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O princípio da proporcionalidade e sua aplicabilidade na problemática das provas ilícitas em matéria criminal

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27/03/2006 às 00:00
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3 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

3.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS

Hodiernamente, a proporcionalidade ocupa posição de destaque no âmbito do Direito Constitucional, uma vez que, tornou-se, na seara dos direitos fundamentais, mormente, nas situações de restrições legislativas, concretização de limites imanentes e colisão, um princípio de exacerbada importância.

Concernente a conceituação da proporcionalidade, cumpre transcrever Paulo Bonavides, que ponderando acerca de afirmação de Xavier Philippe parte da premissa metodológica de que "há princípios mais fáceis de compreender do que definir, a proporcionalidade entra na categoria desses princípios". [17]

A doutrina mais abalizada é unânime em comentar a dificuldade de conceituar a proporcionalidade, primeiramente pela ausência de conceito rígido, sendo ora confundido com o princípio da razoabilidade, ora com o princípio da proibição de excesso. Todavia, com relação a esta distinção terminológica, no tópico 3.3 se tecerá maior consideração.

3.2 BREVE ESCORÇO HISTÓRICO

Concernente a origem da proporcionalidade, cumpre evidenciar que, já na Grécia Antiga, Aristóteles, filósofo e discípulo de Platão, utilizava a idéia de proporcionalidade no campo filosófico, onde, nas palavras de Francisco Fernandes de Araújo, "fazia largas referências ao meio termo e à justa medida, que, naquela época, correspondiam ao princípio da proporcionalidade e era idéia ligada a justiça material". [18]

No aspecto moral, para os gregos da antiguidade, a idéia retora do bom comportamento do individuo, o designava o que era bom e justo, era exatamente a idéia da proporcionalidade, contudo, apenas na seara da filosofia.

Posteriormente, a primeira visualização da proporcionalidade no âmbito jurídico, ocorreu no direito romano, mormente, por meio da máxima summum jus summa injuria, pela qual já se vislumbrava a necessidade de coibir o abuso do direito com respaldo na ponderação consubstanciada na idéia de proporcionalidade.

A proporcionalidade também serviu como fundamento basilar para a Lei das XII tábuas, a qual estabelecia a pena de talião ao delinqüente igual ao mal que ele ocasionara.

No século XIII, na Carta Magna Inglesa, outorgada por João sem Terra, a proporcionalidade já toma moldes mais parecidos com os a ela atribuídos hodiernamente, visto que, visa opor limites ao arbítrio e à onipotência estatal.

Nesta perspectiva, e concernente à formação e nascimento do Estado de Direito, é oportuno citar GUERRA FILHO:

Um marco histórico para o surgimento desse tipo de formação política costuma-se apontar na Magna Carta Inglesa, de 1215, na qual aparece com toda a clareza manifestada a idéia referida, quando estabelece que o homem livre não deve ser punido por um delito menor, senão na medida desse delito, e por um grave delito ele deve ser punido de acordo com a gravidade do delito. [19]

Contudo, na acepção da doutrina majoritária a proporcionalidade surgiu na Idade moderna, precisamente com o surgimento do Estado de Direito.

Suzana de Toledo Barros, afirma em sua obra que:

O germe do princípio da proporcionalidade, pois, foi a idéia de dar garantia à liberdade individual em face dos interesses da administração. É essa consciência que existiam direitos oponíveis ao próprio estado e que este, por sua vez, deveria propiciar fossem tais direitos respeitados decorreu das teorias jusnaturalistas formuladas na Inglaterra dos séculos XVII e XVIII. [20]

No mesmo sentido, preleciona Raquel Denize Stumm "que a localização do princípio da proporcionalidade num dado sistema jurídico pode derivar da concretização do princípio Estado de Direito, ou dos Direitos Fundamentais ou, ainda do princípio do Devido processo legal". [21]

