RESUMO: O setor hoteleiro foi um dos primeiros impactados pelos efeitos da pandemia da Covid-19 em razão da sua vulnerabilidade a conjunturas e tendências nacionais e internacionais, diante da tomada de ações, principalmente, direcionadas à contenção da mobilidade social, como o isolamento e a quarentena. Referidas ações materializaram-se, dentre outras, na proibição de viagens, fechamento de fronteiras, restrição de horário para circulação em vias públicas, isolamento de pontos turísticos e proibição de aglomerações, ensejando um colapso no setor hoteleiro, que é diretamente dependente do contato pessoal. Dessa forma, o presente trabalho objetivou realizar uma breve análise acerca da situação das relações contratuais no âmbito do setor hoteleiro do Brasil durante a pandemia da Covid-19, com vistas a verificar como a legislação atuou para equilibrar as relações contratuais na crise sanitária e evitar prejuízos e violações de direitos, tanto para o consumidor quanto para o setor hoteleiro.
Palavras-chave: Hotelaria; Consumidor; Pandemia.
ABSTRACT: The hotel sector was one of the first to be impacted by the effects of the Covid-19 pandemic due to its vulnerability to national and international situations and trends, given the taking of actions, mainly, aimed at containing social mobility, such as isolation and quarantine . These actions materialized, among others, in the travel ban, border closing, time restriction for circulation on public roads, isolation of tourist spots and prohibition of agglomerations, giving rise to a collapse in the hotel sector, which is directly dependent on personal contact . Thus, this study aimed to carry out a brief analysis of the situation of contractual relations within the hotel sector in Brazil during the Covid-19 pandemic, with a view to verifying how the legislation acted to balance contractual relations in the sanitary crisis and to avoid damages and violations of rights, both for the consumer and for the hotel sector.
Keywords: Hospitality; Consumer; Pandemic.
INTRODUÇÃO
Sabe-se que o turismo constitui uma das atividades com maior representatividade econômica em contexto mundial, sendo responsável pela geração de emprego tanto direta quanto indireta em todos os segmentos da economia que reúne, bem como importante agente de preservação de patrimônios históricos.
Conforme Tomé (2019, p. 3), o setor hoteleiro integra a cadeia produtiva do turismo, de modo que suas receitas decorrem, principalmente, das diárias de hospedagem, despesas com refeições e bares, locação de espaços para eventos e reuniões, lavanderia e atividades de lazer, enquanto seus custos compreendem a depreciação de imóveis e bens e o pagamento de salários administrativos, além dos demais custos de natureza variável como energia elétrica, água, alimentos, telefonia, lavanderia, materiais de limpeza e salários operacionais.
Os serviços hoteleiros são caracterizados, inicialmente: a) pela intangibilidade, vez que não podem ser vistos, provados ou sentidos; b) pela inseparabilidade, já que são serviços que são primeiramente vendidos, e depois, tanto produzidos quanto consumidos, simultaneamente; c) pela variabilidade, tendo em vista serem serviços que dependem de quem os executa e do lugar onde acontece sua prestação; d) pela perecibilidade, diante da impossibilidade de estocamento para venda futura; e) pela padronização, vez que serviços de arrumação de apartamentos e serviços de alimentos e bebidas devem ser padronizados; e f) pela qualificação de mão de obra, por serem serviços que exigem manutenção da qualidade da equipe. (TOMÉ, 2019, p. 3-4)
O setor hoteleiro vinha de números altos, sendo que pesquisa realizada pela JLL (2019) indicou que o Brasil contabilizava aproximadamente 10.501 hotéis até julho de 2019. No mesmo ano, a taxa de ocupação dos hotéis crescia, por conseguinte, elevando a diária média em todas as regiões do Brasil.
No entanto, ainda que naturalmente enfrentasse a característica da sazonalidade, o setor hoteleiro foi um dos primeiros impactados pelos efeitos da pandemia da Covid-19, diante da sua vulnerabilidade a conjunturas e tendências nacionais e internacionais.
