Disso tudo resulta que, em primeiro lugar, o fato de o magistrado ter ingressado na carreira quando ainda era lícito acrescer aos vencimentos as "vantagens" do artigo 65 da LOMAN não lhe garante, indefinidamente, o direito a esse regime remuneratório. É dado ao legislador alterar ― até visceralmente, como foi o caso ― esse regime e, com isso, frustrar direitos subjetivos e expectativas de direito que em tese dimanariam do "factum præterito" em sentido amplo (= o ingresso nos quadros do Poder Judiciário). Ou, perfilhando uma tese muito cara ao Excelso Pretório (que, todavia, deve ser acolhida "cum grano salis", como já pontuamos noutro local 66), não há direito adquirido a certo regime jurídico 67.
Em segundo lugar, impende temperar a primeira premissa e pontuar, com HELY LOPES MEIRELLES que, " desde que não haja redução, não é vedada a alteração de critérios legais de fixação do valor da remuneração ou do regime legal de cálculo ou reajuste de vencimentos ou vantagens funcionais " 68. Noutras palavras, se o regime remuneratório não se incorpora indefinidamente ao patrimônio do servidor, as vantagens adquiridas durante a sua vigência são a ele incorporadas, por força dos "facta præterita" que determinaram o direito a cada uma delas (in casu, os qüinqüênios trabalhados desde o ingresso no serviço público ou na advocacia, até o máximo de sete) 69. Negar essa blindagem e, sem mais, suprimir os ATS conquistados equivaleria a ignorar aquelas vicissitudes (os qüinqüênios trabalhados), como se nunca houvessem existido.
Dissemos alhures (tópico 3) que as restrições aos efeitos futuros do fato jurídico devem ser ponderadas, de modo a não sacrificar por inteiro as expectativas e a condição atual de vida dos interessados, ainda que tais restrições efetivamente se imponham, a bem do interesse público. Há que mediar o conflito, que contrapõe os direitos adquiridos ao interesse geral na moralização da função pública, recorrendo ao princípio da proporcionalidade 70. E a sua aplicação, ao menos nessa matéria, deixa pouca margem às dúvidas de concreção: suprime-se o direito futuro à aquisição de novos adicionais e recusam-se quaisquer efeitos aos "facta pendentia", mas garante-se o direito à percepção continuada dos adicionais já pagos, devidos ou creditados (decorrentes de "facta præterita"), até o limite constitucional inflexível do artigo 37, XI, da CRFB (in casu, o subsídio mensal dos Ministros do STF) 71. À mesma equação conduz a análise das limitações concretas à eficácia imediata da Lei n. 11.143/2005 (inclusive no que tange aos efeitos do artigo 37, XI, e 39, §4º, da CRFB), a saber, a incolumidade essencial do direito adquirido (in abstracto e in concreto) e a garantia da irredutibilidade remuneratória. Do contrário, tal como demonstrado supra, interpreta-se a norma do artigo 39, §4º, da CRFB em contrariedade àquela do artigo 5º, XXXVI, da mesma Carta (e, entre ambas, essa última certamente há de prevalecer). Mas, para além disso, sobrevaloriza-se intransigentemente o princípio da eficácia imediata da lei, sem harmonizá-lo com o princípio da irretroatividade, que antes é tendencialmente debelado do sistema 72 ― quando a rigor foi esse, e não aquele, que mereceu privilégios na lavra do constituinte originário.
5. Conclusões
À guisa de conclusão, recapitulam-se as ilações fundamentais deste parecer e infere-se como segue.
(a) O artigo 5º, XXXVI, da CRFB consagrou o direito adquirido como garantia individual da pessoa, o que lhe confere o caráter de cláusula pétrea constitucional (artigo 60, §4º, IV), inderrogável por obra do Poder Constituinte derivado e tanto menos por força de lei ordinária. Essa garantia alcança não apenas o instituto do direito adquirido (direito adquirido in abstracto), como também os direitos concretamente adquiridos, nos termos do artigo 6º, §2º, da LICC (direitos adquiridos in concreto).
(b) A concepção de direito adquirido do artigo 6º, §2º, da LICC é tributária das doutrinas européias desenvolvidas a esse respeito na segunda metade do século XIX, à luz das quais o preceito deve ser interpretado, inclusive para fins de delimitação do âmbito de alcance da garantia constitucional do artigo 5º, XXXVI.
(c) Acorrendo às clássicas descrições analíticas do direito adquirido (GABBA), reconhecem-se no direito à gratificação por qüinqüênios completos antes de 27.07.2005 todos os elementos que configuram a incorporação de um direito subjetivo ao patrimônio jurídico da pessoa (conseqüência de fato idôneo a produzir o direito, atuação da lei do tempo no qual o fato se consumou, possibilidade jurídica de exercício imediato, impossibilidade factual de fruição integral do direito antes da atuação da lex nova, destinação legislativa a um determinado e vantajoso efeito à pessoa). É, pois, direito adquirido na acepção legal (artigo 6º, §2º, da LICC) e na acepção doutrinária universal.
