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Notas acerca da reciprocidade entre Brasil e Portugal na advocacia

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21/06/2020 às 09:50
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DO ARTIGO 201º, 2 DO ESTATUTO DA ORDEM DOS ADVOGADOS PORTUGUESES (LEI PORTUGUESA Nº 145 DE 2015)

A Lei Portuguesa nº 145, de 9 de setembro de 2015, disciplina o Estatuto da Ordem dos Advogados Portugueses. Nela, encontra-se um dispositivo atinente à atuação dos advogados brasileiros no país ibérico. Vejamos então o teor do referido dispositivo, o art. 201º, 2:

Artigo 201.º - Exercício da advocacia por estrangeiros

(...)

2. – Os advogados brasileiros cuja formação académica superior tenha sido realizada no Brasil ou em Portugal podem inscrever-se na Ordem dos Advogados em regime de reciprocidade. (grifo do autor)

Tal dispositivo aponta duas situações distintas, mas que rumam para uma mesma condição, qual seja: advogado brasileiro (nato ou naturalizado, eis que não há diferenciação no direito brasileiro), formado no Brasil ou então em Portugal, possui o direito subjetivo de inscrever-se na OAP, em regime de reciprocidade.

O Regulamento nº 913-C de 2015, da Ordem dos Advogados Portugueses, que dispõe acerca da inscrição de advogados e advogados estagiários na OAP, esclarece a situação abordada no referido art. 201º, 2, da Ordem Portuguesa, em seu art. 17º:

Artigo 17.º - Inscrição de Advogados de nacionalidade brasileira

1. – Por força do disposto no EOA, os Advogados brasileiros cuja formação académica superior tenha sido realizada no Brasil ou em Portugal podem inscrever-se na Ordem dos Advogados desde que idêntico regime seja aplicável aos Advogados de nacionalidade portuguesa inscritos na Ordem dos Advogados que se queiram inscrever na Ordem dos Advogados do Brasil.

2. – O regime de reciprocidade previsto no número anterior permite a inscrição de Advogado brasileiro com dispensa da realização de estágio e da obrigatoriedade de realizar prova de agregação.

Este art. 17º do Regulamento OAP 913-C/2015 direciona o leitor, após a leitura do item 1, para a ideia de que o advogado brasileiro possuirá os mesmos direitos do português quando da inscrição na Ordem dos Advogados Portugueses, contanto que haja observância do princípio da reciprocidade no Brasil. Como já visto, a OAB editou o Provimento nº 129 de 2008, que disciplina a inscrição dos advogados portugueses em seus quadros, não havendo que se falar, portanto, em falta de reciprocidade.

O item 2 do art. 17º do Regulamento 913-C, traz duas questões importantes: em primeiro lugar, dispensa o advogado brasileiro de realização de estágio obrigatório com advogado português, bem como desobriga o postulante a realizar a chamada prova de agregação, o equivalente ao Exame da OAB português.

Inicialmente, a ideia de estágio para advogados, conforme o disposto no Estatuto da OAP (Lei Portuguesa nº 145 de 2015) tem por objetivo habilitar e certificar publicamente que o graduado em Direito obteve formação técnico-profissional e deontológica adequada ao início da atividade e cumpriu os demais requisitos impostos pelo Estatuto e regulamentos para a aquisição do título de advogado (leitura do art. 191º, 1, do Estatuto da OAP). Em razão de os bacharéis em direito no Brasil realizarem estágio de prática jurídica antes de obterem grau no curso de Direito (ver art. 5º, III, e 7º, caput, e seu § 1º, da Resolução CNE/CES nº 9 de 2004, do Ministério da Educação do Brasil - MEC), a Ordem Portuguesa julgou desnecessário impor ao advogado brasileiro mais um estágio, desta vez dentro de seu território.

Na sequência da análise, o art. 18º do Regulamento nº 913-C de 2015 da OAP dispõe acerca do requerimento de inscrição do advogado brasileiro junto à Ordem Portuguesa.

Em seu número 1, é dito que:

O requerimento de inscrição como Advogado, nos termos do artigo anterior, é apresentado junto do Conselho Regional competente em razão do domicílio escolhido como centro da sua vida profissional, com a indicação deste, do nome completo e demais dados de identificação do requerente, cargos e atividades exercidos, telefone, número de fax, endereço de correio eletrónico bem como a morada em Portugal.

No tocante aos Conselhos Regionais, estes estão estruturados em 7 regiões distintas, conforme o art. 2º do Estatuto da OAP: Lisboa, Porto, Coimbra, Évora, Faro, Açores e Madeira. Assim, o advogado brasileiro deverá escolher uma destas regiões para o seu exercício profissional em terras portuguesas.

