8- CONCLUSÕES
As ciências sociais revelam-se particularmente infensas à estagnação, porque o substrato de seu objeto de estudo é essencialmente dinâmico. Esta mesma particularidade lhes impõe um método próprio de abordagem da realidade. Por força de contigências históricas, o método científico das ciências exatas também serviu de paradigma às ciências sociais. O reducionismo matemático do racionalismo iluminista, que desencadeou a estruturação de boa parte do conhecimento científico moderno, acabou por cercear a percepção de que os diversos ramos científicos não podem ser tratados de forma totalmente simétrica. Há particularidades que não devem ser olvidadas.
Em vista do Direito, esta falha de perspectiva conduziu a uma distorção cumulativa, cujos resultados palpáveis se observaram especialmente no campo do processo, um ramo mais propenso a refletir a disparidade entre a concepção abstrata e a realidade empírica, em uma postura neutralista.
O processo ocidental de feição romano–canônica marcou-se, em seu estágio recente de desenvolvimento, por uma matriz hermenêutica que refletiu os valores do liberalismo. Estruturou-se como um processo voltado à resolução de conflitos privados e individuais, escudando-se sobre dois primados fundamentais, quais sejam a supremacia da cognição exauriente, e a dicotomia cognição-execução [48]. Estes valores descendem da tradição romana, e encontraram esteio para solidificarem-se através da recepção pelos valores da filosofia de Kant, promovendo a separação entre os mundos conceitual e empírico, e do iluminismo, cujo método científico busca a certeza pela razão em uma fórmula matemática. A "certeza" é produzida, em termos de processo, pela cognição exauriente.
Os novos influxos do constitucionalismo social trouxeram novas variáveis. A concepção de direitos de segunda e terceira geração transformou o Estado em grande "devedor", e introduziu componentes de direito público que se irradiam por todos os campos do Direito. Os conflitos passaram não só a envolver direito público, mas a se coletivizarem, invertendo a polaridade indivíduo-direito privado (matriz privatista) que servira de substrato às especulações científicas e legislativas. E dentre os direitos individuais foi, ainda, introduzido o compromisso solene do Estado com a efetividade da jurisdição, que pode ser visto no artigo 5º, inciso XXXV, da CF/88.
Com o aumento dos direitos e das demandas e diante da cláusula de efetividade da jurisdição, surge o problema de celeridade.
Em nosso direito processual, este choque entre o instrumento abstratamente estruturado e as novas necessidades da realidade social se fez ainda mais grave, pois tomamos por modelo o direito processual peninsular, onde a dualidade de jurisdições (administrativa e judicial) permitiu que as discussões de direito público não passassem a exercer pressão sobre o processo judicial. Aqui os conflitos deságuam invariavelmente na instância judicial.
Por outro lado, a filosofia da linguagem nos permitiu ver que, ao contrário do que apregoa a filosófica da consciência, o método não espelha a realidade a ser expressa pela linguagem de forma imparcial. O método e a linguagem moldam a própria realidade. O Direito e o direito processual também são frutos do seu próprio discurso introspectivo e dissociado das realidades empíricas.
A crise de jurisdição, desencadeada pelo déficit entre a realidade e a matriz hermenêutica que embasa o processo, somada à percepção, oriunda dos resultados da aplicação da filosofia da linguagem na epistemologia jurídica, e ao valor do relativismo sofístico em detrimento do dogmatismo, nos forneceu ferramentas para tomarmos ciência da necessidade de uma revisão sobre o processo, sua estrutura e seu papel.
Antes de mero instrumento para resolução de conflitos individuais e pacificação social, o processo é poderoso instrumento de transformação da realidade e materialização dos direitos e valores constitucionais, promovendo a legitimação do exercício do poder jurisdicional e justificando a existência e a presença do Estado. Por isso, ele deve ser pensado em vista da jurisdição (dimensão pública) e não da ação (dimensão privada).
Como o processo deve estar a serviço da jurisdição, legitimando-a e inserindo em seu exercício os valores constitucionais, ele deve ser pensado a partir da premissa da efetividade da jurisdição, ou seja, deve buscar a justiça material do caso concreto no mais breve tempo possível.
Daí deflui que o processo deve ser pensado sob a ótica de uma funcionalidade teleológica. O dogmatismo tem sua importância em qualquer ciência, mas não pode servir de empecilho à necessidade de constante revisão das feições do processo, visando adequá-lo à realidade sobre a qual opera e às expectativas dos cidadãos.
Exatamente por que ele é um amálgama de interesses das partes e do Estado-Juiz, a ação e a relação processual são condicionadas a um gabarito. A atividade de saneamento consiste na permanente fiscalização da conformação do exercício do direito de ação e da relação processual dele originada a este gabarito. Embora conduzida desde o exercício do direito de ação e durante toda a relação processual, há uma fase ideal para o saneamento, que ocorre, no processo de conhecimento, após a resposta do réu.
A preclusão, de seu turno, é instrumento de asseguração da estabilização do processo e da continuidade de seu desenvolvimento rumo ao fim que se destina. Inicialmente concebida em benefício da certeza jurídica, tendo em vista, especialmente, o interesse das partes, a preclusão vem paulatinamente sendo relativizada quando em voga conteúdo de ordem pública.
Na esteira deste pensamento, concebe-se a imprecluibilidade absoluta destas questões, que podem mesmo ser novamente decididas no primeiro grau pelo magistrado.
Esta é a solução defendida pela maioria da doutrina e jurisprudência. Parece-me, todavia, que permitir-se que, após proferida decisão, reveja o mesmo julgador do primeiro grau o anterior posicionamento é uma solução que, além de produzir incerteza jurídica, conspira contra a objetividade e a celeridade processuais. Passamos a ter uma situação em que a decisão de saneamento está condicionada à sentença. Em termos de processo de conhecimento, onde basicamente o que se busca é, antes de tudo, a definição e a estabilização da lide, uma decisão que pode ser modificada a qualquer momento é algo absolutamente improdutivo. No processo de execução, voltado ao escopo satisfativo no plano concreto, mais se afigura descabida e tumultuária uma decisão instável.
Dir-se-á que no segundo grau as questões poderão ser revistas, seja por força de apelação ou reexame necessário. De fato, mas neste caso a revisão está no desdobramento do procedimento como algo previsível. A revisão em primeiro grau e a qualquer momento encontra-se em situação diversa, e causa o desprestígio da decisão de saneamento tomada na fase indicada para tanto.
A preclusão sobre as decisões tomadas em primeiro grau induz a marcha do processo dentro da previsibilidade e estabilidade que deve norteá-la, e traduz um imperativo lógico do procedimento.
Desta forma, não desconsiderando os judiciosos argumentos contrários (que são maioria na doutrina e na jurisprudência, repito), inclino-me a considerar a incidência da preclusão sobre as decisões expressas prolatadas em relação às questões que orbitam em torno da atividade de saneamento. Certamente é uma questão que, por sua importância, ainda demandará muito debate, cujo resultado, espero, contribua para um processo mais célere e efetivo, sem perder de vista os interesses públicos fundamentais que nele se condensam e interagem.
9- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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-STRECK, Lênio; Hermenêutica Jurídica e (m) Crise, Livraria do Advogado, Porto Alegre.
-THEODORO JÚNIOR; Humberto; Curso de Direito Processual Civil, 21a edição, Rio. Forense, 1997, v. I.
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-TORNAGHI, Hélio; A Relação Processual Penal, 2ª edição, Editora Saraiva, São Paulo, 1987.
-ZAVASCKI, Teori Albino; Antecipação da Tutela, São Paulo, Saraiva, 1997.
