IPEA faz recomendações econômicas ao Governo para amenizar os efeitos econômicos da Crise da Covid-19 junto aos mais pobres

02/04/2020 às 13:18
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IPEA faz recomendações econômicas ao Governo de gastos de R$ 68,6 bilhões , o que corresponde a 0,2% do PIB brasileiro de 2019 (7,3 trilhões) com assistência social aos mais pobres, para reduzir os efeitos econômicos da crise do coronavírus (Covid-19)

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) é uma fundação pública federal vinculada ao Ministério da Economia. Suas atividades de pesquisa fornecem suporte técnico e institucional às ações governamentais para a formulação e reformulação de políticas públicas e programas de desenvolvimento brasileiros. Os trabalhos do IPEA são disponibilizados para a sociedade por meio de inúmeras e regulares publicações eletrônicas, impressas e eventos.

Ou seja, é papel do IPEA providenciar pesquisas e dados técnicos para balizar as ações governamentais, especialmente do Ministério da Economia, mas também de outros ministérios, na formulação de políticas públicas e programas de desenvolvimento. Sendo que tais dados são fundamentais para balizar as ações do Governo Federal, especialmente em tempos de crise, como a atual crise do Coronavírus (Covid-19).

Na última sexta-feira, dia 27 de março de 2020 o Instituto IPEA, publicou uma nota técnica de vinte páginas, consistente em estudos elaborados por quatros profissionais técnicos na área econômica, de planejamento e gestão, com o seguinte título: “Evitando a epidemia da pobreza: Possibilidades para o programa bolsa família e para o Cadastro Único em resposta à Covid-19”.  Tal estudo é público, e o arquivo PDF como o referido estudo pode ser baixado, do site de publicações do IPEA.

O Estudo é fruto de uma solicitação do Ministério da Economia para realização de previsões de cenários de intervenção econômica, com intuito de potencializar o uso do Programa Bolsa Família e do Cadastro Único como mecanismos de redução dos prejuízos econômicos causados pela Covid-19 à população brasileira de baixa renda.

No estudo é tido como certo que a pandemia de Covid-19 traz desafios inéditos ao sistema brasileiro de proteção social. E que em termos econômicos, podemos esperar choques tanto do lado da oferta quanto do lado da demanda. Uma nova recessão global é quase certa. E não sabemos quanto tempo as medidas extraordinárias de isolamento social deverão durar. Tampouco sabemos quão exigido será o Sistema Único de Saúde (SUS). E neste cenário, os trabalhadores informais, desempregados e as famílias pobres em geral estão particularmente mais expostos à combinação de pandemia e recessão. E dada a probabilidade de desdobramentos catastróficos do ponto de vista social, medidas sociais. são necessárias para garantir um cenário menos agudo ao mais necessitados.

O estudo considera precedentes locais de distribuição de renda como o aluguel social implementado no Rio de Janeiro em 2011 e o benefício extraordinário pago aos moradores de Brumadinho em 2019, bem como, o fato de 39 países no mundo já usarem alguma forma de transferência de renda como parte das respostas à crise econômica causada pelo Covid-19. E que mais de 30% da população brasileira tem renda familiar mensal inferior a meio salário mínimo, o que corresponde atualmente a R$ 522,50 (quinhentos e vinte e dois reais e cinquenta centavos).

Nele são feitas simulações com base no dados de dezembro de 2018 do Cadastro Único e da folha de pagamento do Bolsa Família, do impacto financeiro dos com a criação de medidas e expansão de programas de distribuições de renda em diversas combinações e cenários, e conclui fazendo recomendações econômicas para que o Governo Federal tome as seguinte medidas:

a) zerar a fila de aproximadamente 1,7 milhão de famílias que estão esperando análise para ingresso no programa bolsa família, para que todas as famílias necessariamente necessitadas, sejam imediatamente incorporadas ao programa, que passaria, assim, a atender quase 15,5 milhões  de famílias. Esta medida depende de decisão meramente administrativa, não sendo necessário decreto ou medida provisória, a única medida prática que traria alguma dificuldade seria a emissão de 1,7 cartões para recebimento do benefício;

