Artigo Destaque dos editores

Aborto: criminalizar ou legalizar?

Exibindo página 4 de 4
11/04/2019 às 17:35
Leia nesta página:

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo buscou demostrar a tratativa do tema do aborto no Brasil e em outras partes do mundo. Ao verificar as hipóteses permissivas do aborto no Brasil, percebe-se que a legislação brasileira é bem rígida a respeito da interrupção da gravidez intencional, principalmente quando há auxílio de um terceiro. Em outros países, o Estado não intervém na escolha e na liberdade da mulher em continuar uma gravidez indesejada.

Na realidade brasileira, com a aplicação do Código Penal no que tange à criminalização do aborto, analisa-se que o legislador deu prioridade à vida intrauterina que está em desenvolvimento, levando em conta a saúde da mãe somente quando a gravidez afetar sua saúde, seja ela física (no caso de risco de morte) ou psíquica (quando a gravidez resultar de estupro).

Como o direito deve acompanhar a realidade do país que se modifica diariamente, o STF teve entendimento que, nos casos em que o feto for anencefálico, isto é, tiver alguma má formação no cérebro, a interrupção da gravidez é legalmente constitucional e pode ser realizada em um hospital. Isto se justifica pelo fato das complicações para a gestante em ter uma gravidez cujo feto está à anencefalia, além de a criança nascer sem expectativa de viver.

Na pesquisa realizada, verifica-se que o número de casos de abortos no Brasil que se tem registro aumentou, bem como as mortes ocorridas em complicações no momento em que a gravidez é interrompida. Pela falta de legislação que legalize o aborto somente pela vontade da gestante, as mesmas procuram em remédios e em procedimentos cirúrgicos a interrupção da gravidez, muitas vezes dirigindo-se a clínicas clandestinas de aborto, correndo risco de morte.

Entende-se também que os princípios constitucionais entram em conflito quando se trata do aborto. A liberdade de escolha da mulher em querer ou não ter um filho de uma gravidez indesejada choca-se com o direito de viver que o feto tem. Alguns doutrinadores entendem que a nossa legislação é limitada ao prever poucas hipóteses legais para o aborto, visto que os casos de aborto por vontade da gestante continuam a existir, porém o índice de mortalidade destas mulheres é maior por não terem o atendimento adequado. Outros doutrinadores entendem que com tantos métodos contraceptivos, uma gravidez é possível de ser evitada, portanto não justifica a legalização do aborto induzido.

Os valores morais, principalmente aqueles incorporados à legislação pela Igreja, ainda são determinantes nas decisões dos Tribunais Superiores Brasileiros. Porém, recentemente, o STF já elaborou parecer de que é constitucional o caso de aborto em caso de feto anencefálico, mesmo não tendo dispositivo legal na constituição ou no código penal que tipifique tal ato. Devido a isto, estes tribunais têm tratado com rigor os casos em que há o aborto provocado, principalmente quando se trata de associação para a prática deste ato, como nos casos em clínicas clandestinas de aborto.

É importante ressaltar que a vida intrauterina que ainda está em formação, isto é, pode ser que se desenvolva, mas por algum motivo a criança não venha a nascer com vida, não deva possuir mais direitos que a mulher que tem uma vida e uma pós-vida após o nascimento de uma criança. Apesar de o Brasil ser um país genericamente esclarecido a respeito de métodos contraceptivos que evitam a gravidez, não existe 100% de eficácia em nenhum anticoncepcional, muitas vezes a fecundação ocorre contra a vontade dos pais, acarretando muitos problemas para ambos, sejam ele psicológicos ou financeiros.


REFERÊNCIAS 

ARRAES, Jarid. No Brasil, o aborto é crime com pena de morte. Revista Fórum, coluna Questão de Gênero, Setembro de 2014. Disponível em: http://www.revistaforum.com.br/questaodegenero/2014/09/10/brasil-o-aborto-e-crime-com-pena-de-morte/. Acesso em: 17 nov. 2015 

BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional contemporâneo: Os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 4ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

BRASIL. Justiça começa audiência de réus acusados de atuar em clínicas de aborto clandestinas. Poder Judiciário do Rio de Janeiro, 27 abril 2015. Disponível em: http://www.tjrj.jus.br/ca/web/guest/home/-/noticias/visualizar/10605. Acesso em: 17 nov. 2015.

BRASIL. Médico acusado de praticar aborto no Rio continua em prisão preventiva. Brasília: Supremo Tribunal de Justiça, 2015. Disponível em: http://www.stj.jus.br/sites/STJ/Print/pt_BR/noticias/noticias/M%C3%A9dico-acusado-de-praticar-aborto-no-Rio-continua-em-pris%C3%A3o-preventiva. Acesso em: 17 nov. 2015.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte especial 2. 12ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

CASTRO, Carolina Oliveira; TINOCO, Dandara; ARAÚJO, Vera. Lei contra o aborto só puniu quatro gestantes em 20 estados. Jornal O Globo, 19 set. 2014. Disponível em: http://oglobo.globo.com/brasil/lei-contra-aborto-so-puniu-quatro-gestantes-em-20-estados-13982017. Acesso em: 15 nov. 2015

