando prerrogativas. É uma forma inteligente de dizer aos demais que a lei existe para os desiguais, demonstrando total desrespeito à Constituição Federal. A participação popular é fundamental para dizer qual ação será punida e como, deverá haver penas alternativas. O vigor penal deverá recair sobre todo aquele que transgredir as normas. A supremacia do direito público sobre o privado regerá o novo paradigma.

Os instrumentos de controle constantes da Carta Magma como vício formal, vício material, controle preventivo e repressivo seria paradoxal se à vontade das classes dominantes prevalecessem sobre as demais. Para uma polícia eficaz é necessário que todos sejam realmente iguais perante a lei. A simplicidade e a certeza de que todos transgressores serão responsabilizados por seus atos, demonstrando não uma sensação de segurança, mas um estado democrático vigente e eficaz.

A polícia não pode arcar com a responsabilidade sozinha de conter a violência. Segurança pública é coisa de sociedade, uma vez que não existe isoladamente. É uma questão política e complexa e não deve ficar limitada apenas à polícia. Antes de propor soluções é preciso que haja concordância de opiniões, principalmente naquilo que se refere aos direitos e garantias fundamentais. Não pode haver retrocessos, por isso, a reflexão sobre práticas anteriores direciona para uma nova realidade. Não se aceitam mais corrupção, tortura e desvio de conduta.

Segurança Pública deve ser entendida como um estado permanente de ordem, pela ausência da desordem, um estado sensitivo coletivo de segurança, tendo a Polícia como um ente ensejador de mudanças sociais, atuando próximo ao povo, como órgão independente dentro de um sistema de Governo Social. Hoje o marketing institucional é a “Polícia Cidadã” 92, e desta maneira, surge como proposta de uma “Polícia Comunitária” 93, atendendo aos anseios da sociedade.

Vamos crer que os organismos policiais consigam atuar eficientemente e todo aquele que delinqüir será conduzido formalmente às cadeias públicas, e na seqüência lógica, o judiciário também terá uma resposta imediata e justa. Haverá lugar para muita gente? Se os mandados de prisão forem cumpridos em sua totalidade, haverá celas suficientes para recolhimento de tantas pessoas? O sistema carcerário não consegue soerguer o cidadão, estando comprovada a falência. Ademais, “jogar” o agente e virar as costas para ele, será apenas criar mais um excluído e revoltado com a sociedade que o pune, transformando-o num ser degradante.

Neste contexto temos por excelência a “orientação” política endossada pelos Estados Unidos quando analisamos e comparamos os mecanismos adotados naquele país:

Essas características distintivas explicam por que, a despeito de a desigualdade social e da insegurança econômica terem aumentado enormemente no curso das três últimas décadas do século XX, o Estado caritativo estadunidense reduziu continuamente seu campo de intervenção e comprimiu seus modestos orçamentos, a fim de satisfazer o explosivo aumento das despesas militares e a redistribuição das riquezas dos assalariados em direção às empresas e as frações afluentes das classes privilegiadas. Essa política chegou a tal ponto que “a guerra contra a pobreza” foi substituída por uma guerra contra os pobres, transformados em bodes expiatórios de todos os grandes males do país, e agora intimados a assumir a responsabilidades por si próprios, sob pena de se verem atacados por uma batelada de medidas punitivas e vexatórias, destinadas, se não a reconduzi-los ao estreito caminho do emprego precário, pelo menos a minorar suas exigências sociais e, por conseguinte, sua carga fiscal.94

Seria simplório atribuir aos “pobres” a responsabilidade do aumento da violência e/ou da criminalidade como um todo. O fator fome não pode ser elemento de avaliação de violência e sim como ausência endêmica do Estado. As políticas sociais “caritativas” estão sendo desmontadas nos países da América Latina através de mecanismos contrários à democracia95 onde se impõe o assalariamento desqualificado aos membros das classes populares. Para os liberais96, o Estado deve abster-se de colocar seu braço secular à disposição de uma ortodoxia – tanto aquela criada e imposta por ele próprio quanto aquela à disposição da qual ele se teria colocado em nome de uma revelação qualquer.

Para um projeto de segurança razoável, não basta apenas investir na formação do operador de segurança pública, é necessário investir na educação, na saúde e oferecer-lhe condições dignas de trabalho, promovendo a redistribuição de rendas, considerando o enriquecimento e a prosperidade de todos. A dignidade deve ser restaurada a todos. Aprimorar o homem para servir ao homem, seu próximo. É preciso refletir através da observação como sujeito de direito o que realmente está acontecendo com a sociedade. Estamos nos aprisionando em condomínios fechados onde existe uma vida própria, o gerente ou gestor tem a responsabilidade “feudal” de cuidar para que os “burgueses” não adentrem em seus domínios. Mas os burgueses a que nos referimos, são aqueles excluídos pela sociedade em guetos e bolsões de miséria.

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Sobre o autor
Ricardo Venâncio de Oliveira da Silva

Delegado de Polícia Federal aposentado - agora no exercício como advogado. Pós-graduado em Segurança Pública e Direitos Humanos e Ciência Policial e Investigação Criminal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Monografia apresentada ao Curso de Pós-gradução em Segurança Pública e Direitos Humanos promovido pela Escola Superior Dom Helder Câmara, em 2007, como requisito parcial para obtenção do título Especialista em Segurança Pública e Direitos Humanos, integrando a Rede Nacional de Altos Estudos em Segurança Pública - RENAESP, sob acompanhamento e financiamento da Secretaria Nacional de Segurança Pública - SENASP, Ministério da Justiça.

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