Prejuízos de credores em face a liberação de pagamento do devedor da falência

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3. SENTENÇA DE ENCERRAMENTO E SENTENÇA DE EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES (ART. 154 A 158, LF)

Fundamentado no Art. 154 ss. da Lei Falimentar, assim que esgotado o ativo com o pagamento dos credores, na medida do possível, instaura-se a fase do encerramento da falência. Esta fase baseia-se na prestação de contas do administrador judicial, que se caso, seja aprovada, resultará na sentença de encerramento da falência.

Em 30 (trinta) dias o administrador judicial apresentará a prestação de contas ao juízo. Como assegura MAMEDE (2014, p. 453), “Essas contas serão prestadas sob a forma mercantil (...), acompanhadas dos documentos comprobatórios, sendo processadas em autos apartados que, ao final, serão apensados aos autos da falência.”.

Assim que recebida, será emitido um aviso de que a prestação de contas foi entregue e posteriormente será disponibilizada aos interessados para análise e possível impugnação. Para isso, terão prazo de 10 (dez) dias. Passado o prazo para impugnação, o juízo citará o Ministério Público para manifestação no prazo de 5 (cinco) dias.

A partir daí, há duas circunstâncias que merecem atenção:

  • Não há impugnação ou parecer contrário;

Caso não haja impugnação por parte de algum credor nem parecer contrário do Ministério Público, os autos serão conclusos e encaminhados para a sentença.

  • Há impugnação ou parecer contrário;

Já neste caso, várias situações são possíveis. A primeira consiste em o Administrador Judicial fazer correções e/ou esclarecimentos quanto ao relatório final. Outra possibilidade seria o Administrador Judicial contestar a impugnação. Ainda é aceitável que se realize diligências para apuração dos fatos, o que é perfeitamente admissível à luz do Art. 154, §3º da Lei Falimentar. Assim que findado o procedimento, os autos serão concluídos, seguindo para sentença.

MAMEDE (2014, p. 454) diz que as contas podem ser aprovadas ou rejeitadas e quanto à sentença é cabível apelação. “Se rejeitadas, a sentença fixará suas responsabilidades, poderá determinar a indisponibilidade ou o sequestro de bens e servirá como título executivo para indenização da massa.”.

O administrador judicial apresentará o relatório final da falência e terá julgadas as suas contas. A partir daí o juiz encerrará o procedimento falimentar por sentença, a qual será publicada por edital. E, de acordo com o Art. 156 da Lei Falimentar, tal sentença é passível de apelação.

Observação interessante se faz no Art. 157, a saber: “O prazo prescricional relativo às obrigações do falido recomeça a correr a partir do dia em que transitar em julgado a sentença do encerramento da falência.”. Em análise ao artigo supracitado, pode-se perceber tratar-se de um marco, pois fica evidente que, por mais que se encerre um procedimento através da sentença, ainda não há extinção de obrigações, ou seja, o processo não transitou em julgado; não houve, portanto, ação decisória definitiva. Como afirma BEZERRA FILHO (2013, p. 326), “(...) a sentença de encerramento é apenas homologatória, de natureza processual (...)”. Há, então, a continuação da contagem prescricional que foi suspendida desde a decretação da falência.

Caberá ao falido requerer a declaração de extinção de obrigações por meio de sentença, como é bem delimitado no Art. 159 da Lei 11.101/2005. Mas torna-se relevante ressaltar o aparato legal do Art. 158 desta mesma legislação a seguir descrito:

Art. 158. Extingue as obrigações do falido:

  1. o pagamento de todos os créditos;
  2. o pagamento, depois de realizado todo o ativo, de mais de 50% (cinquenta por cento) dos créditos quirografários, sendo facultado ao falido o depósito da quantia necessária para atingir essa porcentagem se para tanto não bastou a integral liquidação do ativo;
  3. o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contado do encerramento da falência, se o falido não tiver sido condenado por prática de crime previsto nesta Lei;
  4. o decurso do prazo de 10 (dez) anos, contado do encerramento da falência, se o falido tiver sido condenado por prática de crime previsto nesta Lei.

(BRASIL, 2005)

Essas hipóteses do Art. 158 devem ser avaliadas cuidadosamente pelos operadores do Direito, uma vez que fomentam importantes discussões que serão delineadas no capítulo seguinte.

