Inicialmente, cumpre entender o que é exatamente uma PPP. Em sentido amplo, parcerias entre o setor público e a iniciativa privada não são novidades, estando presentes, em maior ou menor grau, nos mais variados regimes, como a sociedade de economia mista, a licitação de obra pública, a concessão de serviço público ou de uso de bem público, a permissão e a autorização para o exercício de atividade regulada.
O projeto de Lei original (no. 2.546/2003) definia o contrato de Parceria Público- Privada no caput do artigo 2º, da seguinte maneira:
"Art. 2 (...) o ajuste celebrado entre a Administração Pública e entidades privadas, que estabeleça vínculo jurídico para a implantação ou gestão, no todo ou em parte, de serviços, empreendimentos e atividades de interesse público, em que haja aporte de recursos pelo parceiro privado, que responderá pelo respectivo financiamento e pela execução do objeto."
A Lei aprovada pelo Congresso, entretanto, define o contrato de Parceria Público-Privada de uma forma mais concisa, conforme aponta a redação do caput do artigo 2º da Lei 11.079/04, reproduzido abaixo:
"Parceria Público-Privada é o contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa."
Diante desta definição, podemos afirmar que a PPP possui a natureza de contrato administrativo de concessão, não podendo entretanto ser confundida com a concessão instituída pela Lei no. 8.987/95, conforme será demonstrado a seguir.
Tal como concebida pela Lei Federal 11.079, de 30.12.2004 e pelas diversas leis estaduais já aprovadas sobre o tema, a PPP busca designar uma modalidade específica de parceria na qual o parceiro privado assume responsabilidade integral pelo investimento na infra-estrutura que, devidamente operada, lhe permitirá oferecer um determinado serviço ou utilidade à comunidade, em contrapartida a uma remuneração paga, complementada ou garantida pelo setor público ao longo da operação do projeto. A PPP caracteriza-se, assim, pelo compromisso remuneratório assumido pelo Estado, pelo longo prazo e, ademais, pela vinculação da remuneração ao desempenho do parceiro privado de acordo com as metas e padrões de qualidade previamente acordados.
Em vista dessas características, a PPP diferencia-se substancialmente da concessão de serviço público comum, em que o concessionário obtém sua remuneração via tarifa dos usuários de seu serviço, e da licitação de obra pública, em que o pagamento pelo Estado ocorre à medida da execução da obra, e não ao longo de sua operação.
Via de regra, portanto, as PPPs devem ser reservadas a projetos não auto-sustentáveis, pois, havendo viabilidade tarifária, não se justifica a assunção de compromissos financeiros por parte do Estado.
Assim, para que um projeto seja objeto de uma PPP, além de estar previsto no Plano Plurianual (PPA) [01], a sua equação econômico-financeira deve justificar a adoção desta modalidade de concessão. Projetos rentáveis, auto-suficientes, não necessitam de uma PPP para se tornarem viáveis.
Posto isto, é correto afirmar que as PPPs se aplicam a projetos de baixa rentabilidade e que não estão submetidos a regras de mercado. Num setor onde não é possível fixar um preço de mercado para o serviço público a ser prestado pelo Parceiro Privado, a intervenção do Estado torna-se justificável com vistas a determinar este preço.
O quadro abaixo ilustra o método de concessão a ser adotado, de acordo com o grau de rentabilidade do projeto:
É claro que a rentabilidade do projeto não é o único fator capaz de determinar a inserção de determinado projeto na carteira das PPP’s. A abertura do processo licitatório de um projeto sob a égide deste regime está condicionada ao atendimento de uma série de exigências, elencadas no artigo 10 da Lei das PPP’s, e analisadas na seção 2.3 deste trabalho. Entretanto, já é possível adiantar quais foram os critérios empregados pelo legislador para formular tais exigências:
1.Estratégia de desenvolvimento do Governo Federal;
2.Capacidade de geração de receitas do Projeto;
3.Interesse manifestado pelo Setor Privado;
4.Nível de desenvolvimento do Projeto. Projetos em estágio inicial de concepção, por conterem maiores riscos, alguns ainda não identificados, não serão licitados pelo governo enquanto não atingirem um estágio de maturação econômica e técnica.
