7. A impossibilidade de a jurisdição constitucional ignorar a realidade
As intensas transformações vivenciadas pela metódica constitucional exige sejam revisitados aspectos nucleares de atuação da jurisdição constitucional, que, no processo de concretização da norma, passará a apreciar a realidade de forma mais intensa, não raro com a necessidade de dilação probatória.
No direito norte-americano, tornou-se célebre o memorial utilizado pelo advogado Louis D. Brandeis (Brandeis-Brief) no Caso Muller vs. State of Oregon, [58] que dedicava duas páginas às questões jurídicas e cento e dez aos efeitos deletérios que a longa duração da jornada de trabalho causava à mulher. Com isto, contribuiu para que o Supremo Tribunal reconhecesse que o papel social e biológico dessa camada da população poderia ser comprometido pelo trabalho excessivo. [59] Memoriais como esse, anota Tribe, "ajudaram a salvar inúmeros estatutos da invalidação", contribuindo para que o Supremo Tribunal visualizasse a "real e substancial" relação entre a lei e os seus objetivos. [60]
No direito alemão, o Bundesverfassungsgericht tem analisado as prognoses legislativas e a possibilidade de ocorrerem os fatos em que se baseiam: no Caso Apotheken, o Tribunal verificou a constitucionalidade de lei do Estado da Baviera que exigia uma especial autorização da autoridade competente para a instalação de novas farmácias. [61] Ao reconhecer a incompatibilidade dessa medida com a liberdade de exercício profissional garantida na Grundgesetz, baseou-se nos seguintes argumentos: a) laudos periciais demonstravam que a liberdade de instalação de farmácias em outros países do mesmo nível civilizatório da Alemanha não trazia qualquer ameaça à saúde pública; b) em razão do elevado custo de instalação, essa liberdade não conduziria, necessariamente, a uma exagerada multiplicação desses estabelecimentos; c) o possível risco de os farmacêuticos não cumprirem os seus deveres legais em razão da diminuição de sua capacidade financeira, conseqüência do aumento de competitividade, era infundado, já que, além de as opções pessoais equivocadas não poderiam justificar medidas legislativas dessa natureza, a superação do modelo de farmácia de fabricação pelo de entrega aumentava o tempo livre do farmacêutico; d) opiniões de peritos indicavam que a maior procura de medicamentos decorreria de circunstancialismos associados ao pós-guerra (v.g.: desnutrição e patologias de ordem psicológica). [62]
No direito brasileiro, o Supremo Tribunal Federal, em não poucas ocasiões, tem moldado a norma constitucional à luz da realidade, chegando mesmo a realizar uma interpretação ab-rogante nas hipóteses em que a disposição normativa mostrou-se totalmente dissonante dos fins a que se destinava.
O Tribunal, por sua Primeira Turma, em julgamento emblemático, proferiu decisão que, no caso concreto, afastou a incidência de regra constitucional que se mostrava absolutamente incompatível com a situação de anormalidade institucional presente no momento de sua aplicação: trata-se do Habeas Corpus nº 89.417-7, julgado em 22 de Agosto de 2006, sendo relatora a Ministra Cármen Lúcia. [63]
O habeas corpus foi impetrado por parlamentar do Estado de Rondônia, cuja prisão "em flagrante" fora decretada pela Ministra relatora do Inquérito nº 529, do Superior Tribunal de Justiça, sob a acusação de ser ele o chefe de uma organização criminosa instalada na Assembléia Legislativa de Rondônia, organização esta que se ramificara pelas principais estruturas de poder do Estado, cooptando, inclusive, membros do Tribunal de Justiça e do Tribunal de Contas, o que terminou por atrair o caso para a esfera federal. Sustentava-se a incompetência do Superior Tribunal de Justiça e, em especial, a violação aos parágrafos segundo e terceiro do art. 53 c.c. o parágrafo primeiro do art. 27, ambos da Constituição da República. De acordo com esses preceitos, o Deputado Estadual, desde a expedição do diploma, (1) somente poderia ser preso em caso de flagrante de crime inafiançável, (2) nesse caso, os autos deveriam ser remetidos, dentro de vinte e quatro horas, à Assembléia Legislativa, para que resolvesse sobre a prisão e (3) iniciado o processo criminal, por crime praticado após a diplomação, deveria o órgão jurisdicional dar ciência à Assembléia Legislativa, que poderia sustar a tramitação da ação enquanto durasse o mandato. Alegava-se, ainda, a incongruência de um mandado de prisão "em flagrante", figura inexistente no direito brasileiro, bem como que a alegada flagrância referia-se ao crime de quadrilha, cuja pena mínima era de 1 (um) ano de prisão, não se tratando, portanto, de crime inafiançável. Quanto aos demais crimes imputados ao impetrante, como não havia flagrante, não poderiam legitimar a sua prisão.
A Ministra relatora iniciou o seu voto realizando uma ampla exposição das circunstâncias fáticas subjacentes ao caso, conferindo especial ênfase ao preocupante quadro de anormalidade institucional que se instalara no Estado de Rondônia: a) todos os Deputados Estaduais estavam sendo investigados pela sua participação no crime organizado; b) a organização havia cooptado membros das principais estruturas de poder do Estado, inclusive o Presidente do Tribunal de Justiça e membros do Tribunal de Contas; e c) além de desviar recursos públicos, os membros da organização condicionavam a produção normativa à obtenção de benesses.
A alegada incompetência do Superior Tribunal de Justiça foi, de pronto, afastada, isto porque alguns membros da organização criminosa deveriam ser julgados perante esse órgão, o que exercia uma vis atractiva em relação a todos os demais. No que concerne à alegada violação ao estatuto protetivo da imunidade parlamentar, a Ministra reconheceu que a decisão da intitulada autoridade coatora, apesar de destoar do claro sentido das regras constitucionais invocadas, era plenamente justificada pelas circunstâncias do caso, harmonizando-se com as demais normas do sistema.
