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Considerações sobre a futura regulamentação da lei geral dos consórcios públicos

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5.Da personalidade jurídica de direito público suporte de contrato de consórcio público

No exame da possibilidade de o contrato de consórcio público poder ser suportado por personalidade jurídica, neste importante debate jurídico, há quem defenda que não era intenção do legislador constituinte derivado permitir a criação de nova espécie de personalidade jurídica de direito público – associação pública – pelo fato de que, se tivesse tal intenção, teria tratado expressamente do assunto no próprio Texto Constitucional.

Neste aspecto, gostaríamos de expressar nosso entendimento sobre a matéria, começando por lembrar que o papel precípuo de qualquer Carta Política não é disciplinar matérias jurídicas (porque tal tarefa cabe à legislação infraconstitucional), mas fundamentalmente estabelecer competências aos entes federativos e assegurar direitos e garantias fundamentais às pessoas que se encontrem dentro de um determinado território nacional. Na lição de CELSO RIBEIRO BASTOS, a Constituição em seu sentido substancial, "procura reunir as normas que dão essência ou substância ao Estado. É dizer, aquelas que lhe conferem estrutura, definem as competências dos seus órgãos superiores, traçam limites da ação do Estado, fazendo-o respeitar o mínimo de garantias fundamentais" [27].

Portanto, o assunto atinente à questão relativa à espécie de personalidade jurídica suporte de um contrato de consórcio público, evidentemente, não poderia nem deveria estar presente no Texto Constitucional, mas em texto infraconstitucional como de fato aconteceu.

5.1.Da mudança de paradigma trazida pela EC n.º 19/98

Outro aspecto que tem suscitado acalorado debate, quanto à correta personalidade jurídica a ser utilizada como suporte de um contrato de consórcio público, é a tese que postula a impossibilidade de criação de uma associação pública (autarquia interfederativa), com base nos argumentos expendidos no acórdão do Supremo Tribunal Federal (STF), prolatado no REx n.º 120.932 [28], julgado à unanimidade em 24/03/1992, cuja ementa é transcrita abaixo, demonstrando que o STF negou ao BRDE a natureza jurídica de autarquia interestadual por absoluta ausência, no ordenamento que vigia à época, da previsão constitucional para a criação de tal entidade pluripessoal, verbis:

"RE 120932/RS - RIO GRANDE DO SUL RECURSO EXTRAORDINÁRIO Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE

Julgamento: 24/03/1992

Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA

Publicação: DJ 30-04-1992 PP-05725 EMENT VOL-01659-02 PP-00255 RTJ VOL-00141-01 PP-00273

Execução fiscal:. .. II. Autarquia interestadual de desenvolvimento: sua inviabilidade constitucional. 3. O dado diferencial da autarquia é a personalidade de direito público (Celso Antonio), de que a podem dotar não só a União, mas também as demais entidades políticas do Estado Federal, como técnicas de realização de sua função administrativa, em setor específico subtraído a administração direta. 4. Por isso mesmo, a validade da criação de uma autarquia pressupõe que a sua destinação institucional se compreenda toda na função administrativa da entidade matriz. 5. O objetivo de fomento do desenvolvimento de região composta pelos territórios de três Estados Federados ultrapassa o raio da esfera administrativa de qualquer um deles, isoladamente considerado; só uma norma da Constituição Federal poderia emprestar a manifestação conjunta, mediante convênio, de vontades estatais incompetentes um poder que, individualmente, a todos eles falece. 6. As sucessivas Constituições da Republica - além de não abrirem explicitamente às unidades federadas a criação de entidades publicas de administração interestadual, tem reservado a União, expressa e privativamente, as atividades de planejamento e promoção do desenvolvimento regional: análise da temática regional no constitucionalismo federal brasileiro." (grifamos)

Todavia, é fundamental perceber que esta decisão judicial é anterior à Emenda Constitucional n.º 19, de 04/06/1998, tendo sido prolatada, portanto, consoante a ordem jurídica anterior à alteração do artigo 241 da CF, que trouxe ao ordenamento jurídico brasileiro o princípio do federalismo cooperativo ou da cooperação interfederativa, viabilizador da criação de autarquias interfederativas entre nós.

