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Norma geral antielisiva e sua regulamentação

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22/10/2006 às 00:00
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3. REGULAMENTAÇÃO DA NORMA ANTIELISIVA

3.1. A Medida Provisória 66/02

A criação da norma antielisiva se deu, como já se disse anteriormente, ab initio pela inserção do parágrafo único no art. 116. do CTN pela Lei Complementar 104 de 2001. Desse dispositivo já se tratou exaustivamente acima.

Entretanto, a referida norma necessita da sua regulamentação, pois não se trata de norma auto-aplicável, delegando a observância de procedimentos a serem estabelecidos em lei, 24 que acabou tendo uma tentativa, no ano seguinte, através da Medida Provisória 66, que se tornou a Lei 10.637/2002 (não no tocante a regulamentação da norma antielisiva).

No entanto, no que se referia a regulamentação da norma Antielisão, o texto da Lei 10.637/02 foi silente, permanecendo o parágrafo único do art. 116. do CTN não regulamentado.

3.2. A desconsideração da personalidade jurídica na MO 66/02

Quando exsurgir a necessidade de desconsideração de ato ou negócio jurídico praticado pelo contribuinte, a teor do parágrafo único do art. 116. do CTN, a autoridade tributária deverá obedecer ao rito procedimental próprio. Vejamos aqui o modelo proposto pela MP 66/02, de natureza inquisitória e não processual.

Esse é o roteiro que deveria seguir a autoridade tributária para aplicar a desconsideração da personalidade jurídica no caso concreto, segundo James Marins 25:

a) início do procedimento de fiscalização (Mandado de Procedimento Fiscal – MPF, emitido por Coordenadores, Superintendente, Delegado ou Inspetor);

b) notificação prévia ao contribuinte (Auditor-Fiscal);

c) relatório de desconsideração (Auditor-Fiscal);

d) notificação ao contribuinte do relatório de desconsideração (Auditor-Fiscal) e oportunidade de manifestação para o sujeito passivo (contribuinte);

e) representação de desconsideração (Auditor-Fiscal);

f) despacho de desconsideração/requalificação (de competência do Coordenador, Superintendente, Delegado ou Inspetor que tenha emitido o MPF);

g) ato de lançamento (Auditor-Fiscal);

h) auto de infração (Auditor-Fiscal);

i) impugnação administrativa (contribuinte);

j) processo administrativo nos termos do Dec. 70.235/72 (Delegacias de Julgamento, Conselhos de Contribuintes, Câmara Superior de Recursos Fiscais).

Como particularidade se destaca que o rito acima tem a natureza jurídica de garantia formal da relação jurídico-tributária. Isso porque preserva a Fazenda Pública, ao evitar a prática de atos administrativos de gestão fiscal ilícitos, ao passo que ampara o contribuinte, ao assegurar o cumprimento de garantias mínimas de validade procedimental, como do próprio texto do procedimento se conclui.

Esse roteiro se norteia pelo conjunto de princípios aplicáveis ao procedimento segundo a classificação que adotamos em nosso Direito Processual Tributário Brasileiro. Assim é que devem ser observados os princípios gerais do procedimento e do processo, que são legalidade objetiva, vinculação, oficialidade, verdade material, dever de investigação e dever de colaboração e os princípios específicos do procedimento, que são inquisitoriedade, cientificação, formalismo moderado, fundamentação, acessabilidade, celeridade e gratuidade.

3.3. Os critérios e o procedimento de desconsideração da personalidade jurídica

O pressuposto inicial é a emissão de Mandado de Procedimento Fiscal (MPF) na forma como regulamentado pelo Decreto nº 3.724, de 10 de janeiro de 2001. Assim tem início o processo de desconsideração da personalidade jurídica, mandado esse emanado de ação fiscalizadora instaurada anteriormente.

A emissão da MPF é da competência do Coordenador-Geral, Superintendente, Delegado ou Inspetor, que integre a estrutura de cargos e funções da Secretaria da Receita Federal. Nesse mandado consta, sob pena de nulidade formal (entre outros dados): a indicação do tributo ou da contribuição alvo do procedimento fiscalizatório, o correspondente período de apuração, e o prazo para realização da fiscalização.

Calha ressaltar que concorde o princípio da cientificação, antes da prática de qualquer providência, devem obrigatoriamente os Auditores-Fiscais competentes notificar o contribuinte através de termo de início de fiscalização 26.

Após, segue-se a representação de desconsideração, embasada nas provas colhidas pelo fiscalizador. Esta representação, contudo somente poderá ser encaminhada à autoridade competente para apreciá-la após a notificação prévia do contribuinte (princípio da cientificação) que terá o prazo de 30 (trinta) dias para os esclarecimentos e a juntada de provas que julgar necessários (arts. 16, § 1º da MP nº 66/02).

Portanto, já se vê que deverão ser produzidos pelo Auditor-Fiscal competente, em momentos distintos, dois relatórios: o relatório inicial e o relatório de representação.

Formado o relatório de representação, cumpre ao Auditor-Fiscal promover a nova notificação ao contribuinte. Visa oportunizar defesa ao contribuinte e deverá obrigatoriamente possibilitar ao contribuinte o conhecimento integral do relatório de representação no qual conste todos os elementos indicativos que permitam ao sujeito passivo apreender com exatidão quais são as motivações objetivas e subjetivas que ensejam a pretensão desconsideratória (art. 16, § 1º, segunda parte, da MP nº 66/02). O princípio da cientificação no campo fiscalizatório oportuniza ao contribuinte que se manifeste quando julgue necessário ou quando instado a colaborar com a Administração Tributária.

Nesse sentido, a par do contraditório, ao notificar o contribuinte de que a Fazenda Pública pretende desconsiderar seus atos ou negócios jurídicos por entender que poderiam ter sido realizados de forma menos complexa ou menos onerosa ou ainda que tivesse sido praticado um negócio jurídico indireto, isto é, ao estabelecer a "suposição" de que foram praticados com finalidade elisiva, se está presumido uma realidade subjetiva ("intenção" do contribuinte) e provocando o sujeito passivo para que prove o contrário.

Segue-se a representação de desconsideração propriamente dita e somente será encaminhado à autoridade que emitiu o MPF se o Auditor-Fiscal responsável permanecer convencido da necessidade e viabilidade técnica da desconsideração, ainda que tenha o sujeito passivo usado da faculdade de se manifestar quanto a isso. Nesse caso tais argumentos serão incorporados ao relatório, que servirão de base aos fundamentos de sua representação de desconsideração.

Concorde a lei, a representação deverá conter relatório (relatório de representação) circunstanciado do ato ou negócio praticado e a descrição dos atos ou negócios equivalentes ao praticado (princípio da fundamentação do to administrativo) e deverá ser instruída com os elementos de prova colhidos pelo servidor, no curso do procedimento de fiscalização, até a data da formalização da representação e os esclarecimentos e provas apresentados pelo sujeito passivo (art. 15, § 3º, incs. I e II).

A nulidade da representação surge quando a mesma é apresentada não fundamentada ou fundamentada em elementos que não foram submetidos à apreciação do contribuinte quando da notificação prévia. Não é lícito à autoridade tributária acrescentar elementos novos após a oitiva do sujeito passivo. Se após a notificação prévia ao contribuinte surgirem novos elementos relevantes, deverá o contribuinte ser cientificado novamente de modo que lhe seja oportunizado manifestar-se nos termos dos §§ 1º e 2º do art. 16. da MP nº 66/02.

Segue-se assim o despacho de desconsideração, que será dirigido à mesma autoridade administrativa responsável pela ordem de instauração do procedimento de fiscalização. Isto é, ao Coordenador-Geral, Superintendente, Delegado ou Inspetor, conforme o caso competirá receber e apreciar a representação e exarar o ato ou despacho de desconsideração. Cumpre esclarecer que a MP nº 66/02 utiliza-se das duas locuções com o mesmo sentido, "ato" de desconsideração no caput do art. 16. e "despacho" de desconsideração no caput e § 2º do art. 17. e no § 2º do art. 18.

Pelo teor do art. 17. da medida provisória sub examen, esse despacho, além de sua fundamentação, deve conter necessariamente: I – a descrição dos atos ou negócios jurídicos praticados; II – a discriminação dos elementos ou fatos caracterizadores de que os atos ou negócios jurídicos foram praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária; III – a descrição dos atos ou negócios equivalentes aos praticados, com as respectivas normas de incidência dos tributos (requalificação); IV – o resultado tributário produzido pela adoção dos atos ou negócios equivalentes referidos no inciso III, com especificação, por tributo ou base de cálculo, da alíquota incidente e dos encargos moratórios.

A autoridade a quem dirigido o despacho tem a responsabilidade de fundamentar a sua decisão. Assim, cumpre à autoridade que exara o ato de desconsideração justificar porque razões os esclarecimentos e as provas apresentados pelos contribuintes não foram suficientes para infirmar a presunção que se estabeleceu acerca da pratica de atos "dissimulatórios".

Isso porque se os esclarecimentos e provas trazidos aos autos de procedimento pelo contribuinte não forem ao menos apreciados, padecerá de nulidade o despacho de desconsideração por falta de fundamentação.

Com efeito, o sujeito passivo não pode ver seus atos jurídicos lícitos serem desconsiderados com base em "presunção de falta de propósito negocial" ou "presunção de abuso de forma" sem ao menos saber formalmente a razão pela qual suas justificativas e provas não forem suficientes, condição que prejudica seu posterior direito de defesa. De nada serve a lei prever explicitamente a oportunidade de apresentação de esclarecimento e provas que possam desfazer a presunção legal se a autoridade administrativa não tiver a obrigação de apreciá-las.

Tem-se assim, em seguida, o ato de lançamento existente no regime jurídico da MP nº 66/02, que os elenca em dois tipos. O primeiro ato de lançamento está previsto no § 2º do art. 17. ao disposto que o sujeito passivo terá o prazo de trinta dias a partir da data que for cientificado do despacho de desconsideração para efetuar o pagamento dos tributos acrescidos de juros e multas de mora.

O segundo ato de lançamento estava previsto no art. 18, ao prescrever que a falta de pagamento "dos tributos e dos encargos" previstos no § 2º do art. 17. "ensejará o lançamento do respectivo crédito tributário, mediante a lavratura de auto de infração, com aplicação de multa de ofício".

Veja-se que esses dispositivos não cuidavam de modalidade de lançamento por declaração (art. 147. do CTN), pois o ato administrativo não tem matriz em qualquer espécie de declaração do contribuinte; tampouco pode-se falar em lançamento por homologação ou auto-lançamento (art. 150. do CTN), pois não se dá in casu qualquer hipótese de antecipação de pagamento.

Tal nos remete obrigatoriamente ao lançamento de ofício (art. 149. do CTN). Nesse caso, a hipótese da desconsideração de atos ou negócios jurídicos como fundamento para a realização do ato de lançamento somente se pode escorar em um dos nove incisos do art. 149. do CTN.

Sempre tem-se presente que o parágrafo único do art. 13. da MP nº 66/02 expressamente afasta do regime jurídico da desconsideração as hipóteses de dolo, fraude ou simulação, estas sim condutas que se afiguram como atos ilícitos. Se não houver ato ilícito, o lançamento de ofício que decorre do despacho de desconsideração é o previsto no inc. I do art. 149. do CTN e carece de título jurídico para incluir juros ou multa de mora e, portanto, se afiguraria inaplicável a Segunda parte do § 2º do art. 17. da MP nº 66/02. Isso se dá porque o lançamento de ofício nesse caso é de caráter constitutivo e não meramente declaratório.

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Constitui modificando a realidade para tomar como existente um fato imponível que não foi e jamais será praticado pelo contribuinte porque esse adotou formas elisivas e lícitas (elisão eficaz) que produziram o efeito de evitar (e não de dissimular) a ocorrência do fato imponível ou de algum dos elementos constitutivos da obrigação tributária.

Assim é que se percebe que no primeiro momento a fazenda usa de presunção (da falta de propósito negocial ou do abuso de forma decorre a presunção iuris tantum de que o ato ou negócio jurídico foi praticado para fins de elisão fiscal) e em um segundo momento de utiliza de uma ficção legal (ao dar como praticado um fato gerador jamais produzido pelo sujeito passivo). Dessa ficção legal – que decorre logicamente do despacho de desconsideração – é que nasce, estritamente para fins fiscais, a obrigação tributária.

Em seguida, então, tem-se o Auto de infração propriamente dito. Interpretando-se o regime da MP nº 66/02, isso nos conduz à ilação de que no ato de lançamento de ofício previsto no § 2º do art. 117. não é lícito conter a imposição de juros ou multa de mora (consideradas as ressalvas feitas acima sobre a eventual ilicitude do ato), pois a obrigação tributária irrompe exclusivamente do despacho de desconsideração que enseja a adoção da ficção legal concernente na existência da prática de fato imponível jamais praticado realmente pelo contribuinte, pois a ficção legal se apresenta como técnica legislativa que permite considerar verdadeira uma situação sabidamente falsa, não se pode tornar real aquilo que não é, embora conduza ao mesmo resultado.

Equivale dizer, tudo isso, que embora o fato imponível ou de algum dos elementos da obrigação tributária jamais tenha sido praticado (ou se configurado na forma como descrito pelo despacho de desconsideração), produz-se equivalente efeito tributário por força exclusivamente da incidência da regra ficcional.

Veja-se que ao partir da Fazenda Pública do pressuposto de que realmente ocorreu a prática de atos ou negócios jurídicos de efeitos elisivos isso significa que a obrigação tributária não chegou a nascer (pois se tivesse nascido não teria havido ato ou negócio elisivo eficaz) e portanto, mesmo se desconsiderados esses atos ou negócios o fato imponível permanecerá sem ter sido materialmente praticado pelo contribuinte.

Portanto, do ato administrativo desconstitutivo (despacho de desconsideração) não nasce a obrigação tributária, mas sim da aplicação de ficção legal requalificadora que considera como havido o fato inexistente (e constitui relação tributária materialmente falsa, mas que se pretende seja acolhida como verdadeira para fins estritamente fiscais). Segundo James Marins 27:

Traduzir isso com singeleza é dizer-se que a Fazenda Pública serve-se da ficção legal que considera ter-se realizado o fato jurídico tributário enquanto na verdade foi realizado o ato elisivo, não torna inexistente o fato inexistente mas alcança o mesmo resultado tributário.

3.4. As limitações do poder discricionário da administração

Em que pese a natureza inquisitória do procedimento de investigação tributária, o contraditório e os princípios administrativos e constitucionais mais comezinhos garantem ao contribuinte certa segurança de que não se tornará vítima de abusos e exageros por parte do Fisco.

Nesse sentido, manifesta sua preocupação Machado, que enfaticamente adverte:

Qualquer que seja a posição que se adote, tem-se de admitir que uma norma geral antielisão nada mais é do que um reforço aos poderes da Administração Pública. Se colocada em texto de lei complementar pode ter sua constitucionalidade contestada, pois colide com o princípio da legalidade que tem com um de seus desdobramentos essenciais a tipicidade, vale dizer, a exigência de definição, em lei, da situação específica cuja concretização faz nascer o dever de pagar tributo. 28

Claro está que a norma antielisiva acabou por relativizar essa presunção, mas tenha-se em mente que mesmo no procedimento de desconsideração da personalidade jurídica há a amplitude da defesa do contribuinte, como acima se viu. Ou seja, ainda com a inovação lega aqui tratada, há importantes limitações à discricionaridade do poder administrativo.

Com efeito, entre as principais garantias de higidez da relação jurídico-tributária estão a legalidade, irretroatividade e a anterioridade. São as conhecidas garantias dos contribuintes. Estes princípios expressam, simultaneamente, as condições mínimas de aceitabilidade jurídica da relação jurídica e os standards mínimos de sua aceitabilidade social. Tributo cuja instituição seja presidida pela legalidade estrita (tipicidade), irretroatividade, pela anterioridade, pela isonomia e pela capacidade contributiva é tributo eficaz; sua hígida instituição protege não apenas o contribuinte, mas a Fazenda Pública protege a manutenção do erário e, portanto, fortalece o próprio supedâneo econômico do Estado de Direito.

A distorção negativa dessa presunção ensejará a lide de pretensão insatisfeita ou a lide de pretensão resistida. Na pior hipótese, a sonegação. Por sua vez a tributação sadia, limpa, transparente, isenta de impurezas – jurídica – é fator que interessa não apenas aos contribuintes, mas à Fazenda, à sociedade, ao Estado Constitucional e Democrático de Direito.

Corolário disso é que essas garantias – do Estado e do contribuinte – se inserem no campo das limitações constitucionais ao poder de tributar, consoante expressão consagrada por Aliomar Baleeiro, e grafadas constitucionalmente no art. 150, incisos I e III, letras "a" e "b". Evitam que aqueles que temporariamente exerçam o "poder de tributar" dele excedam e comprometam permanentemente o equilíbrio do contrato social tornado corpóreo através da Constituição escrita e gravem com risco o Estado de Direito.

Nesse aspecto, se a cláusula antielisão contém regra material consistente na descrição de um fato (praticar atos ou negócios jurídicos com a finalidade de dissimular...) ao qual atribui a conseqüência fiscal que impõe a constituição de uma dívida tributária; se, portanto cria uma classe aberta de fatos geradores supletivos, suplementares, sucedâneos ou sub-rogatórios, então reclama a observância dos princípios constitucionais da legalidade, irretroatividade, anterioridade, isonomia e capacidade contributiva.

