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Questionamento judicial dos contratos bancários

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O advento do CDC, o posicionamento da doutrina e dos Tribunais de Justiça, de Alçada, e do Superior Tribunal de Justiça, quanto às controvérsias suscitadas sobre as cláusulas que geram excessiva onerosidade, propiciou às pessoas físicas e jurídicas, a possibilidade de ingressarem em juízo, objetivando a revisão dos contratos em curso, bem como, reaver através da Ação de Repetição de Indébito o que pagaram a maior (indevidamente) àquelas instituições financeiras; na mesma esteira, podem ser discutidas as questões que já se encontram na esfera judicial, mesmo na posição de devedor.

As instituições financeiras que, insistentemente, alegavam a inaplicabilidade do CDC sobre os contratos de financiamento, sucumbiram diante da posição do judiciário, que é uníssona quanto ao atrelamento dos contratos bancários às regras restritivas do diploma legal em comento.

Sobreleva ressaltar, que a possibilidade do ajuizamento de ações, que objetivam a readequação dos contratos, encontra guarida em outros diplomas legais, e não somente no CDC. Assim, o regime de capitalização mensal de juros como praticado pelos bancos, é proibido pelo Dec. 22.626/33, mesmo que no âmago do contrato tenha sido acordada, como restou sumulado pelo Supremo Tribunal Federal, através da Súmula 121. A capitalização aparece maquiada sob diversas formas, sendo que, as comumente usadas são: o fator exponencial; a "Tabela Price"; o fator/coeficiente nos contratos de leasing; o Sistema SAC; os juros mensais em contas devedoras; as operações de financiamento encadeadas; e os indexadores unilaterais, tais como Taxa ANBID, CDB e CDI.

Independente das ilegalidades acima (cláusula onerosas, capitalização), ainda é de ser considerado, que, embora o STF tenha se posicionado quanto a necessidade de lei complementar para disciplinar o limite de juros em 12% ao ano, a Constituição Federal recepcionou a Lei nº 1.521/51, que restringe o lucro em 20% sobre a coisa envolvida (captação – CDB).

Infere-se, portanto, que os bancos ao formalizarem os diversos contratos cometeram lesão na "base contratual", posto que não podem auferir lucro com vantagem manifestamente desproporcional (CF 173 § 4º), se comparada com a prestação oposta, ou exageradamente exorbitante (vg: ao captar recursos, o banco paga ao investidor apenas 2%; de outro lado da cadeia econômica, ao firmar um contrato de mútuo, não poderá cobrar a título de remuneração do capital envolvido mais do que 20%, sobre a porcentagem do que foi captado), sob pena de caracterizar a lesão e desproporção quanto às prestações envolvidas. Essa linha de conduta praticada pelo banco, permite ação de revisão de contrato ou repetição de indébito.

E, finalmente, não se pode deixar de enfocar tema de relevância nesses dias de tormenta em que a população brasileira assiste com inquietação, a desvalorização do dólar e para não ser diferente, demissões sucessivas de presidentes do Banco Central do Brasil. Nesse sentido é importante não esquecer a norma contida no artigo 6º, inciso V da Lei 8.078/90 (CDC), que prevê revisão nos contratos quando ocorrem fatos supervenientes, tornando a prestação excessivamente onerosa.

O fato superveniente que a lei se refere é aquele não previsto, alterando abruptamente o valor da prestação em dólar convertido para a moeda real. Como exemplo citamos, que de julho de 1994 até as eleições de outubro de 1998, o governo federal, alardeava que havia acabado com a inflação e a taxa cambial não iria desvalorizar a nossa moeda. Agora, a situação é totalmente diferente do que garantia o governo, portanto, caracterizado está o fato superveniente, autorizador da revisão judicial do contrato, com o fito de substituir a moeda norte-americana pela variação do INPC, para restaurar o equilíbrio entre os contratantes.