(d) Dada a sua condição de direito adquirido in concreto, o direito à gratificação por qüinqüênios completos antes de 27.07.2005 não pode ser extinto ou menoscabado pela lex nova, provenha do legislador ordinário ou do exercício do Poder Constituinte derivado, sob pena de violação à cláusula do artigo 5º, XXXVI, da CRFB.
(e) O instituto do direito adquirido não está universalmente consagrado nas Constituições democráticas, em face da sua volatilidade conceitual. Nos Estados de Direito que não contemplam a figura, os direitos derivados de "facta præterita" escudam-se no princípio da irretroatividade da lei.
(f) Ao princípio da irretroatividade contrapõe-se o princípio da eficácia imediata da lei. A tensão entre ambos deve ser mediada pelo princípio (instrumental) da proporcionalidade. Ainda que se recuse validade aos argumentos estribados na tese do direito adquirido, o princípio da eficácia imediata das fontes encontra limites no "minimum" jurídico das vicissitudes consumadas ("facta præterita") e nas fontes normativas de atuação paralela. Na espécie, uma interpretação do artigo 39, §4º, da CRFB e/ou da Lei n. 11.143/2005 que conduza à supressão, sem mais, dos adicionais de tempo de serviço por qüinqüênios já completos configuraria a supressão daquele "minimum", apagando a vicissitude do mundo jurídico, e antagonizaria o comando de uma fonte paralela superior, a saber, o artigo 95, III, da CRFB.
(g) O elemento teleológico (função de garantia da independência do Poder Judiciário e de seus órgãos) e o elemento histórico (extensão, pelo Decreto-lei n. 2.019/83, da irredutibilidade remuneratória da Constituição de 1967 às gratificações por qüinqüênios), aliados ao padrão aritmético da Lei n. 11.143/2005 para as gratificações mensais dos Juízes Eleitorais e à própria jurisprudência recente do STF, conduzem à interpretação extensiva das expressões "vencimentos" e "subsídios" (respectivamente, artigo 32 da LOMAN e artigo 95, III, da CRFB), para abranger também as vantagens individuais não-temporárias (como o ATS), se existentes.
(h) A entrada em vigor da Lei n.11.143/2005 e a concessão de plena eficácia à norma do artigo 39, §4º, da CRFB não têm o condão de prejudicar as gratificações por qüinqüênio já incorporadas, que devem ser estabilizadas como vantagens pessoais inalteráveis no seu "quantum" e percebidas por toda a carreira do magistrado como parcela autônoma irredutível, inconfundível com os subsídios mensais. Essa incorporação encontra seu único limite global no teto remuneratório do serviço público (artigo 37, XI, da CRFB), dado por razões de ordem pública. Assim, no âmbito federal, a soma dos subsídios com as vantagens pessoais incorporadas (notadamente o ATS) não poderá exceder o subsídio mensal do Ministro do Supremo Tribunal Federal, atualmente dado pelo artigo 1º da Lei n. 11.143/2005.
(i) A não ser assim, transigindo com as deficiências orçamentárias do Estado, haveria, quando menos, que se preservar as gratificações incorporadas até a absorção por futuros reajustes (artigo 37, X, da CRFB), repristinando o sentido da norma do artigo 145 da LOMAN. Por essa via, se bem que não preservado o direito em todas as suas dimensões, tampouco se lhe tisnaria a essência.
Notas
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Artigo 37, §11: "Não serão computadas, para efeito dos limites remuneratórios de que trata o inciso XI do caput deste artigo, as parcelas de caráter indenizatório previstas em lei" (incluído pela EC n. 47, de 05.07.2005).
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Cfr. Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, 30ª ed., São Paulo, Malheiros, 2005, p.473 (g.n.) ― referindo, em geral, os adicionais por tempo de serviço do funcionalismo público, que tiveram origem na Lei de 14.10.1827, interpretada pelo Aviso Imperial n. 35, de 10.02.1854.
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Cfr. STF, RE 103.991/DF, rel. Min. RAFAEL MAYER, TP, 28.03.1985, in DJ 10.05.1985, p.6856.
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Para a diferença entre lei interpretativa e lei concretizadora, cfr., infra, a nota n. 60.
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Esse regime findaria com o advento da Constituição de 1988, cujo artigo 37, XIV vedou, já na sua redação original, a incidência de adicionais sobre adicionais de mesma natureza: "os acréscimos pecuniários percebidos por servidor público não serão computados nem acumulados, para fins de concessão de acréscimos ulteriores, sob o mesmo título ou idêntico fundamento". Sobrevindo a EC n. 19/98, o inciso XIV passou a dispor apenas que "os acréscimos pecuniários percebidos por servidor público não serão computados nem acumulados para fins de concessão de acréscimos ulteriores", estendendo o alcance da vedação constitucional, que não se cinge mais aos acréscimos de "mesmo título ou idêntico fundamento".
