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Processo administrativo disciplinar:

presença facultativa de advogado e obrigatória de servidor defensor dativo apenas na hipótese de revelia na fase de defesa

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09/03/2007 às 00:00
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2.Da ação direta de inconstitucionalidade de dispositivo que exigia a presença de advogado nos juizados especiais

Na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1127-8-DF, proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros, questionando a constitucionalidade de dispositivos da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, entre os quais o inc I do art. 1º, que reputa privativo de advocacia "a postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais", o Supremo Tribunal Federal concedeu liminar para suspender a eficácia desse dispositivo, por inaplicável aos Juizados de Pequenas Causas, à Justiça do Trabalho e à Justiça de Paz.

Por esclarecedor e relevante, transcreve-se, a seguir, trecho do relatório do Ministro Relator, onde é demonstrado que a ausência de advogado nos processos judiciais em epígrafe não constitui violação do princípio da ampla defesa, que enseje nulidade, cuja fundamentação, por analogia, se aplica aos processos administrativos, entre os quais o disciplinar, observando-se que a concessão da liminar se deu em 06/10/94, antes, portanto da promulgação da Emenda Constitucional nº 24, de 9/12/99, que deu nova redação ao art. 116 da Carta Magna, para excluir os juízes classistas temporários, representantes dos empregados e empregadores, da composição das Juntas de Conciliação e Julgamento, cuja jurisdição, atualmente, é exercida apenas por um juiz singular:

Essa norma, além de sujeitar a validade do processo judicial à capacidade postulatória consubstanciada no binômio parte-advogado, contraria os incisos I e II do artigo 98 da Constituição. Cria um pressuposto processual incompatível com singeleza que essas normas quiseram emprestar aos juizados especiais e à justiça de paz, cujas atividades são voltadas para causas regidas pelos princípios da simplicidade, da informalidade, da oralidade e da celeridade, permitindo a pronta tutela de interesses de pouca expressão.

Exigindo a representação da parte por advogado, a norma impugnada compromete a efetividade das normas constitucionais apontadas, afrontando os seus desígnios quando impõe essa obrigatoriedade ao jurisdicionado para postular diante dos juizados especiais, que são providos por juízes "togados, ou togados e leigos", e da justiça de paz, que se constitui por cidadãos eleitos. A intenção desses dispositivos constitucionais foi visivelmente permitir que, naquelas hipóteses, possam obter a jurisdição de modo mais direto e eficaz. A presença de conciliadores e juízes leigos, não necessariamente bacharéis, nesses juizados especiais e na justiça de paz, faz com que a presença obrigatória do advogado se torne incompatível com aqueles, que são desprovidos de conhecimentos técnicos para apreender a postulação. (grifo nosso).

Essas considerações, entende a requerente, rompendo a tradição vitoriosa, alcançam também a necessidade de representação do reclamante perante a Justiça do Trabalho de primeira instância, esses também compostos por maioria de juízes classistas e leigos, conforme o artigo 116 da Constituição, que também o dispositivo argüido contrariou. (grifo nosso)

Também ofendem, o dispositivo questionado, os incisos XXXIV, a, e XXXV, do artigo 5º da Constituição porque, no tocante aos órgãos trabalhistas de primeira instância, aos juizados especiais não penais e à justiça de paz, criou condição restritiva do direito de petição e de acesso à Justiça, ao instituir pressupostos processuais incompatíveis com a estrutura constitucional daqueles órgãos.

Conclui a requerente, em relação à norma impugnada: "Se a opção política, contida na regra impugnada, é censurável porque se destina, claramente, apenas a ampliar o mercado de trabalho da nobre classe dos advogados, sem outras preocupações, que a realidade brasileira torna impositivas, aquele preceito não resiste ao confronto com os arts. 98, I e II, 116 e 5º, XXXIV, a, e XXXV da Constituição Federal, tornando-se indispensável a declaração de sua inconstitucionalidade.

No exame da matéria, o Ministro Relator assim se manifestou em seu voto:

Há determinadas ações que, a despeito da sua relevância, podem ser aforadas por qualquer do povo, sem necessidade de possuir pergaminho universitário ou instrumento procuratório. Assim a ação de habeas corpus. Nenhuma Constituição a assegurou, mas está secular e graniticamente incrustado na vida jurídica do país. O STF recebe dezenas e centenas de HC impetrados pelos próprios pacientes e os processa e julga com o mesmo desvelo com que o faz em relação àqueles que trazem o prestígio da assinatura dos mais eminentes advogados. É um encargo oneroso, pois não é incomum que as turmas, durante uma sessão inteira, se ocupem exclusivamente a julgar HC. Mas talvez seja sua atribuição mais bela. Nenhuma Corte Suprema tem esta incumbência, graças à qual o mais miserável dos condenados, recolhido a uma prisão no fundo do Brasil, pode erguer sua voz até o STF. Não creio que alguém, pudesse dar ao art. 133 da Constituição exegese que importasse na supressão desse direito historicamente ligado à defesa da liberdade.

O habeas corpus pode ser impetrado por qualquer do povo, advogado ou não, mandatário ou não, porque, segundo Rui Barbosa, "a liberdade não entra no patrimônio particular, como as coisas que estão no comércio, que se dão, trocam. Vendem, ou compram: é um verdadeiro condomínio social; todos o desfrutam, sem que ninguém o possa alienar; e se o indivíduo, degenerado, a repudia, a comunhão vigilante, a reivindica. Solicitando, pois, este habeas-corpus, eu propugno na liberdade dos ofendidos a minha própria liberdade; não patrocino um interesse privado, a sorte de clientes: advogo a minha própria causa, a causa da sociedade, lesada no seu tesouro coletivo, a causa impessoal do direito supremo, representado na impersonalidade deste remédio social", Obras Completas, v. XXV, 1898, t. IV, p. 218 e 219.

Aliás, fiel a essa tradição, a lei 8.906, art. 1º, § 1º, como o fizera a lei 4.215, arts. 70 e 71, exclui a impetração do habeas-corpus da atividade privativa do advogado .

Também na Justiça do Trabalho se dá algo semelhante. Com ela nasceu o direito do empregado formular pessoalmente sua reclamatória; registrada por funcionário em uma folha de papel, tem início o processo; ainda hoje, a despeito do número crescente de advogados, é elevado o número de reclamações apresentadas pelo operário, sem a intermediação de quem quer que seja.

Fenômeno novo, mas de sugestiva vitalidade, é o relativo ao juizado de pequenas causas, sobre o qual podem legislar, concorrentemente, os Municípios, os Estados e o Distrito Federal, Constituição, art. 24, X. Os resultados tem sido dignos de louvor. [...].

Acolho em parte a impugnação e concedo a cautelar quanto aos juizados de pequenas causas, à Justiça do Trabalho e à Justiça de Paz, excluindo a cláusula final "e aos juizados especiais".


3.Da constitucionalidade das leis que estabelecem hipóteses em que a presença de advogado no processo é facultativa

As leis que estabelecem os processos judiciais ou administrativos, ou fases destes, em que a presença do advogado é facultativa, não são inconstitucionais, como se depreende da legislação e da jurisprudência retrocitadas, bem assim porque não foram assim declaradas pelo Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102, inc. I, alínea "a").

A constitucionalidade decorre do fato de a própria Constituição Federal, ao dispor no art. 133, que o advogado é indispensável à administração da justiça, ressalva na parte final que essa indispensabilidade é nos limites da lei. Cumprindo essa determinação constitucional, essas leis estabelecem expressamente os limites, ou seja, as hipóteses em que a presença do advogado é indispensável ou facultativa.

No caso do processo administrativo disciplinar, como visto anteriormente, a Lei nº 8.112/90 dispõe literalmente no art. 156 que essa presença é facultativa, logo, em face de todo o exposto, a ausência de advogado não constitui inconstitucionalidade ou vício que enseje a sua nulidade.


4.Do servidor defensor dativo no processo disciplinar

Relativamente ao servidor defensor dativo, a Lei nº 8.112/90 expressamente determina a sua nomeação apenas na hipótese de revelia do indiciado na fase de defesa, o que ocorre se o acusado, regularmente citado de sua indiciação, não apresentar defesa escrita no prazo legal de 10 (dez) dias, conforme se constata do disposto no art. 164, que preceitua:

Art. 164. Considerar-se-á revel o indiciado que, regularmente citado, não apresentar defesa no prazo legal.

§ 1º A revelia será declarada, por termo nos autos do processo e devolverá o prazo para a defesa.

§ 2º Para defender o indiciado revel, a autoridade instauradora do processo designará um servidor como defensor dativo, que deverá ser ocupante de cargo efetivo superior ou do mesmo nível, ou ter nível de escolaridade igual ou superior ao do indiciado.

Nas demais fases do processo, mais especificamente na instrução, a lei não exige a presença de servidor defensor dativo, ainda que o acusado seja revel, por opção ou por encontrar-se em lugar incerto e não sabido.

