Introdução
O pluripartidarismo é um tema muito debatido no Brasil em diversas rodas de conversa, presente em vários nichos sociais, de pessoas que se questionam se o referido direito perdeu seus objetivos iniciais de real representação de ideologias.
Não é raro ver discursos de pessoas que sejam a favor da limitação de criação de partidos, como até mesmo de sua redução, entendendo que, no cenário atual tal, quantidade serve apenas para sobrecarregar a máquina pública com gastos partidários sem atender ao seu objetivo devidamente.
O presente artigo busca fazer uma análise sobre a conjuntura político partidário atual do Brasil, projetando o ponto de vista pessoal do autor ao passo que incentiva a reflexão e propõe o debate acerca do tema.
Formação
Para entender o contexto do pluripartidarismo no Brasil se faz necessário remontar desde a época da Grécia Antiga, momento em que a Democracia começa a ser formulada.
A democracia surgiu na Grécia Antiga como um sistema de governo que visava dar forma aos anseios da sociedade daquele Estado (demo= povo e Kracia= governo).
Naquela época, a democracia era concentrada nas vozes dos homens livres que se reuniam em praças e locais de comum acesso para discutir questões que julgassem relevantes para sua sociedade. Faz-se necessário apontar que não participavam destes processos de debates e decisões mulheres nem escravos.
Com o passar do tempo novas ideologias surgiam, incentivando mudanças em diversos Estados e seus sistemas de governo. Grande parte dos séculos que estavam imersos no feudalismo contavam com um poder centralizado, sem real representação das classes que não ocupavam status de nobreza.
A democracia começa a receber uma guinada diferenciada com os pensadores iluministas no século XVIII, tais como John Locke, e Montesquieu que defendiam o Estado mais liberal, afastando a ideia de poder concentrado nas mãos do Rei absolutista, abrindo espaço para participação política e econômica da burguesia.
Ainda nos pensadores iluministas, foi Jean- Jacques Rousseau o principal defensor da ideia de soberania do povo e não do seu governante. O autor introduz de maneira incisiva e determinante o Contrato Social de participação popular que consideramos hoje como o sufrágio universal e aquilo que virá a se tornar a soberania popular.
Em linhas gerais, o sufrágio universal pode ser entendido como a escolha de representantes do povo no poder, seja por não permitir a descriminação injustificada em qualquer medida daqueles que votam e daqueles que querem se eleger, ou pela isonomia do voto. O sufrágio universal acaba por ser um direito que assegura a soberania popular
A soberania popular por sua vez é fortalecida com o passa do tempo, entendendo que a representação de parcelas da sociedade seria a forma necessária para que o Estado alcançasse seus objetivos reais.
Atualmente a soberania popular está prevista no artigo 1º da nossa Carta Maior, possuindo um grau de suma importância para nossa sociedade, atingindo o patamar de cláusula pétrea, mesmo que de maneira indireta.
“ART.1º, CRFB, Parágrafo único: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”
Com a disseminação de ideias liberais ante absolutistas em diversos Estados, o sufrágio universal de Rousseau se tornou virtualmente impossível de ser praticado de maneira direta, graças ao crescimento exponencial populacional, precisando ser adaptado para outras formas.
Sendo assim, os partidos políticos começam a ser criados e moldados como ferramentas de exercício de democracia indireta, na qual a sociedade elegeria um grupo que seria representado na figura de um individuo que espelhasse as ideologias daqueles que o elegeram.
A democracia indireta se tornou a forma mais comum de eleição de representantes nos Estados Democráticos de Direito, entendendo por ser a melhor maneira de centralizar as principais ideologias de parcelas diversas que compõe a mesma sociedade nos espaços de decisão de poder, representando os interesses de seus eleitores.
Brasil contemporâneo
Ainda recentemente na história, o Brasil saiu de uma fase de Regime ditatorial com pouquíssimo exercício democrático, e ingressou em uma nova etapa de estabilidade com a instituição de diversos direitos fundamentais advindos com a Constituição Federal de 1988, a conhecida “Constituição Cidadã”.
Dentre os direitos previstos na Constituição em vigor, o sufrágio universal está atualmente elencado no Artigo 14 da CRFB, no rol de direitos políticos, que assim dispõe:
“Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos.”
Combinado a esta positivação, a CRFB/88 ainda dispõem sobre o pluripartidarismo em seu Artigo 17, determinando que é livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos resguardados a soberania nacional, o regime democrático e o próprio pluripartidarismo.