Segundo a OPAS (2021), agência internacional especializada em saúde pública das Américas, em 31 de dezembro de 2019, a Organização Mundial da Saúde (OMS) tomou conhecimento de vários casos de suposta pneumonia na cidade de Wuhan, província de Hubei, na República Popular da China. Constatou-se, uma semana depois, em 07 de janeiro de 2020, que havia sido identificado um novo tipo de coronavírus ainda não identificado em seres humanos, posteriormente nomeado SARS-CoV-2, responsável por causar a doença Covid-19, caracterizada pela rápida disseminação e considerável índice de letalidade.
Com vistas a aprimorar a coordenação, a cooperação e a solidariedade global para interromper a propagação do vírus, em 30 de janeiro de 2020, a OMS declarou que o surto do novo coronavírus constituía uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional, nível mais alto de alerta da Organização de acordo com o Regulamento Sanitário Internacional, que descreve um evento extraordinário que pode constituir um risco de saúde pública para outros países devido à disseminação internacional de doenças e potencialmente requer uma resposta internacional coordenada e imediata. Nesta feita, a Covid-19 foi caracterizada pela OMS como uma pandemia, em 11 de março de 2020, a fim de reconhecer que existiam surtos da doença em vários países e regiões do mundo. (OPAS, 2021)
De acordo com a Fiocruz (2021), além das repercussões de ordem biomédica e epidemiológica em escala global, a pandemia da Covid-19 gerou impactos sociais, econômicos, políticos, culturais e históricos sem precedentes na história recente das epidemias, de modo que a estimativa de infectados e mortos é proporcional ao impacto sobre os sistemas de saúde, à exposição de grupos vulneráveis, à sustentação econômica do sistema financeiro e da população, à saúde mental das pessoas em tempos de confinamento, ao temor pelo risco de adoecimento e morte e ao acesso a bens de caráter essencial.
Nesse contexto, tornou-se mister a tomada de ações, principalmente, direcionadas à contenção da mobilidade social, como o isolamento e a quarentena. Tais medidas afetaram diretamente o setor turístico e, consequentemente, o setor hoteleiro.
Dessa forma, o presente trabalho objetiva a realização de uma breve análise acerca da situação das relações contratuais no âmbito do setor hoteleiro do Brasil durante a pandemia da Covid-19, com vistas a verificar como a legislação atuou para equilibrar as relações contratuais na crise sanitária e evitar prejuízos e violações de direitos, tanto para o consumidor quanto para o setor hoteleiro.
1. IMPACTOS DA PANDEMIA DA COVID-19 NA HOTELARIA
Dentre as principais orientações emitidas pela Organização Mundial da Saúde e adotadas pelos governantes brasileiros, encontram-se o estabelecimento da quarentena e distanciamento social, além da limitação dos deslocamentos. Referidas medidas materializaram-se, dentre outras, na proibição de viagens, fechamento de fronteiras, restrição de horário para circulação em vias públicas, isolamento de pontos turísticos e proibição de aglomerações.
A situação acarretou um colapso no setor hoteleiro, que é diretamente dependente do contato pessoal. A título exemplificativo, tem-se que, consoante Monaco (2021), a hotelaria do Rio de Janeiro registrou prejuízo de R$ 1,6 bilhões em um ano.
Sendo assim, com o objetivo de evitar prejuízos ainda maiores decorrentes do não recebimento de hóspedes, a hotelaria precisou tomar uma série de medidas, uma vez que se trata de setor impossibilitado de manter a plena prestação dos seus serviços de forma remota.
