Capa da publicação Advertência em videogames sobre risco de epilepsia e lesão física
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A informação-advertência no âmbito dos videogames:

por uma proteção consumerista pelos danos causados por epilepsias e lesões físicas

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29/01/2020 às 15:37
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4. A TEORIA DA QUALIDADE, RISCOS NORMAIS E PREVISÍVEIS, LEGÍTIMAS EXPECTATIVAS DOS CONSUMIDORES E O FATO DO PRODUTO: APLICAÇÃO AO CONTEXTO DOS JOGOS ELETRÔNICOS

Em direito do consumidor, existe a denominada teoria da qualidade, surgida nas relações de consumo para assegurar a proteção das incolumidades psicofísica e econômica daquele que é presumidamente vulnerável na lei – o consumidor. Tal teoria terá importante papel no que diz respeito à garantia não só da qualidade-adequação, mas também da qualidade-segurança de produtos e serviços no mercado de consumo de massa.

A qualidade-adequação de um produto visa a proteger os interesses econômicos do consumidor, é dizer, o seu patrimônio. Significa que o jogo de videogame ou o console deve atender às finalidades a que se destina. Já a qualidade-segurança do produto visa a proteger a vida e saúde do consumidor. Ambas as tutelas são incluídas como objetivos da Política Nacional das Relações de Consumo – art. 4º do Código de Defesa do Consumidor.

Quando ocorre um problema de qualidade-adequação, diz-se que o produto ou serviço é portador de um vício, e todos os fornecedores que integram a cadeia produtiva devem responder pelos danos causados de forma solidária, nos termos dos arts. 18 a 25 do Código de Defesa do Consumidor. No caso dos jogos eletrônicos, podem ser mencionados como fornecedores: o fabricante, o comerciante ou mesmo a Publisher.

É importante atentar: o que se está a analisar neste texto são casos de prejuízos à saúde do consumidor ocasionados pelos jogos ou consoles. E não prejuízos econômicos. Logo, o regimento dos vícios dos produtos e dos serviços não se aplica para fins de epilepsias e lesões físicas.

Quando ocorre um problema de qualidade-segurança, diz-se que o produto ou serviço é portador de um defeito, e só respondem pelos danos causados por esse problema 4 figuras previstas na lei: o fabricante, o construtor, o produtor e o importador. Eventualmente, de forma subsidiária, o comerciante poderá ser responsabilizado – arts. 12 a 17 do Código de Defesa do Consumidor. No caso dos jogos de videogame, por questões lógicas, não existirão as figuras do construtor e nem do produtor, mas apenas o fabricante e o importador. Porém, o consumidor dificilmente terá acesso ao fabricante, pois provavelmente se tratará de uma empresa localizada nos Estados Unidos, no Japão, no Canadá, etc.

Aqui cabe uma observação acerca da classificação existente na literatura jurídica sobre os tipos de fornecedores. Costuma-se diferenciar três tipos entre eles, quais sejam: o fornecedor real, o fornecedor presumido e o fornecedor aparente. Marco Fábio Morsello tece as seguintes considerações a esse respeito:

Sem prejuízo das referidas ponderações, abarcadoras do gênero fornecedor real, do qual poderão derivar as espécies produtor, construtor, fabricante, por vezes a segmentação da produção implica a utilização de logotipo ou marca notória, em determinado produto, que, no entanto, foi produzido por outro fornecedor. Por óbvio, na referida hipótese, com fulcro na teoria da aparência, correlacionada com a boa-fé objetiva e a teoria do risco criado, o fornecedor aparente será considerado responsável. Por derradeiro, visando tutelar o consumidor, criou-se, outrossim, a figura do fornecedor presumido (importador), responsável solidariamente pela reparação do dano em acidentes de consumo representados pelo fato do produto (MORSELLO, 2013, p. 86-87).

Assim, quem se responsabilizará perante a vítima de uma epilepsia ou lesão física, em caso de ação judicial julgada procedente, será o fornecedor presumido. Mas frise-se: a regra de solidariedade do art. 12 do Código de Defesa do Consumidor não isenta o fornecedor real, sendo apenas uma questão de acessibilidade do consumidor atingi-lo ou não.