Ante o disposto acima, resta claro que a função precípua da proporcionalidade é a garantia das liberdades individuais em face do próprio Estado. Aludida concepção remete-nos à Inglaterra, nação que possui a característica de pioneira em resguardar os direitos dos seus cidadãos. Aludido pioneirismo, na acepção de Jarbas Luiz dos Santos:

revela-se fruto dos avanços políticos da Inglaterra em comparação com as demais nações, o que se ilustra facilmente pelo fato de sua revolução burguesa, a Revolução Gloriosa de 1688, ocorrer com um século de precedência à maior das revoluções desta espécie, a Francesa de 1789. [22]

O século XVIII é, indubitavelmente, marcado, por momentos históricos relacionados a ascensão dos direitos fundamentais, tais como, a declaração Bill of Rights, da Virgínia (EUA) em 1776, que serviu de modelo para varias outras declarações estaduais, bem como aos dez artigos complementares da Constituição Federal Americana, na qual igualmente foram reconhecidos direitos fundamentais aos indivíduos.

Posteriormente, em 1789, com fundamento nasa idéias dos jusnaturalistas sobreveio a Declaração dos Direitos do homem e do cidadão, na França, marco da Revolução Francesa.

Também neste mesmo período, imbuído pelas idéias do iluminismo, o eminente jusfilosofo italiano marquês de Beccaria, em sua famosa obra dei delitti e delle pene, propugnou pala aplicação da proporcionalidade da pena a todos condenados pela prática de delitos.

Por fim, no concernente a aplicação normativa da proporcionalidade, a Alemanha teve expressiva contribuição, consoante expõe Francisco Fernandes de Araújo:

O conceito de proporcionalidade como termo técnico jurídico no Direito Alemão foi utilizado pela primeira vez em 1802, por Von Berg, cujas idéias só bem mais tarde, cerca de um século depois, foram impostas de forma efetiva no campo do Direito de Polícia, por obra do superior tribunal administrativo da Prússia. [23]

Cumpre ressaltar acerca da jurisprudência constitucional da Alemanha, onde muito cedo, sedimentou-se o entendimento de que a proporcionalidade consubstancia relevante meio de controle estatal, visando à observância e concretização dos direitos fundamentais do cidadão. Todavia, no âmbito jurídico – constitucional a mesma somente foi reconhecida no período pós segunda Guerra mundial, haja vista a LEI FUNDAMENTAL DE BONN, quando passou a perfazer um imperativo imanente a idéia de Estado de Direito, impondo o exercício moderado do poder.

Foi com esta idéia desenvolvida na Alemanha que a proporcionalidade se propagou pelo mundo, onde inúmeros Estados a albergaram em suas constituições.

No ordenamento jurídico brasileiro, a proporcionalidade é tida como um princípio e tem sido aplicada nas decisões proferidas pelos tribunais do país. No entanto, sua aplicabilidade ainda é tímida e na maioria das oportunidades em conjunto com o princípio da razoabilidade, como se ambos abrangessem os mesmos preceitos, o que de fato, como analisaremos posteriormente, não ocorre.

Nesta acepção, o que se conclui é que com a Constituição Federal de 1988 inseriu-se no Brasil uma tradição há muito vigente na Europa, a de garantir constitucionalmente direitos fundamentais, o que exige para a sua efetiva concretização a aplicabilidade da proporcionalidade.

3.3 NATUREZA JURÍDICA DA PROPORCIONALIDADE

No concernente a natureza jurídica da proporcionalidade pouco se pretende falar. O entendimento é que a proporcionalidade possui um caráter formal, visto que não é um critério material ou substantivo de decisão, é, somente, um procedimento que conduz á uma solução do caso concreto.

Neste diapasão, entende Robert Alexy, para quem " (…) el procedimiento de ponderación es racional pero, no es un procedimiento que en cada caso conduzca a exactamente una única solución." [24]

No mesmo sentido, preceitua ÁVILA:

(…) o dever de proporcionalidade também não é um princípio ou critério material(…).

