Resumo: O presente artigo trabalha o seguinte tema A corrupção e sua relação com os crimes contra a humanidade pelo viés da violação dos direitos humanos tem como por objetivo trazer a relação da corrupção com os crimes contra a humanidade pelo viés dos direitos humanos o que é um sério obstáculo ao desenvolvimento e à governança em países democráticos como o Brasil. Como método analítico, o texto examina, além de esclarecer o conceito de corrupção, como as ações corruptas podem violar os direitos humanos. A princípio será contextualizado o conceito, a tipificação e as características de corrupção. Após, os crimes contra a humanidade, a compreensão dos direitos humanos e a correlação jurídica entre corrupção e violação de direitos humanos. Por um terceiro momento a corrupção no Direito Internacional e suas Convenções e por um quarto momento a correlação do direito fundamental à vida, o que levou a resposta positiva de que o crime de corrupção previsto no Código Penal pode ser sim classificado como um crime contra a humanidade com base na Declaração dos Direitos Humanos e da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção e da Convenção Interamericana contra a corrupção.
Palavras-chave: Corrupção; Crimes Contra Humanidade; Direitos Humanos; Direito Internacional.
1 INTRODUÇÃO
O assunto trabalhado é a corrupção em relação aos direitos humanos. Para aprofundamento definiu-se o tema A corrupção e sua relação com os crimes contra a humanidade pelo viés da violação dos direitos humanos e por delimitação do tema os apontamentos da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção e da Convenção Interamericana contra a corrupção.
Assim, o estudo necessitou ter um problema detectado para ser o norteador das pesquisas e solucionar uma dúvida jurídica, sendo este O crime de corrupção previsto no Código Penal pode ser classificado como um crime contra a humanidade com base na declaração dos direitos humanos e das convenções existentes?, e conforme apontado no resumo desse artigo, obteve a resposta afirmativa ao questionamento.
Justifica-se a escolha e trabalho sobre o tema considerando que a naturalização da prática da corrupção promove um tipo de abordagem que se acredita apresentar problemas a seu efetivo controle democrático. Na visão do Direito à corrupção é ilícito retrato de conduta humana que desafia valores éticos os quais devem presidir o manejo da coisa pública. Os atos corruptos podem causar prejuízo aos cofres públicos, levando ao desperdício, a ineficiência por conta do desvio e a diminuição da qualidade de vida do povo, ferindo a dignidade da pessoa humana. E esses fatos possuem relevância para o estudo, pois pouco se encontra em material quanto o prejuízo à vida que a corrupção ocasiona na sociedade. De tal forma, é necessário demonstrar as consequências deletérias dessa prática criminosa para as nações e seus respectivos cidadãos, onde algumas vezes impede de exercer plenamente os direitos civis e políticos, privando-os de seus direitos econômicos e sociais, em qualquer caso criando obstáculos ao progresso e desenvolvimento desses países, prejudicando todos os setores da sociedade e a interferência dos Pactos e Tratados sobre o tema.
O objetivo geral do trabalho é caracterizar o crime de corrupção disposto no código penal como um crime que ultrapassa fronteiras e atinge os direitos humanos e as convenções sobre o tema, e os objetivos específicos baseiam-se em conceituar os termos corrupção, responsabilidade de proteger e crimes contra a humanidade; apresentar a normativa internacional que o brasil é signatário no combate à corrupção; realizar a conexão entre corrupção, direitos humanos fundamentais e internacionais; e, demonstrar os impactos da corrupção para a humanidade.
As linhas teóricas iniciam-se desde o filósofo grego Aristóteles que afirmou que a corrupção é a alteração do estado das coisas, uma modificação, um desvio de conteúdo, assim, podem então afirmar que a corrupção se associa diretamente à ideia de decadência moral e espiritual[3], passando pela análise de autores contemporâneos como Carvalho Ramos que afirma que não é necessário que que ocorra uma série de atos para que se caracterize o crime contra a humanidade, basta que exista essa política ou cenário de ataque sistemático à população civil para que uma única conduta seja considerada um crime contra a humanidade[4], e, Leal e Schneider que concluem que não há dúvidas de que a corrupção está diretamente ligada à violação de direitos fundamentais e humanos, principalmente quando as práticas corruptas são utilizadas como forma de violar todo o ordenamento jurídico, aliás, ter efeitos locais na rede existente de direitos e garantias.