b) o reajuste no valor do benefício do Programa Bolsa Família em aproximadamente 29%, para que as pessoas em pobreza extrema integrantes do programa, recuperem o valor real de comprova que tinham em 2004, mesmo que o pico histórico de poder de compra tenha ocorrido em 2009, compensando, assim, a defasagem dos últimos 16 anos, sendo que do último reajuste em 2018 até a presente data, a inflação acumulada chega a quase 6 %, Esta medida dependeria da elaboração de um decreto do Governo Federal;

c) a criação de um benefício extraordinário temporário, com duração prevista para seis meses, com possibilidade de prorrogação, no valor de R$ 450,00 (quatrocentos e cinquenta reais) por família, para todas as famílias com dados atualizados no Cadastro Único e renda familiar per capita inferior a meio salário mínimo. Tal benefício seria pago tanto para famílias que já recebem e continuariam recebendo o Bolsa Família, quanto para famílias não beneficiárias do Bolsa Família com renda abaixo de meio salário mínimo por pessoa. Tal medida dependeria da elaboração de medida provisória, e caso necessário a prorrogação do benefício por mais de seis meses, a medida provisória teria que ser aprovada pelo Poder Legislativo, dependendo, portanto, de certa articulação com o Congresso.

Conforme as recomendações do IPEA, durante a vigência do benefício extraordinário e ampliação do Bolsa Família, os 30% mais pobres da população brasileira poderiam contar com uma renda mínima mensal de R$ 450 por família. As famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família, unindo o benefício regular ao extraordinário, teriam em média uma segurança de renda mensal de quase R$ 690 por família. Após o fim do benefício extraordinário, as famílias beneficiárias continuariam recebendo o Bolsa Família, em média, algo próximo de R$ 240 por família (isto é, R$ 77 per capita), valor 27% maior do que o pago atualmente.

Segundo o estudo, isso implicaria em um aumento de gastos de R$ 68,6 bilhões em 2020, o que corresponde a 0,2% do PIB brasileiro de 2019 (7,3 trilhões), sendo que 80% de tais gastos são decorrentes do benefício extraordinário temporário, tendo um impacto orçamentário modesto para o ano de 2021. E faz previsão de que na pior das hipóteses, mesmo que os riscos sociais estiverem superestimados, as despesas adicionais seriam quase todas temporárias e não chegariam a 1,5% do PIB, o que é inferior ao defict anual da Previdência Social.

Das medidas propostas pelo Congresso no Projeto de Lei nº 9.236/2017

No momento, o Poder Legislativo tomou à frente do Poder Executivo e a Câmara dos Deputados, aprovou no ultimo dia 26 de março, portanto, um dia antes da publicação do estudo citado acima, o Projeto de Lei nº 9236/17, de autoria do deputado Eduardo Barbosa (PSDB-MG), com as medidas substitutivas urgentes inseridas pelo Deputado Marcelo Aro (PP-MG), prevê medidas de assistência social, visando mitigar os efeitos da crise econômica junto à população mais pobre.  O referido projeto foi aprovado pelo Senado no último dia 30 de março e aguarda a sanção presidencial que pode ocorrer à qualquer momento, para virar lei.

Referido projeto traz em seu artigo 2º, como media emergencial a concessão provisória de auxílio durante três meses, popularmente apelidado de coronavoucher, no valor de R$ 600,00 (seiscentos reais) mensais aos trabalhadores, e no caso de mãe solo, onde a mãe é a chefe de família sem contar com ajuda de algum companheiro ou marido, denominado no texto legal como “mulher provedora de família monoparental”  o benefício pode ser dobrado, atingindo o valor mensal de R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais);

Para recebimento do auxílio extraordinário é necessário cumprir alguns requisitos:

– ser maior de 18 anos de idade;

– não ter emprego formal;

– não receber benefício previdenciário ou assistencial, seguro-desemprego ou de outro programa de transferência de renda federal que não seja o Bolsa Família;

– renda familiar mensal per capita de até 1/2 salário mínimo, o que corresponde a R$ 522,50 (quinhentos e vinte dois reais e cinquenta centavos) ou que tenha renda familiar mensal total de até três salários mínimos, o que corresponde a R$ 3.135,00(três mil reais cento e trinta e cinco centavos);

É permitido à duas pessoas de uma mesma família acumularem mais de um benefícios diferente, por e exemplo, um do auxílio emergencial e uma Bolsa Família. Se o auxílio for maior que o bolsa família, a pessoa poderá fazer a opção pelo auxílio. Já a renda média será verificada por meio do Cadastro Único para os inscritos e, para os não inscritos, com autodeclaração em plataforma digital. Na renda familiar serão considerados todos os rendimentos obtidos por todos os membros que moram na mesma residência, exceto o dinheiro do Bolsa Família.

– não ter recebido rendimentos tributáveis, no ano de 2018, acima de R$ 28.559,70.

– A pessoa deve, ainda, exercer atividade na condição de:

a) atividade na condição de microempreendedor individual (MEI);

b) contribuinte individual ou facultativo do Regime Geral de Previdência Social (RGPS);

c) trabalhador informal inscrito no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (Cadastro Único); ou tenha renda familiar per capta de até 1/2 salário mínimo ou renda familiar total de até 3 salários mínimos, até  a data de 20 de março de 2020.

Segundo Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados, há estimativa de que o impacto financeiro de tal programa seja de R$ 14,4 bilhões.

Como já dito, o texto ainda depende da sanção pelo Presidente da República, portanto, aditivos e modificações ainda podem ser implementados, embora a aprovação do referido projeto recomende urgência ante a crise econômica atual referente à Covid-19.

Considerações Finais

A iniciativa do Poder Legislativo é muito válida e em alguns pontos mais benéfica do que a medida semelhante sugerida pelo IPEA, uma vez que abrangeria pessoas com renda familiar total de até três salário mínimos (R$3.135,00) e também as famílias com renda per capta de até meio salário mínimo (R$ 522,50), bem como, o valor do benefício apelidado de “coronavoucher” de R$ 600,00 é maior do que o sugerido pelo IPEA de R$ 450,00, embora o Projeto de Lei seja mais restritivo quanto as meses de auxílio 3 meses ao invés de 6 meses, e quanto à possibilidade mais restrita de cumulação do auxílio extraordinário como o bolsa família. Com impacto estimado em R$ 14,4 bilhões. Contudo, o texto do Projeto de Lei ainda precisa ser sancionado pelo Presidente da República para virar Lei, podendo ainda haver aditivos e modificações em seus textos.

Tal lei daria cumprimento à uma das três recomendações constantes do estudo do IPEA, de maneira que o Poder Legislativo acabou por propor e implementar medidas, em auxiliando a atividade do próprio Poder Executivo

Do Estudo do IPEA pode se extrair que além do benefício extraordinário já constante no projeto de lei do Poder Legislativo, mais medidas ligadas ao Bolsa Família e Cadastro Único podem ser tomadas pelo Governo Federal, o que ampliaria o auxilio aos mais necessitados, como é o caso de zerar a fila de espera do bolsa família e corrigir o valor do benefício do Bolsa Família em 29% ou mais.

Ademais, o estudo do IPEA é importante, pois estima que seja razoável um gasto de R$ 68,6 bilhões que corresponde a 0,2% do PIB, podendo o gasto até a  chegar a 1,5% do PIB, que corresponderia a R$ 510 bilhões, e que por serem despesas de natureza provisória de até 6 meses, não teriam grande impacto no orçamento de 2.021.