Notas
01
Sob certo ponto de vista, a institucionalização e a paralização do conflito estabelecido em vista de determinado direito material representa um importante componente de pacificação social, tornando Judiciário como a alternativa legítima de resolução de problemas. Todavia, esta paralização que decorre do tempo necessário à produção da solução, seja ela acertamento ou execução, tem um espectro dentro do qual opera com utilidade, e que superado induz uma situação onde a institucionalização do conflito se torna contraproducente, perpetuando a incerteza e o atrito.02
Até mesmo edifícios aparentemente inabaláveis das ciências chegaram a um ponto de indeterminação. Temos o exe4mplo da Física. Por séculos a concepção humana baseou-se na estruturação de um espaço-tempo euclidiano, fruto da física newtoniana. A Relatividade Geral e Especial primeiramente introduziu a variação do tempo em vista da velocidade e posteriormente dimensionou um espaço-tempo curvo pela gravidade, subvertendo noções que nos pareciam tão sólidas. Por fim, mais recentemente, a Mecânica Quântica parte dos princípios da indeterminação de Heisenberg (Principles of Quantum Mechanics, 1930), e da complementaridade, de Niels Bohr, onde a certeza passa a virtualmente não mais existir, dependendo o resultado de uma observação do observador e do momento considerado.03
Ovídio Baptista da Silva, Jurisdição e Execução na Tradição Romano-Canônica, 2ª edição, Editora revista dos Tribunais, São Paulo, 1997, p. 131.04
Cássio Scarpinella Bueno, Execução Provisória e Antecipação da Tutela, Dinâmica do efeito suspensivo da apelação e da execução provisória: conserto para a efetividade do processo, Editora Saraiva, 1999, p. 11, ressalta: "Portanto, diante de um Estado que tinha como única função garantir a liberdade dos indivíduos, o processo civil somente poderia ser concebido como instrumento existente à disposição das partes para tutelar e garantir esta liberdade. Daí que o processo civil chamado tradicional – aliás, tradição não tão remota dos dias atuais – nada mais era do que reflexo das próprias afirmações de direitos dos indivíduos enquanto tais"05
A respeito, menciona Lênio Streck, Hermenêutica Jurídica e (m) Crise, Livraria do Advogado, Porto Alegre, p. 57, reportando-se à doutrina de Warat, acerca do "sentido comum teórico em que o jurista se vê imerso: "O sentido comum teórico ‘coisifica’ o mundo e compensa as lacunas da ciência jurídica. Interioriza – ideologicamente – convenções lingüísticas acerca do Direito e da sociedade. Refere-se à produção, à circulação e à ‘consumação’ das verdades nas diversas práticas de enunciação e de escritura do Direito, designando o conjunto das representações, crenças e ficções que influenciam, despercebidamente, os operadores do Direito. Traduz-se em uma ‘para-linguagem’,situada depois dos significantes e dos sistemas de significação dominantes, que ele serve de forma sutil, para estabelecer a ‘realidade’ jurídica dominante. É o local dos ‘segredos."06
A propósito, o magistério de Cândido Rangel Dinamarco, A Instrumentalidade do Processo, 6a edição Malheiros, São Paulo, 1998, p. 21, in verbis: "Com tudo isso, chegou o terceiro momento metodológico do direito processual, caracterizado pela consciência da instrumentalidade como importantíssimo pólo de irradiação de idéias e coordenador dos diversos institutos, princípios e soluções. O processualista, sensível aos grandes problemas jurídicos, sociais e políticos do seu tempo e interessado em obter soluções adequadas sabe que agora os conceitos inerentes a sua ciência já chagaram a níveis mais do que satisfatórios e não se justifica mais a clássica postura metafísica consistente nas investigações conceituais destituídas de endereçamento teleológico". Em outro trecho, conclui, com precisão: "Aprimorar o serviço jurisdicional prestado através do processo, dando efetividade aos seus princípios formativos (lógico, jurídico, político, econômico), é uma tendência universal, hoje. E é justamente a instrumentalidade que vale de suficiente justificação lógico-jurídica para essa indispensável dinâmica do sistema e permeabilidade às pressões axiológicas exteriores: tivesse ele seus próprios objetivos e justificação auto-suficiente, razão inexistiria, ou fundamento, para pô-lo à mercê das mutações políticas, constitucionais, sociais, econômicas e jurídico-substanciais da sociedade" (op. cit, p. 24).07