Com respeito ao princípio da legalidade, a sua observância deve partir de uma análise que contemple as variadas facetas do mesmo fenômeno. Deve o intérprete indagar, em primeiro lugar, qual o veículo normativo é formalmente competente para introduzir o preceito antielisivo no sistema tributário, em seguida deve-se saber qual é ou quais são as pessoas políticas habilitadas constitucionalmente a fazê-lo. Depois, deve-se perquirir se o conteúdo material dessa lei se concilia como regime constitucional tributário e ao final indaga-se quanto a eficácia da tributária no tempo tanto sob o ponto de vista externo, das limitações constitucionais, como sob o ponto de vista de suas próprias prescrições temporais (vacatio legis, regulamentação etc.).

Veja-se ademais que a lei complementar, embora tenha a função de fixar normas gerais não tem competência constitucional para instituir tributos (exceto nos casos previstos constitucionalmente e que não se aplicam à hipótese em exame). A competência instituidora é privativa das pessoas políticas dotadas de competência tributária (União, Estados, Municípios e Distrito Federal).

Como a Lei Complementar nº 104/2001 supostamente extraiu do sistema tributário da Constituição Federal de 1998 uma nova hipótese supletiva de incidência tributária, essa nova hipótese demanda não apenas sua regulamentação, mas sua instituição através dos veículos normativos locais que devem obediência à "norma geral" do parágrafo único do art. 116. do CTN.

Assim é que, por exemplo, a instituição pela União do Imposto sobre Renda deve obedecer às cláusulas gerais dos arts. 43. e seguintes do CTN; que a instituição do ICMS, de competência dos Estados, deve atender às prescrições da Lei Complementar 87/96 e o Imposto sobre Serviços, de esfera municipal, deve ser instituído localmente com obediência às disposições do Decreto-Lei 406/68. A lei complementar adquire no mínimo o valioso status de norma geral de segurança que se interpõe entre a Constituição e a instituição de hipóteses normativas tributárias em todas as esferas fazendárias.

Portanto é possível concluir que a natureza da Lei Complementar 104/2001 é de norma geral em matéria de legislação tributária (art. 146. da CF) enquanto que a MP nº 66/02 continha dupla faceta, pois operava tanto como norma jurídico-tributária em sentido estrito (norma instituidora de hipótese normativa material com fulcro do CTN), como também surgia na condição de norma jurídico-tributária em sentido amplo (de caráter formal), que regulamenta a atribuição de competência funcional da autoridade administrativa (procedimento para promoção da desconsideração de atos ou negócios, que é antecedente lógico do proceder fazendário destinado à tributação das condutas elisivas).

Impende também que se examine se além da lei ordinária podem as medidas provisórias operar validamente como veículos introdutores de normas disciplinadoras do parágrafo único do art. 116. do CTN, pois ainda que gozem de "força de lei" as MPs têm hoje competência material e formal limitadora por força da Emenda Constitucional nº 32 de setembro de 2001.

Nesse sentido, a par do §1º do art. 62. da Constituição Federal de 1988, veja-se que a regra contida no §2º admite a utilização de medidas provisórias que impliquem a instituição e a majoração de tributos desde que respeitado o princípio da anterioridade e desde que seja convertida em lei até o último dia do exercício financeiro em que foi editada. Portanto, ainda que admitida constitucionalmente a utilização da medida provisória como veículo normativo adequado para a matéria contida nos arts. 13. a 19 da MP nº 66/02, deveria ser enfrentada a limitação eficacial referente ao princípio da anterioridade e também as questões que podem ser suscitadas com relação a irretroatividade.

Não obstante, o parágrafo único do art. 116. do CTN, na condição de norma geral com conteúdo material e não aquinhoada com função instituidora da nova hipótese normativa supletória, prerrogativa essa das leis ordinárias da União, Estados, Municípios e Distrito Federal, não produz qualquer efeito jurídico até o advento da norma instituidora/regulamentadora, no caso a MP 66/02 tentou fazer as vezes de regulamentação, acabando engavetada no que tangia à norma antielisiva.

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Sobre o autor
Maicon Guedes Hugo

advogado em Curitiba (PR), especialista em Direito do Estado (UFGRS), mestrando em Direito do Estado (UFPR), professor de Direito da PUC/PR e Faculdade Santa Cruz

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HUGO, Maicon Guedes. Norma geral antielisiva e sua regulamentação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1208, 22 out. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9071. Acesso em: 23 nov. 2024.

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