Essa não-exigência é corroborada mais adiante pela própria Lei nº 8.112/90, quando, em seu art. 173, ao assegurar transporte e diárias apenas ao servidor convocado para prestar depoimento fora da sede de sua repartição, na condição de testemunha, denunciado ou indiciado, e aos membros da comissão e ao secretário, quando obrigados a se deslocarem da sede dos trabalhos para a realização de missão essencial ao esclarecimento dos fatos, não inclui o defensor dativo nesse rol de servidores, porque esses deslocamentos ocorrem somente durante a fase de instrução, na qual a sua presença não é exigida pela lei.

No tocante ao servidor defensor dativo, cabe ainda a observação de que a defesa por ele apresentada, se não for advogado ou, em sendo, estiver impedido ou sua atividade pública for incompatível com advocacia, não é defesa técnica no sentido jurídico dessas palavras, conforme se verifica dos arts. 3º, 4º e 27 da retrocitada lei, adiante reproduzidos:

Art. 3º O exercício da atividade de advocacia no território brasileiro e a denominação de advogado são privativos dos inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB),

Art. 4º São nulos os atos privativos de advogado praticados por pessoa não inscrita na OAB, sem prejuízo das sanções civis, penais e administrativas.

Art. 27. A incompatibilidade determina a proibição total, e o impedimento, a proibição parcial do exercício da advocacia.

Assim sendo, ao contrário do que consta da jurisprudência, a presença do servidor defensor dativo não atenderia ao disposto no art. 133 da Constituição Federal e no art. 2º da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia), que estabelecem que o advogado é indispensável à administração da justiça, de modo a afastar a suposta inconstitucionalidade que resultaria da ausência de advogado, caso o acusado optasse por não constituí-lo. Essa situação inviabilizaria o processo disciplinar, por inexistir lei que autorize a Administração Pública designar compulsoriamente advogado ou defensor público para atuar como defensor dativo.

A propósito, consigna-se que determinadas carreiras do serviço público não dispõem em seus quadros de servidores que possam atuar como advogados, como por exemplo, aquelas com cargos ou funções vinculados direta ou indiretamente a atividade policial de qualquer natureza ou que tenham competência de lançamento, arrecadação ou fiscalização de tributos e contribuições parafiscais, por expressa vedação da Lei nº 8.906/94, cujo art. 28, incs. V e VII, considera esses cargos ou funções incompatíveis com a advocacia, mesmo em causa própria.

Sobre a presença do defensor dativo em momentos ou fases do processo disciplinar que a lei não a exige, o Superior Tribunal de Justiça, apesar da atual jurisprudência dominante, já julgou no sentido de que essa ausência não constituía cerceamento do direito de defesa e nem gerava vício de nulidade, conforme se verifica nos Mandados de Segurança nºs 10.077, 7.165, 6.974 e 9.076, cujas ementas dos dois últimos, dispõem, respectivamente:

Não há falar em cerceamento decorrente da falta de nomeação de defensor dativo, previsto, tão somente, em caso de revelia do indiciado ou quando houver recusa de sua parte de se encarregar da defesa (arts. 163 e 164 da Lei nº 8.112/90). (STJ, MS 6.974-DF).

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O princípio da ampla defesa aplica-se ao processo administrativo, mas isso não significa que o acusado deve, necessariamente, ser defendido por advogado. Ele mesmo pode elaborar sua defesa, desde que assim queira. No caso, o acusado não constituiu advogado até a fase de alegações finais, por opção própria, mesmo porque bacharel em Direito. O que importa é a oportunidade de ampla defesa assegurada. (STJ, MS 9.076-SP).

A Advocacia-Geral da União, que, de acordo com a Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, compete fixar a interpretação das leis e demais atos normativos e unificar a jurisprudência administrativa a ser uniformemente seguida pelos órgãos e entidades da Administração Federal, também entende que, em face do princípio da legalidade, não constitui dever da comissão de inquérito disciplinar nomear defensor dativo fora da hipótese exigida pelo Estatuto do Servidor Público Federal, conforme manifestação contida no item 15 do Parecer AGU GQ 99, de 14 de março de 1996.

Em resumo, a interpretação sistêmica dos dispositivos constitucionais e legais que tratam da matéria demonstra que o ordenamento jurídico nacional admite ampla defesa sem a presença de advogado ou defensor dativo, bem assim que a ausência desses defensores no processo disciplinar, exceto do defensor dativo na fase de defesa, na hipótese de revelia do indiciado, não constitui inconstitucionalidade que implique em vício que nulifique o processo.