Na sequência, o nº 2 do art. 18º do Regulamento nº 913-C enumera os documentos necessários para a inscrição. Vejamos sua redação:

Artigo 18.º - Requerimento de Inscrição (...)

2 – Sem prejuízo de outros elementos ou documentos que venham a ser considerados necessários nos termos legais, o requerimento de inscrição é instruído com os seguintes documentos:

a) Boletim de inscrição com a assinatura pessoal e profissional do requerente;

b) Certidão do processo completo da inscrição principal como Advogado na Ordem dos Advogados do Brasil;

c) Certidão emitida pela Ordem dos Advogados do Brasil comprovativa da inscrição em vigor, da situação contributiva, e bem assim do registo disciplinar do requerente;

d) Comprovativo da habilitação académica necessária oficialmente reconhecida, por faculdade de Direito de Portugal, ou diploma em Direito emitido por instituição de ensino oficialmente credenciada no Brasil, com menção da data de conclusão e respetiva média final, documento que será dispensado se constar do processo de inscrição mencionado na alínea b);

e) Certidão de narrativa do registo de nascimento;

f) Certificado do registo criminal emitido pela entidade competente do Estado brasileiro;

g) Certificado do registo criminal emitido pela entidade competente do Estado português;

h) Quatro fotografias iguais, a cores, tipo passe;

i) Cópia do título de autorização de residência emitido pela autoridade competente do Estado português, devendo ser exibido o respetivo original;

j) Cópia do Passaporte, devendo ser exibido o original; 

k) Cópia do Cartão de contribuinte, devendo ser exibido o original;

l) Impresso para emissão da cédula profissional de Advogado;

m) Autorização do requerente para o tratamento dos seus dados pessoais e profissionais;

n) Declaração, sob compromisso de honra, datada e assinada pelo requerente, de não estar em situação de incompatibilidade com o exercício da Advocacia, nos termos dos artigos 81.º e seguintes do EOA (Lei nº 145 de 2015);

o) Cópia da carteira ou do cartão de identidade de Advogado brasileiro, devendo ser exibido o original;

p) Cópia do contrato de trabalho, do documento comprovativo do título de provimento, ou de qualquer outro vínculo contratual, com indicação das funções e respetivo horário, quando o requerente declare exercer qualquer atividade e, em termos gerais, qualquer que seja o cargo, função ou atividade desempenhada;

q) Documento comprovativo dos requisitos necessários para que os Advogados portugueses se possam inscrever na Ordem dos Advogados do Brasil.

O nº 3 do mesmo artigo aponta que “os documentos emitidos no Brasil devem ser legalizados nos termos previstos na lei”.

Já o nº 4, por fim, diz o seguinte: “não é requisito da inscrição a residência habitual em Portugal se idêntico regime for aplicável aos Advogados portugueses que se queiram inscrever na Ordem dos Advogados do Brasil, porém, nesse caso, o Advogado brasileiro deve indicar e manter domicílio profissional em território nacional ou, juntar declaração, emitida por Advogado, com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados, autorizando a indicação do respetivo domicílio profissional como domicílio profissional do requerente e comprometendo-se a entregar todas as comunicações que lhe forem dirigidas.

Apresentando esta documentação, o advogado brasileiro terá o procedimento de inscrição previsto no art. 13º do Regulamento nº 913-C de 2015:

Artigo 13.º: Tramitação preparatória e inscrição

1. – O Conselho Regional, depois de ter verificado que o requerimento de inscrição está devidamente instruído e que nada obsta à inscrição, emite proposta relativamente à inscrição pelo Conselho Geral, remetendo a este todo o processo para proceder à inscrição do Advogado, procedendo ao seu registo provisório.

2. – O Conselho Geral, verificada a conformidade do processo de inscrição com o EOA e com o presente regulamento, procede à inscrição, seguindo-se o procedimento previsto no artigo 11.º, com as devidas adaptações.

Por fim, em linhas gerais, o advogado brasileiro, após devida inscrição nos quadros da Ordem dos Advogados Portugueses, gozará dos mesmos direitos que o advogado português, não sendo-lhe vedado, por exemplo, a possibilidade de se eleger bastonário (equivalente a presidente nacional da OAB), e presidente e membro dos Conselhos Superior, Regional e de Deontologia (letra do art. 11º do EAOP – Lei nº 145 de 2015).


