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Da inconstitucionalidade da decretação de ofício da prescrição intercorrente de créditos tributários, na forma do art. 40, §4º, da Lei nº 11.051/2004

21/09/2005 às 00:00
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A norma contida no art. 40, §4º da Lei Federal n.º 6.830/1980, inserida pela Lei n.º 11.051/2004, não tem validade jurídica no nosso ordenamento jurídico quantos aos créditos de natureza tributária.

Por força do disposto no art. 219, §5º do Código de Processo Civil, em se tratando de direitos patrimoniais, o juiz não pode, de ofício, acolher a prescrição e decretá-la de imediato.

No entanto, com o advento das alterações promovidas pelo referido dispositivo legal, o juiz fica autorizado a acolher, de ofício, a prescrição intercorrente do crédito objeto da Execução Fiscal movida pela Fazenda Pública contra devedor inadimplente, quando a mesma já tiver sido consumada, quando da decisão que ordenar o arquivamento provisório do feito, verbis legis:

"Art. 40 - § 4º - Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato."

A prescrição intercorrente do crédito tributário é uma construção pretoriana, e visa proteger o contribuinte da inércia da Fazenda Pública em conduzir o processo de execução.

Quando por inércia da Exeqüente o processo de Execução Fiscal ficar paralisado por mais de 5 (cinco) anos, sem que a mesma promova qualquer ato judicial no sentido de proceder a cobrança, opera-se a chamada prescrição intercorrente, que vem sendo reiteradamente acolhidas pelo nosso Tribunal, in verbis:

APELAÇÃO - EXECUÇÃO FISCAL - PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE - PROCESSO SUSPENSO NOS TERMOS DO ART. 40 DA LEI 6830/80 - PRAZO DE MAIS DE 07 ANOS DE SUSPENSÃO - INCIDÊNCIA DO DISPOSTO NO ART. 174 DO CTN - NECESSIDADE, CONTUDO, DE DECISÃO A RESPEITO DE CULPA DA EXEQÜENTE, PELA PARALISAÇÃO DO FEITO - EXCEÇÃO DE PRÉ- EXECUTIVIDADE - POSSIBILIDADE. O incidente de pré-executividade, admitido por construção doutrinário-jurisprudencial, resulta da excepcional faculdade, atribuída ao devedor, de submeter ao conhecimento do magistrado, nos próprios autos da execução, independentemente de penhora, determinadas circunstâncias prejudiciais à ação, suscetíveis de apreciação ''ex officio'', tais como a falta de condições da ação. Permanecendo a execução fiscal com seu andamento paralisado por mais de cinco anos, e em todo esse interregno processual não houve um pertinente ou relevante esforço ou diligência comum da credora em cobrar o seu crédito, afigura-se ser juridicamente admissível o reconhecimento da ocorrência da prescrição intercorrente. A suspensão do feito, nos termos do art. 40 da Lei 6830/80, não tem o condão de tornar a dívida imprescritível, devendo ser interpretado sistematicamente com o art. 174 do CTN. (TJMG - AC n.º 1.0024.89.579183-8/001 - Rel. Des. Francisco Lopes de Albuquerque - 1ª Câmara Cível - pub. 19/12/2003 – sem grifos no original)

EXECUÇÃO FISCAL. INÉRCIA DO EXEQÜENTE POR PERÍODO SUPERIOR A CINCO ANOS. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. INTELIGÊNCIA DO ART. 174 DO CTN. APELAÇÃO IMPROVIDA. Havendo ocorrido a prescrição intercorrente, nos termos do art. 174 do Código Tributário Nacional, decorrente da inércia do exeqüente por mais de cinco anos, impõe-se a confirmação, por seus fundamentos, da sentença pela qual foi julgado extinto o processo de execução por esse motivo. (TJMG - AC n.º 1.0000.00.332153-6/000 - Rel. Des. Fernando Bráulio - 8ª Câmara Cível - pub. 19/12/2003 – sem grifos no original)

No entanto, as referidas alterações, no que tange os créditos da Fazenda de natureza tributária, são absolutamente inconstitucionais, posto que em desacordo com as normas que regem a ordem tributária nacional, contidas no Título IV, Capítulo I da Constituição Federal, mormente o disposto no art. 146, inciso II, aliena "c" do diploma constitucional.

De acordo com o dispositivo constitucional supra citado, cabe à Lei Complementar estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários.

