3. Citação por via eletrônica
Em outra alteração que levou a efeito no corpo do Código de Processo Civil, o legislador acrescentou o inciso IV ao seu art. 221, que passa a prever, dentre as modalidades de citação, a que é feita por meio eletrônico. De fato, o art. 20 da Lei 11.419 (norma do seu Capítulo IV, que trata das disposições gerais e finais), estabelece que:
"A Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil, passa a vigorar com as seguintes alterações:
(...)
Art. 221. ....................................................................
....................................................................................
IV - por meio eletrônico, conforme regulado em lei própria." (NR)
Ao lado da citação que é feita pelo correio (inc. I do art. 221 do CPC), por oficial de justiça (inc. II) e por edital (inc. III), o nosso sistema de leis processuais civis incorpora a citação que é feita por meio eletrônico (inc. IV incluído pela Lei n. 11.419/2006).
A regulamentação do procedimento da citação realizada por meio eletrônico foi disciplinada no corpo da própria Lei 11.419/06, porquanto dispõe o seu art. 6º. que:
"Observadas as formas e as cautelas do art. 5º desta Lei, as citações, inclusive da Fazenda Pública, excetuadas as dos Direitos Processuais Criminal e Infracional, poderão ser feitas por meio eletrônico, desde que a íntegra dos autos seja acessível ao citando".
Ao mandar observar as formas e as cautelas previstas no art. 5º., o legislador adotou o sistema da "auto-comunicação" como padrão único do procedimento da citação eletrônica. O art. 5º. da Lei 11.419/06, como se sabe, instituiu um método de comunicação eletrônica que permite que as partes tomem ciência dos atos e termos processuais em "portal próprio" dos tribunais que adotarem o processo eletrônico (total ou parcial). A citação eletrônica, portanto, diferentemente da simples intimação (eletrônica), só pode ser realizada observando-se esse modelo da "auto-comunicação", em que as partes (e seus advogados) tomam a iniciativa de consultar periodicamente os comunicados judiciais em área própria do site do tribunal. Não há previsão de que a citação eletrônica possa ser realizada mediante utilização do Diário da Justiça eletrônico (previsto e disciplinado no art. 4º.). Ao fazer remissão unicamente ao art. 5º., o legislador elegeu, com exclusividade, a fórmula da "auto-comunicação" para o procedimento da citação eletrônica.
No entanto, podemos enxergar pelo menos uma hipótese de utilização do Diário da Justiça eletrônico para instrumentalização da citação eletrônica, ainda que em parte. É quando a citação tiver de ser feita na forma de edital, em casos em que o réu estiver em lugar desconhecido ou seja ignorado o seu paradeiro (art. 231 do CPC). Pelo menos em relação ao edital que houver de ser publicado "uma vez no órgão oficial" (art. 232, III), a publicação poderá ser feita pela via do Diário da Justiça eletrônico, já que a publicação eletrônica na forma do art. 4º. da Lei 11.419/06 "substitui qualquer outro meio e publicação oficial, para quaisquer efeitos legais, à exceção dos casos que, por lei, exigem intimação ou vista pessoal" (§ 2º.).
A tendência é que, implantado o Diário da Justiça eletrônico, os tribunais extingam outras formas de publicação de atos processuais em forma impressa. Os diários oficiais em forma impressa tendem a desaparecer, sendo substituídos pelo Diário da Justiça na versão eletrônica. Abolida a forma tradicional de publicação de editais, só restará a publicação por via do Diário da Justiça eletrônico. Teremos, então, um caso de citação editalícia parcialmente realizada por meio eletrônico, através do Diário da Justiça eletrônico.
3.1 Citação por via eletrônica pressupõe cadastro dos usuários
A citação realizada por via eletrônica proporcionará resultados muito promissores, em termos de agilização processual. Evitará a emissão de cartas e mandados (em forma física) para entrega ao citando, pelo sistema dos correios ou através de oficial de justiça, o que certamente reduzirá o trabalho das escrivanias e secretarias judiciais, além do tempo gasto para efetivação das comunicações, que também será sensivelmente reduzido. Imagine-se, por exemplo, o caso de um réu que costuma ser objeto de ações de massa em um determinado Juizado (um banco, uma operadora de serviços de telefonia, uma empresa fornecedora de energia elétrica etc.). Todas as citações dos processos ajuizados contra ele poderão ser efetivadas mediante a simples disponibilização do conteúdo do ato citatório no sistema de "auto-comunicação".
Mas uma advertência deve ser feita: a citação eletrônica somente pode ser feita em relação às partes (usuários) previamente cadastradas no sistema de informático de "auto-comunicação" do órgão judicial respectivo. Isso porque o método da "auto-comunicação" pressupõe adesão das partes e seus advogados, mediante realização de cadastro em área específica do portal do tribunal. Para aquele usuário (réu) não cadastrado, a citação é feita da forma tradicional - pelo correio ou por oficial de justiça (art. 221, incs. I e II, do CPC), conforme o caso.