Para fins de se considerar o que seja um defeito, é que o art. 8º do Código de Defesa do Consumidor apresenta as ideias de normalidade e previsibilidade como integrantes do risco que um produto deve apresentar:

 Art. 8° Os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição, obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a dar as informações necessárias e adequadas a seu respeito (BRASIL, 1990).

As noções de normalidade e previsibilidade estão atreladas a um princípio que é denominado proteção da confiança legítima. A partir do momento que o fornecedor tem obrigação de cumprir com todas as tratativas contratuais e de zelar pela qualidade-adequação e qualidade-segurança dos produtos e serviços, ele gera legítimas expectativas nos consumidores.

De acordo com Benjamin (2014), no vício de qualidade por insegurança existiria a falta de conformidade com uma legítima expectativa do consumidor, além de haver no produto a capacidade de provocar acidentes. Se ambas as figuras estiverem presentes, há o defeito no produto. Nos termos da norma jurídica, o defeito pode ser assim caracterizado:

 Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

1° O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I - sua apresentação;

II - o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III - a época em que foi colocado em circulação (BRASIL, 1990).

Bruno Miragem faz a observação de que a definição de defeito é realizada através de um conceito jurídico indeterminado. A precisão do seu significado só vai ser realmente feita no caso concreto pelo juiz, observando os fatos e as circunstâncias relevantes (MIRAGEM, 2016). A normalidade e previsibilidade do risco podem ser relacionadas com a segurança do produto e as legítimas expectativas dos consumidores:

Como a distribuição de produtos e serviços se dá de uma forma muito mais complexa no mundo globalizado, já não interessará para a lei o animus do empresário/fornecedor, mas sim o resultado ao consumidor. Um exemplo que pode ser mencionado é o e-commerce: imagine-se que o consumidor adquira um produto numa loja virtual; logo em seguida, esse objeto segue para a transportadora para ser enviado; a empresa que fabricou a embalagem do transporte, por sua vez, pode ser outra diferente da transportadora; e assim por diante. São vários os fornecedores que integram a cadeia de consumo. Uma vez gerado um dano ao consumidor em razão desse contrato de consumo, haverá solidariedade estabelecida em lei. Fala-se numa verdadeira desmaterialização da produção ou da distribuição. É a era da terceira revolução industrial.

Quanto aos riscos que podem ser considerados normas e previsíveis, a normalidade do risco é um traço objetivo e a previsibilidade é o elemento subjetivo (BENJAMIN, 2008). Um produto que ofereça riscos anormais e imprevisíveis pode gerar legítimas expectativas? Não, pois tal produto oferece insegurança.

E o que vem a ser a legítima expectativa? Segundo Benjamin (2008), é aquela que, de acordo com o desenvolvimento da tecnologia de um determinado momento histórico e levando em consideração as próprias condições econômicas, mostra-se plausível justificada e real.

Legítima expectativa relaciona-se com normalidade e previsibilidade (ROCHA, 2018).

Para fins de avaliação do risco de um produto ou serviço, a doutrina jurídica passou a considerar 3 espécies de periculosidade. Diz-se que um produto possui periculosidade inerente ou latente quando os riscos que ele oferece são normais e previsíveis, não acarretando grave perigo à vida ou saúde do consumidor. Pode-se dizer que são riscos que razoavelmente se esperam do produto. No caso do jogo de videogame, aí se encontram as possibilidades de desencadeamento de epilepsias fotossensíveis e lesões físicas por uso prolongado do produto, desde eu seja repassada a devida informação correta e precisa pelo fornecedor.

O produto que é possuidor de uma periculosidade adquirida, por sua vez, é portador de um defeito. De acordo com a doutrina de Antonio Herman Benjamin, aqui existe uma imprevisibilidade e não adianta a presença de advertências, pois elas serão inúteis para eliminar o risco. São os defeitos de concepção (design ou projeto), defeitos de fabricação e defeitos de comercialização, que são os defeitos informativos (BENJAMIN, 2014). Perceba-se: o jogo de videogame pode até ter as advertências de segurança em língua inglesa, mas para o consumidor brasileiro, elas são incognoscíveis.

A periculosidade exagerada, por último, é aquela que está presente no produto que sequer deve ser colocado no mercado de consumo, dado o seu alto potencial de causar danos. Antonio Herman Benjamin entende que a informação repassada ao consumidor não mitiga os riscos, sendo esses produtos defeituosos por ficção (BENJAMIN, 2014). Exemplo: videogame que na fase de testes apresentou choques elétricos não pode ser colocado no mercado.