O método geral utilizado foi o Dedutivo: "É o que parte do geral e, a seguir desce ao particular. O raciocínio dedutivo parte de princípios considerados verdadeiros e indiscutíveis para chegar a conclusões de maneira formal[5]. Tendo como pesquisa a forma documental via doutrina, jurisprudência, artigos entre outros.
Observa-se que a proliferação desse delito não tem merecido a devida atenção por parte do direito internacional, havendo a tendência por tratá-lo como um problema de ordem interna que só faz vítimas no Estado em que ocorre. Demonstrar o impacto que pode causar no direito humano e no direito internacional, estendendo as barreiras impostas pelo fenômeno ao desenvolvimento e governabilidade do país e a perda de recursos que poderiam ser aproveitadas pela sociedade brasileira e demonstrar como o tribunal penal internacional puniria esse ato delituoso.
2 A CORRUPÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO
A primeira abordagem do trabalho será demonstrar os aspectos da corrupção do direito brasileiro. Para tanto passar-se-á ao conceito, aspectos da criminologia da corrupção e suas características.
2.1 CONCEITO
Nos tempos atuais o país vive em crise institucional e econômica. A cada dia surge escândalos de corrupção que estabelece na sociedade, população a descrença, desilusão com as instituições e a sensação de impunidade que ainda é bastante percebida. A Corrupção vem do latim corruptio que significa corromper, romper ou deterioração. Segundo o dicionário da língua portuguesa Michaelis[6] corrupção significa ação ou efeito de corromper, decomposição, putrefação, depravação, desmoralização, devassidão, sedução e suborno.
Segundo Norberto Bobbio[7], a corrupção:
É um fenômeno pelo qual um funcionário público é levado a agir de modo diverso dos padrões normativos do sistema, favorecendo interesses particulares em troca de recompensa. Corrupto é, portanto, o comportamento ilegal de quem desempenha um papel na estrutura estadual.
A corrupção está associada à um comportamento que contraria a lei por parte de quem desempenha um papel na estrutura estatal.[8] No ordenamento jurídico a corrupção é classificada em corrupção ativa e passiva. São crimes previstos no Código Penal que são relacionados a ação de oferecer ou aceitar compensações ilícitas para obter vantagens e pessoais.[9] Em ambos os casos o crime de corrupção esse configura na ação consumada do ato no momento em que a proposta de corrompimento é feita independente da participação ou do aceite da outra parte popularmente conhecida como propina ou suborno.[10]
2.2 CRIMINOLOGIA DA CORRUPÇÃO
A criminologia é uma ciência que possui como objeto de estudo dos delitos, dos agentes infratores, das vítimas, do controle social formal e informal, estatal das infrações e a análise da criminalidade.[11] O Código Penal, no art. 59, caput trás o comportamento da vítima como algo necessário para que o juiz estabeleça a pena para a condenação assim necessária.[12]
Conforme o Código Penal a corrupção se classifica como ativa e passiva em seus artigos 317 e 333.[13] A corrupção ativa consiste na ação do agente privado em oferecer vantagens ao funcionário público em troca de benefícios próprios ou de outrem. Quando o crime for cometido por particulares, a corrupção ativa é classificada como um crime praticado por particular contra a administração. Já a corrupção passiva consiste na ação do agente quando solicita ou aceita alguma espécie de benefício podendo ser em forma de dinheiro ou bens em troca da realização de serviços relacionados com sua função pública aceitando para favorecer diretamente o interesse do corruptor.[14]
A lei 12.846 de 1 agosto de 2013 também chamada de Lei Anticorrupção disponibiliza em seu texto a responsabilização administrava e civil de pessoas jurídicas pela prática do crime de corrupção como também os tratados e convenções internacionais promulgados pelo afim de os atos de corrupção e tomar todas as medidas necessárias à responsabilização de pessoas jurídicas pela corrupção de funcionário público estrangeiro de acordo com os seus princípios jurídicos.[15]
2.3 CARACTERÍSTICAS
Conforme texto acima o crime de corrupção se classifica como ativo e passivo. A corrupção passiva se caracteriza por ser um crime próprio, na ação do agente quando solicita ou aceita alguma espécie de benefício podendo ser em forma de dinheiro ou bens em troca da realização de serviços relacionados com sua função pública aceitando para favorecer diretamente o interesse do corruptor.[16] Já a corrupção ativa se caracteriza por ser um crime comum, que consiste na ação do agente privado em oferecer vantagens ao funcionário público em troca de benefícios próprios ou de outrem.[17] Assim a corrupção se caracteriza pela deturpação e perversão de hábitos e costumes tornando-os imorais e antiéticos.
