CONSIDERAÇÕES FINAIS
O contrato de time-sharing, também conhecido como de multipropriedade ou de tempo compartilhado, conquistou certa popularidade no Brasil, se apresentando como proposta vantajosa aos consumidores que buscam qualidade em suas viagens turísticas. Contudo, tais contratos, muitas das vezes, são revestidos de vícios que acabam por lesar o consumidor e têm gerado discussões judiciais, o que instigou a presente análise do instituto do time-sharing turístico a partir dos conceitos de práticas e cláusulas abusivas estabelecidos pelo Código de Defesa do Consumidor.
As relações contratuais entre os fornecedores turísticos e os turistas, incluindo as de time-sharing, costumeiramente são firmadas através de contratos de adesão, os quais são definidos pelo CDC, em seu art. 54, como aqueles “cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo”. (BRASIL, 1990). Ou seja, como assevera Bolzan (2014), em tais contratos, não é possível ao consumidor discutir ou modificar substancialmente as disposições contratuais, já que as cláusulas são elaboradas sem a sua participação; a única coisa que terá liberdade para fazer é aceitá-las ou não. Assim sendo, quando firmados contratos de adesão entre fornecedores e consumidores, é necessário uma transparência extrema com os últimos, posto que estarão ainda mais vulneráveis em uma relação na qual não puderam discutir as cláusulas contratuais.
Dentro de tal contexto se encontram os conceitos de cláusulas e práticas abusivas, as quais representam lesões ao direito dos consumidores e, portanto, são expressamente vedadas pelo CDC. Embora sejam conferidos legalmente aos consumidores uma série de direitos, como é o caso do direito à informação e ao arrependimento, diversas vezes o consumidor se depara com ofensas aos mesmos nos contratos de time-sharing turístico, de modo que se vê obrigado a buscar, em muitos dos casos, amparo judicial.
A partir da análise realizada, é possível depreender que o time-sharing turístico em si não é ilegal, abusivo ou lesivo ao consumidor, ao contrário; se utilizada boa-fé e obedecidos os direitos dos consumidores, mormente à informação verdadeira, completa e efetivamente compreendida, bem como ao arrependimento e a não serem submetidos a práticas agressivas, o contrato em questão se torna extremamente válido e capaz de oferecer vantagem àqueles que irão usufruir dos serviços. Entretanto, a ocorrência expressiva e constante de práticas e cláusulas abusivas na celebração dos contratos em comento por parte dos fornecedores têm tornado tais contratações ilegais e totalmente desvantajosas aos consumidores, de modo que seus direitos são diretamente desrespeitados, inclusive alguns dos mais relevantes.
Ademais, o marketing e as informações enganosas utilizados, em conjunto com as manobras agressivas de captação de clientela, diversas vezes fazem com que o consumidor realize o contrato sem ao menos saber ao certo o que está envolvido no mesmo, e sem exercer a sua real vontade de forma consciente. Deste modo, acabam sendo celebrados contratos que não o seriam se o cliente não tivesse sido submetido a tais abusos; e posteriormente, quando o consumidor se arrepende e decide rescindir o contrato, ainda é surpreendido com penalidades exageradas e extremamente onerosas. Resta evidente em tais casos o desequilíbrio contratual, o qual impede uma relação saudável entre fornecedor e consumidor e vantajosa para ambos, e traz vantagens desproporcionalmente maiores aos fornecedores do serviço.
Destarte, para que seja analisada a legalidade de um contrato de time-sharing turístico, é necessário que se verifique e pondere a situação do consumidor antes, durante e após a contratação, considerando tratar-se de parte hipossuficiente na relação consumerista. Deve-se observar a incidência ou não de práticas e cláusulas abusivas, capazes de viciar a vontade dos consumidores, e ainda se estão sendo preservados os direitos que lhes são garantidos pelas disposições legais protetivas do consumidor.
REFERÊNCIAS
BOLZAN, Fabrício. Direito do consumidor esquematizado. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078.htm>. Acesso em dez. 2019.
FONSECA, J. G. O contrato de trabalho no sistema time-sharing, ou multipropriedade. Revista Consultor Jurídico, 2018. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2018-abr-22/jose-fonseca-contrato-trabalho-sistema-time-sharing>. Acesso em dez. 2019.
NICODEMOS, E. C. As práticas abusivas contra o consumidor e os contratos de time-sharing turístico. Conteúdo Jurídico, Brasília (DF), 2013. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/36263/as-praticas-abusivas-contra-o-consumidor-e-os-contratos-de-time-sharing-turistico>. Acesso em dez. 2019.
GARBI JUNIOR, C. A. Contrato de time-sharing. São Paulo: Insper, 107 f. 2012.
PISTORI, S. J. M. D.; GLITZ, F. E. Z. As principais cláusulas abusivas encontradas nos contratos de time-sharing turístico. Revista Percurso, v.15, p. 202-225, 2015.
FIDALGO, M. Ações de indenização contra clubes de viagem – Contrato de time-sharing. Jusbrasil. Disponível em: <https://marcelofidalgoneves.jusbrasil.com.br/artigos/507401816/acoes-de-indenizacao-contra-clubes-de-viagem-contrato-de-time-sharing>. Acesso em: dez. 2019.