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A possibilidade do réu recorrer da sentença absolutória

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10/03/2006 às 00:00
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4. Apelação

A doutrina ensina que o mais usado dos recursos é a apelação, "conhecido por todas as legislações: apelación, appelo, berunfung, e tem como finalidade requerer que o Tribunal reexamine a causa, para reformar, no todo ou em parte, a decisão recorrida" [109].

A parte sucumbida, que tem interesse processual e legitimidade, dispõe da apelação para impugnar os fundamentos da sentença. O Código de Processo Penal trata da apelação do artigo 593 ao 606. Mirabette [110] explica a origem da palavra apelação:

A palavra apellatio (dirigir a palavra) era originariamente a designação de um recurso hierárquico com o objetivo de ensejar novo julgamento substitutivo do anterior, admitidas novas provas, e em número igual ao das instâncias hierárquicas existentes.

Sobre a origem histórica da apelação, destacam-se as palavras de Tourinho Filho [111]:

A apelação é um recurso de largo uso e, salvo engano, deita raízes no direito romano. A princípio, havia a provocatio ad populum, segundo o qual o condenado pedia ao povo a anulação da sentença. mas há quem lhe negue o caráter de apelação. Entretanto, no Império Romano, surgiu a apellatio, remédio que permitia ao litigante sucumbente dirigir-se ao Juiz superior visando à reforma da decisão proferida pelo inferior.

Grinover explica que, atualmente, a apelação consiste em "recurso ordinário por excelência, previsto em quase toda totalidade das legislações modernas, caracterizada por ampla devolução cognitiva ao órgão ad quem. É eficaz instrumento processual para a atuação do princípio do duplo grau de jurisdição" [112].

Capez conceitua apelação como o "recurso interposto da sentença definitiva ou com força de definitiva para a segunda instância, com o fim de que se proceda ao reexame da matéria, com a conseqüente modificação parcial ou total da decisão." [113]

Mirabete [114] apresenta um exemplo de réu absolvido que impugna os fundamentos da sentença e tem legítimo interesse processual, real, moral e econômico na apelação: "assim, se foi absolvido por insuficiência de provas, pode apelar para pleitear seja modificado o fundamento absolutório para que se reconheça, por exemplo, estar provada a inexistência do fato, buscando assim livrar-se de efeitos indenizatórios na esfera cível".

Por outro lado, quando não há prejuízo para o réu absolvido, não há interesse processual. Por exemplo, a doutrina predominante entende que não cabe apelação "quando declarada na sentença a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva, ou por outra causa que extinga o próprio crime, uma vez que foi declarado extinto o direito de punir do Estado" [115].

Dessa forma, quando o réu absolvido em face do inciso, II, III, IV e VI do Código de Processo Penal for prejudicado, poderá apelar.


5. Da possibilidade do réu recorrer da sentença absolutória

A possibilidade de o réu recorrer da sentença absolutória a fim de mudar o fundamento da absolvição é uma questão muito importante, apesar de pouco utilizada na prática forense. Grinover, considera "inegável o interesse do réu em decorrer, devido aos reflexos na sua vida moral e social" [116].

Doutrina e a jurisprudência são unânimes ao afirmar que o réu absolvido por insuficiência de provas pode apelar para tentar modificar o fundamento absolutório, desde que presente a sucumbência.

Como a sentença penal absolutória tem efeitos no direito civil "é possível apelar o réu absolvido da decisão para obter a modificação do fundamento legal quando preenchido o necessário pressuposto do recurso (eventual prejuízo em tese) que lhe confere legítimo interesse" [117].

Por exemplo, no caso de absolvição por insuficiência de provas, o réu pode ter interesse em alterar o fundamento da sentença para que reste provada a inexistência do fato. Obviamente, é melhor ficar provada cabalmente a sua inocência, com fulcro no art. 386, I, do CPP, do que não haver prova suficiente de sua culpa.

Lima entende que "o réu absolvido pode apelar da decisão definitiva absolutória para obter a modificação do fundamento legal de sua absolvição quando preenchido os necessários pressupostos do recurso que são o interesse e a sucumbência (prejuízo sofrido)" [118].

Capez traz á tona o exemplo: réu absolvido por legítima defesa putativa que entenda ter havido legítima defesa real. Conquanto, o doutrinador revela não haver diferença entre os fundamentos da absolvição, explica que "na hipótese de legítima defesa putativa, cabe ação civil para a satisfação do dano, (...) Logo, não se pode falar em falta de interesse do réu." [119].

Mirabete [120] apresenta um exemplo de réu absolvido que impugna os fundamentos da sentença e tem legítimo interesse processual, real, moral e econômico na apelação: "assim, se foi absolvido por insuficiência de provas, pode apelar para pleitear seja modificado o fundamento absolutório para que se reconheça, por exemplo, estar provada a inexistência do fato, buscando assim livrar-se de efeitos indenizatórios na esfera cível".