CASTRO, Fábio de. Número de abortos no Brasil teve redução de 26% nos últimos 20 anos, segundo estudo. Jornal O Estado de São Paulo, 21 ago. 2015. Disponível em: http://ciencia.estadao.com.br/noticias/geral,brasil-teve-queda-de-26-no-numero-de-abortos-nos-ultimos-20-anos--diz-estudo,1748631. Acesso em: 13 nov. 2015

COMISSÃO DOS DIREITOS HUMANOS DA ORDEM DOS ADVOGADOS DE PORTUGAL. Direitos Humanos: Cidadania e Igualdade. São João do Estoril: Princípia, 2006. E-book disponível em: https://books.google.com.br/books?id=kbN6480PqWQC&pg=PA38&dq=criminaliza%C3%A7%C3%A3o+do+aborto&hl=pt-BR&sa=X&ved=0CCQQ6AEwAmoVChMIoti0_pGOyQIVEMpjCh0qmwBp#v=onepage&q=criminaliza%C3%A7%C3%A3o%20do%20aborto&f=false. Acesso em: 13 nov. 2015

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

DINIZ, Debora; MEDEIROS, Marcelo. Aborto no Brasil: uma pesquisa domiciliar com técnica de urna. Brasília: Anis (Instituto Brasileiro de Bioética, Direitos Humanos e Gênero), 2013. Disponível em: http://www.apublica.org/wp-content/uploads/2013/09/PNA.pdf. Acesso em: 15 nov. 2015.

GALVÃO NETO, Fernando; LUZ FILHO, Taciano Holanda da. Análise jurídico-teórica da decisão do STF sobre o aborto de feto anencéfalo. Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 107, dez 2012. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=12615>. Acesso em: 18 nov. 2015.

KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6ª ed. - São Paulo: Martins Fontes, 1998.

NASCIMENTO FILHO, João Batista do. A dignidade da pessoa humana e a condição feminina um olhar sobre a descriminalização do aborto. Curitiba: Juruá, 2013.

NITAHARA, Akemi. Aborto é problema de saúde pública, alerta Anistia Internacional. Portal EBC Agência Brasil, 24 de set. 2014. Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2014-09/aborto-e-problema-de-saude-publica-alerta-anistia-internacional-e. Acesso em: 17 nov. 2015.

NOLASCO, Lincoln. Aborto: aspectos polêmicos, anencefalia e descriminalização. Portal Eletrônico Conteúdo Jurídico, 30 maio 2012. Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,aborto-aspectos-polemicos-anencefalia-e-descriminalizacao,37270.html. Acesso em: 14 nov. 2015.

PEREIRA, Thiago Soares; SILVA, Matheus Passos. O princípio da dignidade da pessoa humana: a autonomia da mulher frente à ampliação das hipóteses de aborto ilegal. Brasília: Vestnik, 2015. E-book disponível em: https://pensarpoliticamente.files.wordpress.com/2014/02/dignidade-aborto.pdf. Acesso em: 16 nov. 2015.

RIBEIRO, Marina. Papa Francisco permite perdão do aborto por todos os padres no Ano da Misericórdia. Portal Eletrônico Revista Época, 01 set. 2015. Disponível em: http://epoca.globo.com/tempo/noticia/2015/09/papa-francisco-permite-perdao-do-aborto-por-todos-os-padres-no-ano-da-misericordia.html. Acesso em: 16 nov. 2015

ROSA, Emanuel Motta da. O crime de aborto e o tratamento penal. Publicado em: 2014. Disponível em: http://emanuelmotta.jusbrasil.com.br/artigos/139263291/o-crime-de-aborto-e-o-tratamento-penal. Acesso em: 16 nov. 2015.

SARMENTO, Daniel. Legalização do aborto e Constituição. Mundo Jurídico, 2005. Disponível em: http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/publicacoes/direitos-sexuais-e-reprodutivos/aborto/legalizacao_do_aborto_e_constituicao_daniel_sarmento.pdf. Acesso em: 16 nov. 2015.

SOUZA, Jean Frederick Silva e; GOMES, Sheyla Polliana Macedo. Anencefalia: aborto ilegal ou inexigibilidade de conduta diversa? Revista Direito e Liberdade - ESMARN - v. 12, n. 2, p. 105 –124 – jul/dez 2010. Disponível em: http://www.esmarn.tjrn.jus.br/revistas/index.php/revista_direito_e_liberdade/article/view/364/390. Acesso em: 14 nov. 2015.

VIANNA, Túlio. Um outro direito. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014. Disponível em: https://books.google.com.br/books?id=mFKDCgAAQBAJ&pg=PA40&dq=criminaliza%C3%A7%C3%A3o+do+aborto&hl=pt-BR&sa=X&redir_esc=y#v=onepage&q=criminaliza%C3%A7%C3%A3o%20do%20aborto&f=false

__________. STF concede liberdade a três de quadrilha que fez aborto em Jandira. Portal eletrônico G1, 14 jan. 2015. Disponível em: http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2015/01/stf-concede-liberdade-tres-de-quadrilha-que-fez-aborto-em-jandira.html. Acesso em: 18 nov. 2015.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Victor Hugo Gomes. Aborto: criminalizar ou legalizar?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5762, 11 abr. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/72272. Acesso em: 19 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos