Capa da publicação PPP em presídios e delegação do poder de polícia
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Delegabilidade do poder de polícia nos casos de parceria público privada nos presídios brasileiros

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PRESÍDIOS PRIVADOS

No Brasil, existem dois modelos de penitenciárias com participação da iniciativa privada, a Cogestão e a Parceria Público Privada, e as suas diferenças estão basicamente na gestão, na segurança e nas obras dos presídios. Segundo Fontes (2019):

Outra diferença importante entre a PPP e os modelos de cogestão – que predominam nos demais presídios privados do país – é a obrigação de construir. Pelo contrato desenvolvido em Minas Gerais, é a GPA quem arca com a despesa da obra. O investimento é amortizado ao longo dos 30 anos de contrato, por meio da remuneração paga mensalmente pelo Estado, por preso.

No Brasil, existe uma penitenciária no modo de Parceria Público Privada em Ribeirão das Neves, no Estado de Minas Gerais 2013 que iniciou suas atividades no ano de 2013, denominado Complexo Penitenciário Público-Privado (CPPP), que segundo Fontes (2019), abrigava no ano de 2019, 2.164 detentos.

Administração do presídio público privado no Brasil

O custo mensal com os presos, por mês, é de R$ 1,9 mil, cada. Porém, o valor repassado pelo Estado é de R$ 3,8 mil, para a empresa custear as despesas dos presos. A diferença do valor que o estado paga para a administradora é referente, de acordo com o contrato, para o pagamento da estrutura que ao término da parceria, o Estado se torna proprietário. No caso dos presídios públicos de Minas Gerais, a fim de comparação, cada preso tem um custo médio de R$ 2,8 mil por mês, de acordo com dados da Secretaria de Administração Prisional (Seap) de Minas Gerais.

Existem algumas diferenças entre o sistema de presídio estritamente Público e o presídio com parceria Privada, por exemplo o sistema de abertura e fechamento das celas que nas penitenciárias públicas são abertas pelos agentes manualmente, diferente da forma como é feita no CPPP, totalmente otimizada com sistema eletrônico, ou seja, os agentes não têm contato com os internos. Somente dão comandos de uma sala de informação. Desta forma a chance de um detento fazer um agente refém é quase nula.

A forma como o Complexo Penitenciário seus internos tem algumas peculiaridades, como por exemplo as visitas que podem ocorrer quinzenalmente. A alimentação que entra no presídio através das visitas poderá ser consumida exclusivamente enquanto durar as visitas. Há dentro do complexo uma área denominada de “Vivências”, que abrigam a moradia dos presos juntamente com locais para atividades escolares, espaços laborais e cuidados da saúde.

Quanto às punições internas, existe uma comissão que fica a carga de avaliar as penalidades cometidas pelos internos Segundo Fontes (2019):

Se houver desrespeito a um dos funcionários, por exemplo, o detento fica em isolamento por até 10 dias, período em que não pode usufruir do banho de sol, ver televisão, fumar ou receber visitas. As faltas são julgadas por uma comissão disciplinar, que podem aplicar penas de até 30 dias de isolamento após o julgamento.

Quem fica responsável pelos internos no presídio, são denominados monitores que podem usar apenas algemas e cassetetes. Caso ocorra algum motim, o Poder Público disponibiliza uma equipe de agentes especiais com poder de polícia. O cerco do presídio e qualquer deslocação dos internos é de responsabilidade do Poder Público e não do Parceiro Privado.

A escolha de quais presos serão encaminhados para o CPPP é feita pelo Governo de Minas Gerais e só poderá ser transferido para o presídio quem já tiver a sua sentença, não podendo abrigar presos com prisões preventivas.

Mão de obra carcerária

A mão de obra carcerária consiste no aproveitamento dos detentos independente do regime de cumprimento de pena para a atividade laboral, que pode ser exercido tanto no interior quanto no exterior da penitenciária que o mesmo cumpre sua pena. Esse tipo de mão de obra, é algo com tendência a ser muito utilizado, considerando as vantagens econômicas e sociais geradas. Esse tipo de trabalho é restrito somente às empresas compromissadas com a sustentabilidade social, pois quanto à temática existe ainda muito preconceito e desinformação.

De acordo com o Art. 28. da Lei de Execução Penal “O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva...”

O trabalho faz com que o detento se sinta útil e produtivo, inegavelmente aumentando sua autoestima, propiciando a inclusão e a reintegração com a sociedade, por meio do mercado de trabalho, por meio de uma ocupação no seu dia-dia, responsabilidade. Descobrindo caminhos fora da criminalidade. Todavia, gera renda para o preso e sua família, e consequentemente promove o crescimento da economia local.

Existem dois tipos de trabalho para o interno, o trabalho interno e o trabalho externo.

O trabalho interno se dá através da supervisão entre a Secretaria de Segurança Pública e a Empresa para qual o interno irá prestar serviço.

O trabalho externo se dará fora do presídio, e está previsto na Lei de Execução Penal n° 7.210/84. O art. 36. define a admissibilidade do trabalho externo:

Art. 36. - O trabalho externo será admissível para os presos em regime fechado somente em serviço ou obras públicas realizadas por órgãos da administração direta ou indireta, ou entidades privadas, desde que tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina.

Contudo, a autorização dependerá de alguns requisitos como rege o art. 37:’

Art. 37. - A prestação de trabalho externo, a ser autorizada pela direção do estabelecimento, dependerá de aptidão, disciplina e responsabilidade, além do cumprimento mínimo de um sexto da pena. Parágrafo único - Revogar-se-á a autorização de trabalho externo ao preso que vier a praticar fato definido como crime, for punido por falta grave, ou tiver comportamento contrário aos requisitos estabelecidos neste artigo.

Deverá também ser levado em conta situações de mercado, vagas e aptidão do interno, conforme art. 32:

Art. 32. - Na atribuição do trabalho deverão ser levadas em conta a habilitação, a condição pessoal e as necessidades futuras do preso, bem como as oportunidades oferecidas pelo mercado.

No que tange a carga horária, os detentos não podem fazer horas extras, normalmente a jornada de trabalho não pode ser inferior a seis nem superior a oito horas por dia, com descanso em domingos e feriados.

Art. 33. - A jornada normal de trabalho não será inferior a seis nem superior a oito horas, com descanso nos domingos e feriados.

Parágrafo único. Poderá ser atribuído horário especial de trabalho aos presos designados para os serviços de conservação e manutenção do estabelecimento penal.

O detento que trabalha tem uma redução na pena, esse processo tem o nome de remição e a contagem é feita em formato de um dia de pena por três dias trabalhados.

Art. 126. - O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, pelo trabalho, parte do tempo de execução da pena.

§ 1º A contagem do tempo para o fim deste artigo será feita à razão de 1 (um) dia de pena por 3 (três) de trabalho.

§ 2º O preso impossibilitado de prosseguir no trabalho, por acidente, continuará a beneficiar-se com a remição.

§ 3º A remição será declarada pelo Juiz da execução, ouvido o Ministério Público.

A mão de obra carcerária, inegavelmente é um dos instrumentos mais importantes e eficazes para a reintegração e inclusão dos detentos na sociedade de uma forma geral, trazendo por outro lado, uma esperança de passar menos tempo privado de liberdade, assim trazendo uma renda extra para sua família, trazendo também uma perspectiva de vida diferente para o detento que trabalha, uma ocupação para corpo e mente, uma perspectiva melhor para sua vida longe da cadeia e longe dos crimes.

O grande problema nesse caso, está em como ajustar a necessidade de ressocialização do preso com o lucro do Parceiro Privado, pois para um parceiro que sempre visa lucro, quanto mais mão de obra melhor, porém não é essa a função da mão de obra carcerária.

Presídios privados no âmbito internacional

No Brasil, a discussão em parcerias público-privadas nos presídios é um tanto quanto recente, dos anos 2000 pra cá, o investimento nesse tipo de “empreendimento” foi ganhando força, até que em 2013 surge o primeiro projeto nesse sentido. Contudo, no âmbito internacional, as penitenciárias administradas pela iniciativa privada já existem há algum tempo, como por exemplo nos Estados Unidos, que serviu de “exemplo” para outros países darem a importância devida ao assunto.

Como no Brasil só existe um projeto concretizado neste sentido, existe muitas diferenças e distinções em relação aos presídios privados dos Estados Unidos, por exemplo. No país norte-americano existe um ordenamento jurídico completamente diferente, isso reflete nos limites de atuação da iniciativa privada nos contratos vigentes. Aqui no Brasil, existe atribuições como o poder de polícia, que não podem ser delegadas pelo estado a empresas privadas, que geram lucro, o que não é o caso nos Estados Unidos.

Os contratos são bem mais amplos, as empresas possuem bem mais liberdade de ação dentro daquele presídio, como por exemplo a forma de vigilância e custódia dos detentos, tem mais liberdade para projetar o complexo, é praticamente nula a atuação do Estado norte-americano, e muito mais poder para a iniciativa privada que ingressou no ramo numa época completamente diferente, quando a precariedade dominava, quando a economia e o Estado não estavam tão estabilizados, nas décadas de 70 e 80. Ajudou a elevar as condições das estruturas prisionais. De lá pra cá aconteceram aprimoramentos, melhoramentos, na forma de administração.