A crise de jurisdição pode ser identificada como o fenômeno que se caracteriza pela incapacidade de sistema processual e judiciário dar vazão, com a velocidade necessária, a uma significativa quantidade de novas demandas. A ineficácia da saída jurisdicional, quer seja pelo seu custo, pela demora ou pela ausência de instrumentos adequados conduz ao generalizado descrédito da instância jurisdicional como legítimo foro de pacificação social. O resultado prático é a existência de direitos violados sem uma resposta satisfatória ou a produção de uma desigualdade em vista das possibilidades de cada um de suportar os custos do processo, em sentido não exclusivamente financeiro. Esta crise apresenta duas dimensões visualizáveis. Uma formal, diz respeito à adequação dos instrumentos processuais, e vem sendo objeto das ondas de reformas do CPC. A outra é a dimensão material e diz respeito à estruturação material do Poder Judiciário, das Defensorias Públicas e do Ministério Público.08
Cássio Scarpinella Bueno, Execução Provisória e Antecipação da Tutela, Dinâmica do efeito suspensivo da apelação e da execução provisória: conserto para a efetividade do processo, cit., p. 10 pondera: "De uma posição neutra, onde o Estado (o então Estado liberal) deveria limitar-se a somente assegurar a liberdade de cada indivíduo (o direito subjetivo enquanto invocado por este ou aquele indivíduo),passou o Estado a ter de garantir certos direitos não somente aos indivíduos considerados como tais, mas à sociedade, a conjuntos de pessoas, que passaram a ser identificados pelas características próprias desses mesmos grupos. Temos aqui, pois, um Estado intervencionista".09
Teori Albino Zavascki, Antecipação da Tutela, Editora Saraiva, São Paulo, 1997, p. 2, referindo-se especificamente ao CPC de 1973, assevera: "Bem se vê, pois, que a estrutura original do Código de 1973, moldada para atender demandas entre partes determinadas e identificadas, em conflitos tipicamente interindividuais, já não espelha a realidade do sistema processual civil". O divórcio entre um processo neutralista e a realidade social está indubitavelmente relacionado à miopia do método científico das ciências exatas aplicado a uma ciência social. A respeito, foi muito feliz Ovídio Baptista da Silva, Jurisdição e Execução na Tradição Romano-Canônica, p. 128, quando afirma: "A suposição de que a ciência do direito pudesse criar , através da razão, como pretende Leibniz, ‘verdades eternas’ é a responsável pelo extraordinário divórcio entre o processo civil e a vida que se observa na experiência contemporânea."10
Marcelo Colombelli Mezzomo, Jurisdição, Ação e Processo à luz da Processualística Moderna: Para onde caminha Processo, Revista Forense, Rio de Janeiro, nov-dez de 2004, v. 376, p. 171.11
Conforme lembra Hélio Tornaghi, A Relação Processual Penal, 2a edição, Editora Saraiva, São Paulo, 1987, p. 245, "O nome condições da ação vulgarizou-se no Brasil, provavelmente por influência de Liebman, que viveu entre nós, e de Chiovenda, cuja obra aqui se divulgou com tradução feita por J. Guimarães Menegale e que foi adotada pelo mesmo Liebman". É fato notório a influência de Liebman sobre Alfredo Buzaid, idealizados do CPC de 1973.12
13
A tutela tipo é a tutela pretendida pelo pedido e que se amolda ao gabarito de tutelas passíveis de serem deferidas ao autor. No processo de conhecimento é uma sentença condenatória, executiva, declaratória, mandamental ou constitutiva. No processo de execução, é a satisfação de uma obrigação de fazer ou não fazer, de dar coisa e de pagamento de quantia certa. No processo de execução, é o acautelamento da eficácia de outro processo.14
Ovídio Baptista da Silva, Curso de Processo Civil, 3a edição, Sérgio Antônio Fabris Editor, Porto Alegre, 1996, v. 1, p. 31.15
Código de Processo Civil Comentado e legislação processual civil extravagante em vigor, 4a edição, Editora revista dos Tribunais, 1999, p. 373.16