CONCLUSÃO

Diante de todo o exposto, Brasil e Portugal, buscando cada vez mais a facilitação e convergência nas relações, editaram, em seus ordenamentos internos, regras para que advogados de um dos países possam trabalhar, com os mesmos direitos assegurados, no outro, desde que obedecidos certos parâmetros. As medidas, por parte das Ordens dos Advogados nacionais respectivas, caminha junto com o fenômeno da globalização, onde cada vez mais nos deparamos com um mundo transformado em uma “aldeia global”, de distâncias cada vez mais facilmente transpostas.


REFERÊNCIAS

BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de out. de 1988. Contém as emendas constitucionais posteriores. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 30 ago. 2017.

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______, Lei nº 8.906 de 4 de julho de 1994. Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8906.htm>. Acesso em: 30 ago. 2017.

______, Ministério da Educação. Resolução CNE/CES n° 9, de 29 de Setembro de 2004. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Direito e dá outras providências. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/rces09_04.pdf>. Acesso em 30 ago. 2017.

______, Ordem dos Advogados do Brasil. Provimento nº 91 de2000. Dispõe sobre o exercício da atividade de consultores e sociedades de consultores em direito estrangeiro no Brasil. Disponível em: <http://www.oab.org.br/ari/files/provimento91-2000.pdf>. Acesso em: 30 ago. 2017.

______, Ordem dos Advogados do Brasil. Provimento nº 129 de 2008. Regulamenta a inscrição de advogados de nacionalidade portuguesa na Ordem dos Advogados do Brasil. Disponível em: <http://www.oabsp.org.br/noticias/2009/03/17/Provimento%20129.2008.pdf>. Acesso em: 30 ago. 2017.

______, Ordem dos Advogados do Brasil. Provimento nº 144 de 2011. Dispõe sobre o Exame de Ordem. Disponível em: <http://www.oab.org.br/arquivos/pdf/Geral/Provimento_ 144_Exame_de_Ordem.pdf>. Acesso em: 30 ago. 2017.

______, Ordem dos Advogados do Brasil. Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB. Dispõe sobre o Regulamento Geral previsto na Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994. Disponível em: <http://www.oab.org.br/content/pdf/legislacaooab/regulamentogeral.pdf>. Acesso em: 30 ago. 2017.

MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internaciona Público. 5. ed. rev., atual., e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais , 2011.

PORTUGAL, Constituição da República Portuguesa: promulgada em 2 de abril de 1976. Disponível em: <http://www.parlamento.pt/parlamento/documents/crp1976.pdf>. Acesso em: 30 ago. 2017.

______, Lei nº 145 de 9 de setembro de 2015. Aprova o Estatuto da Ordem dos Advogados, em conformidade com a Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que estabelece o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das associações públicas profissionais, e revoga a Lei n.º 15/2005, de 26 de janeiro, e o Decreto-Lei n.º 229/2004, de 10 de dezembro. Disponível em: <http://www.oa.pt/Conteudos/Artigos/detalhe_artigo.aspx?idsc=128>. Acesso em 30 ago. 2017.

______, Ordem dos Advogados Portugueses. Regulamento nº 913-A/2015 (Série II), de 22 de dezembro. Regulamento Nacional de Estágio aprovado em Assembleia Geral da Ordem dos Advogados de 21 de dezembro de 2015. Disponível em: <https://www.oa.pt/upl/%7Bbf216838-846c-43f3-8f70-f2099ae946b3%7D.pdf>. Acesso em: 30 ago. 2017.

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Sobre o autor
Otávio Lopes Bertoldi

Graduado em Direito pela Universidade Federal de Pelotas (2016), com pós-graduação em Direito Público pela Universidade Anhanguera-Uniderp (Rede LFG) (2019-2020). Passagem por diversos órgãos da Administração Pública: estágios em entidades como IF-Sul, TJ-RS e AGU, bem como cargo efetivo na Prefeitura Municipal de Pelotas/RS. Atualmente, é advogado autônomo, atuando nas áreas de Direito Público e Civil. Redes de contato: . LinkedIn: https://www.linkedin.com/in/ot%C3%A1vio-lopes-bertoldi-77a036168/ . Jusbrasil: https://otaviolopesbertoldi.jusbrasil.com.br/

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BERTOLDI, Otávio Lopes. Notas acerca da reciprocidade entre Brasil e Portugal na advocacia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6199, 21 jun. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/83221. Acesso em: 5 nov. 2024.

Mais informações

Artigo originalmente publicado no "Caderno de Resumos do I Seminário de Direito Internacional - Relações Jurídicas Contemporâneas" (Seminário de Direito Internacional Relações Jurídicas Contemporâneas (1. : 2016 : Pelotas, RS); Cadernos de resumos/ organização de Ana Clara Correa Henning et. al.; Faculdade de Direito; Universidade Federal de Pelotas - São Leopoldo: Casa Leiria, 2016)

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