INTRODUÇÃO
A reforma da previdência, engendrada pelas Emendas Constitucionais nº 20/98 e nº 41/03, trouxe inúmeras mudanças nas regras de aposentadoria no serviço público brasileiro.
Dentre elas, destaca-se a extinção da especialíssima aposentadoria dos magistrados, membros dos Tribunais de Contas e membros dos Ministérios Públicos.
O presente artigo objetiva espancar as dúvidas nascidas com as novas regras previdenciárias, esclarecendo aos interessados as principais questões até hoje incompreendidas.
Vamos direto ao assunto:
A QUEM SE APLICA
a)Magistrados (Juízes, Desembargadores e Ministros) - fundamentação legal: art. 1º da EC nº 20/98, que alterou a redação original do inciso VI, do art. 93, da CF/88, estabelecendo que a aposentadoria dos magistrados e a pensão de seus dependentes observarão o disposto no art. 40 da CF/88.
b)Membros dos Tribunais de Contas (Ministros e Conselheiros) – fundamentação legal: art. 1º da EC nº 20/98, que alterou a redação original do §3º, do art. 73 da CF/88, estabelecendo que os Ministros do Tribunal de Contas da União terão as mesmas garantias, prerrogativas, impedimentos, vencimentos e vantagens dos Ministros do Superior Tribunal de Justiça, aplicando-se-lhes, quanto à aposentadoria e pensão, as normas constantes do art. 40. Aqui, embora a norma refira-se aos Ministros do TCU, a regra do art. 40 da CF/88, pelo princípio da simetria, aplica-se também aos membros dos Tribunais de Contas Estaduais.
c)Membros dos Ministérios Públicos dos Estados e da União (Promotores de Justiça, Procuradores de Justiça e Procuradores da República, do DF, do Trabalho e Militar, inclusive Procuradores junto aos TCEs e TCU) - fundamentação legal: art. 1º da EC nº 45/04, que alterou a redação do §4º, do art. 129 da CF/88, estabelecendo que aplica-se ao Ministério Público, no que couber, o disposto no art. 93 da CF/88.
Nesta análise preliminar, podemos chegar a uma importante conclusão: se as relevantes carreiras de Estado acima elencadas estão atadas às regras do regime próprio de previdência (art. 40 da CF/88), o que se dirá então das demais carreiras que compõem a estrutura funcional brasileira. Destarte, carreiras como as de Procuradores Federais, Procuradores dos Estados, Defensores Públicos, Professores, Policiais, Médicos e Servidores em geral, estão todos atados às regras do regime próprio de previdência.
O que se precisa entender acerca da reforma da previdência, é que, hoje, qualquer servidor público, titular de cargo efetivo ou vitalício, da Administração Pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer ente federativo, deve submeter-se, no momento da aposentadoria, às regras do art. 40 da CF/88 ou às regras de transição previstas nas EC nºs 20/98, 41/03 e 47/05. Não há exceção. Se o servidor for titular de cargo efetivo ou vitalício, deve submeter-se às regras aqui apontadas.
COMO ERA ANTES
O texto original do art. 93, inciso VI da CF/88, previa que a aposentadoria com proventos integrais seria compulsória por invalidez ou aos setenta anos de idade, e facultativa aos trinta anos de serviço, após cinco anos de exercício efetivo na judicatura.
Tratava-se de uma regra bastante vantajosa aos que dela tinham direito, pois garantia ao magistrado aposentadoria com proventos sempre integrais, seja na invalidez (independente da causa), seja na compulsória.
Hoje, após a EC nº 20/98, diferentemente, a aposentadoria por invalidez para ser concedida com proventos integrais necessita que a causa seja: a) acidente em serviço ou b) moléstia profissional ou doença grave, contagiosa ou incurável, especificadas em lei. Caso contrário, ela será sempre proporcional.
A compulsória, nas regras atuais, será sempre proporcional ao tempo de contribuição, podendo ser integral se o servidor houver cumprido o tempo mínimo necessário de contribuição exigido em lei.
Mas as vantagens não paravam por aí. Na aposentadoria voluntária, que o texto originário do art. 93, inciso VI, chamava de facultativa, o magistrado, independente do sexo, precisava provar apenas trinta anos de serviço, sendo cinco na judicatura.