Em seu voto, afirmou a Ministra que a Constituição, ao mesmo tempo em que assegura a imunidade relativa dos parlamentares, o que é feito em benefício do eleitor com vistas à autonomia do órgão legiferante, proíbe a impunidade absoluta de quem quer que seja, sendo estes os referenciais de interpretação das disposições constitucionais suscitadas pelo impetrante. Invocando as lições de Black e de Rui Barbosa, defendeu que qualquer lei deve ser interpretada em consonância com a realidade, o seu espírito e a razão, não podendo ser excluída do sistema em que inserida. A imunidade parlamentar existe para o regular funcionamento das instituições democráticas, não para legitimar a sua destruição e autorizar a prática de crimes. [64] No caso concreto, a aplicação das regras invocadas pelo impetrante sempre asseguraria a sua impunidade, pois a manutenção da prisão seria decidida pelos demais integrantes da organização criminosa, seus pares na Assembléia Legislativa do Estado de Rondônia.
Perante esse lamentável quadro, questiona a Ministra: "como se cogitar, então, numa situação de absoluta anomalia institucional, jurídica e ética, que os membros daquela Casa poderiam decidir livremente sobre a prisão de um se seus membros, máxime quando ele é tido como ‘o chefe indiscutível da organização (criminosa) (que) coordena as ações do grupo e cobra dos demais integrantes o cumprimento das tarefas que lhes são repassadas. As indicações para importantes cargos... são de sua responsabilidade, e controla, mediante pagamento, os deputados estaduais’ (fls. 80)?" Sendo evidente a impossibilidade de os parlamentares decidirem livremente sobre a prisão, como se aplicar as regras constitucionais invocadas? Em situações desse tipo, "há que se sacrificar a interpretação literal e isolada de uma regra para se assegurar a aplicação e o respeito de todo o sistema constitucional". Apesar de ser o impetrante um parlamentar, a necessidade de garantir a segurança pública indica que "a prisão haverá de ser aplicada segundo as regras que valem para todos quando o status funcional de alguém já não esteja em perfeita adequação ao ofício que determina a aplicação do regime jurídico constitucional ao agente".
Apesar do não atendimento das regras específicas que regulam a prisão de parlamentares, "o que se tem por demonstrado é que o mínimo do conteúdo normativo exigido para a prisão decretada, na contingência de uma excepcional condição, foi atendido." (...) "A prisão atende, portanto, à ordem pública, ao princípio da segurança de todos e de cada um dos membros da sociedade. Nem se indague sobre a excepcionalidade e a gravidade da prisão, mais ainda quando se volta contra um agente que representa o povo".
Em outro julgamento, o Pleno do Supremo Tribunal Federal negou provimento a Reclamação ajuizada contra ato de Tribunal de Justiça, que determinara o seqüestro de verbas do Estado para a quitação de precatório que beneficiava pessoa portadora de doença grave e incurável. [65] Como observou o Ministro Eros Grau, o Tribunal firmara o entendimento, partindo da literalidade do parágrafo 2º do art. 100 da Constituição, que o seqüestro somente seria cabível se houvesse preterição ao direito de preferência na quitação do precatório, o que não ocorria no caso concreto. Apesar disso, a Reclamação não foi acolhida pela unanimidade dos Ministros, já que a situação deveria ser considerada uma exceção à regra constitucional.
Volvendo à Reclamação nº 2.138/2000, é pouco provável que os Ministros do Supremo Tribunal Federal desconheçam haver (muita) corrupção no Brasil, [66] o que em muito dificulta a compreensão das razões que o estão levando a desarticular a Lei de Improbidade. Também é difícil imaginar que tenha passado despercebido ao Tribunal o efeito devastador que sua decisão causará em termos de proliferação da corrupção. A explicação é simples: como os altos escalões de poder estarão imunes à Lei de Improbidade, é fácil imaginar que neles será concentrado todo o poder de decisão, sujeitando-os, tão-somente, à responsabilização nas esferas política e criminal, cuja ineficácia não precisa ser lembrada ou explicada.
A posição do Tribunal destoa (1) do senso comum da esmagadora maioria da coletividade, pois, salvo engano, não visualizamos a existência de movimentos sociais "pró" e "contra" a corrupção, (2) da quase totalidade da doutrina, (3) de todos os tribunais do País [67] e (4) dos compromissos assumidos pelo Brasil no plano internacional (v.g.: Convenção Interamericana de Combate à Corrupção e Convenção das Nações Unidas de Combate à Corrupção).
8. Epílogo.
Na conhecida classificação de Heidenheimer, [68] que leva em consideração a percepção das elites e da opinião pública em relação à corrupção, esta se subdivide em negra, cinza e branca. Na corrupção negra, é divisado um consenso entre as elites e a opinião pública quanto à reprovação de um ato e à imprescindibilidade de sua punição. Na corrupção cinza, alguns elementos, normalmente oriundos das elites, defendem a punição do ato, enquanto a maioria da população assume uma posição dúbia. Por último, na corrupção branca, a maior parte das elites e da população, por tolerar certos atos de corrupção, não apóia com vigor a sua criminalização e conseqüente coibição.
Arriscaríamos afirmar que, no Brasil, temos uma corrupção negra, claramente endêmica, em vários setores da vida pública. Esse estado de coisas bem demonstra a elevada responsabilidade ética e moral do Supremo Tribunal Federal na recepção da "tese" que lhe foi apresentada. [69] Discussões em torno da legitimidade da jurisdição constitucional, por certo, voltarão a aflorar, o que é sempre temerário no âmbito de um Estado de Direito democraticamente constituído, mas recém saído de um longo período ditatorial.
Espera-se, no entanto, sofra a questão maior amadurecimento no âmbito do mais elevado tribunal brasileiro, o que, por certo, contribuirá para sedimentar os próprios alicerces do Estado brasileiro, evitando o descrédito das instituições e, conseqüentemente, da própria democracia.