3 DOS CRIMES CONTRA A HUMANIDADE PELO VIÉS DA VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ATINGIDOS PELA CORRUPÇÃO
Nesse capítulo serão apresentados os aspectos da corrupção que ferem os direitos humanos, demonstrando antes quais são os crimes contra a humanidade, o que são os direitos humanos e a correlação jurídica entre esses institutos.
3.1 OS CRIMES CONTRA A HUMANIDADE
Segundo Carvalho Ramos a evolução do conceito de crimes contra a humanidade fez com que esse vínculo com a situação de guerra fosse totalmente extinto. Sendo assim com o passar dessa evolução um crime contra a humanidade poderia ser praticado mesmo não havendo um contexto de guerra.[18]
Em 17 de Julho de 1998 foi formalizado o Estatuto de Roma. Ele foi responsável pela criação do Tribunal Penal Internacional, como também conhecido Tribunal de Haia que foi estabelecido em Haia no ano de 2002 nos Países Baixos que é uma organização independente que julga indivíduos pelo cometimento de determinados crimes.[19]
Logo em seu artigo 1º do Estatuto traz que[20]:
É criado, pelo presente instrumento, um Tribunal Penal Internacional ("o Tribunal"). O Tribunal será uma instituição permanente, com jurisdição sobre as pessoas responsáveis pelos crimes de maior gravidade com alcance internacional, de acordo com o presente Estatuto, e será complementar às jurisdições penais nacionais. A competência e o funcionamento do Tribunal reger-se-ão pelo presente Estatuto.
Sendo assim, como no Estatuto de Londres, o Estatuto de Roma definiu no seu artigo 7º quais seriam esses crimes contra a humanidade[21]. Vale ressaltar um detalhe por Carvalho Ramos o Estatuto de Roma confirmou essa autonomia do crime contra a humanidade, ou seja, não seria mais necessário um contexto de guerra para assim responsabilizar alguém por essas condutas.[22]
São elencados no artigo 7° do Estatuto de Roma quais são os crimes contra a humanidade:
1. Para os efeitos do presente Estatuto, entende-se por "crime contra a humanidade", qualquer um dos atos seguintes, quando cometido no quadro de um ataque, generalizado ou sistemático, contra qualquer população civil, havendo conhecimento desse ataque:
- a) Homicídio;
- b) Extermínio;
- c) Escravidão;
- d) Deportação ou transferência forçada de uma população;
- e) Prisão ou outra forma de privação da liberdade física grave, em violação das normas fundamentais de direito internacional;
- f) Tortura;
- g) Agressão sexual, escravatura sexual, prostituição forçada, gravidez forçada, esterilização forçada ou qualquer outra forma de violência no campo sexual de gravidade comparável;
- h) Perseguição de um grupo ou coletividade que possa ser identificado, por motivos políticos, raciais, nacionais, étnicos, culturais, religiosos ou de gênero, tal como definido no parágrafo 3o, ou em função de outros critérios universalmente reconhecidos como inaceitáveis no direito internacional, relacionados com qualquer ato referido neste parágrafo ou com qualquer crime da competência do Tribunal;
- i) Desaparecimento forçado de pessoas;
- j) Crime de apartheid;
- k) Outros atos desumanos de caráter semelhante, que causem intencionalmente grande sofrimento, ou afetem gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental.[23]