Antevendo justamente situações como essa, que impedem a realização da citação na forma eletrônica, o legislador admitiu a possibilidade de o ato ser realizado por outros meios convencionais. Quer seja porque o citando não é usuário cadastrado do sistema de "auto-comunicação" ou por qualquer outro motivo de ordem técnica que impeça a realização do ato na forma eletrônica, a citação então deve ser feita pelas modalidades convencionais. A intenção do legislador é que, no processo eletrônico, todos os atos de comunicação sejam realizados por meio eletrônico (art. 9º.), mas em não sendo possível a realização da citação na forma eletrônica, a Lei faculta que seja concretizada segundo as modalidades convencionais previstas no CPC (arts. I e II do art. 221). O sistema deve ter meios para emitir carta ou mandado em forma física e, depois de devidamente cumprida a citação, deve ser digitalizado o documento (carta ou mandado, contendo a certidão respectiva ou a assinatura com registro de recebimento) e incorporado aos autos do processo eletrônico. É o que está previsto no § 2º. do art. 9º. da Lei 11.419, nos seguintes termos: "Quando, por motivo técnico, for inviável o uso do meio eletrônico para a realização de citação, intimação ou notificação, esses atos processuais poderão ser praticados segundo as regras ordinárias, digitalizando-se o documento físico, que deverá ser posteriormente destruído".
3.2 Citação na forma eletrônica pressupõe acesso à íntegra dos autos
A citação é o ato pelo qual se chama a juízo o réu ou o interessado a fim de se defender (art. 213 do CPC). A finalidade da citação, portanto, é dar conhecimento ao demandado da ação que lhe foi proposta e proporcionar que se defenda. No processo tradicional, o citado tem vista dos autos (por meio de seu advogado) mediante retirada na secretaria da vara, durante o prazo da contestação, para que possa assim exercer sua defesa, com conhecimento completo dos fatos e documentos que instruem a causa. O citado não poderia exercer sua defesa sem que lhe fosse proporcionado essa vista dos autos. Na forma eletrônica, a vista dos autos se dá através de acesso ao sistema informático, na área própria do portal onde estão disponibilizadas as peças integrantes do processo. Essa a razão de o art. 6º. da Lei 11.419 estabelecer (em sua parte final) que, para a validade da citação eletrônica, é indispensável que "a íntegra dos autos seja acessível ao citando". Além de cópia do ato citatório, é necessário que o citando tenha acesso, ao ingressar no sistema de "auto-comunicação", das demais peças que compõe o processo eletrônico (petição inicial e todos os documentos que a acompanham). Somente assim, observando-se essas cautelas, a citação na via eletrônica será considerada válida.
Nos termos do § 1º. do art. 9º. da Lei 11.419, "as citações que viabilizem o acesso à íntegra do processo correspondente serão consideradas vista pessoal do interessado para todos os efeitos legais".
4. Cartas rogatória, de ordem e precatória por via eletrônica
Os atos processuais são cumpridos por ordem judicial ou requisitados por carta, conforme hajam de realizar-se dentro ou fora dos limites territoriais da comarca (art. 200 do CPC). Existem três tipos de carta para requisição de cumprimento de ordem judicial: a carta de ordem, quando é dirigida a um juiz subordinado ao tribunal remetente; a carta rogatória, quando dirigida a uma autoridade estrangeira; e a carta precatória, para todos os demais casos, ou seja, quando enviada por um juiz para outro com o qual não tenha subordinação na hierarquia judiciária, desde que dentro do território nacional (art. 201 do CPC).
A Lei 11.419/06, em seu artigo 7º., determina que "as cartas precatórias, rogatórias, de ordem e, de um modo geral, todas as comunicações oficiais que transitem entre órgãos do Poder Judiciário, bem como entre os deste e os dos demais Poderes, serão feitas preferentemente por meio eletrônico". Além disso, o legislador acrescentou o parágrafo 3º. ao art. 202 do CPC, que passa a prever a possibilidade de as cartas judiciais serem instrumentalizadas por meio eletrônico. De fato, o art. 20 da Lei 11.419 (norma do seu Capítulo IV, que trata das disposições gerais e finais), estabelece que:
"A Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil, passa a vigorar com as seguintes alterações:
(...)
"Art. 202. .....................................................................
§ 3º A carta de ordem, carta precatória ou carta rogatória pode ser expedida por meio eletrônico, situação em que a assinatura do juiz deverá ser eletrônica, na forma da lei." (NR)
A implantação de sistemas para envio e recebimento de cartas judiciais pelo meio eletrônico vai pressupor o estabelecimento de acordos entre os diversos órgãos do Poder Judiciário Nacional, para adoção de procedimentos uniformizados e plataformas que possibilitem a interoperabilidade entre os diversos sistemas e, especificamente no que se refere à carta rogatória, o Brasil terá que assinar acordos e tratados internacionais com outros países, em que fiquem estabelecidos os procedimentos para o cumprimento dessas cartas eletrônicas.
