No início de 2003, quando tomava corpo o debate sobre o desarmamento, duas posições radicais e antagônicas estavam presentes. Uma defendia a pura, simples e integral proibição do comércio de armas, porque isso provocaria redução substancial da criminalidade, e a outra patrocinava o comércio completamente livre, sem amarras legais, porque andar armado seria um direito do cidadão sobre o qual o Estado não deveria intervir e, em defesa dessa sua tese, apontava-se um absurdo argumento da possibilidade de aumento da criminalidade no caso da proibição.
Chamada ao debate, em maio daquele ano (2003), preparei um artigo que ganhou o título "Os danos da proibição", no qual defendi a regulamentação do porte de armas e falei do risco de se proibir sua comercialização de maneira integral e completa. Elogiei a legislação que melhorava o controle e limitava o porte de armas de fogo e alertei a população para a necessidade de cobrar a adoção de medidas complementares, porque a simples proibição ou regulamentação, sem outras medidas, não produziria os reflexos esperados sobre os números da criminalidade.
Depois de apresentar dados do mercado clandestino de armas e falar das experiências da Lei Seca e da reserva de mercado de informática, que estimularam o mercado negro de bebidas e computadores, afirmei: "(...) é bom retirar do debate a idéia equivocada de que os que são contra a mera proibição estão no pólo oposto da argumentação, propondo ‘às armas, cidadãos’. Não é assim. Acredito na eficiência da regulamentação e no controle rigoroso da fabricação, do porte e da importação de armas. Acredito na responsabilização direta e penal de todo aquele que, mesmo não portando armas, estimule o porte ilegal. Venho defendendo publicamente esses pontos de vista desde o começo dos anos 90. O caminho do controle foi tomado em fevereiro de 1997, com a edição da lei 9.437(...). Recentemente o Senado melhorou ainda mais a lei, aprovando um projeto que, entre outras medidas, torna o porte ilegal de armas um crime inafiançável. A proposta do Senado será submetida à Câmara, onde terá o meu apoio."
Quem reler o artigo "Os danos da proibição", comparando-o com o Estatuto do Desarmamento, que nasceu sete meses depois, encontrará coincidências evidentes, porque, em maio, eu pedia a regulamentação e a limitação do porte de armas de fogo, o que aconteceu, em dezembro, com o Estatuto do Desarmamento.
O Estatuto do Desarmamento, o referendo, a lei 10.867, de 12 de maio de 2004, e o decreto 5.123, de 1 de julho do mesmo ano, surgiram na direção do bom senso que sempre defendi, um sentimento que percebi quando escrevi, no término do artigo"Os danos da proibição": "A proposta do Senado será submetida à Câmara, onde terá o meu apoio."
Sinto-me obrigada a retornar ao assunto, porque, na internet, claramente com o objetivo de confundir, numa atitude de baixa política e de leviano comportamento, circula o artigo publicado em maio de 2003, que está disponível em minha página na internet. Circula com um tom que não lhe dei e com um sentido que não tinha e não tem, para atribuir a mim, a partir do título, "Os danos da proibição", a preferência pelo "não", na resposta ao referendo. Com as mesmas intenções, um jornal do Rio de Janeiro, sem previamente me ouvir, resolveu, há poucos dias, republicar o artigo. Sei quem o fez, porque mandei apurar.
Perdem tempo com este jogo bobo, porque a minha opção pelo desarmamento é clara, indiscutível, e está demonstrada até pela minha decisão pessoal de nunca andar armada, mesmo tendo porte legal e passado por momentos na vida em que muitos aconselhavam o contrário.
De maneira definitiva: votarei "sim" no referendo, e com o meu voto estarei confirmando a minha opção pelos dispositivos do Estatuto do Desarmamento e das leis que limitam e regulamentam o porte de armas de fogo.