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Princípio da proporcionalidade e sua aplicação no Direito Tributário

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11/12/2005 às 00:00
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5. APLICABILIDADE DA PROPORCIONALIDADE NO DIREITO TRIBUTÁRIO

            A aplicação da proporcionalidade no Direito Tributário depende do efeito e da finalidade das normas a serem aplicadas. As normas tributárias têm duas espécies de eficácia quanto aos bens jurídicos que afetam: fiscal e extrafiscal

            A primeira se verifica quando se colima a retirar dinheiro dos particulares, situação na qual possuem uma eficácia criativa de encargo, cuja medida é obtida mediante a análise das normas que estabelecem como deve ser dividido o encargo (igualdade como capacidade contributiva); a segunda quando visam afetar a atividade econômica dos contribuintes ou influenciar o seu status econômico ou social, hipótese na qual possuem uma eficácia limitativa da liberdade, cuja medida é obtida mediante a análise das normas que garantem a liberdade dos contribuintes (liberdade, propriedade, esfera privada, sigilo, etc.).

            Conforme esclarece Àvila (1999), no caso de normas jurídicas tributárias que tenham uma finalidade estritamente fiscal e afrontem bens jurídicos protegidos pelo direito de propriedade, a aplicação do dever de proporcionalidade, pela deficiência do fim para estruturar a relação jurídica, circunscreve-se à proporcionalidade em sentido estrito, ou proibição de excesso. Se a imposição tributária total for tão alta que implique a não realização de um direito fundamental, como a propriedade, a liberdade de exercício de atividade econômica ou da dignidade humana, deve ser declarada inválida. O que a proibição de confisco e a observância do limite para uma existência digna significam é, apenas, o dever de preservar o núcleo do direito de propriedade e da dignidade humana.

            Nesses casos, respeitado o princípio da legalidade estrita para a instituição do tributo ou da multa, e verificada a situação de fato necessária e suficiente à sua incidência, não incumbe ao Poder Judiciário analisar se o meio escolhido está apto para alcançar o resultado desejado (exame da adequação) ou se, dentre todas as disponíveis e igualmente eficazes para atingir o fim, é a menos gravosa em relação aos direitos envolvidos (exame da necessidade), mas unicamente se houve restrição excessiva dos direitos envolvidos (exame da proporcionalidade em sentido estrito ou da correspondência).

            Consigna Ávila (1999):

            O fim, das normas que instituem tributos, não serve como estruturador da relação, a tal ponto que o caráter trifásico do dever de proporcionalidade possa ser realizado. Como lembra VOGEL, a utilização do fim "custear despesas públicas" como estruturador da relação jurídica surgida com a instituição legal de um tributo levaria tão-só à cobrança cada vez maior de tributos.95 Para que o fim seja estruturador de uma relação jurídica, ele deve ser concretamente verificável na realidade dos fatos, e não unicamente no mundo do Direito.96 Isso, porém, não ocorre no caso de normas que instituem impostos, já que elas têm a finalidade de arrecadação, sem que exista um fim concreto capaz de estruturar a relação jurídica delas decorrente. Não se aplica, portanto, o princípio da proporcionalidade (na sua estrutura meio-fim). Aqui o decisivo é o princípio da igualdade como medida para a divisão dos encargos, depois que estiverem resolvidas as questões relativas a realização mínima dos direitos fundamentais envolvidos (o dever de respeito à existência mínima no caso do direito à vida e da inviolabilidade da dignidade humana, a proibição de confisco no caso do direito de propriedade e de livre exercício de atividade econômica).

            Todavia, no caso de normas jurídicas tributárias que tenham uma finalidade extrafiscal e/ou afrontem bens jurídicos protegidos pelo direitos de liberdade (normas que instituem tributos vinculados — taxas, p. ex. — ou que criem deveres acessórios tais como apresentar informações em um prazo determinado, p. ex.), a obediência ao dever de proporcionalidade admite seu caráter trifásico, porque há uma finalidade objetivamente determinável e estruturante da relação jurídica, em função da qual a relação meio-fim adquire consistência [15].

            No caso, por exemplo, da instituição de taxas tem-se por finalidade custear as despesas decorrentes de serviços públicos colocados à disposição do particular, de tal modo que devam ser adequadas (corresponder ao fato gerador — serviço público prestado ou o exercício efetivo do poder de polícia —, e não ao patrimônio ou à renda do sujeito passivo) [16], e que não devam ficar sem relação de proporcionalidade relativamente à sua finalidade. O importante é que o fim, nessas normas que possuem eficácia formativa do comportamento (criadora de obrigações que afetam os direitos de liberdade) e não uma eficácia meramente impositiva (criadora de encargo tributário desvinculado), serve como estruturador da relação, a tal ponto que o caráter trifásico do dever de proporcionalidade pode ser utilizado.