O dever de proporcionalidade, então, estabelece uma estrutura formal de aplicação dos princípios envolvidos: o meio escolhido deve ser adequado, necessário e não excessivo. Sobre a medida de excesso considerada inválida o dever de proporcionalidade nada diz. Só a análise diante do caso concreto e diante da relevância que o ordenamento jurídico atribui a determinados bens jurídicos (p. ex. vida, dignidade, liberdade, propriedade) pode revelar o excesso da medida. A aplicação concreta só se completa com um conteúdo, até porque os fins só podem ser estabelecidos em contato com normas substanciais. O que importa, entretanto, é que não é o dever de proporcionalidade em si que estabelece a medida substancial da excessividade, mas sua aplicação conjunta com outros princípios materiais. Vale dizer,: o dever de proporcionalidade, ao contrário do que pretende Larenz, seria um princípio ou critério formal, como bem assinalou Kaufmann. [25]

Por obviou, em face da natureza e fins peculiares do trabalho desenvolvido, não se tem a intenção de responder de forma definitiva a questão acerca da natureza jurídica da proporcionalidade. Entretanto, a tese que afirma que a proporcionalidade possui caráter formal apresenta melhores argumentos.

3.4 FUNDAMENTOS DA PROPORCIONALIDADE

Hodiernamente, pouquíssimas são as discussões acerca da incorporação da proporcionalidade ao ordenamento jurídico pátrio, contudo, inúmeras são as discussões quanto ao seu fundamento, vez que a doutrina não adentra em um consenso.

Portanto, a fim de melhor elucidar no tangente ao fundamento da proporcionalidade, faz –se imprescindível uma análise das hipóteses mais prováveis.

3.4.1 Princípio do Estado de direito

O Tribunal Constitucional Alemão deduz a proporcionalidade do princípio do Estado de Direito, justificando aludida dedução do fato de que no Estado de Direito está presente a idéia de justiça, sendo a proporcionalidade um meio de concretização da aludida justiça.

Tal fundamentação parece lógica, pois, não há de se falar em aplicação da proporcionalidade nos Estados absolutistas.

A proposta de fundamentar a proporcionalidade do princípio do Estado de Direito não vigora só na Alemanha, estando presente com bastante força, na Espanha, em Portugal e também no Brasil.

3.4.2 Direitos Fundamentais

Outro fundamento atribuído à proporcionalidade é os direitos fundamentais, entendendo parte da doutrina que a proporcionalidade deriva de aludidos direitos.

Esta hipótese também teve sua nascente no Tribunal Constitucional Alemão, que em determinado momento entendeu que a proporcionalidade "fundamenta-se no conteúdo essencial dos direitos fundamentais, que não pode ser afetado". [26]

Contudo, a adoção desta idéia gera inúmeros problemas, os quais não são de bem expender, haja vista o escopo do presente trabalho, sendo bom ressaltar que, de acordo com Paulo Bonavides, "embora inicialmente o TCF alemão tenha por vezes fundamentado o princípio da proporcionalidade na intangibilidade do conteúdo essencial dos direitos fundamentais, atualmente há uma preferência pelo princípio do Estado de Direito". [27]

3.4.3 Cláusula do Due Process Of Law

A doutrina constitucional brasileira é bastante tendenciosa em justificar a proporcionalidade no princípio do due process of law, preceituado no artigo 5º, inciso LIV, da Constituição Federal da República Federativa do Brasil, o qual dispõe: " ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal."

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Neste diapasão, argumentam eminentes juristas nacionais, tais como Gilmar Ferreira Mendes, Luis Roberto Barroso, Clémerson Merlin Cléve, Raquel Denize Stumm e Rosana de Toledo Barros.

3.4.4 Pluralidade de Fundamentos Normativos - Brasil

Ante o exposto, percebe-se que inúmeras são as bases normativas utilizadas para justificar a proporcionalidade, sendo, de acordo com o âmbito em que se procede a análise, uma possui maiores adeptos que a outra. Por exemplo, na Alemanha, atualmente, a preferência doutrinária e jurisprudencial recai sobre o Princípio do Estado de Direito; já no Brasil, a tendência atual, é de consubstanciar a proporcionalidade no princípio do devido processo legal.