Dentro de um determinado ramo do Poder Judiciário nacional a implantação dos sistemas eletrônicos para envio e recebimento de cartas judiciais (carta de ordem e precatória) será tecnicamente mais fácil, tendo em vista a uniformização tecnológica para os diversos órgãos judiciários que o integram. Por exemplo, o TRT do Maranhão já implantou o seu sistema para processamento eletrônico de cartas precatórias [19], que funcionou inicialmente como projeto piloto na 6ª. Vara do Trabalho, mas com previsão para expansão em curto prazo para todas as varas do Estado.
O processamento eletrônico das cartas judiciais representará uma enorme economia de tempo e redução de custos, já que dispensa a duplicação de peças processuais e pagamento de tarifas postais. As cartas judiciais, em qualquer de suas modalidades, são consideradas fator de grande emperramento da máquina judiciária, pois o seu cumprimento pelo sistema tradicional geralmente consome exagerado tempo. Na modalidade eletrônica, a previsão é que o tempo de tramitação das cartas seja reduzido drasticamente, com benefícios enormes em termos de agilização do processo judicial.
Os sistemas eletrônicos para comunicação entre juízes garantirão não somente o envio e recebimento de cartas judiciais para cumprimento de atos processuais, mas também (como previu o legislador) "todas as comunicações que transitem entre órgãos do Poder Judiciário". Assim, um simples ofício e, de maneira geral, qualquer comunicação oficial, para qualquer finalidade, poderão ser realizadas por meio de sistemas eletrônicos.
4.1 Assinatura eletrônica do Juiz requisitante nas cartas judiciais
A parte final do parágrafo 3º. do art. 202 do CPC, acrescentado pela Lei 11.419/06, exige que, em sendo expedida a carta judicial (de ordem, precatória ou rogatória) por meio eletrônico, deverá conter a assinatura eletrônica do juiz requisitante. Por sua vez, o art. 2º. da Lei 11.419/06 estabelece que ".... a prática de atos processuais em geral por meio eletrônico serão admitidos mediante o uso de assinatura eletrônica". Também no § único do art. 8º da mesma Lei, foi inserida a regra de que obrigatoriamente "todos os atos processuais do processo eletrônico serão assinados eletronicamente".
A assinatura eletrônica, portanto, foi o método de autenticação escolhido pelo legislador pátrio para a transmissão eletrônica de documentos e arquivos digitais integrantes de um processo judicial eletrônico. No caso das cartas judiciais, a assinatura eletrônica a ser utilizada é a da espécie assinatura digital, prevista na alínea a do inc. III do § 2º. do art. 1º. da Lei 11.419/06, como sendo aquela "baseada em certificado digital emitido por Autoridade Certificadora credenciada, na forma de lei específica". A legislação que trata especificamente da utilização de certificados digitais para garantir a autenticidade e validade jurídica de documentos e transações em forma eletrônica é a Medida Provisória n. 2.200, que instituiu a ICP-Brasil (Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira).
Assim, os tribunais têm que contratar os serviços ou celebrar convênio com empresa credenciada à ICP-Brasil [20], que fornecerá a tecnologia de assinaturas e certificados digitais, para que o Juiz possa "assinar" uma carta judicial (de ordem, precatória ou rogatória), toda vez que requisitar a realização de um ato de forma eletrônica.
5. Comunicações com os órgãos dos demais poderes por via eletrônica
Ressalte-se que não somente as comunicações que se estabelecem entre juízes, mas também aquelas que são feitas com quaisquer outras autoridades e repartições públicas poderão ser realizadas por meio eletrônico. O art. 7º. da Lei 11.419/06 determina que não somente as comunicações que transitem entre órgãos do Poder Judiciário, mas também aquelas que se estabeleçam "entre os deste e os dos demais Poderes, serão feitas preferencialmente por meio eletrônico".
A previsão legal possibilita o envio de ordens judiciais e requisições de informações a diversas repartições e órgãos públicos, como, por exemplo, os departamentos estaduais de trânsito, a Receita Federal, o Banco Central, as juntas comerciais, só para citar alguns. Anote-se que, em relação especificamente à requisição de informações bancárias, o CPC já indicava que deve ser feita preferencialmente por meio eletrônico (art. 655-A, incluído pela Lei 11.382), se durante o processo de execução [21].
Mediante convênio, os tribunais podem aproveitar a utilização dos sistemas de comunicação eletrônica já desenvolvidos por órgãos integrantes de outros poderes.