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Cfr., por todos, César Augusto Mimoso Ruiz Abreu, "Adicional por Tempo de Serviço dos Magistrados em face da LOMAN: Legitimidade e legalidade do adicional trienal", in Centro de Estudos Jurídicos/Poder Judiciário de Santa Catarina (Doutrina), março/1995 (disponível em https://www.tj.sc.gov.br/cejur/doutrina/adicional.htm, acesso em 10.08.2005).
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O que não é propriamente verdadeiro. Cfr., por todos, Régis Fernandes de Oliveira, Estevão Horvath, Teresa Cristina Castrucci Tambasco, Manual de Direito Financeiro, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1993, pp.25-26.
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Nesse sentido, o Excelso Pretório entendeu, em 1983, que o artigo 1º do Decreto-lei n. 2.019/83 aplicar-se-ia apenas aos magistrados da União. Confira-se: REPRESENTAÇÃO. INTERPRETAÇÃO DE LEI EM TESE. REPRESENTAÇÃO CONHECIDA PARA ADOTAR-SE O ENTENDIMENTO DE QUE O ART. 1º DO DECRETO-LEI N. 2.019, DE 28.03.83, SE APLICA TÃO-SOMENTE AOS MAGISTRADOS REMUNERADOS PELOS COFRES DA UNIÃO, ENQUANTO QUE O ART. 2º DO MESMO DECRETO-LEI INCIDE SOBRE TODOS OS MAGISTRADOS, FEDERAIS OU ESTADUAIS, DE QUALQUER INSTÂNCIA (STF, Rp 1.155/DF, Min. SOARES MUNOZ, TP, 09.11.1983, in DJ 16.12.1983, p.20.117 ― g.n.). Mais recentemente, confira-se: "ADVOCACIA - CÔMPUTO - MAGISTRATURA ESTADUAL - REGÊNCIA. Os parâmetros a serem observados no pagamento da gratificação por tempo de serviço, relativamente à magistratura estadual, hão de estar previstos em diploma local, observado o limite fixado no inciso VIII do artigo 65 da Lei Complementar nº 35/79 (LOMAN). Descabe a evocação de lei federal no que computado o tempo de advocacia para efeito de qüinqüênios (Decreto-Lei nº 2.019/83)" (STF, RE 140.095-1, rel. Min. MARCO AURÉLIO, in DJ 08.11.1996 ― g.n.). Para a nossa divergência, leia-se a seguir.
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Também nesse caso, emergiram dúvidas quanto à aplicabilidade da lei aos juízes do Poder Judiciário dos Estados. Pugnando pela inaplicabilidade, ao argumento de que "essa lei (Lei n. 7.721/89) é de exclusivo interesse da União e seus magistrados, sem qualquer vinculação com a LOMAN, e aplicabilidade nacional", cfr. Ruiz Abreu, "Adicional por Tempo de Serviço…", loc. cit. Para a nossa divergência, leia-se a seguir.
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Sobre a distinção entre lei nacional e lei federal, que acolhemos, cfr. Régis Fernandes de Oliveria et. al., op.cit., p.21: "(...) não se pode esquecer a existência de leis nacionais, ou seja, as que, expedidas pelo Congresso Nacional, valem para todo território nacional, alcançando todas as pessoas que neles estejam e são de cumprimento obrigatório pelos Estados e Municípios e Distrito Federal e Territórios (caso do Código Civil, do Código de Processo Civil, p ex.). Ao lado delas existem as leis federais. Editadas pela mesma Casa de Leis, apenas alcançam as pessoas vinculadas à União, sem vínculo, portanto, para as demais entidades federadas. O Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União, p. ex., é lei federal ["stricto sensu"], ou seja, tem seu âmbito de incidência limitado àqueles que mantêm vínculo funcional estatutário com a União. Não alcançam qualquer outro servidor público. Como ensina Kelsen, o âmbito espacial de validade e o âmbito pessoal são diferentes".
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Em sentido diverso, cfr. Ruiz Abreu, loc.cit.
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Nesse sentido, quanto aos direitos funcionais, cfr. o acórdão STF de 23.08.1995: "Perante a enumeração taxativa do art. 69. da Lei Orgânica da Magistratura (Lei Complementar n. 35/79), ficaram revogadas as leis estaduais concessivas do direito de licença-prêmio ou especial aos magistrados, aos quais, igualmente, não se aplicam as normas que confiram esse mesmo direito aos servidores públicos em geral" (STF, AO 155-RS, rel. Min. Octávio Gallotti, TP, in DJ 10.11.1995 e RTJ 160/379). Já quanto às vantagens pecuniárias, afastando o direito à gratificação de tempo de serviço por anuênios, cfr., por todos, AO 395/PR, Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, TP, 13.05.2002, in DJ 02.08.2002, p.58. Com relação a essas vantagens, a própria LOMAN é taxativa em seu artigo 65, §2º: "É vedada a concessão de adicionais ou vantagens pecuniárias não previstas na presente lei, bem como em bases e limites superiores aos nela fixados" (g.n.). Na dicção de GOMES DA CRUZ, "o legislador preocupou-se com as disparidades de adiconais e gratificações, principalmente nos diversos Estados da Federação, e tentou contê-los, finalidade que teve, também, seu art. 145, que expressamente reconhece a existência de tais disparidades, quanto ao tipo de vantagem pecuniária ou quanto ao seu percentual excedente do disposto no artigo ora comentado" (José Raimundo Gomes da Cruz, Lei Orgânica da Magistratura Nacional Interpretada, São Paulo, Oliveira Mendes, 1998, p.66).