5.Do equilíbrio de forças nos processos

No processo judicial existe, no mínimo, 3 (três) participantes, com equilíbrio jurídico de forças, pois todos possuem formação jurídica, a saber: o autor, que propõe a ação e que, ressalvadas as exceções legais, deve ser representado por advogado, ou o Ministério Público, na hipótese de denúncia; o réu, que, ressalvadas as exceções legais, também é assistido por advogado; e, no centro, em posição soberana e eqüidistante, o juiz, que impulsiona e conduz o processo e decide a lide.

No processo administrativo disciplinar existe apenas 2 (dois) participantes: o servidor acusado, que se defende das infrações que lhe são imputadas, e a Administração Pública, que acumula as atribuições de parte interessada e juiz, representada, num primeiro momento, pela Comissão Processante, responsável pela instrução do processo e elaboração do respectivo relatório, e, posteriormente, pela autoridade julgadora.

O processo disciplinar ordinário, de acordo com o art. 149 da Lei nº 8.112/90, é conduzido por comissão composta de 3 (três) servidores designados pela autoridade competente, que indicará dentre eles o seu presidente, não se exigindo que sejam advogados ou bacharéis em Direito. Para os vogais condiciona-se apenas que sejam estáveis. Para o presidente exige-se que, além de estável, seja ocupante de cargo efetivo superior ou de mesmo nível, ou que tenha nível de escolaridade igual ou superior ao do indiciado (art. 149).

No tocante à sindicância e ao processo sumário a lei é omissa, exceto, neste último, no que diz respeito à estabilidade, que exige expressamente, e à quantidade de membros, que fixa em 2 (dois). Essa omissão é sanada pelo entendimento pacífico de que os membros das comissões de sindicância e do processo sumário devem ter a mesma qualificação exigida para o trio processante do processo ordinário.

Feitas essas considerações, verifica-se que o fato da lei não exigir que os membros das Comissões Disciplinares sejam advogados ou bacharéis em Direito faz, conforme registrado pelo Ministro Relator da retrocitada Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1127-8-DF, "[...] com que a presença obrigatória do advogado se torne incompatível com aqueles, que são desprovidos de conhecimentos técnicos para apreender a postulação.", ou seja, produz um desequilíbrio jurídico de forças no processo.

Segundo Fernando da Costa Tourinho, in Processo Penal, ed. Saraiva, 2006, vol. 1, o devido processo legal exige um regular contraditório, com o antagonismo de partes homogêneas, de modo que haja uma luta leal entre o acusador e o acusado, devendo, por isso, ambos ficarem no mesmo plano, embora em pólos opostos, com os mesmos direitos, as mesmas faculdades, os mesmos encargos e os mesmos ônus. Leciona ainda o retrocitado autor que:

Do princípio do contraditório decorrem duas regras importantes: a da igualdade processual e a da liberdade processual. Esta última consiste na faculdade que tem o acusado de nomear o advogado que bem quiser e entender; na faculdade que possui de apresentar provas que entender convinháveis, desde que permitidas em Direito, de formular ou não reperguntas às testemunhas etc.

.....................................................

[...] Na verdade, não haveria contraditório se os órgãos contrapostos fossem heterogêneos. O Acusador tem habilitação técnica, e, assim, se o acusado não a tivesse, haveria uma luta desigual entre ambos, e o princípio do contraditório seria provavelmente burlado.

.....................................................

Por isso, e decorrente do princípio do contraditório, é que vigora, no processo do tipo acusatório, a regra da igualdade processual, segundo a qual as partes – acusadora e acusada – encontram-se no mesmo plano, com iguais direitos.

O fato de ser assegurado o direito do acusado de constituir advogado no processo administrativo disciplinar não invalida o afirmado na doutrina e na retrocitada Ação Direta de Inconstitucionalidade, sobre o desequilíbrio processual que a presença desse operador do Direito produz nos processos em que os encarregados de conduzi-los sejam desprovidos de formação jurídica.

Nessa hipótese, a Comissão Disciplinar, se necessário e possível, deve buscar no âmbito da Administração Pública orientação para solucionar os incidentes processuais que possam resultar em posterior alegação de nulidade do processo, tendo em vista que pareceres ou soluções de consultas não ferem a impessoalidade ou independência exigida do trio processante, conforme se depreende do art. 155 da Lei nº 8.112/90, que autoriza o trio processante recorrer a técnicos e peritos para a completa elucidação dos fatos, e da jurisprudência que não acata argüição de nulidade pelo fato da autoridade julgadora, antes de proferir sua decisão, solicitar parecer da Consultoria Jurídica do órgão a respeito da regularidade do processo.