            Analisaremos a seguir dois pontos abarcados pelo Direito Tributário "lato sensu" nos quais a aplicação do princípio da proporcionalidade possui ampla aplicação.

            5.1. Sanções Tributárias

            Em se tratando de sanção jurídica, notório é fato de que ela não constitui um fim em si mesma, mas um mero instrumento para alcançar uma finalidade de interesse publico, consubstanciada na busca de concretização de uma regra ou principio protegidos pela ordem jurídica [17].

            Havendo um fim objetivamente aferível, há espaço para que o principio da proporcionalidade, em sua inteireza trifásica, constitua um instrumento apto a controlar os excessos do legislador e das autoridades estatais em geral na definição abstrata e concreta das sanções.

            O primeiro passo para o controle da constitucionalidade de uma sanção, através do principio da proporcionalidade, consiste na perquirição dos objetivos imediato visados com a previsão abstrata e/ou com a imposição concreta da sanção [18].

            Na maioria da vezes, as sanções tributárias tem por fim realizar o interesse público consistente na arrecadação das receitas indispensáveis ao custeio dos serviços e investimentos públicos. Desta feita, as sanções tributárias constituem nada mais do que um instrumento de busca da concretização do principio da capacidade contributiva, sendo este que exige e valida as funções intimidatória e ressarcitória presentes na regra tributária sancionatória.

            Contudo, verifica-se nos Estados ocidentais contemporâneos, marcados pela intervenção no e sobre o domínio econômico e comprometidos juridicamente com a justiça social, a utilização das hipóteses de incidências tributarias com outros objetivos, além daqueles meramente arrecadatórios. É o que se convencionou denominar função extrafiscal da tributação.

            Neste caso, a sanção não se funda diretamente no princípio da capacidade contributiva, mas no objetivo que justificou a criação daquela incidência tributária; daí porque o juízo acerca da constitucionalidade da sanção tributária, diante do princípio da proporcionalidade, deve, neste caso, considerar o nível da penalidade imposta, não em relação à lesão sofrida pelo principio da capacidade contributivas, mas em relação ao grau de frustração sofrido pelo objetivo extrafiscal buscado com aquela incidência tributária [19].

            Consigna Ávila (2000, p. 137):

            O efetivo controle da constitucionalidade da previsão e da imposição de uma sanção tributária sob a ótica do principio da proporcionalidade, deve considerar não apenas a razoável compatibilidade entre o objetivo visado com a regra tributária inobservada e o nível de sanção previsto para esta inobservância, mas, sobre tudo, a extensão da limitação sofrida pelo individuo que deve suportar a sanção. O principio da proporcionalidade exige que a constitucionalidade da sanção seja verificada também sob o ponto de vista do indivíduo infrator, isto é, impõe ao intérprete-aplicador do Direito o dever de considerar o alcance que a sanção tributária concretamente assume relativamente à esfera jurídica do indivíduo infrator.

            A abstrata previsão legal de uma multa pecuniária pode observar o principio da proporcionalidade quando existe razoável contabilidade entre o que se busca com a regra tributária que tenha sido inobservada e a sanção prevista como conseqüência para essa violação. Contudo, a aplicação desta sanção pode afigurar-se inválida, por ofensa ao principio da proporcionalidade, se, considerando as características peculiares do individuo infrator, a efetiva imposição daquela sanção acaba resultando, por exemplo, no completo aniquilamento da atividade econômica.

            Neste particular, o princípio da proporcionalidade consubstancia meio de concretização do princípio da individualização da pena, garantido pelo artigo 5º, XLVI, da Constituição Federal brasileira, valendo mencionar, entretanto, que o Poder Judiciário na análise do caso concreto deve apenas decidir acerca da validade da penalidade, jamais graduando a mesma, salvo quando a própria lei dispor de modo suficiente, sob pena de afronta ao princípio da legalidade e da tipologia.

            Tratando da análise trifásica do princípio da proporcionalidade aplicado às sanções tributárias, sustenta Ávila (2000, p. 141/144):

            A proporcionalidade, em seu aspecto necessidade (Erforderlichkeit), consubstancia a regra da menor limitação possível, ou do meio menos lesivo (das mildeste Mittel). Para atender ao princípio da proporcionalidade, em seu aspecto necessidade, a medida restritiva imposta pelo Estado deve representar a menor limitação possível à esfera individual juridicamente protegida, e que concretamente á atingida pela imposição da sanção.