Notas
01 "A medida provisória que estipula uma penalidade financeira contra os promotores caso suas denúncias não sejam aceitas pelos pretórios é, em si mesma, um golpe contra a Carta Magna (configurando um golpe de Estado)"... "Se o Ministério Público não investiga livremente os que devem guardar as riquezas nacionais, ele também nada pode fazer contra os que subtraem os bens privados. O governo não ponderou o risco: indo contra os promotores, ele subverte os ideais da vida civil. Santo Agostinho diz que o Estado sem valores não se diferencia das quadrilhas." (Roberto Romano, professor de ética e de filosofia política na Unicamp, "Em Defesa do Ministério Público", in Folha de S.Paulo, edição de 8/1/2001). "Nossa democracia já possui instrumentos para corrigir excessos e punir irresponsáveis sem uma medida que, para alguns, ficaria perfeita nos compêndios jurídicos do regime militar... fragilizar o acusador pode não ser o melhor caminho para evitar acusações injustas. Pode acabar soando mais ou menos como aquela história de tirar o sofá da sala para evitar o que todo mundo sabe o quê. Ou, como já diziam nossas avós quando éramos crianças e temíamos ser punidos por malfeitores alheios: quem não deve, não teme" (Helena Chagas, in "Na contramão", O Globo, edição de 8/1/2001). "O Ministério Público está apenas fazendo seu trabalho. Está se excedendo? Promotores de Justiça com vontade de aparecer são a melhor novidade da República nestes últimos anos. Contrapartida direta da proliferação de corruptos e corruptores com vontade de não aparecer. Dizem que o Supremo derrubará a medida provisória intimidadora, mas só o fato de ela ter sido bolada e editada mostra como vivemos em tempos assustadoramente interessantes" (Luís Fernando Veríssimo, mimeo).
02 Ao discorrer sobre os graves casos de corrupção detectados durante a administração do Presidente norte-americano Harry S. Truman, Jules Abels destacou quatro pontos principais (The Truman Scandals, Henry Regnery Company, Chicago, 1956, pp. 307-314, apud Francisco Bilac Moreira Pinto, Enriquecimento Ilícito no Exercício de Cargos Públicos, Rio de Janeiro: Forense, 1960, pp. 35-37). De acordo com o primeiro, a corrupção, além de ter se disseminado entre grande número de funcionários públicos espalhados por todo o País, infestou a máquina arrecadadora de impostos, o que poderia gerar a irritação dos contribuintes e levá-los a uma evasão fiscal em massa. O segundo ponto demonstrava que a corrupção na administração Truman, além de epidêmica, formava uma faixa contínua que abrangia vários órgãos e era contagiosa. O terceiro ponto deixava claro que os escândalos não só eram epidêmicos, como também constituíam doença endêmica da administração, pois eram conseqüência de uma filosofia de governo essencialmente política, visando sempre vencer a eleição seguinte e fortalecer o Partido Democrático, do qual dependiam os homens politicamente ambiciosos que cercavam o Presidente Truman. O quarto ponto, por sua importância, merece ser literalmente transcrito: "consiste em que a administração de Harry Truman, longe de tomar medidas efetivas para aniquilar a corrupção, em alguns casos protegia os culpados, em outros permanecia indiferente, ou empregava a máquina da administração para bloquear e desviar os investigadores da corrupção. As fraudes foram reveladas, não por causa da administração, mas apesar dela."
03 ADI nº 2.797/DF, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. em 15/09/2005. Na ocasião, com três votos vencidos (Gilmar Mendes, Eros Grau e Ellen Gracie, que defenderam a similitude entre ato de improbidade e crime de responsabilidade), o Tribunal decidiu que: a ação de improbidade tem natureza cível, enquanto o foro por prerrogativa de função restringe-se à seara penal; ao equiparar a ação civil por ato de improbidade à ação penal, a lei contrariou o art. 37, § 4º, da Constituição; o foro por prerrogativa pressupõe a atualidade do exercício da função, isto sob pena de transmudar-se em privilégio, ferindo o princípio da isonomia; o Legislativo não poderia, por via infraconstitucional, desautorizar o cancelamento da Súmula nº 394; e a competência do Supremo Tribunal Federal foi exaustivamente prevista na Constituição, somente podendo ser ampliada por emenda ou, pelo próprio Tribunal, com o auxílio da teoria dos poderes implícitos.
04 No mesmo sentido: STJ, 6ª T., REsp.
nº 161.322/PE, rel. Min. Franciulli Netto, j. em 7/3/2002, DJ
de 16/9/2002; 6ª T., HC nº 13.894/RJ, rel.
Min. Fernando Gonçalves, j. em 21/2/2002, DJ de 22/4/2002, p. 260; 1ª
T., MC nº 3.018-60, rel. Min. Francisco Falcão, j. em
10/4/2001, DJ de 17/9/2001, p. 108; 6ª T., REsp. nº
150.329, rel. Min. Vicente Leal, j. em 2/3/1999, DJ de 5/4/1999; 1ª
Seção, AGRRCL nº 748-SP, rel. Min. Peçanha Martins, j. em
13/6/2001, DJ de 10/9/2001. A 2ª Turma do STJ, por ocasião do
julgamento do AGRMC nº 2.840-SP, ocorrido em 2/8/2001,
publicado no DJ de 17/9/2001, p. 128, sendo relatora a Min. Eliana Calmon,
deixou assentado que "decidida pela Corte Especial a competência da Primeira
Seção para o julgamento de cautelares oriundas de processo de natureza civil,
onde se questiona improbidade administrativa e já extinto o mandato do Prefeito,
perde o objeto a ação cautelar". A Corte Especial do STJ, do mesmo modo, já
decidiu que não há usurpação de competência do Tribunal em caso de "inquérito
civil público instaurado pelo Ministério Público para apurar atos de improbidade
administrativa cuja prática é atribuída a agentes políticos que, em instância
penal e em sede de mandado de segurança, são jurisdicionados originariamente do
Superior Tribunal de Justiça. A competência originária do STJ está arrolada no
art. 105, I, da Constituição Federal, não comportando extravasamento que
ultrapasse os rígidos limites nele fixados" (Rec. nº 580/GO,
rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. em 17/10/2001, DJ de 18/2/2002, p. 210).