Nesse mesmo artigo é disposto no Estatuto de Roma que essas condutas são crimes contra a humanidade pois quando cometidas abrangem todos os grupos de gênero que quando são cometidos no quadro de um ataque, generalizado ou sistemático, contra qualquer outro civil.[24] Portanto o Estatuto de Roma busca punir aqueles que, em regime ditatoriais ou totalitários que usam a máquina do Estado para promover violações graves de direitos humanos em uma situação de banalização de ataques a população civil.[25]
As principais características dos crimes contra a humanidade são a ausência do nexo necessário com um conflito armado, a ausência de um motivo discriminatório como a condição para a sua caracterização exceto no caso de crime de perseguição, o requisito de um ataque generalizado e sistemático e o elemento relativo (a mens rea).[26]
O Tribunal Penal Internacional no Caso Erdemovic[27] expressou os contornos do crime contra a humanidade considerando a humanidade como vítima que foi adotado no caso em que o tribunal declarou:
Crimes contra a humanidade são graves atos de violência que lesam os seres humanos eliminando o que lhes é mais essencial: vida, liberdade, integridade física, saúde e dignidade. São atos desumanos que, por sua extensão e gravidade, ultrapassam os limites do tolerável pela comunidade internacional, que deve, necessariamente, requerer sua punição. Mas os crimes contra a humanidade também transcendem o indivíduo, uma vez que, quando este vitimado, a humanidade é atacada e negada. Assim, o conceito da humanidade como vítima é o elemento caracterizador dos crimes contra a humanidade.
Para Carvalho Ramos não é necessário que ocorra uma série de atos para que se caracterize o crime contra a humanidade, basta que exista essa política ou cenário de ataque sistemático à população civil para que uma única conduta seja considerada um crime contra a humanidade.[28]
São vários os atos de violação grave de direitos humanos que foram mencionados no artigo 7º no Estatuto de Roma como por exemplo os atos de violação do direito à vida, por meio do homicídio e do extermínio, a escravidão, deportação, ou transferência forçada de população, prisão ou de outra forma de privação da liberdade física grave, em violação das normas fundamentais de direito internacional, tortura, crimes sexuais e agressão sexual, escravização sexual, prostituição forçada, gravidez forçada, ou qualquer outra forma de violência no campo sexual de gravidade comparável, perseguição política, racial, religiosa, nacional, étnico, cultural ou de gênero, ou de função de outros critérios universalmente reconhecidos como inaceitáveis no direito internacional que é o caso de da perseguição à comunidade LGBTQIA+, desaparecimento forçado de pessoas e crime de apartheid e uma cláusula que permite que sejam um crime contra a humanidade quaisquer atos desumanos de caráter semelhante, que causem intencionalmente grande sofrimento ou afetem gravemente a integridade física, saúde física e mental.[29]
3.2 COMPREENDENDO OS DIREITOS HUMANOS
No Brasil, os direitos humanos são garantidos pela Constituição Federal de 1998 que foi um grande avanço jurídico. A Constituição garante direito civis políticos, econômicos, sociais e culturais dos cidadãos brasileiros. Tais garantias aparecem no artigo 1º que estabelece a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político. No artigo 4º estabelece por exemplo a prevalência dos direitos humanos. Já no artigo 5º é estabelecido o direito à vida, à privacidade, à igualdade, a liberdade, à segurança e nesse mesmo artigo estabelece direitos fundamentais importantes, sejam eles coletivos ou individuais.[30] A Constituição Federal é o marco mais evidente dos direitos humanos no Brasil.