No início dos anos 80, quando ainda era desconhecido o fato de que os jogos tinham a potencialidade de causar convulsões, o consumidor até poderia ingressar em juízo alegando uma periculosidade adquirida ou exagerada, no sentido de que o produto seria portador de um defeito de design e que sequer poderia ser colocado no mercado de consumo. Hoje, depois de todos os casos clínicos evidenciados, dos estudos realizados e todas as providências informativas adotadas, os jogos de videogame devem ser, necessariamente, considerados produtos de periculosidade inerente, ainda que não exista uma tecnologia capaz de filtrar ou impedir por inteiro esse problema neurológico. Afinal, como menciona Bruno Miragem, o dever de segurança jamais haverá de ser interpretado como uma obrigação de conferir segurança absoluta, mas sim aquela que legitimamente se espera do produto ou serviço (MIRAGEM, 2016).


5. A PERICULOSIDADE INERENTE DO PRODUTO EM JUÍZO (NÃO CARACTERIZAÇÃO DE FATO DO PRODUTO) E A TEORIA DO DANO DIRETO E IMEDIATO

Conforme já mencionado, existem três tipos de defeitos, de acordo com a doutrina nacional: o defeito de concepção, projeto ou criação; o defeito de produção ou de fabricação; e o defeito de informação ou comercialização.

Em regra, o fornecedor presumido ou importador traduzirá todos os folhetos do produto que digam respeito à informação-advertência para a língua portuguesa, cumprindo o disposto no art. 31 do Código de Defesa do Consumidor e isentando-se de responsabilidade. Nesse caso, diz-se que o produto possui uma periculosidade inerente para causar epilepsias e lesões e que os riscos foram devidamente informados. O produto corresponde às legítimas expectativas do consumidor.

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Nesse caso, a ação judicial do consumidor pode ser julgada improcedente, pois o importador tentará provar que, apesar de o produto ter sido colocado no mercado, o defeito inexiste, pois que os avisos de segurança se fazem presentes (art. 12, §3º, II do Código de Defesa do Consumidor), bem como tentará evidenciar a culpa exclusiva do consumidor ou de seus responsáveis pela utilização indevida do produto (art. 12, §3º, III do Código de Defesa do Consumidor).

No caso específico das epilepsias, a condição genética preexistente de fotossensibilidade, as condições de falta de sono, stress, dentre diversos outros fatores podem contribuir para o desencadeamento da crise convulsiva. Até mesmo a tela da televisão, com seus padrões luminosos, ou o requisito de baixa luminosidade ambiental do recinto, podem ser os fatores determinantes do problema.

Em estudo publicado no 8th International Conference on Information Technology and Electrical Engineering, Ferdiana e Rinaldi (2016) avaliam diversos aspectos que podem estar atrelados ao desencadeamento da epilepsia do jogador de videogame. O estudo demonstra que são fatores determinantes, em menor ou maior grau: o brilho do jogo; os movimentos presentes no jogo; os flashes luminosos presentes no jogo; as variabilidades de jogo, que podem ser 3D ou 2D; o estilo de jogo, que pode ser de aventura, luta, corrida, etc; a distância da tela para o jogador; o tamanho da tela; o tipo de tela – que pode ser de LCD, LED ou plasma; e as condições de saúde do jogador.

Ricci e Vigevano (1999), no artigo científico intitulado “The effect of video-game software in video-game epilepsy”, também entendem pela presença de fatores inerentes ao paciente que vão estar relacionados à epilepsia; fatores inerentes à tela da televisão; fatores que dizem respeito à imagem; e, por último, fatores concernentes ao software.