Na doutrina: José Antonio Lisboa Neiva, Improbidade Administrativa, Rio de
Janeiro: Editora Impetus, 2005, p. 26; Odete Medauar, Direito Administrativo
Moderno, 5ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 52; George Sarmento,
Improbidade Administrativa, Porto Alegre: Editora Síntese, 2002, p. 192;
Sérgio Monteiro Medeiros, Lei de Improbidade. Comentários e Anotações
Jurisprudenciais, São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2003, p. 3; Fábio
Medina Osório, Improbidade Adminsitrativa. Observações sobre a Lei
9.429/1992, 2ª ed., Porto Alegre: Editora Síntese, 1998, pp. 217-224;
Marino Pazaglini Filho et alii, Improbidade Administrativa, Aspectos
Jurídicos da Defesa do Patrimônio Público, 4ª ed., São Paulo: Editora Atlas,
1999, p. 135; Marino Pazzaglini Filho, Lei de Improbidade Administrativa
Comentada, São Paulo: Editora Atlas, 2002, p. 115; Carlos Frederico Brito
dos Santos, Improbidade Administrativa, Reflexões sobre a Lei nº
8.429/1992, Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 1; Marcelo Figueiredo,
Probidade Administrativa, Comentários à Lei 8.429/1992 e Legislação
Complementar, 3ª ed., São Paulo: Malheiros, 1998, p. 87; Wallace
Paiva Martins Júnior, Probidade Administrativa, São Paulo: Saraiva, 2001, p. 255; Antonio José de Mattos Neto, "Responsabilidade Civil por Improbidade
Administrativa", RT 752/31; José Augusto Delgado, "Improbidade
Administrativa: Algumas Controvérsias Doutrinárias e Jurisprudenciais sobre a
Lei de Improbidade Administrativa", in Improbidade Administrativa,
Questões Polêmicas e Atuais, org. por Cássio Scarpinelle Bueno et alii,
São Paulo: Malheiros, 2001, p. 211; Sérgio Ferraz, "Aspectos Processuais na Lei
sobre Improbidade Administrativa, in Improbidade Administrativa,
Questões Polêmicas e Atuais, p. 370; José Nilo de Castro, "Improbidade
Administrativa Municipal", in Caderno de Direito Municipal nº
8/2000, p. 82; Fábio Konder Comparato, "Ações de Improbidade Administrativa",
RTDP nº 26/153; José Guilherme Giacomuzzi, A Moralidade
Administrativa e a Boa-fé da Administração Pública, o conteúdo dogmático da
moralidade administrativa, São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 179; Rita
Andréa Rehem Almeida Tourinho, Discricionariedade Administrativa, Ação de
Improbidade & Controle Principiológico, Curitiba: Editora Juruá, 2004, pp.
134/136 e "A Eficácia Social da Atuação do Ministério Público no Combate à
Improbidade Administrativa", RDA nº 227/253; Walter
Claudius Rothenburg, "Ação por Improbidade Administrativa: Aspectos de Relevo",
in Improbidade Administrativa, 10 anos da Lei nº
8.429/1992, org. por José Adércio Leite Sampaio et alii, Belo
Horizonte: Editora Del Rey, 2002, p. 462/466); Carlos Eduardo Terçarolli,
Improbidade Administrativa no Exercício das Funções do Ministério Público,
Curitiba: Juruá Editora, 2002, p. 75; e Benedicto de Tolosa Filho, Comentários à
Lei de Improbidade Administrativa, Rio de Janeiro: Forense, 2003, pp 42-46 e
134. Flávio Sátiro Fernandes ("Improbidade Administrativa", RDA 210/177)
fala em sanções de natureza política ou cível. Francisco Octavio de Almeida
Prado (Improbidade Administrativa, São Paulo: Malheiros, 2001, pp. 20-29)
sustenta que a disciplina básica dos atos de improbidade, não obstante a
existência de pontos de tangenciamento com o direito civil (v.g.:
reparação do dano), encarta-se no direito público, e mais precisamente no âmbito
do direito administrativo, situando-se as sanções cominadas no âmbito do direito
administrativo sancionador. Fernando Rodrigues Martins (ob. cit., p. 83)
entende que as sanções tem natureza civil (ressarcimento, perdimento e multa),
administrativa (perda da função e proibição de contratar) e constitucional
(suspensão dos direitos políticos), entendimento que é encampado por Waldo
Fazzio Júnior (Improbidade Administrativa e Crimes de Prefeitos, São
Paulo: Atlas, 2001, pp. 47 e 296), para quem há um consórcio de penalidades
civis, políticas e administrativas. José Jairo Gomes, ("Apontamentos sobre a
Improbidade Administrativa", in Improbidade Administrativa, 10 anos da Lei nº
8.429/1992, p. 258) as identifica como sendo sanções de
"responsabilidade por ilícito civil-administrativo, de natureza sui generis".
Affonso Ghizzo Neto (Improbidade Administrativa e Lei de Responsabilidade
Fiscal, Florianópolis: Habitus, 2001, p. 83) visualiza uma natureza
administrativa-disciplinar. O STJ, por sua 3ª Seção, em posição
isolada, também entendeu que a Lei nº 8.429/1992 dispõe sobre
ilícitos penais (MS nº 6.478, rel. Min. Jorge Scartezzini, j.
em 26/4/2000, DJ de 29/5/2000).
05 Art. 5º, XXXIX, da CR/1988.
06 Nos crimes comuns, o Prefeito será julgado perante o Tribunal de Justiça (art. 29, X, da CR/1988); os membros do Congresso Nacional perante o Supremo Tribunal Federal (art. 102, I, b, da CR/1988); o Governador e os membros dos Tribunais Regionais Federais, Regionais do Trabalho e de Justiça perante o Superior Tribunal de Justiça (art. 105, I, a, da CR/1988) etc.
07 STF, AGRG em Petição nº 693-4, rel.
Min. Ilmar Galvão, j. em 12/8/1993, DJ de 1º/3/1996, p. 5.013.