Primeiramente, cita-se o fechamento ou redirecionamento de esforços de venda para a população local, em busca de isolamento, bem como para visitantes de outras cidades que se encontravam em tratamento de saúde, a promoção de descontos nas diárias, associados à agregação de serviços ou para públicos específicos e o desenvolvimento de novas receitas, como o aluguel das instalações para fins hospitalares. (SENAC, 2021)
Houve também a redução de despesas por meio da redistribuição de pessoal com manutenção dos funcionários chaves, redução do horário de trabalho dos funcionários, antecipação de férias com postergação de pagamento dos encargos, suspensão dos contratos de trabalho e demissão de funcionários. Para proporcionar o contingenciamento de custos operacionais, a hotelaria procedeu ainda ao fechamento de andares ou redução de acomodações e renegociação de contratos de manutenção estrutural. (SENAC, 2021)
No que se refere às medidas de segurança, higiene e prevenção, o setor hoteleiro adotou a introdução de medidas de higiene suplementares para garantir condições sanitárias e de limpeza e o cuidado com a saúde e segurança de seus colaboradores. Os hotéis que possuíam disponibilidade financeira optaram por aproveitar o período para realizar obras previstas e outras melhorias, fazendo também a manutenção de seus ativos. (SENAC, 2021)
Quanto à comunicação e marketing, a hotelaria buscou emitir orientações claras aos clientes e funcionários, adotar condições flexíveis de cancelamento ou modificações de reservas novas ou existentes, monitorar a percepção da marca nas mídias sociais e refletir sobre novos produtos e serviços. No campo dos seguros e contratos, o setor precisou verificar a cobertura dos seguros em relação a eventual interrupção de negócios por motivo de força maior ou catástrofe natural sanitária, e renegociar contratos com fornecedores e prestadores de serviços. (SENAC, 2021)
Destacam-se aqui as questões de cancelamento, remarcação, suspensão e interrupção de reservas e outros produtos do setor hoteleiro, que foram os principais fatores causadores da instabilidade nas relações contratuais consumeristas, tendo em vista que os consumidores restaram impedidos de utilizar dos serviços e produtos do ramo da hotelaria com segurança devido tanto aos riscos à saúde quanto às restrições governamentais impostas.
É importante estabelecer que a pandemia da Covid-19 é classificada como evento de força maior, uma vez que se trata de evento não previsível, impedindo, portanto, a responsabilização pelos danos e constrangimentos dela decorrentes a um pólo determinado. Dispõe o art. 393 do Código Civil que o devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado. (BRASIL, 2002)
Entretanto, tratando-se de relação de consumo, entende-se pela adequação das demandas ao art. 14, §3°, inc. II, do Código de Defesa do Consumidor. Segundo o dispositivo, o fornecedor de serviços não será responsabilizado pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos, quando provar a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. (BRASIL, 1990)
Diante do cenário, verifica-se a impossibilidade de penalização do fornecedor, pois o estado de calamidade pública impõe o reconhecimento da ausência do nexo de causalidade.
2. MEDIDAS LEGISLATIVAS DIRECIONADAS AO SETOR HOTELEIRO DURANTE A PANDEMIA DA COVID-19
Frente à situação atípica e à necessidade de maior segurança jurídica nas demandas que começaram a surgir, foi promulgada a Medida Provisória n.° 948, de 08 de abril de 2020, com o objetivo de regulamentar o cancelamento de serviços, de reservas e de eventos dos setores de turismo e cultura em razão do estado de calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19, sendo posteriormente convertida na Lei n.° 14.046, de 24 de agosto de 2020.