A estruturação de um projeto de parceria segue normalmente o formato de um Project Finance, que é uma forma de financiamento de um investimento de capital economicamente separável, que tem no fluxo de caixa do projeto a fonte de pagamento dos empréstimos e do retorno do capital investido. Para o desenvolvimento do empreendimento, os investidores e patrocinadores constituem uma sociedade de propósito específico (SPE), cujos ativos e obrigações estão fora do balanço dos acionistas, limitando sua responsabilidade aos capitais aportados no projeto.
Uma das questões mais importantes nos projetos de parceria é a alocação dos riscos entre as partes. Conforme se discutirá na seção seguinte, a lei brasileira de PPP inova ao permitir que o poder público transfira para a iniciativa privada riscos que tradicionalmente são de responsabilidade da administração pública. A alocação de riscos nos projetos de PPP será feita contratualmente, dependendo do setor e do escopo do serviço.
No entanto, pela experiência internacional [02], tipicamente o parceiro privado assume os riscos associados a projeto, construção do empreendimento (principalmente no que se refere a custos e prazos), manutenção, operação e prestação do serviço, riscos financeiros (cambial e de taxa de juros) e demais riscos comerciais. O poder público fica com os riscos de planejamento, desapropriação, licenciamento ambiental prévio, mudança geral de legislação, podendo compartilhar com o parceiro privado riscos de força maior e caso fortuito.
Após esta breve introdução ao instituto das PPP’s, analisaremos nos parágrafos seguintes os principais artigos da Lei que instituiu este método de contratação com a Administração Pública no País.
2.1 – Identidade dos contratantes
Nos termos do artigo 1º da Lei 11.079/04, possuem autonomia para formalizar as PPPs:
2.1.1 - Parceiro Público – a Administração Pública
O Parágrafo Único do artigo 1º da Lei 11.079/04 determina que podem promover a contratação de parcerias público-privadas os órgãos da Administração Direta, aos fundos especiais, às autarquias, às fundações publicas, às empresas públicas, às sociedades de economia mista e às demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
2.1.2 - Parceiro Privado – a Iniciativa Privada
O Parceiro Privado é qualquer pessoa jurídica ou consórcio de empresas capacitado para executar o objeto do contrato de PPP. Tal capacitação deve ser demonstrada com base nos parâmetros fixados pelo edital de licitação que visa a outorga de um empreendimento sob o regime das PPPs. Detalhes sobre este mecanismo de licitação serão divulgados a seguir.
Se observamos o disposto no artigo 9 da Lei das PPP’s, veremos que o objeto da parceria será implantado e gerido por uma sociedade de propósito específico (SPE), a ser criada pelo vencedor da licitação, em momento anterior à celebração do contrato de PPP.
É importante salientar que o § 4 deste mesmo artigo proíbe a Administração Pública de deter a maioria do capital social votante desta SPE. A idéia deste dispositivo é impedir que a PPP se transforme em Parceira Público-Público. Deste modo, se porventura uma empresa estatal firmar um contrato de consórcio com uma empresa privada para participar de uma licitação cujo objeto é a concessão de um empreendimento sob o regime da PPP, esta estatal não poderá ser proprietária da maioria do capital votante da SPE que irá implantar e gerir o empreendimento.
Este dispositivo tem uma clara razão de ser. Como ensina Marçal Justen Filho, o instituto das parcerias público-privadas tem como grande inovação possibilitar que o Poder Público capte investimentos privados para projetos em que anteriormente só dependiam de recursos públicos. Conclui-se então que o ponto central das PPPs diz respeito ao financiamento do empreendimento: "O particular deverá custear a execução da obra, mas o Poder Público prestará garantia séria e firme de que arcará com os valores necessários à liquidação da dívida, no longo prazo. Essa garantia é utilizada pelo particular perante o sistema financeiro, de modo a reduzir os custos." [03]. Ora, referida captação de recursos privados não irá ocorrer se o Estado se auto-contratar para implantar, gerir e financiar um empreendimento.