Em reiteradas oportunidades, o STF decidiu que não é competente para processar e
julgar as ações populares ajuizadas em face do Presidente da República (Petições
nº 2.239/RS, DJU de 2/2/01; 1.546/RJ, 1.282 (AgRg)/RJ, 713/RJ,
682/MS e 626/MG).
08 TRF-1ª R., AG nº
01000132274/DF, DJ de 4/5/2001, p. 640.
09 STF, AGRG em Reclamação nº 1.110-1,
rel. Min. Celso de Mello, j. em 25/11/1999, DJ de 7/12/1999, p. 58. Lê-se, na
ementa do julgado, que "o Supremo Tribunal Federal – mesmo tratando-se de
pessoas ou autoridades que dispõem, em razão do ofício, de prerrogativa de foro,
nos casos estritos de crimes comuns – não tem competência originária para
processar e julgar ações civis públicas que contra elas possam ser ajuizadas.
Precedentes".
10 STF, Inq. nº 1.205-5, rel. Min.
Carlos Velloso, j. em 21/2/1997, DJ de 4/3/1997, p. 4.800-1, e STF, Pleno HC nº
80.112-PR, rel. Min. Sydney Sanches, j. em 1º/8/2000, DJ de
17/11/2000. Neste último caso, o writ havia sido impetrado visando ao
trancamento de inquérito civil público instaurado para apurar a prática de atos
de improbidade em que se vislumbrava o envolvimento de Deputado Federal.
Anteriormente ao julgamento, o Tribunal foi cientificado do ajuizamento, em
primeira instância, de "ação civil pública declaratória de ato de improbidade
administrativa e ressarcimento por dano causado ao patrimônio público, com
pedido de liminar de indisponibilidade e de afastamento de cargo público". Ao
final, não vislumbrando qualquer usurpação de sua competência, terminou por
denegar a ordem, à unanimidade, ante a inexistência de ameaça ao direito de ir e
vir do paciente. Em seu voto, o Ministro Sepúlveda Pertence ressaltou ser "óbvio
que do inquérito civil para apurar improbidade administrativa pode resultar a
colheita de elementos informativos de natureza criminal", mas deixava claro "que
a circunstância de o fato a apurar ter repercussões penais não elide a
possibilidade do inquérito civil e só por si não desloca para o Supremo Tribunal
Federal a competência para realizá-lo".
11 STJ, 6ª Turma, RMS nº
6.208, rel. Min. Anselmo Santiago, j. em 10/11/1998, DJ de 15/3/1999. Não merece
ser acolhida a tese de que os amplos termos do art. 29, X, da CR/1988
("julgamento do Prefeito perante o Tribunal de Justiça") impediriam que o
Prefeito fosse julgado pelo juiz monocrático por atos de improbidade. Tem-se,
aqui, aquilo que Larenz (in Metodologia da Ciência do Direito,
trad. de José Lamego, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, p. 535)
denominou de "lacuna oculta", presente sempre que "a lei contém precisamente uma
regra aplicável a casos desta espécie, mas que, segundo o seu sentido e fim, não
se ajusta a este determinado grupo de casos, porque não atende à sua
especificidade, relvante para a valoração". Essa "lacuna oculta" será preenchida
a partir da interpretação da disposição normativa, norteada, principalmente, por
critérios teleológico-sistemáticos. Especificamente em relação aos preceitos
constitucionais que dispõem sobre o foro por prerrogativa de função, constata-se
a observância de duas diretrizes básicas: referem-se à matéria criminal e a
algumas causas em que haja restrição de direitos fundamentais do cidadão, sendo
a autoridade contemplada com o foro especial a responsável pela coação (v.g.:
mandado de segurança, habeas corpus etc.). Em nenhum momento a Constituição
prestigiou entendimento tão amplo quanto aquele sugerido pelos defensores da
tese de que o Prefeito não poderia ser julgado em 1ª instância
por atos de improbidade. À simples e cômoda interpretação literal do art. 29, X,
da CR/1988 deve ser preferida aquela que desvenda a sua ratio e preserva
a harmonia do sistema, o que terminará por afastar a iniquidade que surgiria com
a conclusão de que o Prefeito, em flagrante dissonância do princípio da
isonomia, é o único agente público no Brasil a gozar de foro especial para o
julgamento dos atos de improbidade. A 2ª Turma do STJ, do mesmo
modo, já decidiu que "o Prefeito Municipal só tem o Tribunal de Justiça como seu
juiz natural nas ações penais, e não nas cíveis" (ROMS nº
2.621/PR, rel. Min. Adhemar Maciel, j. em 15/5/1997, DJ de 23/06/1997, RSTJ
98/140). Na ocasião, afirmou o relator: "ora, como bem asseverou o eminente
Ministro Cesar Asfor Rocha, ao proferir o seu voto-condutor no RMS n. 1.981/AM,
‘a regra contida no art. 29, VIII, da Constituição Federal deve ser interpretada
com temperamento, de forma sistemática e integrativa a outros princípios
constitucionais, por isso que compete ao Tribunal de Justiça julgar o Prefeito
Municipal apenas no pertinente aos crimes comuns’ (1ª Turma do
STJ, unânime, publicado na RSTJ 58/167)". No mesmo sentido: Alexandre de Moraes,
Direito Constitucional, pp. 260-261.
12 STJ, Corte Especial, Rec. nº
780/AP, rel. Min. César Asfor Rocha, red. des. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. em
7/11/2001, DJ de 7/10/2002.
13 STJ, Corte Especial, Rec. nº 591,
rel. Min. Nílson Naves, j. em 1º/12/1999, DJ de 15/5/2000. Em
parecer sobre o tema, Paulo Brossard sustenta a competência do STJ para
processar e julgar membro de Tribunal Regional do Trabalho por ato de
improbidade (in Revista Interesse Público nº 2/108).