A medida provisória previa que os prestadores de serviços turísticos (aqueles previstos no rol do art. 21 da Lei n.° 11.771/08), em regra, não seriam obrigados a reembolsar os valores pagos pelos consumidores. No entanto, deveriam assegurar a remarcação dos serviços, das reservas e dos eventos cancelados, respeitando ainda a sazonalidade e os valores dos serviços originalmente contratados, bem como que estes serviços fossem remarcados dentro do prazo de doze meses, a disponibilização de crédito para uso ou abatimento na compra de outros serviços, reservas e eventos disponíveis nas respectivas empresas, de modo que este crédito poderia ser utilizado pelo consumidor também no prazo de doze meses (ambos contados da data de encerramento do estado de calamidade pública) ou outro acordo a ser formalizado livremente entre as partes. (BRASIL, 2020)
A legislação dispunha que qualquer que fosse a operação escolhida pelo consumidor, não deveria haver cobrança de custo adicional, taxa ou multa, desde que obedecido o prazo de noventa dias para a manifestação (contado a partir da data da publicação da medida provisória). Não sendo o conflito solucionado por nenhuma das alternativas trazidas pela lei, o fornecedor deveria restituir o valor ao consumidor, também no prazo de doze meses contados da data de encerramento do estado de calamidade pública. (BRASIL, 2020)
Entretanto, conforme Campanha (2020), em que pese sua pertinência, a medida provisória causou dúvidas aos aplicadores da lei, uma vez que, ao mesmo tempo em que previa a desobrigação do reembolso em caso de assegurar a remarcação dos serviços ou disponibilização do crédito, previa também que, não obstante a garantia da remarcação, da disponibilização do crédito ou de outro acordo entre as partes, caso não fosse possível celebrar o ajuste, o consumidor faria jus à devolução.
Por tal motivo é que foi publicada a Lei n.° 14.046/20, responsável por alterar alguns dos dispositivos previstos na antiga medida provisória.
Inicialmente, no que se refere à sua aplicabilidade, a nova lei passou a abranger também os eventos adiados, os eventos que tenham sido lançados no decorrer do período de estado de calamidade pública e que, eventualmente, tenham que ser cancelados ou adiados e os eventos que tenham sido adiados uma vez em razão da pandemia e que, ainda por causa do estado de calamidade pública, tiveram que ser novamente adiados, e não mais somente os cancelamentos de serviços, reservas e eventos de setores de turismo e cultura em razão da pandemia. (BRASIL, 2020)
Também houve alteração quanto às alternativas apresentadas ao consumidor para resolução do conflito, pois foi retirada a possibilidade de realização de acordo a ser formalizado com o consumidor, o que de acordo com Campanha (2020), foi correto, tendo em vista que caso fosse realizado outro acordo com o consumidor (que não o reembolso, obviamente), a restituição seria incabível, independentemente de previsão legal. (CAMPANHA, 2020)
Menciona-se ainda a modificação que estendeu o prazo anterior de noventa dias para o consumidor manifestar o interesse em realizar a remarcação ou requerer a disponibilização de crédito, oportunizando o prazo de cento e vinte dias para solicitar as operações, contados da data da comunicação do adiamento ou do cancelamento dos serviços ou até a data em que restarem trinta dias para a realização do evento, a depender da data que ocorrer antes. A não realização de quaisquer das solicitações no prazo legal por motivo de falecimento, internação ou força maior, acarretava na restituição do prazo ao consumidor ou ao herdeiro/sucessor, a contar da data em que ocorreu o evento que impediu a solicitação. (CAMPANHA, 2020)
Ademais, a legislação passou a determinar que o reembolso, antes assegurado ao consumidor que não aceitasse a remarcação, a disponibilização de crédito ou qualquer outra forma de acordo, somente seria cabível caso o prestador de serviços turísticos ficasse impossibilitado de realizar a remarcação ou a disponibilidade de crédito, independentemente da discordância do consumidor, devendo ser deduzidos os valores referentes aos serviços de agenciamento e intermediação já prestados. (CAMPANHA, 2020)
Por fim, consoante Campanha (2020), a legislação determinou que eventuais cancelamentos ou adiamentos em contratos de natureza consumerista que estejam dentro da sua aplicabilidade deveriam ser considerados como hipóteses de caso fortuito ou força maior, não ensejando reparações por danos morais, aplicação de multas ou imposição das penalidades previstas no art. 56 do Código de Defesa do Consumidor, com exceção de situações excepcionais, como quando configurada a má-fé do prestador de serviço.