O fornecedor presumido valer-se-á, então, da teoria do dano direto e imediato, também chamada de teoria da causalidade necessária, para fins de demonstrar ao magistrado que não foi o produto a causa direta e necessária da crise epiléptica, rompendo-se, então, o nexo causal. O Superior Tribunal de Justiça já adotou a teoria do dano direto e imediato em sua jurisprudência, para fins de exclusão da responsabilidade civil de consumo do fornecedor:

RECURSO ESPECIAL. PRELIMINARES. NULIDADE DO ACÓRDÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. DIREITO DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL. FABRICANTE DE CIGARRO. MORTE DE FUMANTE. TROMBOANGEÍTE OBLITERANTE. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. LIVRE ARBÍTRIO DO CONSUMIDOR. CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA. ATIVIDADE LÍCITA. MODIFICAÇÃO DOS PARADIGMAS LEGAIS. PRODUTO DE PERICULOSIDADE INERENTE. CASO CONCRETO. ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO. REANÁLISE. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. AUTORIA. NÃO COMPROVAÇÃO. NEXO DE CAUSALIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO. DEVER DE INDENIZAR. NÃO CONFIGURAÇÃO.

1. Caso concreto em que a recorrente foi responsabilizada objetivamente pelos danos morais sofridos pelos familiares de fumante, diagnosticado com tromboangeíte obliterante, sob o fundamento de que a morte decorreu do consumo, entre 1973 e 2002, dos cigarros fabricados pela empresa.

2. Não há deficiência de fundamentação na hipótese em que as premissas fáticas foram bem delineadas e a decisão foi embasada na análise do conjunto probatório, incluindo referências aos depoimentos testemunhais dos médicos que assistiram o falecido, assim como o cotejo entre o caso concreto e o entendimento jurisprudencial e doutrinário acerca do tema.

3. Referências a textos científicos obtidos a partir de pesquisa realizada pelo magistrado não implicam, por si, nulidade ou violação do contraditório, quando utilizadas como mero reforço argumentativo. A vedação jurídico-constitucional é de que o juiz produza provas diretamente, ultrapasse os limites dos pedidos das partes ou se distancie do caso concreto, comprometendo sua imparcialidade, o que não ocorreu.

4. Controvérsia jurídica de mérito exaustivamente analisada pela Quarta Turma nos leading cases REsp nº 1.113.804/RS e REsp nº 886.347/RS. Resumo das teses firmadas, pertinentes à hipótese dos autos: (i) periculosidade inerente do cigarro; (ii) licitude da atividade econômica explorada pela indústria tabagista, possuindo previsão legal e constitucional; (iii) impossibilidade de aplicação retroativa dos parâmetros atuais da legislação consumerista a fatos pretéritos; (iv) necessidade de contextualização histórico-social da boa-fé objetiva; (v) livre-arbítrio do indivíduo ao decidir iniciar ou persistir no consumo do cigarro; e (vi) imprescindibilidade da comprovação concreta do nexo causal entre os danos e o tabagismo, sob o prisma da necessariedade, sendo insuficientes referências genéricas à probabilidade estatística ou à literatura médica.

5. A configuração da responsabilidade objetiva nas relações de consumo prescinde do elemento culpa, mas não dispensa (i) a comprovação do dano, (ii) a identificação da autoria, com a necessária descrição da conduta do fornecedor que violou um dever jurídico subjacente de segurança ou informação e (iii) a demonstração do nexo causal.

6. No que se refere à responsabilidade civil por danos relacionados ao tabagismo, é inviável imputar a morte de fumante exclusiva e diretamente a determinada empresa fabricante de cigarros, pois o desenvolvimento de uma doença associada ao tabagismo não é instantâneo e normalmente decorre do uso excessivo e duradouro ao longo de todo um período, associado a outros fatores, inclusive de natureza genética.

7. Inviável rever as conclusões do Tribunal estadual quanto à configuração do dano e ao diagnóstico clínico do falecido diante da necessidade de revolvimento do conjunto fático-probatório, procedimento vedado nos termos da Súmula nº 7/STJ.

8. Na hipótese, não há como afirmar que os produto(s) consumido(s) pelo falecido ao longo de aproximadamente 3 (três) décadas foram efetivamente aqueles produzidos ou comercializados pela recorrente. Prova negativa de impossível elaboração.

9. No caso, não houve a comprovação do nexo causal, sob o prisma da necessariedade, pois o acórdão consignou que a doença associada ao tabagismo não foi a causa imediata do evento morte e que o paciente possuía outros hábitos de risco, além de reconhecer que a literatura médica não é unânime quanto à tese de que a tromboangeíte obliterante se manifesta exclusivamente em fumantes.