Entretanto, posto que a maior parte dos juristas nacionais entenda que a proporcionalidade encontra respaldo no princípio do devido processo legal, Paulo Bonavides, por exemplo, concebe a proporcionalidade como princípio geral do direito implícito com fundamento normativo-constitucional no Estado de Direito; [28] Já Guerra Filho, que se apóia em Karl Larenz aduz que não se mostra necessário, nem mesmo correto, procurar derivar o princípio da proporcionalidade de um outro princípio qualquer, pois tem vida própria, e rege os demais princípios submetidos à avaliação do intérprete.

Dessa forma, resta exacerbadamente claro que a doutrina constitucional brasileira oferece um leque de fundamentos para a proporcionalidade, não havendo nada que impeça esta variedade de fundamentações. Contudo, verifica-se que a idéia do Estado de Direito melhor confere força ao princípio da proporcionalidade.

3.5 ELEMENTOS ESTRUTURAIS DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

Primeiramente, faz-se necessário para uma adequada compreensão do princípio da proporcionalidade a identificação e a análise se seus princípios parciais. Aludida divisão do princípio da proporcionalidade em subprincípios decorre da jurisprudência e doutrinas alemãs.

Dessa forma, percebe-se que o princípio da proporcionalidade é estruturado por três subprincípios: princípio da adequação, princípio da necessidade e princípio da proporcionalidade em sentido estrito.

Com fulcro na análise destes subprincípios, tem-se que a proporcionalidade, em sede de limitação de direitos fundamentais, consoante Wilson Antônio Steinmetz:

Pressupõe a estruturação de uma relação meio-fim, na qual o fim é o objetivo ou finalidade perseguida pela limitação, e o meio é a própria decisão normativa, legislativa ou judicial, limitadora que pretende tornar possível o alcance do fim almejado. O princípio ordena que a relação entre o fim que se pretende alcançar e o meio utilizado deve ser proporcional, racional, não excessiva, não – arbitrária. Isso significa que entre meio e fim deve haver uma relação adequada, necessária e racional ou proporcional. [29]

3.5.1 Princípio da Adequação

O princípio da adequação determina que se averigúe, no caso concreto, se a decisão normativa restritiva (meio) do direito fundamental viabiliza o alcance da finalidade almejada. Trata-se de inquirir se a medida é apta, útil e apropriada para atingir à finalidade perseguida.

Consoante Wilson Antônio Steinmetz, "o juízo de adequação pressupõe que, conceitualmente, saiba-se o que significam meio e fim e que, empiricamente, identificam-se claramente o meio e o fim que estruturam a restrição de direito fundamental". [30]

Para se concluir se a medida é adequada deve-se responder a seguinte pergunta: A medida a ser tomada é útil para atingir o fim perseguido?

Portanto, em outros termos, a medida será adequada se for possível por meio dela atingir o fim pretendido.

Cumpre ressaltar que, aludido exame possui caráter empírico, ou seja, tem como fundamento apenas a experiência.

O elemento estruturador da adequação ordena que a medida adotada para a realização do caso concreto seja apropriada aos objetivos almejados, perfazendo, portanto, o controle da relação e adequação entre o meio e o fim. Posteriormente, ao tratarmos dos casos práticos envolvendo a aplicação do princípio da proporcionalidade na problemática das provas ilícitas, visualizaremos como se opera este elemento.

3.5.2 Princípio da Necessidade

Após se proceder a análise do princípio da adequação, entendendo-se que a medida é adequada, passa-se, então, para a análise do princípio da necessidade, ou exigibilidade, pelo qual, será necessária a medida que causar o menor prejuízo possível.