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Como tampouco o atual Código Civil português, de 1966, reproduziu a expressão, que entretanto constava do artigo 8º do codex anterior (Código de SEABRA). Justificando essa supressão histórica, OLIVEIRA ASCENSÃO observa que "os autores antigos explicam o princípio da não retroactividade apelando para o conceito dos direitos adquiridos", mas "com o tempo a teoria dos direitos adquiridos passou a ser objecto de numerosas críticas ", havendo sobretudo a notar que "a teoria é insuficiente como critério de distinção, pois há numerosas situações que não recebem nenhum esclarecimento desta noção. A distinçào entre direito adquirido e mera expectativa é muito difícil de traçar. Os autores acabam por chamar expectativas a umas situações e direitos a outras consoante pretendem ou não a aplicação da nova lei, o que representa a inversão do princípio. O facto demonstra que o «direito adquirido» é insuficiente como critério fundamental" (José de Oliveira Ascensão, O Direito: Introdução e Teoria Geral, 13ª ed., Coimbra, Almedina, 2005, p.556 ― g.n.). Mesma impressão ― a de uso oportunista e anti-científico do conceito ― se percebe na obra de PLANIOL, embora os "droits acquis" tenham previsão no Code Civil: "Elle n’est qu’un moyen commode d’affirmer la solution. Les arrêts répètent à l’envi que la loi nouvelle ne peut toucher aux droits acquis; mais quand on tente de dégager de l’ensemble de ces arrêts une notion générale du droit acquis, on constate que c’est tout simplesment le droit que nie peut pas être atteint par la lou nouvelle. Selon l’observation de M. GÉNY, […] «dans nombre de cas, la solution juste est acquise par sentiment intuitif plus que par raisonnement»" (Marcel Planiol, Traité Élémentaire de Droit Civil, Georges Ripert (rev. et compl.), 4ª ed., Paris, Librairie Générale de Droit et de Jurisprudence, 1948, t. I, p.110 ― g.n.). O primeiro autor citado ainda critica o texto do artigo 6º, §2º, da LICC, aduzindo que "é um critério interessante, mas não está em condições de sobrepujar todas as críticas que vimos serem dirigidas à teoria dos direitos adquiridos. Nomeadamente, os vários «direitos», como se costuma dizer, que constituem o conteúdo da propriedade, poderão ser afastados pela lei nova, não obstante susceptíveis de ter sido exercidos no domínio da lei antiga, se o proprietário o tivesse querido" (José de Oliveira Ascensão, O Direito…, p.557, nota n. 893. ― g.n.). De nossa parte, basta dizer que, bom ou não o critério, " legem habemus ": é com ele que devemos lidar.
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Hely Lopes Meirelles, op.cit., pp.494-495 (g.n.).
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Manoel Gonçalves Ferreira Filho, Aspectos do Direito Constitucional Contemporâneo, São Paulo, Saraiva, 2003, pp.112 e 117 (g.n.).
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Idem, p. 118.
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Com efeito, "pode (...) toda norma constitucional, inclusive a norma derivada, restringir os efeitos futuros de «facta pendentia». (...) Neste último caso, a restrição tem de respeitar os princípios inerentes a toda restrição de direitos fundamentais, mormente os de razoabilidade e proporcionalidade" (idem, pp. 118. e 125).
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Cfr., por todos, Maria Helena Diniz, Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretada, São Paulo, Saraiva, 1994, pp.180 e ss.
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C. Aubry, F. C. Rau, Cours de droit civil français, 5ª ed., Paris, M. Bartin, 1897, t. I, § 30, p.101. É, com efeito, o texto do artigo 2º do Code Civil francês: "La loi ne dispose que pour l’avenir: elle n’a pás d’effect rétroactif". É isso que está em suma consagrado no artigo 5º, XXXVI, da CRFB, consoante o escólio de FERREIRA FILHO, supra.
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Op.cit., pp.102-103.
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C. F. Gabba, Retroatività delle Leggi, 3. ed., Torino, Unione Tipografico-Editrice, 1891, v. I, p.191.
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Quanto à natureza desse "tempo de serviço", cfr., supra, o tópico 2.