Para o Unicef os direitos humanos pertencem a todos e todas e a cada um de nós igualmente. Os direitos são universais, inalienáveis, indivisíveis, interdependentes, inter-relação, iguais, não discriminatórios, participativos, inclusivos e que os Estado são responsáveis e detentores de deveres e que tem de cumprir as normas e padrões legais consagrados nos instrumentos de direitos humanos.[31] A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 10 de dezembro de 1948 em seu preâmbulo reconhece que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direito. Tendo direito à vida, ser reconhecidos iguais perante a lei, à liberdade e a segurança.[32]
Segundo Carvalho Ramos os direitos humanos constituem direitos indispensáveis para uma vida humana pautada na liberdade, igualdade e dignidade pois os direitos humanos são direitos essenciais e indispensáveis à vida digna.[33] Kant, no final do século XVIII, defendeu a existência da dignidade intrínseca a todo ser racional, que não tem preço ou equivalente.[34] Na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem de 1948 traz em seu preâmbulo a proteção internacional dos direitos do homem e os direitos essenciais do homem.[35]
Os direitos humanos, bem como foi exposto acima, são direitos inerentes a todas as pessoas, independentemente da raça, sexo, nacionalidade, etnia, idioma, religião ou qualquer outro status. Eles estão normatizados no Direito Internacional no âmbito da ONU, na Carta Internacional dos Direitos humanos, integrada pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, no âmbito regional, na Convenção Americana de Direitos Humanos e estão normatizados também na Constituição Federal de 1988.[36]
Os direitos humanos servem para ressaltar e evidenciar que a existência de uma pessoa é de um valor absoluto e que nada é mais superior ou equivalente a essa premissa. Sendo assim a dignidade da pessoa humana é tida como valor incondicional, imensurável, insubstituível e que não admite equivalência.[37]
3.3 A CORRELAÇÃO JURÍDICA ENTRE CORRUPÇÃO E VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS
É necessário determinar quando os direitos humanos são violados por atos de corrupção, para determinar a relação de causa e efeito. Desde que seja demonstrado que as ações ou omissões de um Estado não estão em conformidade com as normas nacionais e internacionais de direitos humanos, o escopo e o conteúdo das obrigações de direitos humanos devem ser determinados com base em normas internas e tratados internacionais, direitos e costumes ou princípios gerais de direito.[38]
Existem três níveis de obrigações de direitos humanos para os estados: respeitar, proteger e cumprir. A obrigação de proteger impõe ao Estado a obrigação de limitar a prática de quaisquer atos que privem a pessoa do direito ao benefício ou da capacidade de praticá-los. Por outro lado, a obrigação de proteger inclui a obrigação do Estado de prevenir danos irreparáveis de membros da sociedade, de forma que países devam evitar violações de direitos humanos em alguns terços, evitar e eliminar incentivos para violar os direitos de terceiros e fornecer acesso a soluções legais em caso de violação. O não cumprimento dessas obrigações pode levar à responsabilização do Estado em casos de corrupção. Além disso, as obrigações de conformidade exigem que os Estados tomem medidas para garantir que suas necessidades primárias sejam atendidas, especialmente quando eles não podem garantir que suas necessidades primárias sejam atendidas.[39]
A corrupção pode levar indiretamente a violações de direitos humanos quando é uma condição necessária para a violação, é um elemento essencial em uma cadeia de comportamento que acaba levando a violações de direitos humanos. A corrupção também pode ser uma violação distante dos direitos humanos, portanto, a corrupção é um dos fatores que levam a essa violação.[40] É importante observar como violações de direitos humanos e atos de corrupção podem estar conectados. Para Leal e Schneider não há dúvidas de que a corrupção está diretamente ligada à violação de direitos fundamentais e humanos, principalmente quando as práticas corruptas são utilizadas como forma de violar todo o ordenamento jurídico, aliás, ter efeitos locais na rede existente de direitos e garantias.[41]
Dando continuidade a essa discussão, é costume que um ato de corrupção viole diretamente um direito, ou seja, não respeita uma obrigação do país em relação a esse direito. Da mesma forma, um direito é violado diretamente pela corrupção quando um funcionário ou organismo público age para impedir que terceiros tenham acesso e usufruam desse direito. Por outro lado, não se deve esquecer que as práticas corruptas podem infringir indiretamente certos direitos. A observação de um órgão público, ao evitar denúncias de corrupção passiva, ameaça à integridade física dos jornalistas e decreta a censura da mídia. Essas atitudes afetam indiretamente os direitos consagrados na Constituição Federal de 1988, como o direito à liberdade de expressão e à integridade física e moral das vítimas.[42]
Na esfera internacional, a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção se preocupa com as ameaças representadas pela corrupção, pois promove a insegurança social e a destruição das instituições democráticas, além de comprometer o desenvolvimento do Estado de direita. Da mesma forma, o Conselho da Europa vê a corrupção como um ataque ao governo, ao judiciário, à economia e à burocracia do Estado.
