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Atualidades sobre a prescrição intercorrente na execução civil

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06/04/2019 às 19:12
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Conclusão

A prescrição em estudo, conforme vimos no presente trabalho, dá-se somente no curso do processo de execução, estando prevista no artigo 921 do Código de Processo Civil de 2015.

É um instituto estranho ao revogado ordenamento processual, porquanto não tinha previsão legal no CPC/73. Exercida a pretensão, não mais cabia falar em prescrição.

Na verdade, houve uma espécie de deturpação ao conceito original de prescrição: de fluência exterior e anterior à instauração da relação processual, passou também a transcender na esfera endoprocessual, mediante criação da doutrina e jurisprudência [6].

Vê-se, portanto, na sua gênese, motivos de natureza política judiciária, com o fito de enxugar o volume de processos em tramitação.

A transformação da prescrição para a sua modalidade intercorrente passa a vigorar no processo, decorrido o prazo dilatório de um ano (§ 1º do artigo 921) ou a partir do transito em julgado da sentença condenatória, no mesmo prazo da prescrição da ação, conforme vimos.

A sua origem, frisa-se, deturpada e eivada por motivos de ordem política, estranhos ao Direito, torna esta modalidade de prescrição (sui generis), no processo civil, uma medida excepcional, de aplicação restrita, sendo necessária a sua motivação, corroborada com a prova irrefutável da negligência (inércia) do credor/exequente.

A uma, porque o artigo 789 do CPC frisa que o devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações.

A duas, pela exigência da prova da negligência (inércia) pelo credor, a sua recalcitrância injustificada.

Com efeito, os exequentes/credores, não dispõem de meios para localizar os bens eventualmente ocultados pelo devedor/executado, encontrando vários obstáculos, como a necessidade de observar o dever de sigilo bancário.

Nesta discussão, destaca-se na prática forense a negativa de alguns Juízos quanto ao pedido de segundo bloqueio de ativos via BACENJUD em nome do executado, sob o fundamento de inexistir prova de sua alteração patrimonial, sendo defesa a prática de atos processuais sabidamente inúteis.

Contudo, mostra-se desarrazoada tal entendimento, porquanto o credor não tem informações dos ativos financeiros dos executados, tão somente, de bens imóveis mediante consulta pública perante os cartórios.

E ainda que tivesse, seria obstado pelo dever de sigilo bancário, sendo de rigor o deferimento do bloqueio, autorizando a quebra do sigilo.

Ademais, a Lei não limitou a utilização do BACENJUD a uma única vez, carecendo de fomento jurídico, o condicionamento da diligência à demonstração de alteração patrimonial do executado [7].

O mesmo se diga quanto à demora na citação, porquanto uma vez provado que o exequente promoveu todas as diligências na procura do paradeiro do executado, não lhe pode ser imputado à prescrição, porquanto não foi negligente, tendo sido motivada, muitas vezes, por fatos burocráticos do mecanismo da justiça ou até mesmo, de ocultação ardil do executado.

A três, a execução se realiza no interesse do credor (Código de Processo Civil, artigo 797, “caput”).

Os atos do processo executivo visam à satisfação do crédito discutido na lide. Inexiste dispositivo legal que vede a concessão da medida (bloqueio de ativos) por mais de uma vez.

A quatro, cabe ao Judiciário servir o jurisdicionado, oferecendo prestação jurisdicional de qualidade, entenda-se efetividade, de modo célere e não o contrário.

O acúmulo de trabalho, a falta de pessoal, a ausência de varas especializadas e tantos outros problemas de morosidade da Justiça e sem qualquer tipo de enfrentamento, não podem ser transferidos ao exequente, com a decretação desmotivada da prescrição, nas contendas executivas.

Entendimento a contrario sensu seria premiar o executado/devedor laudino, hábil em blindar o seu patrimônio, propiciando a possibilidade de “repatriar” seu patrimônio, após a decretação da prescrição, em detrimento a credibilidade do próprio judiciário e do custo Brasil. [8]

A segurança jurídica é posta em cheque, nesta situação, sendo um fardo insustentável para o exequente, após se frustrar com a ausência de bens do executado, ver seu direito de executá-lo extinto por prescrição intercorrente, sem ter lhe dado causa e, até diante da possibilidade de se ver nesta situação, por conta do emprego pelo executado de meios fraudulentos. 


Referências Bibliográficas

[1] ALVIM NETO, José Manoel Arruda. Manual de Direito Processual Civil.  2006. Ed. Revista dos Tribunais. P. 34.

[2] MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. EXECUÇÃO. São Paulo: RT, 2007. p. 338.

[3] THEODORO JÚNIOR. Humberto. Curso de direito processual civil. 36. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 139, v. 2.

[4] Neste contexto, o credor pode opor algum fato impeditivo à incidência da prescrição, como aquelas hipóteses previstas nos artigos 313, 315 e 921 do CPC, e o disposto no inciso I, do artigo 202 do Código Civil.  

[5] E. Supremo Tribunal Federal. Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal – Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 84. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=150.NUME.%20NAO%20S.FLSV.&base=baseSumulas.

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[6] A grande influência para a inserção deste instituto na esfera do processo civil foi o art. 40 da Lei de Execuções Fiscais (6.830/80) § 4º: “Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato”.

[7] Como bem observado pelo Ministro Herman Benjamin no julgamento de caso análogo, “a lei não limitou a utilização do Bacen Jud a uma única vez. Por se tratar de instrumento destinado a promover a satisfação da pretensão creditória, o referido expediente pode ser utilizado da mesma forma que qualquer outra diligência (e.g., expedição de ofício ao Detran ou aos Cartórios de Imóveis), isto é, tantas vezes quanto necessário. (...)Para finalizar, tenho por evidente que a utilização do Bacen Jud, quanto à reiteração da diligência, deve obedecer critério de razoabilidade. Não é o Poder Judiciário obrigado a, diariamente, consultar o referido programa informatizado. Contudo, não vejo abuso na reiteração da medida quando decorrido, por exemplo, o prazo de um ano, sem que tenha havido alteração no processo. Naturalmente, isso não impede que, antes da renovação da pesquisa via Bacen Jud, a Fazenda Pública credora promova as diligências ao seu alcance, para localização de outros bens. Porém,conduta dessa natureza não pode ser exigida como requisito para fins de exame judicial do pedidode reiteração do sistema Bacen Jud, pois isso seria equiparável a ensejar o retorno da orientação jurisprudencial ultrapassada, conforme anteriormente explicitado” (STJ, 2ª Turma, REsp nº 1.199.967/MG, 16.11.2010).

[8] Em decorrência da falta de segurança de que o crédito vai ser recuperado o credor embute o risco nos juros, em especial, nos contratos de financiamento, onerando ou mesmo restringindo o crédito, o que também implica na diminuição de investimentos. A participação da Justiça no custo Brasil se dá em razão do alto nível de insegurança jurídica e de efetividade da jurisdição, o que provoca o aumento do risco e dos custos das transações econômicas, afetando a competitividade das empresas brasileiras e onerando, por conseguinte, a renda familiar dos consumidores.

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Sobre o autor
Alexandre Assaf Filho

Pós-Graduado em Direito Societário - Instituto Insper (SP). Especialização em Processo Civil (Lato Sensu) - FAAP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ASSAF FILHO, Alexandre. Atualidades sobre a prescrição intercorrente na execução civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5757, 6 abr. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/73126. Acesso em: 18 mai. 2024.

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