6. Dos embargos à execução contra a Fazenda Pública
O art. 5º modifica a denominação e, por conseguinte, a eficácia, do capítulo II, do título III, do livro II, do CPC, passando a constar "Dos Embargos à Execução contra a Fazenda Pública" e não mais "Dos Embargos à Execução fundada em sentença".
Em razão da mudança substancial, introduzida pela Lei 11.232/2005, na execução - que, como analisado, passa a ser fase do processo cognitivo, não mais processo autônomo - o capítulo atinente aos embargos à execução deveria, em princípio, ser inaplicável a qualquer caso de cumprimento de sentença, entretanto, assim não ocorreu. Nas execuções contra a Fazenda Pública, o capítulo atinente aos embargos à execução permanece inalterado. A Fazenda Pública, mediante a nova Lei, passa a ser a única "parte processual" que, no Direito Processual Civil Brasileiro, fará jus à defesa por meio de embargos de devedor nas execuções de sentença, pois, todas as demais, deverão se utilizar, para tanto, do confuso procedimento de impugnação, ora analisado.
As alterações previstas no art. 5º se destinam à mera adequação dos dispositivos pertinentes aos embargos, ao processo de execução contra a Fazenda Pública, que, como se sabe, tem normas próprias e distintas do processo comum, ao qual se adequavam os artigos 741 e seguintes do CPC. Vale dizer que, o fato de não haver penhora contra a Fazenda Pública não justifica o benefício a ela concedido, nos termos da Lei 11.232/2005, de continuar usufruindo, com exclusividade, dos embargos de devedor. A paridade de armas no processo é uma garantia fundamental e não pode ser relativizada em prol de privilégios injustificáveis.
7. Da ação monitória
O art. 6º - que trata da ação monitória - permanece inalterado em seu conteúdo, correspondendo, a mudança nele introduzida, à simples adequação formal. De acordo com a nova Lei, a execução, em casos de ação monitória, se dará exatamente como ocorrerá com as execuções de sentenças proferidas em processo cognitivo, ou seja, como fase continuativa do mesmo - não como processo autônomo – e com todas as modificações e peculiaridades advindas com a lei.
8. Dos embargos à arrematação e à adjudicação
Os demais artigos da Lei 11.232/2005 não exigem considerações, sendo clara a sua interpretação.
Merece reflexão e estudo mais aprofundado uma lacuna da Lei 11.232/2005, quanto à possibilidade, ou não, de, doravante, as partes oporem embargos à arrematação e embargos à adjudicação nas execuções de sentenças. Sabe-se que o PL 4.497/2004 - que está na iminência de ser aprovado – mantém vigente o Livro II do CPC apenas para as execuções de título extrajudicial. No entanto, quanto às execuções de título judicial, perdura a dúvida – que esta Lei não esclarece – quanto à permanência, no sistema processual, dos embargos à arrematação e à adjudicação.
Parece-me que, analogicamente, deve-se permitir a utilização dos embargos à arrematação e à adjudicação também nas execuções de título judicial, uma vez que são instrumentos que asseguram mais garantias ao devedor do que o procedimento de impugnação, ora inserido pela Lei 11.232/2005. Na verdade, o procedimento de impugnação previsto por esta Lei não guarda qualquer semelhança e qualquer possibilidade de ser estendido às hipóteses abarcadas pelos embargos à arrematação e adjudicação até então cabíveis.
Entretanto, acredito que tal questão trará inúmeras divergências dentre os operadores do Direito, pois, certamente, haverá aqueles que sustentarão que os embargos à arrematação e à adjudicação foram extintos do processo de execução de sentença - cabendo a sua utilização, apenas, nas execuções de título extrajudicial - porque a Lei poderia tê-los estendido às execuções de sentença e assim não fez, o que demonstraria não ser a intenção do legislador mantê-los vigentes no atual sistema processual.
9. Dos honorários advocatícios
Por derradeiro, oportuno refletir sobre a questão dos honorários advocatícios, segundo a nova concepção da execução de sentença, embora a Lei nº 11.232/2005 silencie sobre este tema.