É interessante notar que esta vedação não se aplica às instituições financeiras controladas pelo Poder Público. Sempre que estas figurarem como financiadoras do empreendimento, poderão adquirir a maioria do capital votante da SPE, a fim de garantir melhores condições de funcionamento e continuidade na prestação dos serviços, nos termos do § 5 da Lei das PPP’s. São os chamados "Step in Rights" do financiador, de acordo com o jargão do setor.
Afora a questão do controle acionário da SPE, o artigo 9 da Lei das PPPs estipula que as SPE’s constituídas no âmbito de uma Parceria devem obedecer os padrões internacionais de governança corporativa, podendo assumir a forma de companhia aberta, com valores mobiliários admitidos à negociação no mercado de capitais.
2.1.3 – A missão de cada Parceiro
A repartição de tarefas entre as partes contratantes de uma concessão em parceria é a seguinte:
- as sociedades de propósito específico a serem constituídas pelo parceiro privado estão incumbidas de investir na implantação do objeto da parceria, assumindo posteriormente a obrigação de geri-lo, primando sempre pela qualidade dos serviços e modicidade tarifária;
- a administração pública figura como o poder concedente incumbido de delegar, supervisionar e cobrir, total ou parcialmente, os gastos realizados pelas sociedades de propósito específico nos contratos de parceria, ocupando-se igualmente da fiscalização da qualidade e preço dos serviços prestados, além de assegurar a justa compensação do Parceiro Privado, de forma a garantir a remuneração do investimento por ele realizado por ocasião da implantação do objeto da concessão, não esquecendo de incluir nesta equação os gastos posteriores com a gerência deste objeto (operação e manutenção do empreendimento).
Ao distribuir obrigações às partes contratantes da maneira exposta acima, o legislador procurou garantir a cada parceiro o exercício de suas melhores qualificações, com vistas à realização do interesse público. Neste esteio, cabe ao Parceiro Público idealizar as políticas de desenvolvimento à longo prazo, de acordo com as necessidades do País. Adicionalmente, o Parceiro Público deverá buscar uma maneira de promover as melhorias infra-estruturais e a prestação de serviços públicos compatíveis com tais políticas de desenvolvimento. O Parceiro Privado, a seu turno, financiará as políticas de longo prazo idealizadas pelo Governo, agregando qualidade aos serviços prestados, mediante uma contraprestação adequada e assunção de riscos aceitáveis.
2.2 – Modalidades de parceria
Em determinado aspecto, a nova lei pode ser considerada como um simples aditivo à antiga Lei de Concessões e Permissões de obras e de serviços públicos (Lei 8.987/95), pois ela autoriza o Estado a realizar duas novas formas de concessão: a concessão patrocinada e a concessão administrativa. A modalidade de concessão praticada até então, entretanto, continuará existindo, sob o nome de concessão comum [04].
É possível caracterizar estas duas novas modalidades de concessão da seguinte maneira: na "PPP patrocinada", o serviço é prestado diretamente ao público, e o Estado se encarrega de complementar a remuneração recebida pelo concessionário dos usuários do serviço, em princípio através de uma contraprestação pecuniária. Na "PPP administrativa", entretanto, os serviços são prestados direta ou indiretamente (quando há um terceiro beneficiário, a população na maioria das vezes [05]) à Administração Pública, e todo pagamento realizado ao particular contratado é realizado pela própria entidade estatal contratante [06]. Não importando o real usuário dos serviços, em função do interesse público, caberá a Administração Pública arcar com a totalidade da remuneração devida à iniciativa privada pela prestação dos serviços.
O Contrato de PPP envolve a realização dos projetos, construção, financiamento, operação e transferência dos bens ao final para o Poder Público. O investimento realizado no âmbito de um contrato de PPP deve ser amortizado no respectivo período de vigência, sabendo-se que referido período será de, no mínimo, 5 anos, e, no máximo, 35 anos.
No âmbito da Concessão Patrocinada, a receita do Parceiro Privado será composta pelas tarifas pagas pelos usuários dos serviços, de um lado, e a contraprestação paga pelo Parceiro Público, de outro lado. A contraprestação paga pelo Parceiro Público fica limitada a 70% da contraprestação total recebida pelo Parceiro Privado, salvo autorização legislativa específica [07]. Na Concessão Administrativa, conforme já dito, o Parceiro Privado será sustentado por uma contraprestação pública, paga pelo ente da Administração beneficiado pela prestação dos serviços. Vale lembrar que o pagamento da parcela atribuída ao Poder Público está condicionado à efetiva prestação dos serviços e a performance satisfatória do parceiro privado [08].
