Fenômeno que tem se desenvolvido e alargado ao longo dos anos, a terceirização pode ser entendida como o instituto pelo qual se dissocia a relação econômica de trabalho da relação justrabalhista que lhe seria correspondente. Por tal mecanismo, o obreiro é inserido no processo produtivo do tomador de serviços, sem que se estendam a este os respectivos vínculos empregatícios, que se preservam fixados com uma entidade interveniente, criando-se, assim, uma relação trilateral em face da contratação de mão-de-obra no mercado capitalista.
Note-se que esse modelo trilateral de relação sócio-econômica e jurídica que surge com o processo terceirizante é francamente distinto do clássico modelo empregatício (que se funda em caráter essencialmente bilateral), e traz alguns desajustes em contraponto aos tradicionais objetivos tutelares que caracterizam o Direito do Trabalho.
De outra parte, o fenômeno da terceirização tem se expandido crescentemente, sem merecer, ao longo dos anos, cuidadoso esforço de normatização pelo legislador pátrio. A CLT faz referência ao instituto somente nas figuras de empreitada e subempreitada, e no campo privado, há apenas dois diplomas legais que prevêem a hipótese terceirizante, quais sejam, a Lei 6.019/74 (Lei do Trabalho Temporário) e a Lei nº 7.102/83, que regula a terceirização dos serviços de vigilância.
Cumpre assinalar que ambos os textos legais em referência caracterizam-se por sua restrita área de incidência, porquanto a primeira lei aplica-se tão somente a contratos de curta duração, produzindo efeitos transitórios no tempo, e a segunda dirige-se a um específico e delimitado conjunto de trabalhadores, vinculados ao ramo de segurança.
Já no segmento estatal, criaram-se alguns mecanismos jurídicos propiciadores da denominada descentralização administrativa, consubstanciados no Decreto Lei 200/67 e na Lei 5.645/70, que possibilitam a contratação de trabalhadores assalariados por interpostas empresas para a realização de serviços de apoio, instrumentais, meramente de execução. Ou seja, no âmbito das entidades públicas, há autorização legal à terceirização, porém esta se limita às chamadas atividades-meio, meramente assessórias.
Assim, o processo terceirizante tem evoluído, em boa medida, à margem da normatividade estatal, como processo algo informal, situado fora das diretrizes que norteiam a ordem jurídica trabalhista.
Por tais razões, a terceirização tem sofrido grandes restrições por parte da doutrina e jurisprudência pátrias, que nela tendem a enxergar uma modalidade excetiva de contratação.
Tanto o é que o Tribunal Superior do Trabalho fixou súmula a respeito do problema, incorporando orientação fortemente limitativa das hipóteses de contratação de trabalhadores por empresa interposta. Nos termos do Enunciado 331 do TST, constitui terceirização lícita somente situações empresariais que autorizem a contratação de trabalho temporário, atividades de vigilância, conservação e limpeza, e ainda, serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador. Excluídas tais situações, não há em nossa ordem jurídica preceito legal para dar validade ao processo de terceirização, sem que o respectivo tomador responda, juridicamente, pela relação laboral estabelecida com o obreiro.
Ademais, com o fito de evitar que o modelo terceirizante seja utilizado de modo fraudulento, o Enunciado tem o cuidado de estatuir que se manterá lícita a terceirização perpetrada, nas três últimas situações acima mencionadas, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta entre trabalhador e terceirizado e tomador de serviços.
Por conseguinte, independentemente da terceirização da atividade-meio ou fim, caso seja verificado que o profissional alocado na prestação de serviços está, de fato, exercendo suas funções de forma pessoal e com habitualidade, bem como subordinado às ordens e mandamentos da empresa tomadora de serviços, fatalmente será considerada existente relação empregatícia, reconhecendo-se a fraude na terceirização da atividade.
Ainda, no que pertine à terceirização ilícita, por ter como objeto serviços considerados preponderantes, importante enfatizar que a definição de atividade-fim precisa ser constantemente revista, eis que, em face da dinâmica da economia e desenvolvimento tecnológico, atividades consideradas essenciais para as empresas anos atrás, hoje são tão somente meios de execução do seu negócio. E a renovação de tal interpretação nos parece ser ilimitada, na medida em que cada vez mais se exige especialização e foco no processo produtivo.
Entretanto, o que se verifica é que os tribunais trabalhistas não têm acompanhado a evolução prática desse conceito com a velocidade desejada, considerando como fraude terceirizações absolutamente lícitas e que não trazem quaisquer prejuízos aos obreiros envolvidos, impedindo, assim, a adoção do procedimento como meio de flexibilização das relações de trabalho.
Vale lembrar, ainda, que mesmo não havendo qualquer ilegalidade na contratação de interposta empresa, a tomadora de serviços responderá de forma subsidiária pelo inadimplemento da fornecedora de mão-de-obra, com relação ao cumprimento das obrigações trabalhistas. Essa responsabilidade decorre da culpa in eligendo e in vigilando, isto é, se a empresa tomadora não escolher uma prestadora idônea, ou ainda, não fiscalizar o correto pagamento dos empregados da mesma, poderá ser condenada, subsidiariamente, em eventual reclamação trabalhista, cabendo-lhe, entretanto, ingressar com ação regressiva em face da devedora principal, requerendo o ressarcimento dos valores desembolsados.
Ante o exposto, as empresas tomadoras de serviços devem acautelar-se quanto ao processo de terceirização, a fim de evitar que os contratos firmados possam ser considerados fraudulentos perante o Judiciário, bem como reduzir eventuais riscos de responsabilização trabalhista com relação a empregados da prestadora.