            A sanção tributária nada mais é do que a imposição de uma limitação à esfera jurídica do infrator (protegida prima facie) e para cumprir o princípio da proporcionalidade, em seu aspecto necessidade, deve ser graduada de modo a impor a menor limitação possível àquela esfera.

            O princípio da proporcionalidade, em seu aspecto necessidade, forma inconstitucional também grande parte das sanções indiretas ou políticas impostas pelo Estado sobre os sujeitos passivos que se encontrem em estado de impontualidade com os seus deveres tributários.

            Por último, o princípio da proporcionalidade em sentido lato exige que a sanção tributária seja conforme ou proporcional em sentido estrito aos objetivos que pretende alcançar, e que pretendem validar a sua previsão e aplicação concreta. Através deste aspecto, o intérprete-aplicador do Direito deve verificar se a finalidade de interesse público buscada pela regra sancionatória supera o grau de limitação jurídica decorrente da imposição concreta da sanção. A conformidade ou proporcionalidade em sentido estrito impede que, a pretexto de alcançar uma finalidade de interesse a público, o Estado acabe por anular completamente o âmbito de eficácia de outros direitos e garantias individuais.

            A proporcionalidade em sentido estrito permite a verificação dos efeitos concretos que a imposição da sanção gera sobre a esfera jurídica do sujeito infrator.

            5.2. Intervenção no Domínio Econômico

            A Magna Carta prevê a possibilidade da União lançar mão de contribuições interventivas como instrumento de sua atuação no domínio econômico. Tal exação, assim, servirá como instrumento para a União intervir no domínio econômico.

            Quadra ressaltar que se trata de uma atuação em campo originariamente não destinado ao Estado, vez que se contrario fosse, não poderia essa atuação levar a alcunha "intervenção", a qual exprime indesviável caráter de exceção.

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            A Cosntituição Federal, em seu art. 173, caput, permite ao Estado a exploração direta da economia, ressalvados os casos nela previstos, somente quando necessária aos imperativos de segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, nos termos da lei.

            Em consonância com o disposto no indigitado cânone, o art. 174 disciplina a atuação do Estado como agente normativo, regulador da atividade econômica, no exercício das funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo esse determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. Tais artigos revelam o conteúdo de exceção que permeia a atuação do Estado no domínio econômico, sendo possível denominar essa atuação como uma intervenção.

            Paulo Roberto Lyrio Pimenta (2002, p. 38/40) discriminou essa intervenção do Estado em duas formas, a saber, direta e indireta.Pela primeira, o Estado intervém no domínio econômico, como verdadeiro agente, assumindo integralmente (por absorção) ou parcialmente (por participação) o controle dos meios de produção e/ou troca de determinado setor da atividade econômica em sentido estrito. Ou seja, o Estado, através de um ente com personalidade jurídica própria (empresa pública, sociedade de economia mista ou subsidiária), atua no domínio econômico, seja sob o regime de monopólio, seja em concorrência com os demais agentes econômicos da iniciativa privada. Pela segunda, ao intervir de forma indireta, o Estado se limita a condicionar, a partir de fora, a atividade econômica privada, exercendo sua função normativa e regulatória. Tal postura pode se dar por meio de duas modalidades (ou técnicas).

            Por direção, o Estado exerce pressão sobre a economia, estabelecendo mecanismos e normas de comportamento compulsório para os agentes particulares, de caráter eminentemente cogente, inclusive para as empresas estatais que desempenhem atividade econômica em sentido estrito.

            Já na modalidade de intervenção por indução, a atuação estatal se concretiza mediante a adoção de técnicas regulatórias de estímulo e desestímulo de determinadas condutas, em consonância com as leis do mercado.

            Respaldando-se na distinção feita pelo indigitado Autor e na lição de Pontes (2002, p. 138), é possível concluir que a intervenção indireta seria a única autorizada constitucionalmente a balizar a instituição de contribuições de intervenção no domínio econômico, malgrado a literalidade do art. 149 da Carta. O exame, porém, não está completo. Entre as duas modalidades de intervenção, por direção e por indução, fixamos o entendimento de que somente a intervenção indireta por indução poderia servir como finalidade suficiente a legitimar a exação tributária em tela.

            A Constituição não limita o exercício da função regulatória pelo Estado à adoção de medidas de caráter positivo. Ao contrário, a Constituição se preocupou em gizar que uma intervenção estatal deve apontar para a consecução dos objetivos elegidos nela como finalidades que espelhem os princípios da ordem econômica, seja através de uma ação negativa, seja através de uma ação positiva.