Quanto ao inciso “I”, é evidente o cumprimento da obrigação por parte do falido no que se refere ao pagamento de todos os créditos. Importa dizer que o devedor obtivera, a partir do procedimento falimentar, condições diante do ativo arrecadado, de arcar com todas as dívidas.

Para analisar o inciso “II” é importante promover uma breve apreciação da ordem para pagamentos no procedimento falimentar. A determinação legal requer extrema competência avaliativa, uma vez que não há um direcionamento consecutivo quanto a essa ordem para os pagamentos, como segue:

1º - Créditos trabalhistas;

Art. 151. Os créditos trabalhistas de natureza estritamente salarial vencidos nos 3 (três) meses anteriores à decretação da falência, até o limite de 5 (cinco) salários-mínimos por trabalhador, serão pagos tão logo haja disponibilidade em caixa.

(BRASIL, 2005)

2º - Pagamentos indispensáveis à administração da falência;

Art. 150. As despesas cujo pagamento antecipado seja indispensável à administração da falência, inclusive na hipótese de continuação provisória das atividades previstas no inciso XI do caput do art. 99 desta Lei, serão pagas pelo administrador judicial com os recursos disponíveis em caixa.

(BRASIL, 2005)

3º - Restituições;

Com base na parte introdutória do Art. 149, o verbo “realizadas”, empregado no particípio, indica algo já concluído, acabado; ou seja, nesta etapa as restituições já foram contempladas.

4º - Créditos extraconcursais; e

Art. 84. Serão considerados créditos extraconcursais e serão pagos com precedência sobre os mencionados no art. 83 desta Lei, na ordem a seguir, os relativos a:

  1. remunerações devidas ao administrador judicial e seus auxiliares, e créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho relativos a serviços prestados após a decretação da falência;
  2. quantias fornecidas à massa pelos credores;
  3. despesas com arrecadação, administração, realização do ativo e distribuição do seu produto, bem como custas do processo de falência;
  4. custas judiciais relativas às ações e execuções em que a massa falida tenha sido vencida;
  5. obrigações resultantes de atos jurídicos válidos praticados durante a recuperação judicial, nos termos do art. 67 desta Lei, ou após a decretação da falência, e tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência, respeitada a ordem estabelecida no art. 83 desta Lei.

(BRASIL, 2005)

5º - Demais créditos (Art. 83 e incisos), destacando os chamados “créditos quirografários” (Art. 83, VI da Lei Falimentar).

[...]

VI – créditos quirografários, a saber:

  1. aqueles não previstos nos demais incisos deste artigo;
  2. os saldos dos créditos não cobertos pelo produto da alienação dos bens vinculados ao seu pagamento;
  3. os saldos dos créditos derivados da legislação do trabalho que excederem o limite estabelecido no inciso I do caput deste artigo;

[...]

§ 4o Os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão considerados quirografários.

(BRASIL, 2005)

Com base no que foi explanado anteriormente, no que se refere a hierarquia de pagamentos no procedimento falimentar, depara-se com o que versa o inciso II do Art. 158 da Lei nº. 11.101/2005:

o pagamento, depois de realizado todo o ativo, de mais de 50% (cinquenta por cento) dos créditos quirografários[grifo nosso], sendo facultado ao falido o depósito da quantia necessária para atingir essa porcentagem se para tanto não bastou a integral liquidação do ativo;

Nesta possibilidade, assim que o falido atingir o percentual de mais de 50% (cinquenta por cento) de pagamento dos crédito quirografários, tem prerrogativa para solicitar a extinção da obrigação de pagar os demais crédito. Destaca-se que não é uma opção não pagar, todo o ativo deve ter sido antes utilizado nestes pagamentos, ou seja, o devedor não tem mais possibilidade de arrecadação para o pagamento dos demais possuidores de créditos.

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Os incisos III e IV representam o período prescricional e a condicionante para que o devedor possa solicitar a extinção das obrigações em trânsito em julgado.

Desde que observadas as hipóteses previstas nos incisos analisados, o devedor solicita, com base no Art. 159 da Lei Falimentar, a sentença de extinção das obrigações.