Aduz, em síntese, que apesar de as sanções da Lei nº 8.429/1992
terem natureza cível, deve ser realizada uma "construção constitucional" visando
à utilização das regras de competência relativas à matéria criminal (ante a
parcial similitude dos efeitos da decisão – perda do cargo e suspensão dos
direitos políticos), pois, em que pese reconhecer a não aceitação de uma
interpretação extensiva em tal seara, "a Constituição não é aleijada", postulado
este que certamente seria violado fosse admitido que um juiz inferior julgasse
outro de hierarquia superior, isto em nítida afronta ao sistema constitucional
consagrado de 1824 a 1988, máxime quando possa resultar em perda do cargo de
juiz. Não obstante o brilho dos argumentos, entendemos que a capacidade de
criação do direito é deferida ao legislador, não ao intérprete, motivo pelo qual
não encampamos quer as premissas, quer a conclusão.
14 STJ, Corte Especial, HC nº
22.342/RJ, rel. Min. Félix Fischer, j. em 18/9/2002, DJ de 23/6/2003, p. 231.
15 Nesse sentido: Arnoldo Wald e Gilmar Ferreira
Mendes, "Competência para julgar ação de improbidade administrativa", in
Revista de Informação Legislativa nº 138/213.
16 Para Álvaro Lazzarini (Temas de Direito
Administrativo, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 64) tais sanções
têm natureza política, com o que não concordamos, ante a natureza do órgão que
as aplicará e a necessidade de fundamentação da decisão a ser proferida (art.
93, IX, da CR/1988), o que possibilita seu reexame por outro órgão em havendo
irresignação; elementos estes incompatíveis com uma decisão essencialmente
política. Ives Gandra da Silva Martins (Aspectos Procedimentais do Instituto
Jurídico do ‘Impeachment’ e Conformação da Figura da Improbidade Administrativa,
in RT nº 685/287) sustenta que as sanções teriam natureza penal, já que a
Lei nº 8.429/1992 tipifica verdadeiros crimes de
responsabilidade. Sérgio de Andréa Ferreira (A Probidade na
Administração Pública, in Boletim de Direito Administrativo, agosto/2002,
623), do mesmo modo, afirma que "os atos de improbidade são espécies do
mesmo gênero dos crimes de responsabilidade e das infrações
político-administrativas".
17 Art. 52, I e parágrafo único, da CR/1988.
18 Art. 102, I, c, da CR/1988.
19 Art. 1º do Decreto-Lei nº 201/1967. O mesmo diploma normativo, em seu art. 4º, fala nas "infrações-político-administrativas dos Prefeitos Municipais", o que se assemelharia aos crimes de responsabilidade da Lei nº 1.079/1950. Nesse sentido: "Penal. Processual Penal. Prefeito: Crime de Responsabilidade. D.L. 201, de 1967, artigo 1º: crimes comuns. I. – Os crimes denominados de responsabilidade, tipificados no art. 1º do D.L. 201, de 1967, são crimes comuns, que deverão ser julgados pelo Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores (art. 1º), são de ação pública e punidos com pena de reclusão e de detenção (art. 1º, § 1º) e o processo é o comum, do C.P.P., com pequenas modificações (art. 2º). No art. 4º, o D.L. 201, de 1967, cuida das infrações político-administrativas dos prefeitos, sujeitos ao julgamento pelo Câmara dos Vereadores e sancionadas com a cassação do mandato. Essas infrações é que podem, na tradição do direito brasileiro, ser denominadas de crimes de responsabilidade. II. – A ação penal contra prefeito municipal, por crime tipificado no art. 1º do D.L. 201, de 1967, pode ser instaurada mesmo após a extinção do mandato. III. – Revisão da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. IV. – HC indeferido." (STF, Pleno, HC nº 60.671/PI, rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 19/05/1995).
20 Como única exceção, pode ser mencionado o crime de responsabilidade passível de ser praticado pelo Presidente da Câmara dos Vereadores que gastar mais de 70% de sua receita com folha de pagamento, incluído o gasto com subsídio de seus Vereadores (art. 29-A, §§ 1º e 3º, da CR/1988).
21 Essa constatação é reforçada pela redação do art. 42
da Lei nº 1.079/1950: "A denúncia só poderá ser recebida se o
denunciado não tiver, por qualquer motivo, deixado definitivamente o cargo".
Deixando o cargo, suprimida estaria a responsabilidade política do agente. O
art. 3º da Lei nº 1.079/1950 ressaltou, de
forma expressa, que ainda seria possível o julgamento do agente, perante o órgão
jurisdicional competente, em tendo praticado crime comum. Não bastasse isto, o
art. 52, parágrafo único, da Constituição, dispõe que, no julgamento dos crimes
de responsabilidade imputados ao Presidente e ao Vice-Presidente da República,
aos Ministros de Estado, aos Comandantes da Marinha, do Exército e da
Aeronáutica, aos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aos membros do Conselho
Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, ao
Procurador-Geral da República e ao Advogado-Geral da União, "funcionará como
Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente
será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo,
com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem
prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis". À luz desses preceitos, resta
incontroversa a dicotomia e a independência entre as instâncias política e
jurisdicional.
22"El enfrentamiento y discusión política se traslada de la sede parlamentaria a los tribunales y, por ende, a la opinión pública a través de los medios de comunicación. Pero, sobre todo se confunden dos conceptos radicalmente diferentes: la responsabilidad política y la penal. El segundo es uma responsabilidad subjetiva, por culpa o dolo, y la primera es uma responsabilidad objetiva que además de culpa y dolo incluye la responsabilidad in vigilando e in eligendo. El proceso de exigencia es diferente, la responsabilidad penal requiere la fijación nítida y firme de los hechos hasta conducir a un convencimiento judicial de la culpabilidad, mientras que la responsabilidad política requiere sólo el convencimiento político-moral de tal culpabilidad. El parámetro de juicio es diverso, el de la responsabilidad judicial es el ordenamiento jurídico penal (que incluye únicamente las conductas que merecen el máximo desvalor por parte de la sociedad), mientras que em la política el parámetro de juicio es un código de conducta más vinculado a la moral y ética públicas. En fin, tras esta construcción subyace una identificación absolutamente inaceptable y que no resiste el más mínimo juicio desde una perspectiva democrática: la identificación entre inocencia política e inocencia penal. Esta identificación lleva a la aberrante conclusión de que los responsables políticos pueden desempeñar su cargo como quieran siempre que sus conductas no signifiquen la comisión de un delito" (Rafael Bastos Gisbert, "La Corrupción de los Gobernantes: responsabilidad política y responsabilidad penal, in La Corrupción: aspectos jurídicos y económicos, org. por Eduardo A. Fabián Caparrós, Salamanca: Ratio Legis, 2000, p. 37).