10. Não há como acolher a responsabilidade civil por uma genérica violação do dever de informação diante da alteração dos paradigmas legais e do fato de que o fumante optou por prosseguir no consumo do cigarro em período no qual já havia a divulgação ostensiva dos malefícios do tabagismo e após ter sido especificamente alertado pelos médicos a respeito os efeitos da droga em seu organismo, conforme expresso no acórdão recorrido.

11. Aquele que, por livre e espontânea vontade, inicia-se no consumo de cigarros, propagando tal hábito durante certo período de tempo, não pode, doravante, pretender atribuir a responsabilidade de sua conduta a um dos fabricantes do produto, que exerce atividade lícita e regulamentada pelo Poder Público. Tese análoga à firmada por esta Corte Superior acerca da responsabilidade civil das empresas fabricantes de bebidas alcóolicas.

12. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido para restabelecer a sentença de primeiro grau que julgou improcedente a demanda indenizatória (REsp 1322964/RS, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/05/2018, DJe 01/06/2018) (BRASIL, 2018).

A teoria do dano direto e imediato encontra fundamento no art. 403 do Código Civil de 2002. Bruno Miragem entende que, para fins de responsabilidade civil nas relações de consumo, ela serve muito bem para definir a presença ou não de um defeito:

Da mesma forma, a teoria do dano direito e imediato, também denominada por alguns como da causalidade necessária, diz que a causa que servirá de critério para imputação da responsabilidade é aquela que, se não existisse, não existiria o dano. Ou seja, se a cadeia causal de acontecimentos tivesse se rompido, pela interrupção do nexo causal, o dano não teria se efetivado. A aparente vantagem desta teoria é a de permitir um critério um tanto mais preciso de identificação da causa, inda que não se desconheça – como de resto nas situações de responsabilidade civil – algum grau para a discrição do juiz.

No que se refere à responsabilidade civil de consumo, a teoria do dano direto e imediato responde de modo preciso à questão do defeito como pressuposto do dever de indenizar do fornecedor. Em outros termos, só há responsabilidade civil pelo fato do produto ou do serviço quando houver defeito, e este for a causa dos danos sofridos pelo consumidor. Pela regra da interrupção do nexo causal, a pergunta correta para imputação do dever de indenizar ao fornecedor será: se não houvesse defeito, haveria dano? A resposta afirmativa, exonera o fornecedor de responsabilidade. A resposta negativa, caracteriza os elementos da responsabilidade civil pelo fato do produto ou do serviço (MIRAGEM, 2016, p. 593).

Quanto às lesões físicas já referidas, podem ser ocasionadas por situações de caso fortuito, como na hipótese da mulher que despencou do sofá e ficou com quadro de hemotórax (HEINEMAN et al, 2014), ou podem decorrer de uma utilização exacerbada ou inadequada, caso que se enquadra na culpa exclusiva do consumidor.

No próximo tópico, será vista a única situação que dá uma margem de interpretação ao magistrado para que, mesmo nesses casos de traumas físicos, o consumidor venha a pleitear indenização, em decorrência da mácula informativa que acompanha o produto. É a hipótese em que a periculosidade inerente se converte em periculosidade adquirida.

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Sobre o autor
Thiago dos Santos Rocha

Thiago dos Santos Rocha é um advogado e autor de livros e artigos jurídicos, graduado em Direito pela Universidade Federal do Maranhão. É especialista em Direito do Consumidor, em Direito Constitucional Aplicado e em Direito Processual Civil pela Faculdade Damásio. Em seus textos acadêmicos, promoveu o diálogo entre Direito e Game Studies, abordando temas como: videogames e epilepsia; advergames e publicidade infantil; gameterapia e planos de saúde; videogames e política nacional de educação ambiental; etc. Também publicou obras na área de Direito Médico, tendo escrito os livros "A violação do direito à saúde sob a perspectiva do erro médico: um diálogo constitucional-administrativo na seara do SUS" (Editora CRV) e "A aplicação do Código de Defesa do Consumidor à relação médico-paciente de cirurgia plástica: visão tridimensional e em diálogo de fontes do Schuld e Haftung" (Editora Lumen Juris).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROCHA, Thiago Santos. A informação-advertência no âmbito dos videogames:: por uma proteção consumerista pelos danos causados por epilepsias e lesões físicas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6055, 29 jan. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/79177. Acesso em: 2 nov. 2024.

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