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Exceto nos casos de mora imputável ao servidor (como, e.g., nos casos em que o juiz recém-admitido deixasse de informar, de imediato, o tempo de serviço anterior no serviço público ou na advocacia).
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A inaplicabilidade do artigo 37, XI, da CRFB ― e, por conseqüência, do artigo 39, §4º, da CRFB ―, antes da fixação legal dos subsídios dos ministros do STF pela lei referida no artigo 48, X, foi reconhecida pelo STF em sucessivas oportunidades. Confira-se, por todos: "CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MAGISTRADO. REMUNERAÇÃO: TETO. VANTAGEM PESSOAL: ADICIONAL POR TEMPO DE SERVIÇO. Lei 11.564, de 1998, do Estado de Pernambuco. C.F., art. 37, XI, art. 48, XV. EC 19/98. I. - Enquanto não editada a lei referida no inciso XV do art. 48, acrescentado pela EC 19/98, não tem aplicação o sistema instituído pelo inciso XI do artigo 37, da C.F., redação da EC 19/98. Precedentes do STF. II. - Não inclusão, no teto da remuneração, da vantagem pessoal do adicional por tempo de serviço. III. - Inconstitucionalidade da Lei 11.564/98, do Estado de Pernambuco, que dispõe sobre a fixação de subsídio mensal dos membros do Poder Judiciário de Pernambuco. IV. - Mandado de segurança indeferido" (AO 864/PE, Ação Originária, rel. Min. CARLOS VELLOSO, 19.05.2004, Tribunal Pleno, in DJ 12.11.2004, p.05 ― g.n.).
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Cfr., por todos, Pedro Manuel de Melo Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil, 2ª ed., Coimbra, Almedina, 2003, p.687: "Os direitos subjectivos podem ser inatos ou adquiridos, e a sua constituição pode ser originária ou derivada".
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C. F. Gabba, op.cit., p.207 (g.n.).
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Idem, p.210 (g.n.).
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Cfr., infra,a nota n. 67.
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Cfr., a propósito, Gomes da Cruz, op.cit., p.65: "Temos aqui a vantagem pecuniária pelo tempo de serviço do magistrado. Além de incentivo, ela funciona como recompensa pela persistência no exercício do cargo " (g.n.).
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Nesse sentido, cfr., por todos, Maria Helena Diniz, op.cit., pp.182-183.
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Nos termos do artigo 6º da Lei: "Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação". A publicação deu-se em 27.07.2005, no Diário Oficial da União. Quem completou o qüinqüênio no dia 27.07.2005 tecnicamente não adquiriu o direito à parcela.
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"A contrario sensu", se implementada a condição temporal, as gratificações adicionais haveriam de ser pagas segundo a lei vigente à época em que se completou o tempo necessário.
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Reza o artikel 19, 1, da Grundgesetz für die Bundesrepublik Deutschland (GG): "Soweit nach diesem Grundgesetz ein Grundrecht durch Gesetz oder auf Grund eines Gesetzes eingeschränkt werden kann, muß das Gesetz allgemein und nicht nur für den Einzelfall gelten. Außerdem muß das Gesetz das Grundrecht unter Angabe des Artikels nennen" ("Quando, de acordo com a presente Lei Fundamental, um direito fundamental seja restringido, por ou em virtude de uma lei, a lei deverá ter aplicação geral e não só a um caso individual. Ademais, a lei deverá especificar o direito fundamental e o oportuno artigo"). Nada obstante, dispõe o artikel 19, 2: " In keinem Falle darf ein Grundrecht in seinem Wesensgehalt angetastet werden " ("Em nenhum caso, a essência de um direito fundamental poderá ser tocada").
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Reza o artigo 18º, 3, da Constituição da República Portuguesa: "As leis restritivas de direitos, liberdades e garantias têm de revestir carácter geral e abstracto e não podem ter efeito retroactivo nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais". Nada obstante, dispõe o n. 2: "A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos " (g.n.).
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Cfr. Friedrich Karl von Savigny, Traité de Droit Romain, Paris, Livrarie de Firmie Didat Frères, Fils et Cie, 1860, t. VII, §§ 390 a 400.
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Cfr. Ludwig Enneccerus, Theodor Kipp, Martín Wolff, Tratado de Derecho Civil, trad. Blas Pérez Gonzáles y José Alguer, Barcelona, Bosch, 1934, t. I (Parte General), pp.232-250.
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Cfr. Marcel Planiol, Traité Elémentaire de Droit Civil, pp.111-112.
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F. K. Savigny, op.cit., § 398.
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Marcel Planiol, op.cit., p.113.