23 Arts 15, V, e 37, § 4º, da CR/1988.
24 Arts. 29, §§ 2º e 3º; 50, caput e § 1º; 52, I; 85, caput e parágrafo único; 86, caput e § 1º, II; 96, III; 100, § 6º; 102, I, c; 105, I, a; 108, I, a; e 167, § 1º, da CR/1988.
25 Arts. 37, § 4º e 85, parágrafo único, da CR/1988.
26 Na síntese de Karl Korinek, "interpretação jurídica é como um processo mental para compreender" [Zur Interpretation von Verfassungsrecht, in Staatsrecht in Theorie und Praxis – Festschrift Robert Walter zum 60. Geburtstag, Wien: Manzsche Verlags, 1991, p. 363 (365].
27 Cf. Pérez Luño, Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constitución, 8ª ed., Madrid: Editorial Tecnos, 2003, p. 254.
28 Cf. Vergottini, Diritto Costituzionale,, 3ª ed., Padova: CEDAM, 2001, p. 163. Segundo o autor, a interpretação é o "perfil dinâmico" da fonte. A interpretação, no entanto, não se confunde com a aplicação: "interpretar equivale a preparar o iter que produzirá em cada caso a norma ad hoc, mas finaliza quando o sujeito intérprete decide entre as soluções possíveis: a partir daqui, o momento que vivemos é o da aplicação e não outro" (Raúl Canosa Usera, Interpretatión Constitucional y Fórmula Política, Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1988, p. 13).
29 Em sentido contrário: Eros Roberto Grau, Ensaio e Discurso sobre a Interpretação/Aplicação do Direito, 3ª ed., São Paulo: Malheiros Editores, 2005, p. 82. Nas palavras de Savigny, a interpretação é a "reconstrução do conteúdo da lei" [Metodologia Jurídica (Juristische Metodenlehre), trad. de Heloísa da Graça Buratti, Editora Rideel, p. 25)].
30 Cf. Lenio Luiz Streck, Jurisdição Constitucional e Hermenêutica – Uma Nova Crítica do Direito, 2ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 594.
31 Cf. Friedrich Müller, Métodos de Trabalho do Direito Constitucional, 3ª ed., trad. de Peter Naumann, Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2005, pp. 53/54.
32 Cf. Otto Pfersmann, Esquisse d´une Théorie des Droits Fondamentaux, in Droits des libertés fondamentaux, org. por Louis Favoreau, 2ª ed., Paris: Dalloz, 2002. p. 83 (83/84).
33 Cf. Jerzy Wróblewski, Constitución y teoría general de la interpretatión jurídica, 1ª ed., reimp., Madrid: Cuadernos Civitas, 2001, p. 18.
34 Cf. Peter Häberle, Hermenêutica Tradicional - A Sociedade Aberta dos Intérpretes da Constituição: Contribuição para a Interpretação Pluralista e "Procedimental" da Constituição (Die offene Gesellschaft der Verfasungsinterpreten. Ein Beitrag zur pluralistischen und "prozessualen" Verfassungsinterpretation), trad. de Gilmar Ferreira Mendes, 1ª reimp., Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2002, p. 30.
35 Cf. Konrad Hesse, Elementos de Direito Constitucional da República Federativa da Alemanha, trad. de Luís Afonso Heck, Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1998, p. 61.
36 Hamon, Troper e Burdeau, Manuel de Droit Constitutionnel, 27ª ed., Paris: L.G.D.J, 2001, p. 59.
37 Cf. Jerzy Wróblewski, Constitución y teoría general de la interpretación jurídica, trad. de Arantxa Azurza, Madrid: Cuadernos Civitas, 2001, p. 83.
38 Cf. Aguila, Cinq questions…, in RFDC nº 21, p. 9 (15), 1995.
39 Cf. Canosa Usera, Interpretación..., p. 106.
40 Cf. Peter Häberle, Teoría de la Constitución como Ciência de la Cultura, trad. de Emilio Mikunda, Madrid: Editorial Tecnos, 2000, p. 44.
41 Cf. Häberle, Teoría de la Constitución…, p. 45.
42 Como afirmou Hesse, "não há interpretação da Constituição independentemente de problemas concretos" (Elementos de Direito Constitucional..., p. 62).
43Pluralismo y Constitución. Estúdios de Teoría Constitucional de la Sociedade Abierta (Die Verfassung des Pluralismus. Studien zur Verfassungstheorie der offenen Gselschaft), trad. de Emilio Mikunda, Madrid: Editorial Tecnos, 2002, pp. 59 e ss..
44 Cf. James. E. Fleming, "Constitutional Tragedy in Dying: Or Whose Tragedy Is It, Anyway?", in Constitutional Stupidities, Constitutional Tragedies, org. por William N. Eskridge Jr. e Sanford Levinson, New York: New York University Press, 1998, p. 162 (168).
45 Cf. Norberto Bobbio, Teoría General del Derecho, trad. de Jorge Guerrero R., 2ª ed., 3ª reimp., Bogotá: Editorial Temis, 1999, p. 20.
46 Cf. Francesco Carnelutti, "Il primato del diritto", in Discorsi Intorno al Diritto, Padova: CEDAM, 1937, pp. 16/17. Nas palavras do autor, "a justiça é como a beleza: provavelmente aquele tanto de divino que nós procuramos vincular à forma humana".