PRÁTICAS ABUSIVAS

a) Capitalização de juros: forma de cálculo de juros compostos, em que os juros se integram ao capital e sofrem incidência de nova parcela destes encargos.

b) Cláusula Mandato: Condição em que o financiado outorga uma procuração (mandato) para a instituição financeira ou empresa a ela coligada criar um título de crédito em nome do financiado e seus garantidores, pelo valor que a instituição pretender cobrar. Prática vedada pela Súmula 60 do Superior Tribunal de Justiça.

c) Indexadores alternativos: Possibilidade de escolha unilateral por parte da instituição financeira, do indexador (ou pseudo-indexador)que melhor atenda aos seus interesses.

d) Flutuação de taxas: Possibilidade de majoração periódica das taxas de juros pactuadas em um contrato, sem qualquer interferência do financiado alterando, dessa forma, cláusula essencial do negócio.

e) Comissão de permanência: Prática de cumular essa verba moratória com outros encargos que são excludentes (juros contratuais, multas, honorários, correção, etc). Da mesma forma, em se tratando de taxa de juros, não se admite a cobrança de forma capitalizada como usualmente ocorre.


CARACTERÍSTICA DAS OPERAÇÕES

a) Arrendamento mercantil ou lease back: Nos contratos comuns de leasing, o financiado adquire bens para a implementação de suas atividades produtivas, via financiamento pela instituição financeira, sem dispor, de imediato, da totalidade do capital necessário para adquirir tal bem. No caso do lease back, o financiado desmobiliza seu ativo fixo, aferindo capital de giro para pagamento em longo prazo sem, contudo, deixar de utilizar seu equipamento. As duas grandes vantagens do leasing são a característica de longo prazo da operação e a possibilidade de contabilizar as contraprestações como despesas, o que se traduz em ganho fiscal.

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b) Mútuo: Financiamento usual para capital de giro. Os bancos, atualmente, não operam com essa espécie de contrato em longo prazo, mas, sim, no máximo com 30 ou 31 dias. Com isso, podem renová-los periodicamente, fazendo o encadeamento de uma série de operações, o que lhes permite capitalizar juros.

c) Hot money: Operações de empréstimo de curto prazo (por vezes 2 ou 3 dias), com taxas de juros superiores às normalmente praticadas. Essa operação visa sanar, em caráter imediato, problemas de fluxo de caixa.

d) Cédulas de Crédito rural, industrial ou comercial: São operações especiais voltadas ao fomento de atividades tidas como imprescindíveis à produção e ao desenvolvimento harmonioso do País. Integram o rol das exceções, até porque as taxas de juros deveriam ser privilegiadas. A grande desvantagem, aqui, é que a capitalização de juros é permitida, desde que expressamente convencionada em contrato.

e) Operações de Recursos Externos ("Operação 63") Há distinção entre operações com recursos externos (repasses) e operações em que a instituição financeira, no Brasil, capta recursos no exterior e empresta a diversos clientes no País. Neste último caso, o banco é o devedor no exterior, não podendo, portanto, repassar (cobrar) os juros nem o Imposto de Renda incidente na operação, bem como indexar o valor do saldo pela variação cambial. Os encargos moratórios nessas operações não podem ultrapassar a multa de 10% a partir do ajuizamento da ação, e a majoração dos juros contratuais na ordem de 1% ao ano.

f) Conta Garantida: O banco faz cobrança automática dos juros em conta-corrente sobre os saldos devedores diários, realizando débitos sem a autorização prévia do cliente. Os juros cobrados incorporam-se ao saldo devedor, ocorrendo, também nesse caso, a capitalização.

g) Descontos de títulos: Desconto direto com taxas de juros elevadas. Em relação às duplicatas, o cliente fica na expectativa de o sacado pagar o título.

h) Abertura de crédito: Essa forma de obtenção de capital de giro resume-se a saques diretos na conta-corrente. A operação tem prazo superior ao mútuo. O grande risco para o tomador de empréstimo é que ele não tem controle sobre as oscilações das taxas de juros cobradas pelo banco, perdendo o controle sobre o volume de seu débito, o que o coloca em uma situação bastante vulnerável.

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Sobre os autores
Fernando Castelo

advogado em São Paulo

Soraya Abdalla Santos

advogada em São Paulo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CASTELO, Fernando ; SANTOS, Soraya Abdalla. Questionamento judicial dos contratos bancários. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 29, 1 mar. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/722. Acesso em: 19 abr. 2024.

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