            Finalidade e destino do produto da arrecadação

            Vale ressaltar que exercício da competência impositiva do art. 149 submete-se a um critério de validação finalístico. A União instituirá contribuições interventivas para que uma finalidade (intervenção no domínio econômico) seja atingida. No entanto, é necessário esclarecer qual é a relação existente entre a contribuição (meio) e a intervenção (fim).

            Nas exatas palavras do constituinte, a União poderá instituir contribuições de intervenção no domínio econômico como instrumento de sua atuação na respectiva área. A Constituição, nesse ponto, não limitou a atuação do legislador infraconstitucional na escolha do mecanismo regente da relação contribuição/intervenção, permitindo-lhe, segundo o juízo de conveniência legislativa e a política econômica adotada pelo Estado, a eleição do meio mais eficaz para o alcance das finalidades que impulsionam a intervenção Estado.

            A definição adotada pela Constituição para a contribuição interventiva apenas deixa claro que a exação deve servir de instrumento à intervenção pretendida. De uma forma ou de outra. Dessa feita, entendemos que a Constituição, por seu art. 149, autoriza a União a instituir uma contribuição interventiva que exerça, por si só, através da sua incidência, a intervenção sobre o domínio econômico. A finalidade da intervenção, que deve estar contida na hipótese de incidência dessa contribuição, não é desprezada nesse modelo, mas realizável segundo outros critérios.

            Ademais, como descrito no item anterior, a intervenção indireta do Estado por indução, mediante o desestímulo de certas condutas em prol de outras, consoantes com o objetivo da intervenção, pode se expressar por um ônus tributário como fator primordial para a concretização do efeito indutivo pretendido, caso em que o próprio Constituinte atrelou à receita à referida intervenção.

            A norma impositiva do art. 149 e o princípio da proporcionalidade como critério de aferição de constitucionalidade

            O exame da proporcionalidade em sentido amplo da hipótese de incidência da contribuição interventiva deve seguir os três deveres impostos por esse princípio.

            Adequação

            A adequação exige que o desenho da hipótese de incidência seja apropriado à finalidade da intervenção instrumentalizada pela contribuição. Assim, a relação causal entre a contribuição (meio) e o fim (princípio balizador da intervenção) deve ser examinada pelo intérprete-aplicador.

            A intervenção visa a atingir determinado setor do domínio econômico e provocar alterações na realidade de seus agentes econômicos que corrijam as falhas existentes no mercado em prol de um desiderato constitucional. A instituição do gravame tributário deve ser capaz de promover as alterações pretendidas de forma adequada. Assim, a eleição do grupo de sujeitos passivos da contribuição (e das materialidades a serem oneradas) deve guardar um liame lógico–material com a finalidade buscada com a intervenção, ou seja, a escolha do grupo deve contribuir para o alcance da finalidade e não obsta-lo ou dificulta-lo.

            Logo, uma contribuição infringirá o dever de adequação se, a propósito de intervir em determinado setor da economia, o Estado seleciona outro setor, sem qualquer relação lógica com aquele a ser atingido pela intervenção, para arcar com ônus tributário. No entanto, cabe, aqui, ressaltar que o dever de adequação não exige uma referibilidade direta entre os sujeitos passivos e aqueles beneficiários da intervenção sobre o domínio econômico. Entender a adequação nesses moldes seria desprezar as nuanças peculiares da atividade econômica e o caráter indutivo de que pode se revestir a intervenção através de uma contribuição.

            O que se exige é um liame lógico entre o grupo de sujeitos passivos e a finalidade almejada, e não uma identidade obrigatória entre o grupo e os beneficiários. Se pensarmos, dentro da tipologia já exposta, na hipótese da intervenção indireta por indução, enfrentaremos uma espécie tributária que não tem como fundamento o princípio da contraprestação, como é o caso da taxa, e que, por isso, necessita de um estudo mais complexo. Vejamos com mais vagar essa questão.

            Com base nesse sustentáculo teórico, Pontes (2002, p. 143) afirma que a causa da contribuição interventiva no princípio da necessidade do mercado. Segundo esse raciocínio, o Estado deve utilizar-se das contribuições interventivas para regular distorções existentes no mercado, que vulnerem determinado princípio da ordem econômica, e que necessitem ser eliminadas ou, pelo menos, atenuadas.

            É dentro dessa idéia que afirmamos supra que o dever de adequação, ínsito ao princípio da proporcionalidade, não exige, necessariamente, uma referibilidade direta na delimitação do pólo passivo da contribuição interventiva. O juízo acerca da relação entre contribuintes e beneficiários dependerá da distorção que se quer intenta corrigir com a intervenção.