Pois bem, o magistrado teria que ter apenas trinta anos de serviço e não de contribuição. Tempo este que poderia ser todo dentro do serviço público ou possuir período averbado de outro regime, inclusive o celetista. O que importava é que dentro desses trinta anos, pelo menos cinco deveriam ser no cargo de magistrado, exercendo a função jurisdicional.
A regra não fazia distinção de sexo. Magistrados e magistradas, após trinta anos de tempo de serviço e, pelo menos cinco da judicatura, podiam requerer suas aposentadorias com proventos integrais.
Tais requisitos, bem mais brandos que os exigidos para os servidores das demais carreiras, não respeitavam qualquer regra atuarial, o que acarretava desequilíbrio nas contas do regime e fazia nascer sentimentos de inconformismo entre os servidores não contemplados com tal benesse.
Esta regra, por força dos textos originais dos artigos 73, §3º e 129, §4º da CF/88, aplicava-se não só aos magistrados, como também aos membros dos Tribunais de Contas e aos membros dos Ministérios Públicos. Destarte, a expressão "cinco anos de exercício efetivo na judicatura" deveria ser entendida como cinco anos no efetivo exercício das funções e prerrogativas correlatas a cada uma destas carreiras.
COMO É HOJE
Após, entretanto, o advento da EC nº 20/98, as regras para a concessão da aposentadoria voluntária dos magistrados sofreram substancial alteração.
O art. 1º da EC nº 20/98, extinguiu os requisitos até então vigentes, determinando que a aposentadoria dos magistrados e a pensão de seus dependentes observariam, a partir dali, o disposto no art. 40 da CF/88.
Portanto, a partir 16/12/98, data de publicação da EC nº 20, os magistrados só podem se aposentar voluntariamente pela regra geral do art. 40 da CF/88, tendo que cumprir, cumulativamente, todos os requisitos ali elencados, quais sejam: sexo, idade, tempo mínimo de contribuição, tempo de efetivo exercício no serviço público e tempo no cargo em que se dará a aposentadoria. Além disso, devem contribuir, pois o sistema hoje é contributivo e solidário. Sem contribuição não há o direito ao benefício da aposentadoria.
A título de exemplo, vamos ilustrar o seguinte caso: João, nascido em 13/11/45, tomou posse no cargo vitalício de Conselheiro do TCE/PI, em 07/05/1991. Averbou 9 anos de tempo de serviço no regime celetista e mais 11 anos de tempo de serviço no regime estatutário da União, em face de cargo público efetivo que possuía, somando, então, 20 anos de tempo de serviço averbado. Com estes dados, podemos chegar à seguinte conclusão: até o dia 16/12/98, data de puplicação da EC nº 20/98, o interessado possuía pouco mais de 27 anos de tempo de serviço, o que não lhe garantiu o direito de aposentar-se pelas regras até ali vigentes, pois faltavam pouco menos de 3 anos para que o interessado cumprisse os 30 anos que lhe eram exigidos. Destarte, como o interessado não se tornou elegível antes da EC nº 20/98, automaticamente, por força do princípio de que ninguém tem direito adquirido a regime jurídico, foi submetido às novas regras do art. 40 da CF/88, insculpidas pela EC nº 20/98. Dessa forma, ao invés de ter que trabalhar por pouco menos de 3 anos, terá agora que trabalhar e contribuir por pouco mais de 6 anos, pois somente em 07/05/2006, o mesmo terá cumprido 35 anos de contribuição. Assim, somando-se este aos demais requisitos exigidos pelo art. 40, §1º, III, "a" da CF/88, como a idade de 60 anos, 10 anos de tempo de serviço e 5 anos do cargo em que se dará a aposentadoria, o interessado poderá pleitear sua aposentadoria com proventos integrais.
É de fácil conclusão que as novas regras são muito mais rigorosas que as antigas. Como se diz no jargão popular, a EC nº 20/98, jogou os magistrados na vala comum da aposentadoria, igualando-os aos demais servidores que já eram submetidos às regras do art. 40 da CF/88. Nesse ponto, a reforma andou bem ao extirpar do ordenamento constitucional pátrio esta insustentável teratologia.
E, finalmente, como já foi dito parágrafos acima, as EC nºs 20/98 e 45/04, alteraram o texto dos artigos 73, §3º e 129, §4º da CF/88, estendendo aos membros dos Tribunais de Contas e dos Ministérios Públicos, a mesma regra de aposentadoria aplicada aos magistrados, qual seja, a prevista no art. 40 da CF/88.