Referida legislação passou por outras pequenas alterações até o momento (como a ampliação do prazo até 31 de dezembro de 2022 para remarcações e reembolsos das atividades nos setores de turismo e cultura canceladas em razão da pandemia), porém possibilitou a manutenção da prestação de serviços por parte das empresas do setor com maior tranquilidade, sendo um importante instrumento no enfrentamento tanto da crise sanitária quanto no fomento da economia.
3. ATUAÇÃO DO GRUPO EXECUTIVO DE PROTEÇÃO AO CONSUMIDOR NO SETOR HOTELEIRO DURANTE A PANDEMIA DA COVID-19
O Governo do Estado de São Paulo, no ano de 1976, criou o Grupo Executivo de Proteção ao Consumidor (PROCON), órgão destinado à proteção do consumidor, possuindo atuação na aplicação da política estadual de proteção e defesa, na regulação das relações de consumo e na proposição de soluções extrajudiciais de conflitos. Tal órgão se espalhou para outros estados da Federação, sendo primordial na resolução de conflitos consumeristas ao longo dos anos.
No âmbito de Minas Gerais, temos o Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor (PROCON/MG), que é um órgão do Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG), responsável por coordenar a política dos órgãos e entidades que atuam na proteção do consumidor no estado, com vistas a equilibrar as relações de consumo. O PROCON/MG se destaca pelo atendimento de reclamações que envolvam o interesse da coletividade, função realizada pelos promotores de Justiça de Defesa do Consumidor nas comarcas, em todas as regiões do estado.
Durante a crise provocada pela pandemia da Covid-19, a atuação do PROCON precisou ser intensa, uma vez que com o impacto gerado pelo fechamento de fronteiras, o fechamento do comércio e as diversas medidas sanitárias de contenção ao vírus, fornecedores e consumidores sofreram vários infortúnios. Um dos segmentos atingidos foi o turismo, que ficou severamente prejudicado em diversos sentidos, sendo que só no setor hoteleiro, 75 mil trabalhadores foram dispensados. (BRASIL, 2021).
O Código de Defesa do Consumidor dispõe em seu art. 6º, inc. I, que é direito básico do consumidor a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos de serviços considerados perigosos e nocivos. Ainda, o art. 49, parágrafo único, do mesmo diploma, estabelece o direito ao arrependimento e a imediata devolução de valores após a desistência do contrato pelo consumidor. O código consumerista disciplina então, a proteção do consumidor frente às questões que são decorrentes, inclusive, de uma crise sanitária, como a da Covid-19.
De acordo com o indicador semanal elaborado pelo FOHB, que apresenta dados sobre o percentual de hotéis abertos e fechados no país no período de crise do COVID-19, de 28 hotéis na cidade de Belos Horizonte/MG, 15,40% estavam fechados, o que demonstra a grande necessidade de articulação entre a proteção aos direitos dos consumidores e a garantia de possibilidade de funcionamento dos estabelecimentos. (BRASIL, 2021)
Ainda, a respeito da importância do PROCON enquanto órgão de proteção ao consumidor, cumpre destacar que em Levantamento realizado pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), por meio do PROCON/MG, houve um crescimento de 210% na procura ao órgão, tanto por demandas relacionadas a cobranças ou preços abusivos em diversos produtos, quanto relativas a informações e dúvidas dos diversos sentidos.
Nesse sentido, é latente a posição do PROCON, em consonância com o Código de Defesa do Consumidor, de que os consumidores possuem o direito de cancelar passagens aéreas, reservas em hotéis e até mesmo seguro viagem em decorrência da pandemia do coronavírus.