Jesus, igualmente, acredita ser "cabível apelação do réu absolvido para fins de alteração do fundamento legal da sentença" [121]. Na anotação referente ao artigo 577 do Código de Processo Penal, Damásio Evangelista de Jesus [122], cita o seguinte parecer:

Tem legítimo interesse em recorrer de sentença que o absolveu por insuficiência de provas o acusado que pretende que sua absolvição decorra da inexistência de fato típico, vale dizer, seja fundamentada no n.I do artigo 386 do CPP (TJSP, RT 524/336 e 762/596; TAPR, RT 800/698).

No mesmo sentido, a jurisprudência [123]:

O réu tem direito subjetivo para recorrer da sentença absolutória, com finalidade de modificar o fundamento legal da absolvição, firmada na insuficiência de provas para ver reconhecida a atipicidade do fato ou, então, não constituir sua conduta infração penal. O que justifica esse interesse recursal é o prejuízo que decorre dos efeitos indenizatórios diversos, dos fundamentos citados, na esfera civil, mormente na satisfação do dano ex delicto" (TAPR – 4°C. - AP 150143 -7 – Rel. Airvaldo Stela Alves – j. 24.05.2001 – RT 800/698).

A respeito da necessidade de se indicar o correto fundamento legal da absolvição, Moraes [124] cita a jurisprudência:

Recurso criminal. Apelação. Interesse de recorrer. Ocorrência com a pretendida absolvição por fundamento diverso do reconhecido em primeira instância. - ´ Os recorrentes têm interesse recursal, porquanto admissível a pretensão de absolvição por fundamento diverso daquele reconhecido na primeira instância, em especial para atalhar contenciosos indenizatórios na alçada criminal" (TJSP – 1°C. - AP 273.940-3 – Rel. Cerqueira Leite – j. 03.10.2001 – jtj – lex 251/448).

Entretanto, nem sempre o réu absolvido tem legítimo interesse em recorrer da sentença. Mirabete [125] apresenta os dois lados da questão:

Em algumas hipóteses, tem legítimo interesse processual, moral e econômico na apelação o réu absolvido quando impugna os fundamentos da sentença. Assim, se for absolvido por insuficiência de provas, pode pleitear seja modificado o fundamento absolutório para que se reconheça, por exemplo, estar provada a inexistência do fato, buscando assim livrar-se de efeitos indenizatórios na esfera cível. De outro lado, por inexistência de prejuízo, não há interesse do réu absolvido que pretenda na apelação ver reconhecida nulidade processual.

Moraes [126] apresenta jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4° Região em que se verifica a ausência de interesse recursal, fundamentado no artigo 577 Código de Processo Penal:

A absolvição com fundamento no art. 386, II e III, do CPP, não impede o exercício de reparação de dano conforme previsão do art. 66 do Diploma Processual Penal e do art. 1.525 do CC. Hipótese em que o apelado foi absolvido com fundamento no inc. VI do art. 366 do CPP, inexistindo no caso, interesse na alteração do fundamento, sem modificação do resultado. Aplicação do 577 do CPP. Recurso não-conhecido" (TRF 4° R. - 1° Turma – AP 94.04,53932-5 – Rel. Maria de Fátima Freitas Labarrère – j. 31.08.1995 – RTRF 4° R. 30/91).

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Dessa forma, quando não houver sucumbência o réu não poderá recorrer da sentença absolutória, pois não há legítimo interesse recursal. Assim, estando presente a sucumbência, o réu absolvido poderá apelar.


Considerações finais

Através do compromisso de sempre buscar a verdade real e visando acima de tudo a dignidade da pessoa humana, acreditamos que o absolvido não pode receber punição indevida. A sentença absolutória, fundamentada em ausência de provas, pode gerar graves prejuízos ao réu, tanto econômicos, quanto morais e sociais.

Sendo assim, se ficar constatado o interesse na modificação da decisão, quando a absolvição ocorre por insuficiência de provas, o acusado tem a pretensão de ver proclamada a negativa de autoria ou inexistência do fato.

Cercear o réu da faculdade de buscar a reforma das razões de sua absolvição implica não só em obstruir seu direito constitucional de acesso à justiça, como também em onerá-lo, na discussão cível da causa, quando acionado pelo interessado em eventual reparação de danos.


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Sobre a autora
Pollyanna Maria da Silva

bacharelanda em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Pollyanna Maria. A possibilidade do réu recorrer da sentença absolutória. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 982, 10 mar. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8088. Acesso em: 23 nov. 2024.

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