Nas palavras de Francisco Fernandes de Araújo, "o meio é exigível quando o legislador não poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz, mas com menor grau restritivo ao direito fundamental envolvido". [31]

Em relação ao subprincípios da necessidade, faz bem expor as palavras de Wilson Antônio Steinmetz, seguindo o entendimento de Gonzáles –Cuellar Serrano:

No princípio da necessidade, identificam-se, no mínimo, quatro notas essenciais. A primeira, já exposta, é o da ingerência ou intervenção mínima no exercício do direito fundamental pelo seu titular. A segunda é a de que se parte da hipótese de que havia ou pode haver uma medida alternativa menos gravosa. É a presença do elemento da dúvida. Nesse sentido, é o princípio da desconfiança. A terceira nota essencial é a dascomparabilidade dos meios ou das medidas de restrição. Inicialmente compara-se adotando o critério da menos prejudicialidade. Se houver empate no quesito prejudicialidade, então verifica-se qual é o meio ou medida mais eficaz. (…) A quarta nora essencial é a dimensão empírica. É um juízo de dimensão empírica aquele que indica qual é o meio menos prejudicial. [32]

Em suma, "o emprego de determinado meio deve limitar-se ao estritamente necessário para a consecução do fim almejado, e, havendo mais de um meio, dentro do faticamente possível, deve ser escolhido aquele que traga menos desvantagens ou prejuízos". [33]

3.5.3 Princípio da Proporcionalidade em Sentido Estrito

Este terceiro subprincípio da proporcionalidade exige uma reciprocidade razoável entre a relação meio-fim. Consoante CANOTILHO "os meios e fins são colocados em equação mediante um juízo de ponderação, como objetivo de se avaliar se o meio utilizado é ou não desproporcionado em relação ao fim". [34]

O princípio parcial da proporcionalidade perfaz a idéia de justa medida. Em outros termos, para se alcançar o fim perquirido, deve-se sopesar as desvantagens dos meios em relação as vantagens dos fins.

Portanto, o subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito revela a ponderação de bens já explicitada.

Em relação a colisão de direitos fundamentais, Robert Alexy desenvolveu de forma primorosa a lei da ponderação, a qual dispõe: "cuanto mayor es el grado de la no satisfacción o de afectación de un principio, tanto mayor tiene que ser la importância de la satisfacción del outro." [35]

3.6 APLICABILIDADE DA PROPORCIONALIDADE

Ocorrendo uma colisão de direitos fundamentais, resta imprescindível a operacionalização do princípio da proporcionalidade, da forma abaixo aduzida.

O primeiro passo, é o de se analisar se realmente existe uma colisão de direitos fundamentais, o que se faz, nas palavras de Wilson Antônio Steinmetz averiguando, "interpretativamente, se os direitos em tensão são estatuídos, de forma direta ou indireta (não-escrita), por normas –princípios constitucionais". [36] Consoante expõe Gonzáles – Cuellar Serrano, "o exame da constitucionalidade do fim perseguido expressa a realização do princípio da justificação teleológica, pressuposto material da aplicação do princípio da proporcionalidade." [37]

Nesta acepção, resta evidenciado que a possibilidade de aplicabilidade da proporcionalidade só passa a existir, efetivamente, se o fim perquirido possui legitimidade constitucional.

No segundo passo deve –se visualizar a situação de conflito, tendo por escopo primordial identificar todas as circunstâncias relevantes a serem abordadas.

Cumpre ressaltar, que tanto a verificação de colisão de direitos fundamentais como a identificação das circunstancias relevantes são classificados pelo TCF alemão como tests prévios. Somente após a configuração destes, é que se prossiguirá para a aplicação do princípio da proporcionalidade propriamente dito.

O terceiro passo consiste no exame do princípio da proporcionalidade, por meio da análise sucessiva de seus três subprincípios na seguinte ordem: princípio da adequação, princípio da necessidade e princípio da proporcionalidade em sentido estrito, visto que há entre os três subprincípios uma progressão do tipo lógico. Aludida progressão significa que:

Uma decisão normativa (meio) será considerada proporcional em sentido amplo se ela, primeiro, for adequada, depois, necessária e, por fim, proporcional em sentido estrito. A inadequação do meio já será suficiente para considera-lo desproporcional. Apenas analisa-se a proporcionalidade à luz do princípio subseqüente se ela satisfez o princípio antecedente. [38]

Por fim, caracterizando-se as três situações anteriormente elencadas, tendo-se em vista o caráter principal dos direitos fundamentais e as circunstâncias do caso concreto, será necessário se fundamentar racionalmente o resultado da ponderação de bens.