Para conseguir encontrar um equilíbrio nas relações de consumo,
a Associação Brasileira da Indústria de Hoteis do Estado de São Pualo (ABIH-SP), Fórum de Operadores Hoteleiros do Brasil (Fohb), Resorts Brasil (ABR) e Brazilian Travel Luxury Association (BLTA) assinaram um termo de alinhamento ao Procon-SP quanto aos itens de remarcação, substituição por outro serviço semelhante ou o cancelamento de reserva com o reembolso dos valores pagos. (VIEIRA, 2021)
Ficou assegurado quanto à reserva, que esta ocorreria sem incidência de multa aos consumidores que optaram pela remarcação, podendo-a fazer no prazo de doze meses depois de vencida a pandemia e encerrado o decreto de calamidade. A remarcação deve ainda observar as condições de compra, sendo que as compras feitas na alta temporada (dezembro, janeiro e julho) podem ser remarcadas em qualquer tempo, e as compras feitas em baixa temporada só podendo ser marcada na mesma baixa temporada.
Para a substituição por outros serviços semelhantes, estipulou-se a possibilidade de que os consumidores alterem sua reserva para outro estabelecimento hoteleiro de igual categoria do mesmo grupo empresarial, dentro do prazo de doze meses depois de vencida a pandemia e encerrado o decreto de calamidade, sendo que, para os consumidores que não desejarem a remarcação ou substituição, podem optar pela concessão de crédito do valor integral contratado para ser utilizado no período de doze meses.
Quanto ao reembolso, restou estipulado que será integral dos valores aos consumidores que optarem pelo cancelamento da reserva, sendo que o número de parcelas do reembolso não poderá ser superior a doze e dependerá de negociação entre o consumidor e o estabelecimento hoteleiro.
As entidades do setor hoteleiro informaram à época que os direitos dos consumidores estariam sendo respeitados, ao mesmo tempo em que as operações dos estabelecimentos hoteleiros estariam sendo viabilizadas durante a crise sanitária, reforçando a ausência de culpa ou responsabilidade dos estabelecimentos quanto a situação vivida, uma vez que tanto clientes quanto empresas são vítimas da pandemia.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando todo o exposto, podemos concluir que a legislação consumerista, apesar de já possuir disposições acerca da proteção e defesa dos consumidores nos litígios contra o setor de turismo, não comportou a grande demanda de cancelamentos em razão da pandemia da Covid-19, exigindo a tomada de outras medidas pelo poder público, o que demonstra a necessidade de incentivo à utilização de mecanismos alternativos para resolução de controvérsias.
Dessa forma, para garantir os direitos do consumidor e ao mesmo tempo preservar as empresas, equilibrando as relações entre fornecedores e consumidores, foram editadas medidas provisórias, que convertidas em lei, objetivavam a solução dos impasses gerados pela calamidade pública que atingiu tão severamente o setor de turismo no país.
As novas regras que foram adotadas especificamente para o período da pandemia, flexibilizaram momentaneamente as normas de defesa do consumidor. Em tempos normais, conforme as disposições do Código de Defesa do Consumidor, em caso de cancelamento de hospedagem, o hotel seria obrigado a fazer o reembolso ao cliente, porém agora, tem-se a possibilidade de remarcação de data ou oferecimento de créditos pelo hotel.
Inegavelmente, alguns pontos das novas leis vão de encontro ao Código de Defesa do Consumidor, como a dispensa do reembolso havendo a remarcação ou a concessão de créditos e o fato de cancelamentos e adiamentos dos serviços não serem passíveis de gerar indenização por danos morais. Contudo, ressalta-se que essas regras possuem caráter temporário e buscam assegurar tanto os direitos dos consumidores, quanto a sobrevivência das empresas que, caso fossem obrigadas a um reembolso imediato, não teriam como se manter.
Para o futuro próximo, resta o desafio sob o enfoque da proteção ao consumidor, sobre decidir sobre a retirada ou prorrogação dessas regras em um cenário ainda repleto de incertezas.
REFERÊNCIAS
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