A pandemia do novo coronavírus trouxe diversas mudanças, causando os mais variados impactos na vida de todos nós; destes, um dos mais visíveis ocorreu nas relações familiares.
Para muitos, essa é uma excelente oportunidade de estar mais próximo das pessoas queridas. Contudo, para outros, essa proximidade expôs a fragilidade do relacionamento ou dos sentimentos de alguns casais.
A quarentena forçada tem causado consequências inesperadas, devido a uma maior proximidade dos casais dentro de suas casas, em contraste aos distanciamentos periódicos que as obrigações profissionais, acadêmicas e sociais impunham a um ou ao outro.
Com o confinamento residencial, em uma atitude forçada pelas circunstâncias da pandemia, o stress do risco do contágio e outros elementos de ordem emocional tem posto diversos relacionamentos à prova. Agora, a vivência diante do desafio da vida se mostra constante, contínuo, sem qualquer interrupção, fazendo com que os elementos que vinculam os casais se dissolvam de tal modo que não lhes resta outra alternativa, senão a separação. O que antes era amor, tornou-se desespero.
O primeiro objetivo das medidas de distanciamento decretadas pelas Autoridades, foi a adoção de um meio de restrição na propagação do contágio do Covid-19. Neste momento, de fato, as famílias assimilaram a medida como forma de proteção de seus membros, na manutenção da saúde e no resguardo da vida. Assim, os membros familiares foram levados, por força das circunstâncias, a construir uma nova relação, algumas vezes com efeitos bem danosos e de teor inimaginável, vindo a ocasionar uma outra pandemia, consequente da primeira, desta vez, com relação a divórcios e a separações.
Temos como exemplo, a China, primeiro epicentro da pandemia de Covid-19, a qual, infelizmente, registrou um recorde no número de pedidos de divórcio, logo após o afrouxamento das medidas restritivas de isolamento e distanciamento social. A consequência imediata da liberdade de locomoção foi o impulso desenfreado à busca pelo rompimento dos relacionamentos, sejam eles casamentos ou uniões estáveis.
No Brasil, houve um aumento de 177% na procura por escritórios especializados em Direito de Família e divórcios, comparado com o mesmo período do ano passado, apresentando uma crescente, desde o início da quarentena.
Segundo levantamento do site de buscas Google, foi registrado em março, no Brasil, um aumento de 82% nas pesquisas com o termo: “como dar entrada no divórcio?”, enquanto no mês de abril houve um aumento escandaloso de 9900% nas pesquisas pelo termo: “divórcio online gratuito”.
Nos Estados Unidos, país onde o coronavírus teve um avanço de enormes proporções, observou-se um comportamento equivalente ao dos brasileiros. Casais confinados têm buscado muito mais os Advogados para ingressar com pedidos de divórcio.
Devemos ressaltar, que a vida conjugal durante a quarentena, como já mencionamos, pode ser uma excelente oportunidade para estreitamento dos laços familiares, contudo, esse confinamento, traz à tona um outro lado não muito animador dessa situação.
O isolamento, mal administrado emocionalmente, exalta os ânimos, contribui para o aumento das discussões e brigas, chegando, em alguns casos, ao absurdo das agressões físicas.
Este convívio integral, imposto pela quarentena, torna as zonas de atrito entre os cônjuges muito mais perceptíveis, fazendo com que as diferenças entre os parceiros, antes toleradas ou até mesmo nem percebidas pela pouca convivência, saltem aos olhos, como fatos desagradáveis e, até mesmo, inaceitáveis.
A rotina é o elemento de maior potencial de devastação dos relacionamentos. Cabe aos casais buscar alternativas para fugir desses efeitos deletérios e reinventar a relação, buscando aquilo que sempre desejaram: estarem juntos, movidos por carinho, companheirismo e respeito.
Casais que, acima de tudo, se respeitam e se amam, possuem todas as ferramentas essenciais para passarem ilesos por essa pandemia e até mesmo fortalecer a relação, seja pelo companheirismo, seja pelo apoio mútuo, mantendo-se cada dia mais unidos, com o respeito ao espaço e às necessidades do outro. Todos temos manias e defeitos, afinal, somos humanos. Contudo devemos estar, sempre atentos a todo e qualquer tipo de comportamento invasivo.
De fato, as discussões do dia a dia já são inevitáveis, ainda mais num momento de emoções tão intensas e afloradas pelos medos e incertezas dessa pandemia, e agravados pelo isolamento social. Contudo, é preciso parar e repensar as atitudes. O momento presente não comporta atos de intransigência. O respeito e o bom senso devem ser aplicados em todas as nossas relações pessoais, principalmente, no casamento.
Uma decisão pelo divórcio é bastante difícil, ainda mais neste período. O calor dos ânimos causados pelo medo e o stress da pandemia, empurra os cônjuges e companheiros a uma situação altamente indesejável, haja vista a inviabilidade quase absoluta, de obter-se uma ordem judicial de afastamento do lar em meio a pandemia, salvo nos casos de abuso e violência doméstica.
Não podemos esquecer, principalmente nestes tempos de altíssimo estresse, por conta da convivência contínua forçada, que o lar, é justamente, o local mais perigoso para mulheres vítimas de violência doméstica. É, justamente, nesses casos, quando o convívio acarreta o risco de morte, e que se faz necessário requerer medidas protetivas de afastamento do lar, até mesmo perante o Plantão Judiciário ou, diretamente, nas Delegacias de Defesa da Mulher.
Nos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo o número de denúncias de violência doméstica sofreu um incremento de aproximadamente 50%, o mesmo ocorrendo com os casos de feminicídio, tomando-se por base as informações havidas desde o início da implementação das medidas de distanciamento social.
Os maiores desafios dessa quarentena encontram-se na esfera familiar. A forma como se desenvolve a vida das famílias e dos casais sem filhos, tem sofrido mudanças drásticas. O confinamento é uma prova de fogo para as relações familiares, e em especial, para os casamentos.
Assim, é muito provável que esse aumento considerável no número de divórcios pelo mundo pós pandemia, se torne tão danoso para a estabilidade social e à saúde das pessoas, como a infecção de Covid-19.
Devemos, como seres humanos comprometidos com o melhor ao próximo, ao menos compreender este momento, como uma oportunidade de aproveitar mais e melhor a vida em família, e a dois.