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Comentários à MP 936/2020: principais aspectos relacionados ao Direito do Trabalho

07/04/2020 às 15:52
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Neste artigo, abordaremos os principais aspectos relacionados a MP 936/2020 e suas consequências ao Contrato de Trabalho.

O Programa Emergencial de Manutenção do Empregado e da Renda foi estabelecido pelo Governo Federal, por meio de Medida Provisória, tendo como objetivo principal a regulamentação das relações de emprego em tempos de COVID-19, estabelecendo medidas emergenciais com o escopo principal da preservação dos contratos de trabalho.

As medidas a seguir poderão ser aplicadas a todos os tipos de contrato de trabalho, exceto no caso de jornada de tempo parcial e contratos de aprendizagem.

Vejamos seus principais artigos e as possíveis consequências decorrentes de sua implementação no âmbito do Direito do Trabalho.

Primeiramente, o artigo 3. º estabelece como medidas principais visando a conservação dos contratos de trabalho: a) Benefício Emergencial de Preservação de Emprego e da Renda; b) Redução da jornada de trabalho e do salário; c) Suspensão Temporária do Contrato de Trabalho.

 IMPORTANTE: por expressa determinação legal, tais medidas não são aplicáveis no âmbito da União, dos Estados, do DF e dos Municípios.

1. Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda

O referido benefício, de periodicidade mensal, será custeado com recursos da União, será destinado aos trabalhadores quando houver a redução da jornada de trabalho e do salário, bem como a suspensão temporária do contrato de trabalho.

Para tanto, deverão ser preenchidos os seguintes requisitos:

- Celebração de acordo entre empregado e empregador: De acordo com o texto legal, a partir de simples acordo individual entre empregado e empregador, permitindo a suspensão do contrato de trabalho ou a redução da jornada, com a proporcional redução de salários.

Vejamos.

De acordo com o que define o artigo 12 da Medida Provisória em comento, o benefício emergencial será implementado por meio de acordo ou de negociação coletiva aos empregados:

I - com salário igual ou inferior a R$ 3.135,00 (três mil cento e trinta e cinco reais);

II - portadores de diploma de nível superior e que percebam salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.

Já para os empregados não enquadrados nos critérios acima, as medidas para implementação do benefícios somente se darão por norma coletiva, exceto a redução de jornada de trabalho e de salário de vinte e cinco por cento, que poderá ser pactuada por acordo individual.

Tal medida, contudo, contraria delimitação constitucional, onde medidas análogas exigem a intermediação do sindicato da categoria profissional, ou seja, se permite a redução da remuneração, com proporcional redução de jornada, desde que haja autorização em norma coletiva.

Vejamos o que define os artigos 7. º e 8. º da Carta Magna:

Art. 7. º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(...)

VI - Irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo;

(...)

XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;

[...]

XXVI - reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho;

[....]

Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:

[...] III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;

[...] VI - é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho;

 

Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal, em decisão liminar proferida pelo Min. Ricardo Lewandoswki, na ADI n. º 6363, delimitou ser obrigatória a intervenção dos sindicatos das categorias profissionais em tal negociação.

Vale destacar, aqui, importante recorte da decisão proferida pelo Ministro:

Na hipótese sob exame, o afastamento dos sindicatos de negociações, entre empregadores e empregados, com o potencial de causar sensíveis prejuízos a estes últimos, contraria a própria lógica subjacente ao Direito do Trabalho, que parte da premissa da desigualdade estrutural entre os dois polos da relação laboral.

Nesse sentido, o afastamento dos sindicatos nestas negociações acaba por contrariar ao princípio da proteção inerente ao Direito do Trabalho e, portanto, absolutamente inconstitucional.

Para garantir a efetividade da medida, foi proposta a seguinte alternativa: os acordos individuais, evidentemente escritos, para que sejam válidos, deverão ser chancelados pelos sindicatos das respectivas profissionais em um prazo de 10 dias, sendo eventual omissão considerada como concordância tácita.

Interessante observar que o caput do artigo 11 da Medida Provisória oferta como possibilidade a implementação das condições elencadas a negociação coletiva. Contudo, importante ressaltar que, de acordo com a liminar proferida na ADI 6363, tal participação será obrigatória.

Comunicação ao Ministério da Economia

- Pagamento em até 30 dias, a partir da comunicação.  

2. Redução da Jornada de Trabalho e Suspensão do Contrato de Trabalho: requisitos e valores dos benefícios.  

Conforme estabelecido no artigo 6. º da Medida Provisória, o valor do benefício terá como base o valor mensal do Seguro-Desemprego a que o empregado faria jus, conforme os seguintes parâmetros:

a) Redução da Jornada de Trabalho

O valor do benefício será pago conforme o percentual de redução da jornada de trabalho e do salário. Tal redução poderá perdurar por até 90 dias.

IMPORTANTE I: a redução da jornada de trabalho será realizada tão somente nos seguintes patamares: 25%, 50% ou 75%, exceto se convencionado de maneira diversa em norma coletiva.

IMPORTANTE II: trabalhadores que enfrentarem uma redução inferior a 25% em sua jornada de trabalho, e, por consequência, no salário, não farão jus a qualquer benefício governamental.