Humberto Theodoro Júnior, Curso de Direito Processual Civil, 21a edição, 1997, Forense, Rio de Janeiro, v. 1, p. 39-40.17
Ovídio Baptista da Silva, Curso de Processo Civil. cit., p. 33-35.18
Segundo Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery. Código de Processo Civil Comentado e legislação processual civil extravagante em vigor cit., p. 1866, o caso, em vista dos direitos homogêneos é, de substituição processual. Já em relação aos direitos difusos coletivos, há legitimação autônoma, concorrente e disjuntiva.19
Código de Processo Civil Anotado; 9a edição, Editora Forense, Rio de Janeiro, 2005, p. 8.20
Com este teor, as Súmulas nº 269 e 271 do STF.21
A jurisprudência do STJ e do STF tem admitido a presença do fundamento de inconstitucionalidade na ação civil pública, contanto que não sirva de subterfúgio para mascarar uma violação à competência para o controle concentrado de constitucionalidade. Assim, por exemplo, decidiu o STJ que: "É possível a declaração incidental de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos em sede de ação civil pública, nos casos em que a controvérsia constitucional consista no fundamento do pedido ou na questão prejudicial que leve à solução do bem jurídico perseguido na ação" (REsp 401554 / DF, DJ 26.05.2006 p. 237, Ministro João Otávio de Noronha). No STF, o julgamento do AI 189.601 AGR, relator o Ministro Moreira Alves, DJ de 03/10/97, conclui que: "Não se admite ação que se intitula ação civil pública, mas, como decorre do pedido, é, em realidade, verdadeira ação direta de inconstitucionalidade de atos normativos municipais em face da Constituição Federal, ação essa não admitida pela Carta Magna." A respeito, sugiro uma consulta ao meu "Introdução ao Controle de Constitucionalidade, Difuso e Concentrado", disponível nos sites http://www.juz.com.br, http://www.advogado.adv.br, e http://www.jurid.com.br, e no CD JURISPLENUM, edição 88, 2° volume.22
Ver por todos, Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pelegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, Teoria Geral do Processo, 14ª edição, Malheiros, São Paulo, ps. 257-258.23
Isso porque o Estado é o grande "devedor" da atualidade. Estudos indicam que em alguns casos, as lides envolvendo o Estado alçam a 70 das causas que tramitam em determinada Justiça, sobretudo em causas previdenciárias e tributárias. Isso se deve, de um lado, à ampla gama de direitos que a constituição social confere aos cidadãos, e, de outro, a uma melhoria no nível de conhecimento da população em geral, que conhece melhor seus direitos e a forma de fazê-los valer.24
Conforme Nelson Nery Júnior, Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, 6ª edição, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 2000, p. 102: "A CF/88 não repetiu a ressalva contida no texto revogado, de modo que na mais se permite, no sistema constitucional brasileiro a denominada jurisdição condicionada. Já se decidiu que não é de acolher-se a alegação da Fazenda Pública, em ação judicial, de que não foram esgotadas as via administrativas pata obter-se o provimento que se deseja em juízo. Apenas quanto às ações relativas à disciplina e às competições esportivas é que o texto constitucional exige, na forma da lei, o esgotamento das instâncias da justiça desportiva (CF, art. 217, parágrafo 1º)"25
Quanto a esta questão, ver o meu "O Exaurimento da Instância Administrativa como condição para o Interesse Processual", disponível nos sites http://www.ufsm.br/direito e http://www.jurid.com.br. Na jurisprudência, cita-se recente julgamento do STF, onde se assentou que: "Quanto à alegada preclusão, o prévio uso da via administrativa, no caso, não é pressuposto essencial ao exercício do direito de interposição do mandado de segurança. Condicionar a possibilidade do acesso ao Judiciário ao percurso administrativo, equivaleria a excluir da apreciação do Judiciário uma possível lesão a direito individual, em ostensivo gravame à garantia do art. 5º, XXXV da Constituição Federal."