Ante o exposto, percebe-se que a finalidade primordial da aplicação do princípio da proporcionalidade é a proteção dos direitos fundamentais, por meio da garantia dos mesmos ante as possibilidades fáticas e jurídicas.

3.7 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE

No que se refere a estes dois princípios, a doutrina e jurisprudência nacional entendem não haver distinção essencial entre ambos. O próprio Supremo Tribunal Federal não estabelece distinção entre os princípios apreciados.

Eminentes doutrinadores como Luís Roberto Barroso e José dos Santos carvalho Filho, prelecionam neste sentido, entendendo que os princípios em tela diferem entre si apenas pela origem, pois o princípio da razoabilidade surgiu no direito anglo-saxão (Common Law), como face material da cláusula do due process of law, enquanto o princípio da proporcionalidade foi desenvolvido a partir da doutrina e jurisprudência alemã (Civil Law), entendendo estes autores que os conceitos de ambos são fundíveis.

Este entendimento é ressaltado por Luciana Sampaio Gomes Rolim, in verbis:

"Sem embargo de opiniões em contrário, entendo não haver distinção essência entre o princípio da razoabilidade e o princípio da proporcionalidade. Ambos funcionam como meios de controle dos atos estatais, através da contenção dos mesmos dentro de limites razoáveis e proporcionais aos fins públicos". [39]

Todavia, ainda que a doutrina majoritária nacional entenda ser a proporcionalidade uma "faceta do princípio da razoabilidade", isto de fato não corresponde a realidade, uma vez que, embora estes princípios "se imbriquem de alguma maneira na sua atuação prática, o fato é que são princípios distintos". [40]

Helenilson Cunha Pontes aponta quatro diferença entre o princípio da proporcionalidade e o princípio da razoabilidade:

a) o princípio da proporcionalidade exige maior motivação racional nas decisões do que o princípio da razoabilidade; b) o princípio da razoabilidade, ao contrário do princípio da proporcionalidade, prescinde de consideração da relação meio-fim; c) enquanto a razoabilidade constitui princípio geral de interpretação, a proporcionalidade, além dessa qualidade também consubstancia princípio jurídico material; d) finalmente, a razoabilidade tem função eficacial de bloqueio, enquanto a proporcionalidade, além dessa mesma função, também assegura a concretização dos interesses constitucionalmente consagrados. [41]

Do exposto, verifica-se que a o princípio da razoabilidade possui uma maior abstração do que o princípio da proporcionalidade, bem como vislumbra-se que a razoabilidade possui uma função negativa, enquanto a proporcionalidade uma função positiva.

A função negativa do princípio da razoabilidade é caracterizada pela sua forma de atuação, sempre tendo por desiderato impedir que o poder estatal cometa medidas de excesso em face dos direitos fundamentais dos indivíduos, por meio de uma ponderação em busca do equilíbrio.

Em contra partida, o princípio da proporcionalidade possui função positiva, porque, além de evitar o cometimento de excessos por parte do poder público, exige a "utilização de mecanismos para equacionar as medidas corretas na solução dos casos concretos, o que se "materializa" pelo manejo de seus elementos ou subprincípios, de adequação, necessidade e princípio da proporcionalidade em sentido estrito (meio termo e justa medida)." [42]

Nessa esteira, percebe-se que existem diferenças e semelhanças entre os dois princípios supramencionados, concluindo-se, portanto, que ambos não se confundem, sendo princípios distintos, inclusive pela sua forma de aplicabilidade.

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Sobre a autora
Roberta Pacheco Antunes

advogada, pós-graduada pela Escola da Magistratura do Paraná

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANTUNES, Roberta Pacheco. O princípio da proporcionalidade e sua aplicabilidade na problemática das provas ilícitas em matéria criminal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 999, 27 mar. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8153. Acesso em: 10 mai. 2024.

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