Portanto, entendemos que o referido acórdão mostra-se imprestável ao exame, sob a ótica da ordem jurídica vigente, da possibilidade de se criar uma associação pública, espécie do gênero autarquia.

5.1.1.Do princípio da cooperação (inter)federativa

Nesse aspecto, cabe referir que o artigo 241 da Carta Políticatraz em seu conteúdo normativo, um importante conceito que merece reflexão atenta. Trata-se do princípio da cooperação (inter)federativa [29], ou do federalismo cooperativo, que já tivemos a oportunidade de abordá-lo em outro estudo [30], quando concluímos que dito comando principiológico carrega a idéia da conjugação de esforços dos diferentes entes federativos, visando à implementação de determinada política pública, que individualmente, nenhum deles teria condições plenas de realizar com eficácia.

Assim, a partir da alteração constitucional operada pela Emenda Constitucional (EC) n.º 19 de, 04 de junho de 1998, o ordenamento jurídico brasileiro sofreu substancial evolução nas formas de se conceber a criação das entidades integrantes da administração indireta. É que até o advento da aludida emenda, a criação de entidades de direito público da administração indireta (fundação pública e autarquia) obedecia, em regra, à consagrada dogmática jurídica de que somente seria possível a criação de tais entidades de forma unipessoal, ou seja, uma autarquia, por exemplo, somente poderia ser criada por um ente federativo e integrar, via de conseqüência, uma só administração indireta.

5.1.2.Do estudo de caso do BRDE

Importa destacar que tal dogmática, como se pôde perceber no acórdão colacionado acima, trouxe grandes problemas ao Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE), uma instituição financeira de fomento criada conjuntamente pelos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná em 15 de junho de 1961, sob a forma de autarquia interfederativa, pois a Constituição de 1946, vigente à época de sua criação, não previa o princípio da cooperação interfederativa, ora em exame, o que acabou trazendo sérios problemas de definição da personalidade jurídica do BRDE.

A fim de ilustrar o nível de dificuldade jurídica na conformação jurídica do aludido banco de fomento, em razão da falta de fundamentos constitucionais e legais embasadores da figura que se desejava criar – uma autarquia interfederativa –, ressaltamos que o problema somente pôde ser solucionado através da edição do Decreto n.º 51.617, de 05 de dezembro de 1962, de duvidosa constitucionalidade, levada a cabo pelo Presidente João Goulart, que autorizou o funcionamento do Banco de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) como autarquia interestadual de natureza econômica.

Portanto, o problema da existência formal do BRDE no plano jurídico, como autarquia interfederativa, foi literalmente resolvido por decreto presidencial, sem que existisse, no entanto, o necessário respaldo constitucional para tanto, evidenciando a enorme fragilidade dos fundamentos jurídicos utilizados em sua criação.

Em função dessa inconsistente classificação da natureza jurídica do BRDE, no decorrer da existência daquele aludido banco de fomento, surgiram outros problemas ligados à polêmica questão, haja vista que sua anômala situação de autarquia interestadual acabou ensejando algumas ações judiciais, tendo o Supremo Tribunal Federal (STF), por fim, se manifestado no sentido de negar-lhe a condição de autarquia interestadual, equiparando-a empresa pública, conforme ementa da Ação Cível Originária n.º 503-RS, julgada em 25/10/2001 [31], verbis:

"AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA N.º 503-RS EMENTA: Ação Cível Originária. Imunidade fiscal com base no disposto no artigo 150, VI, "a", e seu parágrafo 2º. Natureza jurídica do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul - BRDE. - Rejeição da preliminar de ilegitimidade ativa "ad causam" dos Estados do Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Em conseqüência, fica prejudicada a alegação de incompetência residual desta Corte. Aliás, ainda quando os Estados-membros não tivessem legitimidade ativa "ad causam", haveria conflito federativo entre o Banco-autor, criado como autarquia interestadual por eles, e a União Federal que lhe nega essa natureza jurídica para efeito de negar-lhe a imunidade fiscal pretendida. No mérito, esta Corte já firmou o entendimento (assim, no RE 120932 e na ADI 175) de que o Banco-autor não tem a natureza jurídica de autarquia, mas é, sim, empresa com personalidade jurídica de direito privado. Conseqüentemente, não goza ele da imunidade tributária prevista no artigo 150, VI, "a", e seu parágrafo 2º, da atual Constituição, não fazendo jus, portanto, à pretendida declaração de inexistência de relação jurídico-tributária resultante dessa imunidade. Ação que se julga improcedente."