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Tal estimativa de impacto financeiro feita no estudo do IPEA, ganha ainda mais relevância, se compararmos às notícias de que a previsão de gastos do referido Projeto de Lei  seria de R$ 14,4 bilhões menos de 0,1% do PIB, enquanto o gasto do Brasil até o momento com outras medidas contra o Covid-19 é de 2% do PIB do nosso país, comparado com as medidas econômicas adotadas por outros países como é caso dos Estados Unidos que deve gastar US$2 trilhões (R$ 10 trilhões), número maior que o nosso PIB total que é de R$ 7,3 trilhões, e o que corresponde a 6,4% do PIB daquele pais, da Inglaterra, onde os gastos chegam a 17 % do PIB daquele país e da Alemanha que gasta 12 % de seu PIB.

Lógico que devemos levar em consideração as diferenças de capacidade econômica e o poder de compra de cada país. Contudo, o estudo do IPEA, só pela análise do volume de gastos, faz parecerem insuficientes a distribuição de renda provisória gerada pelo Projeto de Lei nº 9.236/2017, podendo haver mais medidas de assistência social a serem tomadas pelo Poder Executivo Federal por decretos e atos administrativos, ou pelo Poder Legislativo por meio de novos Projetos de Lei.

Assim, entendemos importante a divulgação do referido estudo do IPEA, pois comprova a possibilidade econômica de tomada de mais medias de urgência, visando garantir uma subsistência mínima aos trabalhadores e à população brasileira de baixa renda.

E as noticias de novos projetos já vem aparecendo, como o Projeto de Lei aprovado no Senado, ainda dependendo da aprovação da Câmara e sanção presidencial, para preservação de empregos com pagamento de parte dos salários pelo Governo Federal,

Bem como, da Medida Provisória nº 936/2020  que trata do mesmo tema, e foi publicada no Diário Oficial na data de ontem 1º de abril, que prevê a possibilidade a possibilidade de empresas, por acordo individual, reduzir a jornada de trabalho em 25%, 50 %ou 70 %, com a redução proporcional do salário do trabalhador, por no máximo 90 dias, cabendo ao Governo Federal, durante tal período, realizar  pagamento de benefício extraordinário a tal trabalhador, num valor correspondente à proporção da redução salarial realizada, em relação ao que o trabalhador receberia de seguro desemprego (25%,50% ou 70% de no máximo R$ 1.813,03), ou até a suspensão temporária do contrato de trabalho, por também no máximo 90 dias, como o pagamento do Governo Federal, durante o período correspondente à totalidade de que o trabalhador receberia caso recebesse um seguro desemprego (no máximo R$ 1.813,03), benefício esse intitulado como “benefício emergencial de preservação do emprego e renda”, e dá estabilidade aos trabalhadores pelo mesmo período em que durar a redução de jornada e salarial.

Torcemos para uma aprovação e sanção rápida dos projetos de lei que visem auxílio econômico à população, devido à urgência da crise econômica do Coronavírus (Covid-19), e esperamos que tanto o Poder Legislativo quanto o Poder Executivo Federal, devam, em breve, implementar mais medidas, tanto de assistência aos pobres, quanto  de assistência aos empregados e empresários que sofrerão com a crise e recessão econômica decorrente do isolamento social necessário para combater a atual pandemia de Covid-19.

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Texto escrito por Dr. Diego dos Santos Zuza, advogado e sócio de Zoboli & Zuza Advogados Associados.

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Sobre o autor
Diego dos Santos Zuza

#Fique em casa! Faça sua consulta por Whatsapp (11) 97188-1220 Advogado e sócio de Zoboli & Zuza Advogados Associados. Formado pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo; Especialista de Direito Penal e Direito Processual Penal pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo; Especialista em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP. Advogado atuante nas áreas de Direito Penal, Direito Civil, Direito do Consumidor, Direito de Família e Direito do Trabalho.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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