Neste sentido, é correto afirmar que os pagamentos efetuados pelo Poder Público ao Parceiro Privado estão vinculados à etapa de desenvolvimento do projeto. Durante a fase de construção, o Parceiro Privado não recebe recursos do Parceiro Público, posto que a liberação destes depende da efetiva prestação dos serviços que constituem o objeto da concessão. Esta assertiva se aplica tanto à concessão patrocinada, quanto à concessão administrativa. Na fase de operação, entretanto, o Parceiro Privado receberá do Parceiro Público uma contraprestação pelos serviços efetivamente oferecidos, que irá variar de acordo com o seu grau de performance na execução dos serviços, bem como o atendimento das metas fixadas no contrato que regulamenta a parceria.
Na fase de construção do projeto, o Parceiro Privado também não irá receber recursos oriundos das tarifas pagas pelos usuários, já que não é possível cobrar tarifas por um serviço que ainda não está sendo prestado.
Ainda relação à remuneração do parceiro privado, constata-se que a SPE no âmbito de uma concessão patrocinada dispõe de duas fontes de renda. A primeira delas é a tarifa paga pelos usuários que usufruem dos serviços prestados. A segunda é a contraprestação paga pela Administração Pública, representada pelo Parceiro Público, o outorgante da concessão. Tal fonte de renda é garantida por um Fundo Garantidor, composto por recursos orçamentários e ativos não financeiros, instituído pelo Decreto 5.385/2005, que regulamenta o artigo 14 da Lei das Parcerias-Publico Privadas [09]. Os financiadores do projeto e os acionistas da SPE, por sua vez, desejam recuperar o investimento realizado na fase de implantação do projeto, objeto da Parceria. Além de se preocupar em reaver o volume de recursos investidos, os acionistas esperam que as fontes de renda da SPE sejam suficientes para cobrir os custos operacionais do projeto.
Em relação à contraprestação devida ao Parceiro Privado, é importante frisar que, quanto maiores forem os riscos inerentes ao negócio, maior será a remuneração por ele exigida. Durante o prazo de vigência do Contrato de PPP, o Parceiro Privado buscará recuperar o investimento realizado na implantação do objeto, quitar dívidas com eventuais financiadores e, por fim, mas não menos importante, auferir lucro. É essencial para o Estado, portanto, e em sintonia com o interesse público, a política de avaliar e atenuar ao máximo os riscos a serem suportados pelo setor privado. Por este motivo, pode-se afirmar que o momento da negociação e formulação do contrato de concessão pelo regime das PPPs é uma ocasião de suma importância para ambas as partes, pois é neste momento que serão discutidos e repartidos os riscos capazes de comprometer o sucesso da parceria.
Esta análise das características das principais modalidades de parceria não estaria completa se não mencionássemos as vedações à celebração de um contrato de PPP. Além da restrição referente a rentabilidade do projeto, uma PPP, tanto aquela licitada sob a modalidade administrativa, quanto sob a patrocinada, não pode ser objeto de um contrato cujo valor envolvido seja inferior a R$ 20.000.000,00. Tampouco pode ser contratada por menos de 5 anos, ou mais de 35, nem pode ser usada como meio de contratação de pessoal, aquisição de equipamentos ou mera realização de obras públicas [10]. Conforme já mencionado, a natureza jurídica do contrato de PPP é a de um contrato administrativo de concessão de serviço público, no qual estão presentes elementos que visam mitigar os riscos inerentes a tal contratação, em prol de ambas as partes.
2.3 – Mecanismo de Licitação
Primeiramente, deve-se frisar que a abertura de qualquer processo licitatório visando a contratação de uma PPP deve atender a certo número de exigências, elencadas no artigo 10 da Lei das PPP’s. São elas:
"Artigo 10 – [...]
