A disseminação de notícias falsas é uma chaga na democracia contemporânea. Por intermédio das hoje nomeadas “fakes news”, alguns estão a controlar o sentimento da sociedade, em prol de benefícios pessoais, sejam eles econômicos ou políticos, expondo inverdades que deturpam a realidade e os fatos, tal como desacreditam o jornalismo profissional.
Em artigo anterior, acresci que a liberdade de expressão é incensurável, todavia se ela abranger conteúdo imoral que implica ilicitude penal e civil, o autor responderá pelos danos causados, conforme artigo 5º, X, da Constituição Federal. Em suma, a liberdade de expressão não é absoluta, ainda que não possa sofrer censura. Ou seja, amplo é o direito de dizer, produzir, escrever e se manifestar da forma que melhor lhe convier. Contudo, se disso resultar ofensa à honra e à imagem de terceiros, tal como constituir crime, o autor poderá ser punido.
Nessa esteira, muitos estão a confundir liberdade de expressão com “fake news”, sendo que a última, além de precipuamente desinformar, macula a honra e a imagem de terceiros, utilizando-se de falsidades ou meia verdades, onde dados falsos são adicionados.
É inegável que a disseminação das “fake news”, vem causando danos aos pilares de nossa sociedade democrática, devendo, portanto, ser combatida.
Assim, o Projeto de Lei n.º 2.630/2020 propõe instituir a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, estabelecendo normas, diretrizes e mecanismos de transparência de redes sociais e de serviços de mensagensa privadas através da internet, para desestimular o seu abuso ou manipulação com potencial de dar causa a danos individuais e ou coletivos, tendo como objetivos a defesa da liberdade de expressão e o impedimento da censura no ambiente online, fortalecendo o processo democrático por meio do combate ao comportamento inautêntico e as redes de distribuição artificial do conteúdo.
O projeto pretende atacar as “fake news”, mirando nas ferramentas usadas para espalhar notícias falsas em rede sociais e aplicativos de mensagem, todavia somente será aplicado aos provedores de rede social com mais de dois milhões de usuários, assim como aqueles sediados no exterior e ofertem serviços ao público brasileiro.
A fim balizar a sua atuação, o projeto conceitua “fake news” como sendo aquele conteúdo, em parte ou no todo, inequivocamente falso ou enganoso, passível de verificação, colocado fora de contexto, manipulado ou forjado, com potencial de causar danos individuais ou coletivos, ressalvado o ânimo humorístico ou de paródia.
O mesmo é feito em relação às contas “fakes”, definindo-as como sendo aquela criada ou usada com o propósito de disseminar desinformação ou assumir identidade de terceira pessoa para enganar o público.
Entre os principais pontos do projeto de lei, está a maior transparência sobre conteúdos pagos, a responsabilidade dos provedores no combate a desinformação, sendo vedado contas “fakes”, robôs disseminadores de “fake news” e conteúdo patrocinado não rotulado.
Em relação a Lei das Eleições, o projeto estabelecendo que no período da propaganda eleitoral e durante situações de emergência ou de calamidade pública, o número de encaminhamentos de uma mesma mensagem fica limitado a no máximo 1 (um) usuários ou grupos.
Em relação aos usuários das redes sociais e aplicativos, estes poderão permitir ou recusar o recebimento de mensagens em massa, sendo que o padrão dos apps será pela não permissão.
No tocante ao poder público, este deve disponibilizar mecanismo acessível e destacado para qualquer usuário reportar “fake news”, assim como promover campanhas para servidores públicos sobre a importância do combate à desinformação e transparência de conteúdos patrocinados na internet.
Dentre as sanções estabelecida, sem prejuízo das de ordem cíveis, criminais e administrativas, os provedores ficam sujeitos a advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas; multa; suspensão temporária das atividades; proibição de exercício das atividades no país. Para fixação e gradação da sanção, deverão ser observados a gravidade do fato, a partir da consideração dos motivos da infração e das consequências nas esferas individual e coletiva; a reincidência na prática das infrações previstas e a capacidade econômica do infrator.
Outra importante medida do projeto lei é a inclusão das “fakes news” no rol das improbidades administrativas, quando praticada por servidor público.
O projeto ainda conta com mais de 60 emendas e três substitutivo. Entre as que merecem destaques, está a não inclusão das tradições, crenças e religiosas e as convicções filosóficas ou políticas, tal como a proibição da Administração Pública em disseminar desinformação, por meio de contas “fakes”, robôs ou conjunto de robôs, além de conferir à vítima da desinformação direito de resposta à declarações falsas, como o devido destaque.
Uma das emendas também garantem o contraditório, uma vez que o usuário deverá ser notificado de eventual reclamação a respeito da verossimilhança de suas postagem, assegurando-lhe o prazo 24 horas para manifestar-se quanto à veracidade do conteúdo divulgado e a procedência ou improcedência da reclamação.
Curiosamente, há uma emenda que define que contas públicas, para todos os fins em direito admitidos, são aquelas utilizadas, mesmo que com caráter eminentemente pessoal, por agentes políticos nas aplicações de internet, assim entendidos aqueles investidos em seu cargo por meio de eleição, nomeação ou designação, cuja competência advém da própria Constituição, como os Chefes de Poder Executivo e membros do Poder Legislativo, Judiciário, Ministério Público, Tribunais de Contas, além de cargos de Diplomatas, Ministros de Estado e de Secretários nas Unidades da Federação.
Desta breve síntese do polêmico projeto de lei, não restam dúvidas que de este representará um marco no combate a este mal que aflige a todos, especialmente a democracia contemporânea, posto que as “fake news”, por vezes, são utilizadas para solapá-la.
É evidente que muitas imperfeições e imprecisões estão presentes no projeto, bem como lacunas a serem sanadas. Entretanto, o debate é salutar e indispensável, porquanto só com ele avançaremos, a fim de produzirmos uma legislação distinta e eficaz contra as “fake news”.