5.2.Da natureza jurídica de uma associação pública

O singular fenômeno jurídico, experimentado pelo BRDE, de reclassificação judicial de personalidade jurídica, devidamente declarada em acórdão do STF, pode ser explicado pelo fato de que, da leitura que até então se fazia das normas constitucionais que tratam da criação das autarquias [32], não existia fundamento jurídico que pudesse admitir a criação de entidades que integrassem simultaneamente a administração indireta de mais de um ente federativo.

Contudo, ressalta-se, este paradigma da dogmática jurídica pátria alterou-se com a positivação do princípio da cooperação interfederativa em nível constitucional com o advento da alteração do artigo 241 da CF. Assim, a partir de 04/06/1998 (data da promulgação da EC n.º 19/98), tornou-se possível a criação de entidades pluripessoais da administração indireta.

Assim, tomando em conta este relevante aspecto, que até então, não houvera sido devidamente considerado em nossos apontamentos, urge rever nosso posicionamento externado em sentido contrário em que sustentávamos a impossibilidade jurídica de se considerar uma associação pública como espécie de autarquia [33]. Em razão disso, passamos a acompanhar o entendimento esposado por ALICE GONZALEZ BORGES [34] e de FLORIANO DE AZEVEDO MARQUES NETO [35], que defendem a idéia de ser plenamente, possível, sob a égide do atual art. 241 da CF, constituir autarquias pluripessoais, que integrem, simultaneamente a administração indireta dos entes consorciados.

Dessa forma, concluímos que a natureza jurídica de uma associação pública, pessoa jurídica de direito público interno, suporte de um contrato de consórcio público é de uma autarquia pluripessoal, como bem conceituou ALICE GONZALEZ BORGES [36]ou, na dicção de FLORIANO DE AZEVEDO MARQUES NETO [37], uma autarquia multifederada ou, ainda, uma autarquia interfederativa.

Ademais, curiosamente, é possível extrair-se do próprio voto utilizado para fundamentar a impossibilidade jurídica de o BRDE constituir-se em autarquia interestadual, respaldo jurídico embasador da criação de autarquias pluripessoais a partir da EC n.º 19/98. Observe-se, para isso, a conclusão "b" do voto do Relator, Ministro SEPÚLVIDA PERTENCE, fl. 30, parágrafo 68, no já aludido Recurso Extraordinário (REx) n.º 120.932 [38], julgado à unanimidade em 24/03/1992, em que o mesmo assevera que "na estrutura federal brasileira, à falta de entidades intermediárias entre a União e os Estados, a instituição de autarquias interestaduais por ato de vontade convergente de unidades federadas só se poderia legitimar por força de norma constitucional federal, que não existe" (grifamos), mas que passou a existir a partir da EC n.º 19/98, com a nova redação do art. 241, como minudentemente explicitado acima.

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Com estas explicações, concluímos pelo absoluto anacronismo dos argumentos aduzidos no sentido de extrair da CF, partilhando dos fundamentos do acórdão do REx acima analisado, a impossibilidade de se criar uma autarquia interfederativa. É que, em assim procedendo, estaremos esquecendo por completo de analisar a questão sob o matiz do novo Texto Constitucional concebido a partir da alteração do artigo 241 procedida pela EC n.º 19/98, cujo escopo, cabe ressaltar, foi justamente mudar paradigmas de gestão em busca de resultados mais eficazes na administração pública. É inafastável concluir que a gestão associada de serviços públicos trazida pela nova dicção do artigo 241 faz parte dessa alteração paradigmática de se compreender a administração pública brasileira. Portanto, temos que as análises que se centram em repetir os antigos argumentos pré-EC n.º 19/98, padecem da necessária atualidade, pelo que não podem ser aceitos racional e validamente no exame hermenêutico da questão em tela. A nosso juízo, a correta apreciação da matéria deverá necessariamente contemplar a existência do princípio constitucional da cooperação interfederativa que, como já se afirmou, é autorizativo da criação de autarquias multifederadas.