I – autorização da autoridade competente, fundamentada em estudo técnico que demonstre:
a) a conveniência e a oportunidade da contratação, mediante identificação das razões que justifiquem a opção pela forma de parceria público-privada;
b) que as despesas criadas ou aumentadas não afetarão as metas de resultados fiscais previstas no Anexo referido no § 1º do art. 4º da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa; e
c) quando for o caso, conforme as normas editadas na forma do art. 25 desta Lei, a observância dos limites e condições decorrentes da aplicação dos arts. 29, 30 e 32 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, pelas obrigações contraídas pela Administração Pública relativas ao objeto do contrato;
II – elaboração de estimativa do impacto orçamentário-financeiro nos exercícios em que deva vigorar o contrato de parceria público-privada;
III – declaração do ordenador da despesa de que as obrigações contraídas pela Administração Pública no decorrer do contrato são compatíveis com a lei de diretrizes orçamentárias e estão previstas na lei orçamentária anual;
IV – estimativa do fluxo de recursos públicos suficientes para o cumprimento, durante a vigência do contrato e por exercício financeiro, das obrigações contraídas pela Administração Pública;
V – seu objeto estar previsto no plano plurianual em vigor no âmbito onde o contrato será celebrado;
VI – submissão da minuta de edital e de contrato à consulta pública, mediante publicação na imprensa oficial, em jornais de grande circulação e por meio eletrônico, que deverá informar a justificativa para a contratação, a identificação do objeto, o prazo de duração do contrato, seu valor estimado, fixando-se prazo mínimo de 30 (trinta) dias para recebimento de sugestões, cujo termo dar-se-á pelo menos 7 (sete) dias antes da data prevista para a publicação do edital; e
VII – licença ambiental prévia ou expedição das diretrizes para o licenciamento ambiental do empreendimento, na forma do regulamento, sempre que o objeto do contrato exigir."
Afinal, qual seria a autoridade competente para aprovar o lançamento de um edital de PPP, com base nos critérios definidos no inciso I do artigo em comento? No âmbito da União, seria o Comitê Gestor das Parcerias Público Privadas, previsto no artigo 14 da Lei 11.079 e regulamentado pelo Decreto 5.385/05 [11]. Nos Estados e Municípios, a identidade do órgão gestor das parcerias será definida pela lei estadual ou pela lei municipal, respectivamente [12].
Para evitar o aumento do endividamento público, o ordenador da despesa deve declarar formalmente que a assunção das obrigações decorrentes da contratação da parceria, principalmente a obrigação de honrar com a contraprestação devida ao Parceiro Privado, são compatíveis com a lei de diretrizes orçamentárias e estão previstas na lei orçamentária anual.
É importante notar que somente os projetos inscritos nos Planos Plurianuais (PPAs) editados pela União, Estados e Municípios podem ser objeto de um contrato de PPP.
Outra que merece destaque é a exigência de licença ambiental prévia ao lançamento do edital. Dada a morosidade do seu processo de emissão, condicionar o lançamento de um edital a tal providência pode atrasar a fase de implantação de uma obra de suma importância para o país. De qualquer modo, do ponto de vista do concessionário (ou do Parceiro Privado) é mais vantajoso condicionar o lançamento do edital à emissão de licença ambiental prévia ou às diretrizes para o licenciamento, na forma do inciso II do artigo 10, do que exigir a obtenção destas licenças após a assinatura do contrato de concessão. Não fosse esta precaução, a fixação de qualquer cronograma de implantação para o projeto seria uma tarefa impossível.
Com base no exposto, é evidente a preocupação do legislador em assegurar a viabilidade de um projeto concedido sob o regime das PPP’s. Quando mal concebido, um projeto de PPP pode causar graves prejuízos ao Estado e aos usuários do serviço.
Feita a análise das condições impostas à abertura de um processo licitatório de PPP, é razoável afirmar que se o projeto estiver em sintonia com o interesse público, e não levar o ente concedente, chamado de Parceiro Público, após a assinatura do contrato de concessão, a violar os limites de endividamento impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal, não há nada que impeça a publicação do edital de concorrência referente ao projeto em questão. Supridas estas condições, de maneira geral, qualquer projeto passível de concessão nos moldes da Lei de Concessões de Serviços Públicos [13] pode ser concedido na modalidade PPP.