As regras que privilegiavam os membros das três carreiras aqui estudadas, portanto, não mais existem.
REGRAS DE TRANSIÇÃO E O BÔNUS DE 17% PARA OS MAGISTRADOS, MEMBROS DE TRIBUNAIS DE CONTAS E MEMBROS DOS MINISTÉRIOS PÚBLICOS DO SEXO MASCULINO
Mas a reforma da previdência não poderia acabar com os sonhos dos que até aquela data, 16/12/98, encontravam-se na iminência de implementar tão amistosos requisitos e ingressar na inatividade a fim de desfrutar da tão almejada aposentadoria com proventos integrais.
De fato, a reforma não poderia ser tão cruel assim. A mudança de regras não poderia ser tão abrupta ao ponto de provocar desassossego no serviço público. As regras do art. 40 da CF/88, denominadas de regras gerais, não poderiam ser a única opção daqueles que chegaram tão perto e viram seus planos desmoronarem como um castelo de cartas ao vento. Essa mudança haveria de ser razoável e respeitar as inúmeras expectativas de direito existentes à época.
E dessa compreensível preocupação, criaram-se as regras de transição. Então nem tudo estava perdido. O legislador ofereceu opções mais brandas para que os servidores que já se encontravam no serviço público antes do advento das emendas.
Dessa forma, os membros das carreiras aqui estudadas, a exemplo dos demais servidores públicos, também tiveram direito a socorrerem-se das regras de transição criadas pelas EC nºs 20/98, 41/03 e 47/05.
Desnecessário, se nos afigura, explicar a sistemática das regras de transição, já que esse não é o objetivo deste artigo. O que se torna importante frisar é que, tanto na regra de transição do revogado art. 8º da EC nº 20/98, quanto na do art. 2º da EC nº 41/03, criou-se um bônus de 17% para os magistrados, membros dos Tribunais de Contas e membros dos Ministérios Públicos, do sexo masculino. Tal bônus deve ser somado ao tempo de contribuição implementado até a data de 15/12/98, a fim de compensar a mudança no tempo de contribuição que passou de 30 para 35 anos. Vale ressaltar que não se trata de um privilégio. Trata-se apenas de uma compensação que objetiva neutralizar os efeitos desvantajosos do aumento do tempo de contribuição. Este artifício não alcança as mulheres visto que o tempo de contribuição das mesmas continuou inalterado, ou seja, 30 anos.
Num exemplo: se um determinado Promotor de Justiça quisesse se valer de alguma das duas regras acima apontadas, e possuísse 29 anos de tempo de serviço em 15/12/98, e 53 anos de idade, teria o direito de acrescentar mais 17% deste número (29) ao total de tempo de serviço até ali cumprido, o que se resumiria no seguinte cálculo: (29 anos = 10.585 dias) + 17% = 12.384 dias → 12.384 dias = 33 anos, 3 meses e 2 dias. Isso quer dizer que o Promotor, em 15/12/98, contaria com 33 anos, 3 meses e 2 dias de tempo de serviço. No passo seguinte, subtrai-se 35 anos de tempo contribuição de 33 anos e 3 meses e 2 dias de tempo de serviço, (o que equivale a subtrair 12.775 dias de 12.384 dias, que resulta em 391 dias). Soma-se 391 dias ao pedágio de 20%, resultando em 469 dias, o que corresponde a 1 ano e 3 meses e 14 dias. Isto quer dizer que, a partir de 16/12/98, o promotor teria que contribuir por mais 1 ano, 3 meses e 14 dias. Prazo este que terminou em 30/03/00, antes, portanto, do advento da EC nº 41/03.
Por fim, é importante lembrar que, além das regras de transição do revogado art. 8º da EC nº 20/98, e do art. 2º da EC nº 41/03, existem as do art. 6º da também EC nº 41/03, e do art. 3º da EC nº 47/05, todas elas aplicáveis aos servidores das importantes carreiras aqui tratadas.
CONCLUSÃO
Estão são, portanto, as considerações que pretendíamos esposar acerca das novas regras de aposentadoria dos magistrados, membros dos Tribunais de Contas e membros dos Ministérios Públicos.