5.2.1.Do controle da autarquia interfederativa pelos entes criadores

No que tange ao aspecto de controle da autarquia pelos entes criadores, vale destacar que ele se dará através das deliberações da Assembléia Geral, composta pelos Chefes dos Executivos consorciados. Este órgão deliberativo máximo do Consórcio Público é o principal liame existente entre os diversos Executivos consorciados e a Associação Pública, em termos políticos, apresentando-se como adequada e suficiente forma de controle pelos consorciados, que deliberarão através dela. Ademais, não é demais lembrar que não há falar em níveis excessivamente rígidos de controle sequer em autarquias convencionais porque, por natureza, estas entidades foram criadas para que pudessem realizar atividades estatais com maior grau de autonomia em relação ao ente federativo instituidor, a ponto de constituírem personalidade jurídica própria.

5.2.2.Do controle externo da associação pública

Quanto ao controle externo, a Lei Consorcial foi irrepreensível ao estipular as regras de controle externo, estabelecendo a unicidade de controle externo dos consórcios públicos, conforme analisamos em outro ensaio que, face à pertinência do tema, ousamos reprisar, verbis:

"Relativamente ao controle financeiro do consórcio público, fica expressamente consignado que "a execução das receitas e das despesas do consórcio deverá obedecer às normas de direito financeiro aplicáveis às entidades públicas" [39]. Esta norma é dirigida, a toda evidência, aos consórcios públicos constituídos sob a forma de pessoa jurídica de direito privado, pois aqueles criados sob a denominação de associação pública, por serem pessoas jurídicas de direito público, já estariam submetidos às aludidas regras de direito financeiro.

Em seguida, a Lei dos Consórcios Públicos adentra na importante questão do controle externo dos consórcios públicos, aprimorando a idéia trazida no projeto de lei, que apenas atribuía a responsabilidade das contas do consórcio ao seu representante legal, mas não determinava qual tribunal de contas ficaria com o encargo de fiscalização do consórcio, no caso de a gestão associada ser composta por mais de uma espécie de ente federativo.

Da forma como estava disciplinada esta situação no aludido projeto, surgia a peculiar possibilidade de um consórcio público ser fiscalizado simultaneamente por mais de um tribunal de contas, como referido no ensaio sobre o PL n.º 3.884/04 [40], significando violação ao princípio da economicidade.

Sanando esta insuficiência normativa, o legislador instituiu, através da Lei dos Consórcios, o que se poderia denominar de unicidade de controle externo dos consórcios públicos, ao disciplinar que "o consórcio público está sujeito à fiscalização contábil, operacional e patrimonial pelo Tribunal de Contas competente para apreciar as contas do Chefe do Poder Executivo representante legal do consórcio" [41].

Portanto, atendendo ao princípio da economicidade e, também, a uma desejável visão racional e sistêmica de controle externo, estabeleceu a norma em comento, com todo acerto, que as contas de um consórcio público, relativas a um determinado exercício, serão fiscalizadas por apenas um tribunal de contas, qual seja, aquele competente para apreciar as contas de seu representante legal no âmbito do ente consorciado.

Dessa forma, trazendo novamente o exemplo hipotético retratado no estudo do PL n.º 3.884/04, um consórcio formado pela União, Estado do Rio de Janeiro e Município do Rio de Janeiro será fiscalizado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) quando o seu representante legal for o Presidente da República; pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE/RJ), quando o responsável for o Governador daquele Estado; e pelo Tribunal de Contas do Município do Rio de janeiro (TCM/RJ), quando o gestor for o Prefeito daquela cidade.

Essa ação coordenada dos tribunais de contas envolvidos na fiscalização de consórcio público reforça o entendimento já referido de que urge "a criação de um sistema de controle externo nacional" [42] em que haja compartilhamento de dados, ações fiscalizatórias conjuntas e, sobretudo, padronização processual pelas 34 cortes de contas brasileiras a fim de que o rodízio da atribuição do controle externo, que incidirá em alguns consórcios públicos a partir de agora, signifique efetiva fiscalização, controle e conseqüente aprimoramento contábil, financeiro, orçamentário, operacional e patrimonial da entidade controlada. E isso somente se dará se os procedimentos de auditoria utilizados pelos órgãos fiscalizatórios envolvidos foram unívocos, utilizando a mesma metodologia e perseguindo metas idênticas de controle externo.