Quanto ao procedimento licitatório em si, nos termos do artigo 12 da Lei das PPPs, este seguirá as regras instituídas pela Lei que regulamenta o regime de concessão e permissão de prestação de serviços públicos no País, assim como a lei que institui as normas para licitações e contratos com a Administração Pública [14].
Neste sentido, é possível destacar os dois critérios empregados na seleção dos licitantes:
a)melhor preço (menor contraprestação pública ou menor tarifa);
b)combinação entre técnica e preço.
A Lei das Parcerias Público-Privadas inova ao permitir a inversão das fases de habilitação e julgamento em seus certames. Atualmente, esta regra esta é utilizada somente nas licitações efetuadas na modalidade "pregão". Assim, num processo licitatório cujo objeto é a prestação de serviços sob o regime das PPPs, caso expressamente previsto no edital do certame, serão analisadas primeiramente as propostas comerciais e técnicas dos proponentes. Feito este exame, haverá a classificação dos proponentes de acordo com as características intrínsecas de cada uma das propostas. Num segundo momento, a comissão de licitação avaliará a documentação de habilitação do proponente melhor qualificado, para verificação do atendimento das condições fixadas no edital. Verificado o atendimento das exigências contidas no edital, o proponente será declarado vencedor. Caso haja algum problema na documentação de habilitação do proponente que apresentou a melhor proposta comercial, serão analisados os documentos habilitatórios do proponente que apresentou a 2ª melhor proposta, e assim sucessivamente, até que um proponente atenda às condições fixadas no edital.
Outra inovação presente na Lei das Parcerias Público-Privadas diz respeito à possibilidade de saneamento de falhas, de complementação de insuficiências ou ainda correções de caráter formal no curso do procedimento licitatório, conforme dispuser o edital, desde que o proponente possa satisfazer as exigências dentro do prazo fixado pelo instrumento convocatório.
De acordo com o inciso III da Lei das PPPs, o edital do certame para contratação de parcerias público-privadas poderá definir duas formas de apresentação das propostas econômicas: (a) propostas escritas, com envelopes lacrados, ou (b) propostas escritas, seguidas de lances em viva voz. Neste último caso, o edital poderá restringir a participação dos proponentes à segunda etapa do processo licitatório. Assim, somente aqueles cuja proposta econômica escrita for, no máximo, 20% maior do que o valor da melhor proposta recebida apresentarão seus lances em viva voz.
2.4 - Limites de Financiamento Público à SPE [15]
Com relação às fontes de recursos financeiros [16] oferecidas à SPEs pelo Poder Público, mais especificamente por empresas públicas ou sociedades de economia mista controladas pela União, o artigo 27 da Lei das PPP impôs os seguintes limites:
a) Quando envolver entes da Administração Indireta (como o BNDES):
- 70% debt and equity [17]
- 80% debt and equity para projetos no Norte, Nordeste e Centro-Oeste, em regiões em que o IDH [18] seja abaixo da média nacional;
b) Quando envolver, cumulativamente, fundos de pensão e entes da Administração Indireta da União (como o BNDES):
- 80% debt and equity
- 90% debt and equity para projetos no Norte, Nordeste e Centro-Oeste, em regiões em que o IDH seja abaixo da média nacional.
Com base no resumo acima, é possível afirmar que, de acordo com o disposto no artigo 27 da Lei das PPP’s, se um ente da Administração Indireta se unir a iniciativa privada com vistas a constituir uma SPE sob a égide do regime das Parcerias-Público Privadas, seja através do aporte de recursos financeiros (empréstimos e demais operações de crédito), seja pela participação direta no capital da SPE (contribuições de capital), o volume dessas fontes de recursos não poderá superar o limite de 70% do total de fontes de recursos financeiros que abastecem o capital da sociedade de Propósito Específico. Este limite pode ser elevado a 80%, se o contrato de parceria visar um projeto a ser executado nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, onde o IDH for inferior à média nacional.
Se além da contribuição realizada pelo ente da Administração Indireta, a parceria contar com o aporte em recursos financeiros proveniente de uma entidade fechada de previdência complementar (fundos de pensão), o limite imposto ao volume de recursos aplicados por tais entes ligados ao Poder Público passa a 80%, ou 90% se o projeto visado pelo contrato de parceria for realizado nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, em locais onde o IDH é inferior à média nacional.