(MS 23.789, voto da Min. Ellen Gracie, DJ 23/09/05). Ainda no âmbito do STF, é pertinente uma consulta ao informativo nº 349, onde consta: "Processo Fiscal: Utilização Simultânea das Vias Administrativa e Judicial.O Tribunal iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do TJ/RJ, que negara provimento à apelação da recorrente e confirmara sentença, que indeferira mandado de segurança preventivo por ela impetrado, sob o fundamento de impossibilidade da utilização simultânea das vias administrativa e judicial para discussão da mesma matéria, com base no parágrafo único, do art. 38, da Lei 6.830/80 (‘Art 38. A discussão judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública só é admissível em execução, na forma desta Lei, salvo as hipóteses de mandado de segurança, ação de repetição do indébito ou ação anulatória do ato declarativo da dívida, esta precedida do depósito preparatório do valor do débito, monetariamente corrigido e acrescido dos juros e multa de mora e demais encargos. Parágrafo único. A propositura, pelo contribuinte, da ação prevista neste artigo importa em renúncia ao poder de recorrer na esfera administrativa e desistência do recurso acaso interposto.’). O Min. Marco Aurélio, relator, tendo em conta o entendimento do STF no sentido de independência das esferas administrativa, cível e criminal, nas quais a atuação pode ser simultânea, ressalvada a previsão do art. 1.525, do CC/16, conheceu e deu provimento ao recurso para declarar a inconstitucionalidade do parágrafo único, do art. 38, da Lei 6.830/80, e determinar o prosseguimento do processo administrativo — que, na espécie, fora obstado em decorrência da tramitação de outro mandado de segurança anteriormente impetrado pela recorrente. Entendeu o relator que o dispositivo mencionado ofende o direito de livre acesso ao Judiciário, assegurado pelo art. 5º, XXXV, da CF. Acompanhou o voto do relator o Min. Carlos Britto. Os Ministros Cezar Peluso e Joaquim Barbosa divergiram por considerar que o art. 38, da Lei 6.830/80 apenas veio a conferir mera alternativa de escolha de uma das vias processuais. Após, pediu vista o Min. Gilmar Mendes. Aplicou-se a mesma decisão para outros recursos extraordinários. (RE 233582/RJ; RE 389893/RJ; RE 267140/RJ; RE 234798/RJ; RE 234277/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, 27.5.2004)."26
Sobre o tema ver, de minha autoria, "Cautelares Satisfativas?", "A Fungibilidade Cautela-Antecipação e o Artigo 273, § 7º, do Código de Processo Civil - Reflexões e Condicionantes", disponíveis nos sites http://www.juz.com.br e http://www.jurid.com.br; e "Refletindo Sobre a Antecipação dos Efeitos da Tutela", revista Ciência Jurídica, Belo Horizonte, nº 125, ps. 11-49, também disponível nos mesmos sites.27
Conforme célebre doutrina de Pontes de Miranda, os órgão de gestão e administração das pessoas jurídicas não as representam, mas presentam, pois representação pressupõe pessoas diversas, o que não ocorre neste caso, pois o órgão é a pessoa jurídica.28
Ver a súmula 644 do STF.29
Sobre este aspecto, ver o meu "A Quarta Face do Acesso à Justiça", disponível no site http://www.jurid.com.br, onde dentre outros aspectos, advogo a necessidade de uma educação para a cidadania pata que a população possa entender a função de cada órgão, quais são seus direitos básicos e como fazer com que sejam respeitados, o que carece de providências como a estruturação das Defensorias Públicas.30
A respeito, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery. Código de Processo Civil Comentado e legislação processual civil extravagante em vigor cit, p. 473, apostilam que a falta de presença do litisconsorte necessário "não se trata de ilegitimidade de parte (CPC 267VI), porque o litisconsorte que se encontra no processo é parte legítima ara nele figurar; apenas não pode obter o provimento jurisdicional de mérito, se desacompanhado de seu litisconsorte necessário".31