4. PREJUÍZO DOS CREDORES EM FACE DO PERMISSIVO LEGAL FALIMENTAR (ART. 158, II, LF)

Como objeto principal desta discussão, torna-se relevante dedicar um capítulo exclusivo para demandar a propositura da reflexão acerca do aparato legal que beneficia o falido.

A referência ao benefício se dá, justamente, porque de acordo com esta legislação vigente, os créditos quirografários não são os últimos a serem quitados, e ainda, que podem, inclusive, não serem pagos na sua totalidade, considerando que após esgotado o ativo e quitado mais de 50% destes créditos, os demais – 49,99% – estão propensos a não receberem o que lhes é devido.

Bezerra Filho (2013, p. 327), pontua que na lei anterior (Decreto-Lei Nº 7.661, de 21 de junho de 1945), os créditos quirografários eram os últimos a serem pagos, assim, mesmo que a porcentagem de pagamento fosse menor – 40% – o prejuízo dos credores era também menor, sabendo que quando se chegava na quitação dos créditos quirografários, todas as demais dívidas já teriam sido contempladas.

Na lei vigente, não. Após os créditos quirografários ainda existem os credores por multa contratual, penal ou administrativa, incluindo multas tributárias (inciso VII, Art. 83) e os créditos subordinados (inciso VIII, Art. 83), que também não serão pagos no caso de o falido utilizar o inciso II do Art. 158 para peticionar a extinção das obrigações. Lembrando que quando se refere ao não pagamento, nesta etapa já foi esgotado o ativo e não há mais condições de o devedor cumprir com o pagamento de seus débitos.

Mas mesmo que se considere a falta de condições de arcar com o compromisso de pagar, espera-se ainda que a maneira moral de se encerrar um procedimento falimentar seja com a liquidação de todos os créditos, sem exceção.

Cabe ainda salientar outra situação que traz à tona uma maneira de favorecer o falido, a saber:

II – o pagamento, depois de realizado todo o ativo, de mais de 50% (cinquenta por cento) dos créditos quirografários, sendo facultado ao falido o depósito da quantia necessária para atingir essa porcentagem se para tanto não bastou a integral liquidação do ativo [grifo nosso];

(BRASIL, 2005)

O destaque acima importa na possibilidade de o devedor buscar outros meios, inclusive com terceiros, para atingir o percentual a fim de liquidar com o ativo e requerer a extinção de sua obrigação. Ora, se o falido, em situação hipotética, pode buscar meios para chegar a uma porcentagem para atingir tal objetivo, porque deveras não poderia “buscar meios” de modo a não causar prejuízos a credores.

Importa aqui avaliar, de forma muito particular, que a lei estaria a beneficiar um desacerto. Entendendo que nas relações comerciais, importa que credores e devedores cumpram com suas obrigações, garantindo assim, um fluxo comercial saudável.

Ao longo do processo de evolução histórica do Direito, percebeu-se cedo que a insolvência criava um desafio jurídico e econômico: sobre o patrimônio de um mesmo devedor concorrem as pretensões de diversos credores, sem que todos possam ser satisfeitos.

(MAMEDE, 2014, p. 7)

Pertinente citar o conceituado doutrinador avaliando que o fato de haver a abertura de um procedimento falimentar na atual conjuntura, já se tem a pressuposição de que haverá prejuízo. Como trata-se de um processo coletivo, já se tem como certo que alguns serão satisfeitos e outros, prejudicados – justamenteporque o devedor não tem condições de quitar seus débitos; que seu patrimônio ativo é inferior ao passivo e que decerto, causará lesão a alguém que investiu e não terá retorno do seu investimento.

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Sobre os autores
Aluer Baptista Freire Júnior

Pós-Doutor em Direito Privado-PUC-MG.Doutor em Direito Privado e Mestre em Direito Privado pela PUC-Minas. MBA em Direito Empresarial, Pós Graduado em Direito Público, Penal/Processo Penal, Direito Privado e Processo Civil. Professor de Graduação e Pós Graduação. Coordenador do Curso de Direito da Fadileste. Editor-Chefe da Revista REMAS - Faculdade do Futuro. Advogado. Autor de Livros e artigos.

Luciano Dutra Ferreira

Acadêmico do Curso de Direito da FADILESTE

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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