Inobstante o Código de Processo Civil não previsse - como não prevê - de forma direta, a incidência de honorários a serem fixados especificamente nas execuções de títulos judiciais - além dos já arbitrados no processo de conhecimento - firmou-se entendimento nesse sentido, no Colendo Superior Tribunal de Justiça e nos Tribunais de Estado. Ou seja, comumente, nas execuções por título judicial, são arbitrados honorários advocatícios, além daqueles pertinentes ao processo de conhecimento. [03]
O fundamento de tal exegese se consubstancia no fato de que a execução – ao menos até a entrada em vigor da Lei nº 11.232/2005 – se caracteriza como um novo processo, distinto e autônomo do processo de conhecimento, acarretando a fixação de honorários específicos.
Mediante a nova dinâmica da execução judicial - introduzida pela Lei no 11.232/2005 - estapassa a se evidenciar como fase contínua e complementar do processo de conhecimento. Em sendo assim, em princípio, poderia parecer que a Lei nº 11.232/2005 teria extinguido a possibilidade de incidência dos honorários advocatícios específicos da execução de títulos judiciais, tendo em vista que não mais se poderia admitir o arbitramento de honorários em duas fases do processo (conhecimento e execução), eis que doravante só há uma fase, a de conhecimento.
Ocorre que, a redação do §4º do art. 20 do CPC – não revogado pela Lei 11.232/2005 – é clara no sentido de prever que, nas execuções, embargadas ou não, serão fixados honorários, consoante apreciação eqüitativa do juiz.
Ademais, a Lei 11.232/2005 permanece denominando de EXECUÇÃO, a fase de cumprimento da sentença, que, aliás, não perdeu as suas características essenciais.
Destarte, mesmo com a vigência da Lei 11.232/2005, a meu ver, os honorários advocatícios deverão permanecer sendo fixados em dois momentos distintos do processo, tanto no ato da prolação da sentença, quanto no momento em que se iniciar a execução, uma vez que, se fosse intenção do legislador extinguir os honorários da execução, ele teria emprestado nova redação ao §4º do art. 20 do CPC, o que não ocorreu.
10. Considerações finais
De fato, a execução, como asseverado na exposição de motivos do PL 3.253/2004, do qual se originou a Lei sob estudo, é o "calcanhar de Aquiles" do processo civil, mas não se pode olvidar que existem garantias fundamentais de um processo justo [04], que não devem ser relativizadas em prol da celeridade, que, aliás, não se tem certeza, sequer, de que se efetivará.
O que se espera é que a nova lei, com tão pouco tempo de vigência, seja instrumento eficaz no alcance da justiça e que seja interpretada de forma a não ferir garantias processuais já conquistadas.
Notas
01 Nesse diapasão, foi promulgada, em 07/02/2006, a Lei nº 11.276/2006, que modifica a redação do art. 518 do CPC, a fim de criar um novo requisito de admissibilidade recursal, com o fito, justamente, de evitar recursos procrastinatórios, como se justifica na exposição de motivos do projeto de lei, ao se asseverar "(...) Trata-se, portanto, de uma adequação salutar [a modificação do art. 518 do CPC] que contribuirá para a redução do número excessivo de impugnações sem possibilidades de êxito.". Vale transcrever a nova redação do art. 518, in verbis: "Art. 518 (...) § 1º. O juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal.".
02 "Ninguém pode ser atingido por uma decisão judicial na sua esfera de interesses sem ter tido ampla possibilidade de influir eficazmente na sua formação". Nisso se resume o princípio do contraditório, nas palavras do Professor Leonardo Greco, às quais me reporto para fundamentar o entendimento ora colocado. (GRECO, Leonardo. Garantias Fundamentais do Processo: O Processo Justo. Disponível na Internet: acesso em 30/11/2005. Artigo publicado no Mundo Jurídico (www.mundojuridico.adv.br) em 18.03.2002).
03 Ver acórdãos do STJ (RESP 262327/RS, RESP 200407/SP, RESP 133105-RS, RESP 141511-RS)
04 GRECO, Leonardo. Garantias Fundamentais do Processo: O Processo Justo. Disponível na Internet: acesso em 30/11/2005. Artigo publicado no Mundo Jurídico (www.mundojuridico.adv.br) em 18.03.2002.