            Em outras palavras, é a necessidade do mercado, fundamento da tributação por essa via, que determinará os níveis de identidade nessa relação, levando-se em conta as circunstâncias jurídicas e fáticas do caso concreto. O aspecto da adequação exige que haja um liame lógico-material entre a eleição dos sujeitos passivos e a finalidade (correção das distorções), ou de forma mais simples, que o alcance da última seja facilitada pela primeira. Se a necessidade do mercado, a distorção existente exigir que haja essa identidade, então ela se mostrará imprescindível. Não se deve, contudo, adotar essa idéia, de forma apriorística, como requisito ao cumprimento do aspecto da adequação.

            Necessidade

            Para que uma medida estatal interventiva cumpra o dever de necessidade estampado no princípio da proporcionalidade, deve estabelecer o menor gravame à esfera juridicamente protegida dos indivíduos, a menor restrição possível aos direitos e garantias fundamentais. Nesse sentido, a efetivação do princípio constitucional que fundamente a instituição da contribuição interventiva não se legitima se, para tanto, outro princípio constitucional seja limitado, a ponto de ter seu núcleo essencial vulnerado.

            Segundo esclarece Pontes (2000, p. 183), a verificação de atendimento a esse dever de necessidade se dá em dois diferentes níveis, externo e interno, segregados pela sua relação com a hipótese de incidência tributária da contribuição interventiva.

            Em nível externo, o intérprete-aplicador deve aferir se a intervenção sobre o domínio econômico realmente necessita de recursos decorrentes de um ônus tributário para que as finalidades que a qualificam sejam alcançadas, visto que podem ocorrer hipóteses nas quais outras medidas, de natureza não tributária, já seriam suficientes.

            Ainda sob essa perspectiva externa, cumpre ao intérprete-aplicador se certificar de que não há no ordenamento jurídico espécie tributária outra destinada àquele mesmo fim, caso contrário, a instituição de uma nova exação tributária se mostraria desnecessária.

            Em nível interno, o aspecto da necessidade é investigado diretamente na hipótese de incidência tributária. Através dessa análise, busca-se verificar se o ônus econômico imposto pela contribuição à atividade dos agentes econômicos possui a medida necessária à promoção do interesse público objetivado. A limitação ao direito de propriedade dos indivíduos deve ser, portanto, a menor possível, preservando-se o seu núcleo essencial, de forma a ver-se cumprida a exigência constitucional da vedação ao confisco. Ademais, o Estado não encontra guarida constitucional para intervir sobre o domínio econômico através de um ônus tributário desmedido, fora dos padrões de necessidade, que inviabilize o exercício de atividade econômica lícita, em afronta direta ao principio da livre iniciativa, fundante da ordem econômica.

            Proporcionalidade em sentido estrito

            O juízo da proporcionalidade em sentido estrito ou conformidade destina-se a averiguar se as vantagens decorrentes da intervenção através de contribuição superam os prejuízos trazidos às órbitas de eficácia dos princípios constitucionais. Analisa-se, nesse estágio, a pertinência da finalidade perseguida com a instituição de uma contribuição perante os demais desideratos constitucionais e a relação entre os níveis de sacrifício que a busca dessa finalidade acarreta aos referidos desideratos e o de efetivação dos princípios constitucionais gerado pela intervenção.

            Os princípios da propriedade privada, da livre iniciativa e da livre concorrência poderão ser afetados por uma intervenção como a que se cogita, mas não poderão dela advir efeitos deletérios ao núcleo essencial de tais bens jurídicos constitucionalmente tutelados. As circunstâncias fáticas e jurídicas do caso concreto é que alimentarão a análise do intérprete-aplicador do Direito na constatação da obediência a esse dever de proporcionalidade em sentido estrito.

            Como expressão da idéia nuclear do princípio da proporcionalidade, a aplicação desse aspecto consubstancia a afirmação do referido princípio nas dimensões da vedação ao excesso e da concordância prática entre os princípios jurídicos conformadores do ordenamento jurídico.

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Sobre o autor
Alessandro Ribeiro Couto

advogado e consultor jurídico em Salvador (BA), mestrando em Direito Público pela UFBA, especialista em direito tributário pelo Instituto Brasieiro de direito Tributário (IBET), professor da FABAC

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COUTO, Alessandro Ribeiro. Princípio da proporcionalidade e sua aplicação no Direito Tributário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 891, 11 dez. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7673. Acesso em: 20 abr. 2024.

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