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Criticando a concepção de SAVIGNY e de BONNECASE (entre outros), PLANIOL escreveu: "La modification immédiate de la substance des droits préexistantes ou de l’aménagement des situations juridiques préétablies, et à plus fort raison, leur supression, ont été considérées comme un effet rétroactif de la loi nouvelle […]. C’est un erreur certaine. La loi ne garantit nullement l’exercise indéfini des droits qu’elle sanctionne non plus que le maintien indéfini des situations juridiques q’elle crée. Certes, il est d’une mauvaise politique législative d’opérer brusquement des bouleversements profonds. Mais c’est là un problème de législation, non d’interprétation. L’interprète ne peut que constater que l’empire de la loi ancienne a cessé" (Traité…, p.112 ― g.n.).
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Artigo 1º da Lei n. 11.143/2005: "O subsídio mensal de Ministro do Supremo Tribunal Federal, referido no art. 48, inciso XV, da Constituição Federal, será de R$ 21.500,00 (vinte e um mil e quinhentos reais) a partir de 1º de janeiro de 2005 " (g.n.).
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Cfr. artigo 6º da Lei n. 9.655/98 e artigo 2º, caput, da Lei n. 10.474/2002.
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Assim, nos argutos exemplos de ENNECCERUS, "carecería totalmente de sentido, por ejemplo, el que una ley que declara redimibles ciertos censos o que deroga el derecho del propietario a recoger los frutos que cayeran del árbol de su finca sobre la finca vecina, no se aplicase a los censos existentes o a la propiedad ya existente" (op.cit., p.232).
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Marcel Planiol, Traité…, p.114.
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Op.cit., p.557 (g.n.).
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Cfr., por todos, Pedro Pita, O Contrato de "Colonia" na Madeira, Lisboa, Peninsular, s.d. [1929], passim.
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Traité…, pp. 113, 117 e 124-125.
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Cfr., por todos, o magistério de Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco (Teoria Geral do Processo, 9ª ed., São Paulo, Malheiros, 1993, pp.135-142), que justificam tais garantias pela "posição do Poder Judiciário, como guardião das liberdades e direitos individuais, [que] só pode ser preservada através de sua independência e parcialidade", e reconhecem, para além do artigo 95, III, um amplo sistema de garantias respeitantes ao Poder Judiciário como um todo (prerrogativas do autogoverno: auto-organização, auto-regulamentação, autonomia administrativa e autonomia financeira) e aos magistrados (as garantias propriamente ditas ― referidas acima ― e os impedimentos do artigo 95, par. único, que "garantem às partes a imparcialidade do juiz").
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José de Oliveira Ascensão, op.cit., p.415 (g.n.).
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"Dispõe sobre gratificações de representações na Justiça Eleitoral".
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Essas gratificações, que também se destinariam a Juízes de Direito dos Estados (artigo 668 da CLT), não foi contemplada na Lei m. 11.143/2005.
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Que ao menos se haveria de presumir, já que a Lei n. 11.143/2005 é ― também ― de iniciativa do Presidente do STF, tribunal-guardião da Constituição Federal (artigo 102, caput, da CRFB).
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Na ação principal, julgada após a edição da EC n. 19/98, não se julgou o mérito, por se considerar prejudicado o objeto (controle concentrado de constitucionalidade de norma) com a alteração do texto do artigo 37, XI, da CRFB. Nada obstante, o relator Min. MAURÍCIO CORRÊA entendeu por bem enfatizar, em seu voto, que "o não-conhecimento desta ação direta de inconstitucionalidade e a conseqüente cassação do deferimento da cautelar não impedem que os magistrados alagoanos ajuízem ação adequada em que se poderá apreciar, por meio do controle difuso, a alegada inconstitucionalidade da norma aqui impugnada" (ADIn 1.550/AL, rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, TP, 23.05.2001, in DJ 21.09.2001 ― g.n.).
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Cfr., supra, o tópico 2, in fine.
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Como, e.g., a gratificação pelo exercício da função de Corregedor (cfr. STF, RE 111.349/PR, rel. Min. RAFAEL MAYER, 1ª T., 14.11.1986, in DJ 28.11.1986).
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Tal qual a LOMAN, o artigo 108, III, da Constituição de 1967 estatuía a "irredutibilidade de vencimentos, sujeitos, entretanto, aos impostos gerais" (g.n.).
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Por força da Emenda n. 7, de 13.04.77, que criou o Conselho Nacional da Magistratura e aditou um parágrafo único ao artigo 112 da Constituição de antanho, acometendo à Lei Orgânica da Magistratura Nacional a disciplina estatutária da Magistratura brasileira. In verbis: " Lei complementar, denominada Lei Orgânica da Magistratura Nacional, estabelecerá normas relativas à organização, ao funcionamento, à disciplina, às vantagens, aos direitos e aos deveres da magistratura, respeitadas as garantias e proibições previstas nesta Constituição ou dela decorrentes" (g.n.).
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Ruiz Abreu, "Adicional por Tempo de Serviço…", loc. cit.
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José de Oliveira Ascensão, op.cit., p.562. O autor acresce que "não vemos razão para exigir que o carácter interpretativo seja expressamente afirmado, quando a retroactividade não tem de o ser". No ordenamento português, a lei interpretativa é expressamente regulada pelo artigo 13º do Código Civil de 1966.