Contudo, apesar de anos de parceria, o poder executivo do país norte-americano realizou o anúncio de que tem a intenção de não usar mais as prisões privadas para alojar os detentos sob custódia do governo federal, porém o caminho continua aberto para as prisões estaduais. Acabando com uma era de décadas de parceria do governo federal para com a iniciativa privada de acordo com Correa (2016):

A decisão foi anunciada após a divulgação de um relatório do Office of Inspector General (divisão de fiscalização do Departamento de Justiça) que analisou como as prisões privadas são fiscalizadas, se cumprem determinados padrões de segurança e como se comparam em relação às instalações operadas pelo governo federal.

Ainda segundo Correa (2016):

O relatório concluiu que é preciso melhorar a fiscalização e revelou que as prisões privadas registram mais casos de agressões, contrabando e motins, além de oferecerem menos serviços de reabilitação, como programas educacionais e de treinamento profissional.

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Na Inglaterra também existe uma certa força das penitenciárias privadas, e a exemplo dos Estados Unidos, possui consideráveis diferenças. No país europeu já existe uma filosofia diferente na visão de privatização dos complexos prisionais. A prioridade máxima é reintegração do detento ainda mesmo privado de liberdade, como por exemplo o presídio HMP Lowdham Grange, situado em Notthingham no interior da Inglaterra. A penitenciária construída por meio de parceria público-privada e inaugurada no ano de 1998 tem como notável característica, explorar ao máximo a tecnologia como ferramenta para cumprir as metas que são estabelecidas juntamente com o Estado. As celas possuem aparelhos tecnológicos destinados a comunicação com o mundo aqui fora, como TVs, computadores e telefones para que detentos se comuniquem com suas respectivas famílias, e consequentemente aprimorar seus conhecimentos, conforme RS.Gov (2010):

O presídio tem capacidade para 628 presos e recebe hoje 690. Desses, 20 fazem curso superior e a quase totalidade participa de cursos profissionalizantes (marcenaria, pedreiro, encanamento, eletricista, informática, pintura e decoração, entre outros). Somente 2% são analfabetos. Para monitorar os detentos existem 404 funcionários. O diretor da instituição, Gareth Sands, destaca que o sucesso atingido passa pela relação dos funcionários com os presos e a preparação deles para a reinserção social, após a pena. Portanto, pode-se notar a gritante diferença das parcerias entre o governo e a iniciativa privada. Observa-se também a diferença cultural da vontade do detento em ser reintegrado na sociedade novamente, o Estado se preocupa com isso a partir do momento em que o detento entra sob sua custódia, e consequentemente os resultados são ótimos. Há uma preocupação em manter o detento ocupado durante o dia, fazendo com que o bom comportamento vire rotina e facilite a obtenção de uma profissão que será fundamental para reinserção na sociedade quando deixarem o sistema carcerário


CONCLUSÃO

Este trabalho possibilitou entender as diferenças entre os presídios públicos e presídios com parceria privada existentes no Brasil. Diante disso, foi possível identificar a necessidade de desestatização dos presídios, porém com regras que venha a impedir o parceiro privado a visar somente o lucro nessas parcerias.

Para chegar a essa conclusão, foram definidos alguns problemas existentes nos presídios públicos, como por exemplo a ineficácia da administração, superlotação, precariedade dos presídios e desrespeito aos direitos dos presos. Quanto aos presídios privados ou em parcerias público-privados, foram definidas as experiências internacionais e também nacionais, incluindo o Complexo Penitenciário Público-Privado, localizada em Ribeirão das Neves, no Estado de Minas Gerais.

Notou-se que a forma atual de administração dos presídios públicos não têm surtido efeitos positivos na manutenção dos presos, muito menos na sua ressocialização, por descaso do poder público, gerando na maioria das vezes um efeito cascata, em que o preso ao sair da prisão acaba retornando à sociedade pior do que quando entrou na prisão, perdendo assim o efeito educativo da reclusão do preso.

Como solução para esses problemas, surge a parceria público-privada, que na maioria das vezes efetua um melhor trabalho tecnicamente, porém com objetivação maior no lucro. Desta forma, o parceiro privado enxerga o preso somente como uma mão de obra barata, e nesse momento é que o Estado deve surgir como a mão firme para mediar esse conflito, ressocialização do preso x objetificação do lucro e mão de obra barata. Essa regulamentação deverá ser feita através de Lei.

Foi observado que apesar desse problema, a ressocialização do preso nos presídios com parceria público privada tende a ser maiores pelo fato da infraestrutura ser melhor.

Vale ressaltar que este artigo é uma fase teórica da análise da ressocialização dos presos nos presídios, necessitando de vários testes práticos para se chegar a um resultado concreto.

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