Além disso, o Conselho Internacional de Política de Direitos Humanos define claramente sua posição sobre o impacto negativo na esfera social. Para esta ONG, que inclui um pequeno grupo de defensores dos direitos humanos díspares, a corrupção cria uma verdadeira provocação à discriminação nas suas mais diversas formas, privações, tiram rendimentos de pessoas vulneráveis e impedem-nas de gozar dos seus direitos políticos e sociais, civis, direitos culturais e econômicos.[43]
Nesse sentido, a Resolução nº 1/18 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos indica que a corrupção na gestão dos recursos públicos impede a capacidade dos governos de atingir as metas relacionadas à saúde, educação e saúde, água, transporte e saneamento são necessários para a realização dos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais e especialmente das populações vulneráveis.
Sob essa mesma ótica Miranda[44] diz que:
Inegavelmente, muito pior que o ladrão, o homicida, enfim, do criminoso comum, é o corrupto, o dilapidador dos cofres públicos, da moral administrativa, pois esse último, com sua conduta ilícita, acaba atingindo o direito de um número indeterminado de pessoas, impossibilitando investimentos em diversas áreas e projetos sociais, como, por exemplo, os relativos à segurança pública, no combate à fome, à educação, saúde, à construção e reforma de escolas, hospitais etc., enfim, acaba-se privando milhões de brasileiros de suas necessidades básicas, fundamentais para a sobrevivência da pessoa humana.
Por essas razões, a corrupção atenta contra os princípios de igualdade e não discriminação, fundamentais para a organização democrática de um Estado, afetando pessoas de grupos do interior do país, circunstâncias discriminatórias, como imigrantes, pobres, povos indígenas, refugiados etc. Como se pode perceber, não gozam de seus direitos da mesma forma que o resto da sociedade, em grande parte devido à sua adaptação à linguagem e às práticas sociais, tornando-se facilmente vítimas de abusos. Segundo Campos e Bascuñan[45]:
Membros de grupos marginalizados são mais vulneráveis à corrupção, pois não têm a possibilidade de cumprir ou fugir das condições extrajurídica impostas a eles para exercer seus direitos. A discriminação contra a corrupção estrutural é ainda mais intensa, pois é seletiva, como muitas de suas formas operam através de marcadores sociais como etnia, status socioeconômico, gênero, orientação sexual, etc. Em outras palavras, corrupção, especialmente estrutural, tende a preferir o mais fraco, o que ao mesmo tempo reforça sua condição de marginalidade.
Partindo um pouco mais além, não se pode esquecer que o impacto da corrupção pode afetar vários direitos humanos ao mesmo tempo, devido às relações recíprocas que existem entre eles. Por exemplo, observe que se um ato de depravação impede uma família de ter uma casa própria, certamente outros direitos como alimentação, água, saúde e o mais importante, dignidade humana também deve ser afetada.[46]