Há que se mencionar ainda a limitação imposta pelo § 4 do artigo 9 da Lei das PPP’s, incluindo a ressalva realizado pelo § 5 do mesmo artigo. Apenas para relembrar, referido dispositivo estipula que a Administração Pública não pode deter a maioria do capital votante das SPE constituídas sob a égide do regime das PPPs. Entretanto, de acordo com o § 5, tal vedação não se aplica na hipótese da maioria do capital votante da SPE ser adquirida por instituição financeira controlada pelo Poder Público, sempre que houver inadimplemento do contrato de financiamento.
2.4 – Possibilidade de resolução amigável de disputas
Muito embora o inciso III do artigo 11 da Lei das PPP permita a inclusão nos editais de contratação de PPP mecanismos privados de resolução de litígios, incluindo neste rol a arbitragem, a ser realizada em território nacional, sendo o português o idioma predominante, a doutrina pátria encontra-se dividida a respeito da legalidade e da adequabilidade deste dispositivo.
Assim, para o ilustre Professor Toshio Mukai [19], se a Lei das PPP’s faculta a utilização da arbitragem nos termos da Lei no. 9.307/96, o objeto da discussão deverá ser obrigatoriamente um bem disponível, já que referida lei determina que a arbitragem só poderá ser usada para dirimir litígios que envolvam bens disponíveis [20]. Portanto, continua ele, a arbitragem só poderá ser utilizada no âmbito de um contrato de PPP quando as partes estiverem diante de questões que não envolvam bens e direitos públicos indisponíveis.
Sobre o assunto, o Professor Cretella Neto [21] ensina que a previsão constante da Lei das PPPs é desnecessária, pois, mesmo que não houvesse nada expresso neste sentido, o emprego da arbitragem seria aceito, como já verificado em outros contratos administrativos, apesar de nenhum deles trazer qualquer menção ao instituto da arbitragem. Além disso, o mestre entende que o edital que visa a contratação da PPP não deveria fazer qualquer alusão à solução de conflitos pela via arbitral, posto que inexiste arbitragem obrigatória, a não ser quando as partes, de livre e espontânea vontade, a ela se obriguem previamente. Na sua opinião, as partes deveriam inserir a cláusula prevendo a arbitragem ou qualquer método de solução de litígios que não passe pelo viés do Poder Judiciário num momento posterior, durante a fase de negociação das cláusulas do contrato. Entretanto, como o contrato de concessão vinculado ao edital é de adesão, não havendo portanto espaço para discussão das suas cláusulas, o Professor vislumbra apenas uma saída, para que esta regra não seja considerada inconstitucional, violadora do disposto no inciso XXXV, artigo 5 da Constituição da República Federativa do Brasil [22]:
"Terá, então, o órgão Público, caso deseje resolver litígios oriundos do contrato de PPP por via não judicial, o cuidado de observar os ditames da Lei de Arbitragem, seja destacando em negrito a cláusula compromissória [...], seja apresentando-a em documento anexo ao contrato, para aceitação específica dessa cláusula pelo empreendedor privado".
Sobre a admissibilidade da arbitragem no âmbito de contratos firmados com a Administração, convém ainda citar que o Tribunal de Contas da União, na Decisão 188/95, em que eram interessados o DNER e o Consórcio Andrade Gutierrez/Camargo Corrêa, admitiu a utilização da arbitragem fundamentando-se na Lei de Concessão de Serviços Públicos, que autoriza o uso da arbitragem no seu artigo 23, inciso XV [23].
A possibilidade de se recorrer à arbitragem em contratos administrativos foi sedimentada no voto da Ministra do STJ Nancy Andrighy, enquanto juíza do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (relatora do MS 1998002003066-9, j. em 18.5.99), ao declarar que "[...] pelo artigo 54 da Lei 8.666/93, os contratos administrativos regem-se pelas cláusulas e preceitos de direito público, aplicando-se-lhes supletivamente os princípios do direito privado, o que vem reforçar a possibilidade de adoção do juízo arbitral para dirimir questões contratuais."