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Como é, aliás, a tese predominante em Portugal. Confira-se, por todos, o mesmo OLIVEIRA ASCENSÃO: "o último requisito da interpretação autêntica [é que] a nova fonte não deve ser hierarquicamente inferior à fonte interpretada" (op.cit., p.562). Adiante: "Sendo assim, nada obriga a que a interpretação seja obra da fonte da mesma espécie que a fonte que se interpreta. Pode prover de uma fonte de nível equivalente ― um costume pode ser interpretado por uma lei, por exemplo. E pode até valer como interpretação autêntica a que é realizada por fonte de nível superior, como se um decreto-lei esclarece dúvidas resultantes de um decreto anterior: da mesma forma se declara que a fonte tem aquele significado. […] Já não haverá porém, por natureza, interpretação autêntica, se realizada por diploma hierarquicamente inferior à fonte interpretada. Nesse caso há especificação ou concretização, mas o título do diploma hierarquicamente superior não é alterado" (pp.589-590 ― g.n.).
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Por força da EC n. 19/98.
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Cfr., por todos, o acórdão STF de 13.05.2002: "I. Magistratura: remuneração: recepção do art. 65, VIII, da LOMAN, da qual decorre a inadmissibilidade da percepção de gratificação por tempo de serviço mediante "anuênios". II. Vencimentos: garantia de irredutibilidade que ― atinente à soma global anteriormente percebida ― não impede que a parcela correspondente a determinada vantagem funcional seja absorvida por força de lei que, antes de diminuí-la, ao contrário, aumenta a remuneração do servidor ou do magistrado" (AO 395/PR, Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, TP, 13.05.2002, in DJ 02.08.2002, p.58 ― g.n.). Na doutrina, cfr. Hely Lopes Meirelles, op.cit., p.495, nota n. 200.
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Artigo 37, X: "a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o§ 4º do art. 39. somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices" (g.n.).
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O artigo 145 da LOMAN, típica norma de direito transitório, dispôs que "as gratificações e adicionais atualmente atribuídos a magistrados, não previstos no art. 65, ou excedentes das percentagens e limites nele fixados, ficam extintos, e seus valores atuais passam a ser percebidos como vantagem pessoal inalterável no seu quantum, a ser absorvida em futuros aumentos ou reajustes de vencimentos".
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Nesse sentido, Hely Lopes Merelles, op.cit., p.495.
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Cfr. Guilherme Guimarães Feliciano, "Magistratura, Previdência Social e Constitucionalidade", in Reforma da Previdência e Magistratura – Inconstitucionalidades, Grijalbo Fernandes Coutinho, Marcos Neves Fava, Paulo Luís Schmidt (coord.), São Paulo, LTr Editora, 2005. pp. 56-80 (passim).
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Verbi gratia, confira-se: 1. AI 511024 AgR/PR, rel. Min. EROS GRAU, 1ª T., 14/06/2005, in DJ 05.08.2005: "Se o crédito se constituiu após o advento do referido texto normativo, é fora de dúvida que a sua extinção, mediante compensação, ou por outro qualquer meio, há de processar-se pelo regime nele estabelecido e não pelo da lei anterior, uma vez que aplicável, no caso, o princípio segundo o qual não há direito adquirido a regime jurídico " (g.n.); 2. RE 175767, AgR/PR, rel. Min. EROS GRAU, 1ª T., 31.05.2005, in DJ 24.06.2005: "Pacífico é o entendimento nesta corte de que inexiste direito adquirido a regime jurídico. Sendo assim, o Tribunal tem admitido diminuição ou mesmo supressão de gratificações ou outras parcelas remuneratórias desde que preservado o montante nominal da soma dessas parcelas, ou seja, da remuneração global" (g.n.); 3. RE 246443 AgR/SC, Min. CEZAR PELUSO, 1ª T., 22.03.2005, in DJ 15.04.2005: "RECURSO. Extraordinário. Inadmissibilidade. Servidor Público. Estabilidade financeira. Gratificação complementar de vencimento. M.P. nº 61/95 convertida na Lei nº 9.847/95, Estado de Santa Catarina. Direito adquirido. Agravo Regimental não provido. Não há direito adquirido a regime jurídico " (g.n.).
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Hely Lopes Meirelles, op.cit., p.493 (g.n.). O autor cita, em abono à sua ilação, dois julgados do STF (RE 226.462 e RTJ 149/96).