47 Cf. Hamon, Troper e Burdeau, Manuel..., p. 57.
48 A Constituição, como sistema normativo aberto e dinâmico, apresenta "uma estrutura dialógica (Caliess), traduzida na disponibilidade e ‘capacidade de aprendizagem’ das normas constitucionais para captarem a mudança da realidade e estarem abertas às concepções cambiantes da ‘verdade’ e da ‘justiça’" (Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª ed., Coimbra: Almedina, 2003, p. 1145).
49Constitución y teoría..., 2001, pp. 72/75.
50 É célebre a teoria de Savigny, ao afirmar que interpretar significa "transportar-se ao ponto de vista do legislador, reproduzir artificialmente suas operações e recompor a lei pelo pensamento" (Traité de Droit Romain, Tome Premier, trad. de M. CH. Guenoux, Paris: Firmin Didot Frères, Libraires, Imprimeurs de L´Institut de France, 1840, p. 207). O reconhecimento de que o processo de concretização da norma é essencialmente criativo, reflexo inevitável de um sistema aberto, pode ser considerado o "grande triunfo da hermenêutica" (Gomes Canotilho, Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador, 2ª ed., Coimbra: Almedina, 2001, pp. 62 e 184). Como afirmou Radbruch, "a lei pode ser muito mais inteligente do que os seus criadores" (Filosofia do Direito, trad. de Marlene Holzhausen, São Paulo: Martins Fontes, 2004, p. 164). Apesar da evolução do constitucionalismo contemporâneo, francamente partidário da ideologia dinâmica, merece lembrança que o direito alemão vivenciou uma vaga de refluxo com a ascensão do Nacional-Socialismo e a prevalência do Führerprinzip (princípio de organização política que atribuía às ordens do Führer força de lei), conferindo uma feição personalista à interpretação.
51 Jérzy Wróblewski (Constitución y teoría..., p. 76). Thomas Paine, em obra escrita no final do Século XVIII, ao discorrer sobre a imutabilidade de determinadas disposições constitucionais, proferiu sentença que bem sintetiza as críticas à ideologia estática: "nunca existiu, nunca existirá e nunca poderá existir um Parlamento, nem corpo algum de homens, nem geração destes em nenhum país, que possua o direito ou o poder de obrigar e controlar a posteridade ‘até o fim dos tempos’ (...).Todas as épocas e gerações devem ser livres e atuar por si mesmas em todos os casos em que atuaram por si mesmas as épocas e gerações que as precederam. A vaidade e a presunção de governar além da tumba é a mais ridícula e insolente de todas as tiranias. O homem não tem direito de propriedade sobre o homem, nem nenhuma geração tem direito de propriedade sobre as gerações vindouras " (Los Derechos del Hombre, trad. de José Antonio Fernández de Castro e Tomás Muños Molina, México: Fondo de Cultura Económica, 1996, pp. 35/36).
52 Cf. Engisch, Introdução ao Pensamento Jurídico, de J. Baptista Machado, 8ª ed., Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001, pp. 170/183.
53 Cf. Hamon, Troper e Burdeau, Manuel..., pp. 58/59.
54 Nesse sentido: Hesse, Elementos de Direito Constitucional..., pp. 56 e ss..
55 Cf. Norberto Bobbio, Teoria dell’Ordinamento Giuridico, Torino: G. Giappichelli Editore, 1960, p. 3.
56 Cf. Wróblewski (Constitución. .., p. 76) e Engisch (Introdução ao Pensamento..., p. 171).
57 Cf. Engisch, Introdução ao Pensamento...., p. 173.
58 208 U.S. 412, 1908.
59 Cf. Nowak e Rotunda, American Constitutional Law, 5ª ed., St. Paul: West Publishing Co, 1995, pp. 376/377.
60American Constitutional Law, 2ª ed., Nova Iorque: The Foundation Press, 1988, pp. 568 e 573.
61BVerfGE 7, 377.
62 Cf. Gilmar Ferreira Mendes, Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade, 3ª ed., 2ª tiragem, São Paulo: Editora Saraiva, 2006, pp. 475/477.
63 DJ de 15/12/2006, p. 879.
64 Nas palavras da Ministra Cármen Lúcia: "a Constituição não diferencia o parlamentar para privilegiá-lo. Distingue-o e torna-o imune ao processo judicial e até mesmo à prisão para que os princípios do Estado Democrático da República sejam cumpridos; jamais para que eles sejam desvirtuados. Afinal, o que se garante é a imunidade, não a impunidade. Essa é incompatível com a Democracia, com a República e com o próprio princípio do Estado de Direito."
65 STF, Pleno, Reclamação nº 3.034, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. em 21/09/2006.
66 Sobre as múltiplas estatísticas a respeito do tema, remetemos à primeira parte da obra Improbidade Administrativa, 3ª ed., 2ª tiragem, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, pp. 11/14.
67 Como não poderia deixar de ser, da semente plantada no Supremo Tribunal Federal já começam a germinar as primeiras ervas daninhas, como é o caso do acórdão proferido pela 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 456.649/MG, rel. p/ o acórdão Min. Luiz Fux, j. em 05/09/2006, em que se afirmou que Prefeitos e Vereadores, como agentes políticos que são, não se submetem à Lei de Improbidade.
68Perspectives on the Perception of Corruption, in Political Corruption, A. Handbook, org. por Arnold Heidenheimer et alii, 3ª ed., Londres: Transactions Pub., 1993, pp. 161 e ss..
69 A gravidade da situação não passou despercebida a múltiplos setores da sociedade. Para citar apenas uma iniciativa que busca contornar os seus efeitos deletérios, merece menção a Sugestão nº 226/2006, apresentada pela Ordem dos Advogados do Brasil, em maio de 2006, à Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados. Nesse documento, a OAB propõe seja apresentado um projeto de lei que promova um acréscimo à parte final do art. 1º da Lei de Improbidade, verbis: "Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público (...) serão punidos na forma desta lei, sem prejuízo da aplicação ao responsável, conforme as circunstâncias, das sanções cominadas na Lei nº 1079, de 10 de abril de 1950".