Sem o implemento dessa sistematização, pensa-se que o controle externo dos consórcios públicos, que alberguem entes federativos que estejam sujeitos à fiscalização de tribunais de contas diversos, será ineficaz, redundando em simulacros fiscalizatórios que em nada ou muito pouco contribuirão no combate à corrupção, à fraude e ao uso indevido do dinheiro público no âmbito dos consórcios públicos.

Por sua vez, a Norma Reguladora dos Consórcios Públicos também dedicou regra para o controle dos contratos de rateio, disciplinando que a fiscalização desses instrumentos ficará ao encargo dos controles externos respectivos [43]. Assim, retomando o exemplo hipotético, que considera um consórcio público estabelecido entre a União, Estado do Rio de Janeiro e Município do Rio de Janeiro, a fiscalização do contrato de rateio celebrado por cada um dos entes consorciados será realizada simultaneamente, nas respectivas esferas de competência, pelo TCU, TCE/RJ e TCM/RJ, por ocasião do exame das contas daqueles entes jurisdicionados.

No que tange aos agentes públicos incumbidos da gestão de consórcio, a Lei Federal n.º 11.107/05 estabelece que os mesmos não responderão pessoalmente pelas obrigações contraídas pelo consórcio. Dessa forma, não se poderá exigir a responsabilização civil ou administrativa de um representante legal de consórcio, se a obrigação contraída pela gestão associada defluiu de ato praticado em conformidade com a lei ou com o seu estatuto. Contudo, responderá o aludido agente público pelos atos praticados pelo consórcio que violarem normas legais ou estatutárias.

Este regramento impede, por exemplo, que eventuais divergências surgidas na relação consorcial possam resultar em demandas administrativas e judiciais, que visem à responsabilização de quem, dirigindo o consórcio dentro dos ditames normativos, contraiu obrigação que tenha conflitado com interesses de algum ente integrante, cujo voto tenha sido vencido na deliberação assemblear de determinada questão, pois o gestor consorcial, em tais circunstâncias, sempre poderá invocar em sua defesa o Parágrafo único do art. 10 da Lei Federal n.º 11.107/05 [44].

Trata-se de uma prerrogativa legal proporcionada ao representante de consórcio, visando a estabelecer as condições imprescindíveis de resguardo de seu patrimônio particular, a fim de que ele possa conduzir com destemor os negócios consorciais, pois de outra forma, seus bens pessoais estariam constantemente ameaçados pela irresignação dos demais componentes da assembléia geral ou, ainda, de terceiros, o que inviabilizaria a função diretiva de um consórcio público. Assim, as obrigações de um consórcio serão satisfeitas apenas com o patrimônio da entidade constituída para tal fim.

Ainda dentro do escopo fiscalizatório, o legislador, em consonância com as diretrizes da Lei de Responsabilidade Fiscal, estipulou a obrigação de o consórcio público fornecer as informações necessárias a fim de que os entes consorciados possam consolidar em suas respectivas contas "todas as despesas realizadas com os recursos entregues em virtude de contrato de rateio", conferindo a necessária transparência de gestão às ações consorciais." [45]

Portanto, temos que a Norma Consorcial, em termos de controle financeiro da Associação Pública, foi diligente, estabelecendo as imprescindíveis conexões com o sistema de controle externo atualmente utilizado no Brasil, nele incluídas as novas regras de transparência fiscal trazidas pela Lei Complementar n.º 101/2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

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Sobre o autor
Cleber Demetrio Oliveira da Silva

Sócio da Cleber Demetrio Advogados Associados, da RZO Consultoria e Diretor Executivo do Instituto de Desenvolvimento Regional Integrado Consorciado (IDRICON21), Especialista em Direito Empresarial pela PUCRS, Especialista em Gestão de Operações Societárias e Planejamento Tributário pelo INEJE, Mestre em Direito do Estado pela PUCRS, Professor de Ciência Política no curso de graduação da Faculdade de Direito IDC, de Direito Administrativo em curso de pós-graduação do IDC e Professor de Direito Administrativo e Direito Tributário em cursos de pós-graduação do UNIRITTER da rede Laureate International Universities.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Cleber Demetrio Oliveira. Considerações sobre a futura regulamentação da lei geral dos consórcios públicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 934, 23 jan. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7863. Acesso em: 3 mai. 2024.

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