Art. 146. Cabe à lei complementar:

I – dispor sobre conflitos de competência em matéria tributária, entre a União, os Estados o Distrito Federal e os Municípios;

II – regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;

III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:

a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, base de cálculos e contribuintes;

b) obrigação, lançamento crédito, prescrição e decadência tributários;

c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas." (grifos nossos).

A Lei n.º 5.172/66, que constituiu o Código Tributário Nacional, recepcionada pela Constituição Federal de 1988 com status de Lei Complementar, ao dispor sobre o Sistema Tributário Nacional e instituir as normas gerais de direito tributário, cumprindo seu mister, disciplinou a prescrição dos créditos tributários, conforme o disposto no art. 174, recentemente alterado pela Lei Complementar n.º 118/2005.

Assim, as eventuais alterações nas normas referentes à prescrição do crédito tributário devem, necessariamente, por força de determinação constitucional, ser realizadas através de Lei Complementar, figura normativa que exige quorum qualificado, conforme o disposto no art. 69 da Constituição Federal.

Neste sentido, diante da invalidade das disposições da lei ordinária em matéria de prescrição tributária, assim se pronunciou o I. Min. do Superior Tribunal de Justiça, Luiz Fux, verbis:

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. EXECUÇÃO FISCAL. ART. 40, DA LEF. ART. 174 DO CTN. PREVALÊNCIA DAS DISPOSIÇÕES RECEPCIONADAS COM STATUS DE LEI COMPLEMENTAR. PRECEDENTES. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. 1. O artigo 40 da Lei de Execução Fiscal deve ser interpretado harmonicamente com o disposto no artigo 174 do CTN, que prevalece em caso de colidência entre as referidas leis. Isto porque, é princípio de Direito Público que a prescrição e a decadência tributárias são matérias reservadas à lei complementar, segundo prescreve o artigo 146, III, "b" da CF. 2. Em conseqüência, o artigo 40 da Lei nº 6.830/80, por não prevalecer sobre o CTN, sofre os limites impostos pelo artigo 174 do referido Ordenamento Tributário. Precedentes jurisprudenciais. 3. A suspensão decretada com suporte no art. 40 da Lei de Execuções Fiscais não pode perdurar por mais de 05 (cinco) anos porque a ação para cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva (art. 174, caput, do CTN). 4. (...) 5. Agravo regimental a que se nega provimento. (Agravo Regimental no Recurso Especial n.º 615831/MG - Rel. Min. Luiz Fux- 1ª Turma - pub. DJ 25/10/2004 – sem grifos no original)

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Neste ínterim, insta reconhecer a inconstitucionalidade do §4º, do art. 40 da Lei n.º 6.830/1980, inserido pela Lei Federal n.º 11.051/2004 uma vez que em se tratando de Leis Ordinárias, não houve a devida observância ao processo legislativo competente, uma vez que ao promover inovação ao art. 174 do CTN, deveria a mesma ter sido editada, processada e votada como Lei Complementar.

Ressalte-se, todavia, que quanto aos créditos de natureza não tributária, objeto de cobrança pela Fazenda Pública, através da ação de Execução Fiscal disposta na Lei n.º 6.830/1980, não há qualquer impedimento para a aplicação do §4º do art. 40, tendo em vista que a reserva de lei complementar, acima mencionada, refere-se tão somente à legislação tributária, não abrangendo os demais créditos da Fazenda de natureza diversa daquela prevista no art. 3º, do CTN.

Conclui-se, portanto, que diante da inconstitucionalidade patente do §4º do art. 40 da Lei n.º 6.830/1980, não pode o juiz, consoante o disposto no art. 219, §5º do CPC, acolher de ofício a prescrição de direitos patrimoniais, quando o objeto do processo de Execução movido pela Fazenda Pública for a cobrança de tributos, sob pena de violar a Lei Maior deste país.

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Sobre a autora
Patrícia Brandão Paoliello

Assessora Jurídica do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Especialista em Direito Público pelo Instituto de Educação Continuada da PUC Minas.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PAOLIELLO, Patrícia Brandão. Da inconstitucionalidade da decretação de ofício da prescrição intercorrente de créditos tributários, na forma do art. 40, §4º, da Lei nº 11.051/2004. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 810, 21 set. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7316. Acesso em: 21 nov. 2024.

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Título original: "Da inconstitucionalidade da decretação de ofício da prescrição intercorrente de créditos tributários, na forma instituída pelo §4º, do art. 40 da Lei n.º 6.830/80, inserido pela Lei nº 11.051/2004".

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