Entendendo a história do país e seu anseio em obter uma representação política genuína após duas décadas de autoritarismo, é compreensível a demanda por um sistema de governo de representação democrática que defendesse o voto direto, secreto, universal e periódico.
Com a redemocratização do país os partidos começaram a surgir e se estabelecer segundo ideologias que representassem as parcelas da sociedade.
Atualmente o Brasil conta com 35 partidos políticos devidamente cadastrados pelo Tribunal Superior Eleitoral- TSE, e uma lista de outros muitos em estágio de formação aguardando aprovação do Tribunal.
Não é necessário dizer que a quantidade de partidos existentes no contexto brasileiro atual é exorbitante e parece desmedidamente desnecessário, uma vez que, muitos desses não têm representação factível nas rodas de poder.
Grande parte desses 35 partidos são completamente desconhecidos por grande parte da população, ocupando apenas listas em despesas administrativas do orçamento público.
É certa que o sufrágio universal é um dos direitos que assegura a liberdade de ideologias e de representação partidária. Entretanto, obsta observar que a quantidade exacerbada de partidos acaba por diluir em muito as ideologias políticas, gerando pouca diferença entre os partidos instituídos.
Para além da questão de ideologias inexpressivas, os partidos políticos acabam sendo criados como formas de obtenção recursos do fundo partidário e quota mínima de tempo de propaganda eleitoral gratuita, que é utilizada como moeda de troca com outros partidos coligados para promoção de certos indivíduos.
Apesar dos esforços das chamadas reformas eleitorais dos códigos brasileiros que buscam estabelecer cláusulas de barreiras e outros mecanismos limitadores, parece que ainda não se chegou à solução necessária para combater essa epidemia de partidos.
Cabe ressaltar que, apesar de ser muito improvável a tomada de decisões quando se faz necessário alinhar propostas com essa quantidade tão grande de partidos, e que muitos dos que existem não tem uma separação tão clara de ideologias políticas que poderia justificar a criação de uma nova legenda, é preciso perceber que a criação de cancelas que representação dos partidos pequenos não é a solução.
É preciso pensar para além de limitações para pequenos e novos partidos.
Faz-se necessário também filtrar as legendas que contam com grande representação, buscando traçar de fato aqueles partidos que possuem ideologias concretas que justificam a sua existência, buscando soluções para aqueles que não as possuem.
De fato é muito mais difícil lidar com os partidos que já foram cadastrados e estão em vigor, porém o poder Constituinte já positivou a ideia de extinção de partidos, tornando essa possibilidade viável.
Conclusão
Por fim, creio na importância do pluripartidarismo, entendendo este como uma ferramenta essencial para a representação social em nosso contexto atual de democracia indireta, junto com a viabilização real do sufrágio universal e projeção ideológica como ferramentas de direitos fundamentais.
O pluripartidarismo se faz uma ferramenta de extrema importância para assegurar diretamente direitos políticos e, indiretamente, direitos sociais e fundamentais.
Contudo, também percebo que o cenário atual de 35 partidos políticos cadastrados no TSE causa um inchaço na máquina pública, com grandes gastos orçamentários, poucos resultados palpáveis de gestão eficiente e efetiva, sem uma clareza político-ideológica que justifique estas legendas, resultando em um completo caos em termos administrativos.
Ressalto que existem modelos internacionais que contam com pluripartidarismo com um número muito inferior de legendas, e mesmo assim sofrem profundas dificuldades de alinhamento de gestão.
Novamente, o artigo se propõe à exposição de uma posição pessoal, com a indução ao debate e reflexão, buscando a elaboração de ideias que possam sanar essa questão do atual cenário político brasileiro.
Como apontado acima, não entendo que as cláusulas de barreira que se limitem a frear os partidos pequenos de menor representação sejam a solução. Por isso é necessário analisar também as grandes legendas e entender se sua existência é embasada em uma ideologia que de fato represente parcela da sociedade ou se é apenas um artifício para troca e centralização de poder, perpetuando a história de concentração política do Brasil.
Referências
http://www.tse.jus.br/partidos/partidos-politicos/registrados-no-tse
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9096.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4737.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm
http://www.tse.jus.br/partidos/partidos-politicos/partido-em-formacao
http://fernandavertuan.jusbrasil.com.br/artigos/172396235/elementos-historicos-da-conquista-do-sufragio-universal