Além disso, a complementação será paga conforme as regras abaixo:

- vinte e cinco por cento sobre a base de cálculo prevista no art. 6º para a redução de jornada e de salário igual ou superior a vinte e cinco por cento e inferior a cinquenta por cento;

- cinquenta por cento sobre a base de cálculo prevista no art. 6º para a redução de jornada e de salário igual ou superior a cinquenta por cento e inferior a setenta por cento; e

- setenta por cento sobre a base de cálculo prevista no art. 6º para a redução de jornada e de salário superior a setenta por cento.

IMPORTANTE III: A jornada de trabalho poderá retornar a seu quantum ordinário após o encerramento do estado de calamidade pública ou vencimento do acordo celebrado, mas tal alteração deverá ser comunicada ao empregado com antecedência mínima de 2 dias.

b) Suspensão do Contrato de Trabalho

O valor será pago seguindo-se os critérios abaixo:

- 100% do valor do Seguro-Desemprego a que o empregado teria direito, no caso do empregador aferir rendimento bruto de até R$ 4.800.000,00 em 2019.

- 70% do valor do Seguro-Desemprego a que o empregado receberia, no caso do empregador tiver obtido em 2019 rendimento superior a R$ 4.800.000,00.  Neste caso, os 30% restantes serão complementados pelo empregador.

De se destacar que a suspensão do contrato de trabalho perdurará por até 60 dias, fracionados em 2 períodos de 30 dias, exceto se pactuado de maneira diversa em norma coletiva.

Durante este período, o empregado terá direito a receber todos os benefícios usualmente concedidos pelo empregador, em razão de obrigação contratual ou decorrente de norma coletiva, como, por exemplo, um plano de saúde, mas somente terá suas contribuições previdenciárias computadas se, excepcionalmente, recolhê-las como contribuinte facultativo.

IMPORTANTE I: Não terá direito ao benefício:

- empregado que esteja ocupando cargo ou emprego público, mesmo que em comissão, e, ainda, que esteja exercendo mandato eletivo;

- empregado em gozo de benefícios do Regime Geral de Previdência Social ou outros regimes próprios;

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- empregado em gozo de seguro-desemprego ou de bolsa de qualificação profissional.

IMPORTANTE II: se o empregado tiver mais de um vínculo empregatício constituído, terá direito a receber um benefício referente a cada um deles, levando-se em consideração os critérios já mencionados, exceto no caso de vínculo contratual caracterizado na modalidade de contrato de trabalho intermitente. Neste caso, terá direito a benefício limitado ao valor de R$ 600,00, independentemente de quantos contratos de trabalho intermitente houver firmado.

IMPORTANTE III: cessada a situação que enseja a decretação de calamidade pública ou vencido o prazo do acordo celebrado, o contrato será retomado em um prazo de 2 dias.

IMPORTANTE IV: Um dos aspectos mais interessantes da Medida Provisória em comento se relacionada a impossibilidade de o empregador manter as operações empresariais, mesmo em regime de teletrabalho, no caso de suspensão do contrato de trabalho. Se tal fato se configurar, o empregador estará sujeito:

I - ao pagamento imediato da remuneração e dos encargos sociais referentes a todo o período;

II - às penalidades previstas na legislação em vigor; e

III - às sanções previstas em convenção ou em acordo coletivo.

c) Ajuda compensatória

A critério dos empregados e do empregador, conforme delimitarem por meio de negociação coletiva, poderá ser estabelecido que este disponibilize ajuda compensatória àqueles, a que será paga cumulativamente ao benefício de preservação do emprego e renda.

Importante destacar que tal benefício terá natureza indenizatória, e, portanto, não integrará a base de cálculo para pagamento de benefícios previdenciários e de eventuais tributos, bem como não servirá, ainda, para cálculo do FGTS.

IMPORTANTE: Havendo redução proporcional de jornada e de salário, tal ajuda compensatória não integrará o salário devido pelo empregador, ou seja, não será utilizada na base de cálculo demais direitos trabalhistas inerentes a relação de emprego.

3. Estabilidade Provisória

Conforme estabelece o artigo 10 da MP 936/2020, aqueles empregados que fizerem jus ao Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda terão a garantia de impossibilidade de dispensa sem justa causa durante o período de redução da jornada ou de suspensão do contrato  e, após o retorno as atividades laborativas em período normal, pelo mesmo prazo em que houve a suspensão ou redução da jornada de trabalho.  

IMPORTANTE: Se for verificada a rescisão sem justa do contrato de trabalho neste período, o empregado, além de todos os direitos que normalmente faria jus a título de verbas rescisórias (multa equivalente a 40% do FGTS, saldo do FGTS, férias proporcionais + 1/3, 13. º Salário proporcional, Aviso Prévio, etc), também terá direito a:

I - cinquenta por cento do salário a que teria direito no período de garantia provisória no emprego, na hipótese de redução de jornada de trabalho e de salário igual ou superior a vinte e cinco por cento e inferior a cinquenta por cento;

II - setenta e cinco por cento do salário a que teria direito no período de garantia provisória no emprego, na hipótese de redução de jornada de trabalho e de salário igual ou superior a cinquenta por cento e inferior a setenta por cento; ou

III - cem por cento do salário a que teria direito no período de garantia provisória no emprego, nas hipóteses de redução de jornada de trabalho e de salário em percentual superior a setenta por cento ou de suspensão temporária do contrato de trabalho.

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Sobre o autor
José Eduardo Lourencini

Advogado, professor do Curso de Direito da UNIFAI (Centro Universitário de Adamantina-SP). Atualmente é aluno do Programa de Pós-Graduação (Mestrado) da Universidade do Oeste Paulista-SP (UNOESTE).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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