A Administração Pública, por sua vez, para tentar evitar ou minimizar esse desequilíbrio, deveria, sempre que possível, designar para compor as comissões processantes servidores bacharéis em Direito, o que, como se sabe, é praticamente impossível, tendo em vista que essa qualificação não é exigida para o exercício da maioria dos cargos e funções públicas.

À semelhança do que ocorre com os membros da Comissão Disciplinar, para a designação do defensor dativo, a Lei nº 8.112/90, em seu art. 164, § 2º, não exige que o servidor seja advogado ou tenha formação jurídica, mas apenas que seja "[...] ocupante de cargo efetivo superior ou do mesmo nível, ou ter nível de escolaridade igual ou superior ao do indiciado.". Assim, em princípio, se não houver advogado constituído e o defensor dativo não tiver formação jurídica, estaria mantido o referido equilíbrio processual.

Contudo, por não haver vedação legal, a Administração Pública pode designar para defensor dativo servidor graduado em Direito. O fato de a lei exigir defensor dativo apenas para elaboração da defesa escrita, na hipótese de revelia do indiciado, minimiza, mas não elimina o referido desequilíbrio processual, tendo em vista que após a apresentação da defesa, a Comissão Disciplinar deve apreciá-la e elaborar o relatório final conclusivo.

Assim sendo, se a presença de advogado constituído no processo administrativo disciplinar for considerada obrigatória, forçoso seria admitir como necessária também a presença de um promotor ou procurador, bem assim que a autoridade julgadora também seja advogado ou bacharel em Direito, de modo a estabelecer o equilíbrio jurídico tanto na instrução como no julgamento.

Tais medidas, entretanto, se adotadas, significariam, na prática, a implementação de uma espécie singular de contencioso administrativo, com incidentes e peculiaridades semelhantes ao do processo judicial, que o Direito Disciplinar procurou evitar, visando dar a sociedade uma resposta mais ágil e eficaz às denúncias de ilicitudes no Serviço Público Federal, amparado no fato de que a ampla defesa é permanentemente assegurada pelo inc. XXXV, do art. 5º, da Constituição Federal, no próprio processo disciplinar ou fora dele, no seu interregno ou após a sua conclusão.

Se o processo administrativo disciplinar tiver que ficar processualmente semelhante ao processo judicial, em face do ônus que isso implica, talvez fosse o caso da legislação estabelecer que as infrações disciplinares, em especial as denúncias de improbidade administrativa, que abrangem as de corrupção, entre outras, fossem apuradas exclusivamente mediante processo judicial, onde estariam presentes, desde o início, a acusação e a defesa técnicas, mediante complementação da Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, que dispõe sobre sanções aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências, tendo em vista que a mesma já prevê, em seu art. 12, entre outras sanções, a perda da função pública por improbidade administrativa.


Conclusão

O art. 133 da Constituição Federal, ao dispor que o advogado é indispensável à administração da justiça, preceitua na sua parte final, que essa indispensabilidade é nos limites da lei. A legislação infraconstitucional, por sua vez, estabelece literalmente em diversos diplomas legais os processos judiciais e administrativos e as fases destes em que a presença do advogado se faz indispensável, bem assim, quando é facultativa, ou seja, quando fica a critério do acusado ou demandado constituir ou não o seu patrono.

No tocante especificamente ao processo administrativo disciplinar, o Estatuto do Servidor Público Federal, aprovado pela Lei nº 8.112/90, ao dispor no art. 156 que é assegurado ao servidor o direito de acompanhar o processo pessoalmente ou por intermédio de procurador, estabelece incontroversamente que a presença de advogado constituído é facultativa. Relativamente ao defensor dativo, o art. 164 exige a designação apenas na fase defesa, para elaboração da defesa escrita do indiciado revel.

Em resumo, o ordenamento jurídico nacional, literalmente, admite a ampla defesa sem a presença de advogado ou defensor dativo nos processos em que a lei estabelecer que ela é facultativa, donde, nesses processos, entre os quais o administrativo disciplinar, essa presença não é pressuposto da ampla defesa, razão pela qual a ausência desses defensores, exceto a do dativo na hipótese de revelia do indiciado na fase de defesa do processo disciplinar, não constitui inconstitucionalidade ou vício que enseje nulidade do processo.

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Sobre o autor
José Oleskovicz

Bacharel em direito. Ex-Conselheiro do Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLESKOVICZ, José. Processo administrativo disciplinar:: presença facultativa de advogado e obrigatória de servidor defensor dativo apenas na hipótese de revelia na fase de defesa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1346, 9 mar. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9578. Acesso em: 18 nov. 2024.

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