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Ou, na dicção de MEIRELLES, "não se afirma […] que há direito adquirido ao regime jurídico; o que se sustenta é o direito adquirido de ordem individual, isto é, os efeitos jurídicos produzidos no passado (facta præterita) e já incorporados ao patrimônio jurídico do servidor, ativo e inativo, e de seus pensionistas. Portanto, os limites remuneratórios decorrentes da EC 19, da EC 20 e, agora, da EC 41 aplicam-se a partir da entrada em vigor de cada uma e, quanto à última, para o futuro, não podendo retroagir para colher efeitos que ocorreram em momento anterior ao da respectiva publicação" (op.cit., p.495). Na verdade, estão também garantidos certos efeitos futuros dos "facta præterita", como se demonstra no texto principal; ou seja, o argumento não se restringe aos "efeitos jurídicos produzidos no passado" (questão da irrepetibilidade), mas alcança ainda os efeitos jurídicos patrimoniais derivados da vicissitude passada (presentes ou futuros), que não podem ser essencialmente coarctados. Compulsando os exemplos da obra, percebe-se que o autor acolhe, em sua tese, toda essa pletora de hipóteses, conquanto não proceda a maiores distinções entre a teoria do direito adquirido e a teoria da irretroatividade da lei (que, na doutrina universal, não caminharam pari passu).
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Observe-se que, no escólio há pouco citado (supra, tópico 3 e nota n. 17), FERREIRA FILHO propõe que a proporcionalidade e a razoabilidade sejam empregadas na fixação dos efeitos futuros dos " facta pendentia " (i.e., dos fatos constitutivos ainda não completados ou consumados ― como seriam, in casu, os qüinqüênios em curso à época da entrada em vigor da Lei n. 11.143/2005). Para os estritos limites deste estudo, escusa-se chegar a esse extremo. Bastaria, para assegurar um quatro estatutário minimamente justo, que apenas os efeitos futuros dos " facta præterita " fossem fixados com razoabilidade e proporcionalidade, arrefecendo a tese da extinção sumária que, afogadilha, toma de assalto a primeira hora.
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Diga-se, porém, que sequer esse limite é pacífico na doutrina brasileira (supra, tópico 3). Para HELY LOPES MEIRELLES, "o servidor, o inativo ou o pensionista que percebia quando da publicação da EC 41 remuneração, proventos ou pensão superior ao teto geral previsto no art. 37, XI, da CF, na sua nova redação, não poderá ter redução desse valor. A diferença entre esse valor e o do teto geral deverá ser absorvida por alterações futuras do subídio, da remuneração ou do benefício" (op.cit., p.495 ― g.n.). Cremos, porém, que nesse caso há razões de ordem pública que impõem a limitação, justificando o "abate-teto" e a não-ultratividade da lei anterior. Ou, na dicção de PLANIOL, manter os direitos pessoais preexistentes acabaria comprometendo a nova ordem de relações econômicas e sociais que a lei nova pretende fundar (Traité…, p.125). Aliás, é mesmo MEIRELLES que, adiante, acaba flertando com os princípios da proporcionalidade e da moralidade administrativa para, assim, relativizar a sua afirmação anterior: "É manifesto que somente o que foi adquirido de conformidade com a ordem jurídica constitucional e legal então vigentes é que tem a garantia do direito adquirido. Nessa linha, no nosso entender, remunerações que estejam em valores notoriamente desproporcionais aos limites máximos estabelecidos pelo art. 37, XI, da CF, inclusive com as vantagens pessoais incorporadas, não guardam razoabilidade e moralidade. […] Porém, quando o exame do caso indicar a ilicitude da remuneração, a Administração Pública deverá instaurar processo administrativo e observar o devido processo legal, com o direito de defesa e contraditório, devendo a decisão pela redução ou pela manutenção ser amplamente motivada e comunicada ao respectivo Tribunal de Contas" (op.cit., pp.495-496 ― g.n.). Do nosso ponto de vista, aferir o que seja "notoriamente desproporcional" oportuniza exagerado subjetivismo que, na prática, acabaria por ferir o princípio constitucional da isonomia. Mantemos, por isso, nosso entendimento.
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Segundo DWORKIN, as regras seriam aplicadas "in an all-or-nothing fashion", i.e., sob a lógica do "tudo ou nada", porque a validade de uma regra implica sempre a revogação da regra contrária anterior; já os princípios seriam casuisticamente ponderados nas intersecções axiológicas, prevalecendo uns em detrimento de outros (elegendo-se, caso a caso, quais devam ser levados em conta), mas sempre contextualmente (o que significa que os princípios "contrapostos" não desaparecem do sistema, podendo prevalecer sob diversas circunstâncias). Cfr., a respeito, Ronald Dworkin, Taking Rights Seriously, Cambridge, Harvard University Press, 1978, pp.22-23. Se, porém, entende-se que todos os efeitos futuros, de "facta pendentia" e de "facta præterita", admitem sempre aniquilamento por lei ulterior, o princípio da irretroatividade não é meramente "afastado", mas antes tendencialmente alijado do sistema jurídico, porque bons recursos retóricos podem reduzir à noção de "efeitos futuros" tudo quanto se produza e perenize por conta das vicissitudes consumadas ao tempo da lei antiga (como, e.g., o patrimônio amealhado com as gratificações percebidas).
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