É incorreto falarmos em "interesse privado" na conformação da nulidade relativa. É que interesse privado é antônimo, no caso, de interesse público, e pode ocorrer que o interesse de uma das partes em juízo tenha natureza pública. Mas o interesse visado pela norma é o interesse público imediatamente visível na relação processual. Ao se referir a interesse privado, na verdade estamos mencionando o interesse das partes, que se é o contraponto do interesse do Estado-Juiz. Este interesse das partes poderá ter natureza pública ou privada, não importa. O que é fundamental é que se o interesse protegido é preponderantemente das partes (sejam de natureza pública ou privada), sendo a norma cogente, há nulidade relativa. Se a norma violada é cogente e o interesse público, interesses estes do Estado-Juiz (necessariamente públicos, portanto), que busca a prevalência dos valores constitucionais na condução do processo, há nulidade absoluta.32
A respeito das condições da ação e pressupostos processuais no processo de execução, ver o meu "A Exceção de Pré-Executividade e seu emprego diante da Teoria Geral do Processo", Suplemento Eletrônico da Revista Forense, nº 377, p. 569 e seguintes, disponível, também, nos sites http://www.jus.com.br e http://www.jurid.com.br.33
Ações, pretensões e pedidos não precluem. Decaem ou prescrevem.34
Curso de Processo Civil, 3a edição, Sérgio Antônio Fabris Editor, Porto Alegre, 1996, v. 1, p. 174.35
Segundo Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery. Código de Processo Civil Comentado e legislação processual civil extravagante em vigor cit, .p. 614: "Os motivos indicadores do impedimento do juiz são de natureza objetiva, caracterizando presunção iure et de iure, absoluta, de parcialidade do magistrado (Arruda Alvim CPCC, VI, 26; Barbi, Comentários, 718, 335)"36
Antônio Janyr Dall´Agnol Júnior, Invalidades Processuais, Editora Lejur, p. 54.37
Idem ibidem, p. 55.38
Curso de Direito Processual Civil, 21a edição, 1997, Forense, Rio de Janeiro, v. 1, p. 413-414.39
Galeno Lacerda; Despacho Saneador, 3ª edição, Sérgio Antônio Fabris Editor, 1990, p. 177.40
Ovídio Baptista da Silva, Curso de Processo Civil cit., p. 174.41
Na jurisprudência, cita-se, ad exemplum, a Apelação e Reexame Necessário nº 70012575460, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Naele Ochoa Piazzeta, Julgado em 10/11/2005.42
3ª Turma do STJ, DJ 23.05.2005 p. 266.43
DJ 01.08.2000 p. 21744
"Transita em julgado o despacho saneador de que não houve recurso, excluídas as questões deixadas, explícita ou implicitamente, para a sentença."45
J.J. Calmos de Passos, Comentários ao Código de Processo Civil, 8a ed., Rio de Janeiro, Forense, 1999, v. III, ps. 516 e seguintes.46
Eventualmente a hipótese poderá ser de agravo de instrumento, quando, por exemplo, for uma parte excluída. Obviamente não tem sentido manejar neste caso agravo retido.47
Foi o estabelecido no julgamento do Resp 343.750/MG, DJ de 10/02/2003, p. 215, relatado pelo Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, em cuja ementa consta: "I - Tratando-se de matéria indisponível, não há preclusão para o tribunal de segundo grau, mesmo havendo decisão anterior de primeiro grau irrecorrida e ainda que a parte não tenha suscitado a questão. II - Inaplicável o enunciado nº 424 da súmula/STF à matéria que deve ser apreciada de ofício." Com o mesmo escólio, o Resp 641.904/DF, DJ de 06/02/3006, p. 201, relator o Ministro Teori Albino Zavascki, em cuja ementa lê-se: "Quando eventual nulidade processual ou falta de condição da ação ou de pressuposto processual impede, a toda evidência, que o julgamento do recurso cumpra sua função de ser útil ao desfecho da causa, cabe ao tribunal, mesmo de ofício, conhecer da matéria, nos termos previstos no art. 267, § 3º e no art. 301, § 4º do CPC. Nesses limites é de ser reconhecido o efeito translativo como inerente também ao recurso especial."48
Em outra ocasião já ressaltei: "Quando sobreveio o Estado Liberal, a jurisdição tomou a feição que seria mais útil ao sistema organizacional vigente, prestigiando o cunho declaratório da sentença, a separação rígida direito-processo e fundamentando-se no sistema sentença condenatória execução forçada, adquirindo uma postura introspectiva que distanciou o processo das realidades em que ele deveria operar. Isso na causa rubores em um Estado que se limitava a garantir direitos no plano meramente formal."(Jurisdição, Ação e Processo à luz da Processualística Moderna: Para onde caminha Processo, revista Forense, Rio de Janeiro, v. 376, p. 172).