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O papel da Defensoria Pública como órgão da execução penal e a imprescindibilidade de sua atuação para a garantia dos direitos fundamentais dos reeducandos

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13/05/2022 às 18:10

Resumo:


  • A Defensoria Pública desempenha um papel crucial na execução penal, especialmente após a Lei nº 12.313/2010, que prevê assistência jurídica integral e gratuita aos presos e atribui competências específicas à instituição.

  • A instituição é essencial para garantir o acesso à justiça aos mais vulneráveis, promovendo a defesa dos seus direitos e a humanização da execução penal, atuando dentro e fora dos estabelecimentos penais.

  • O fortalecimento da Defensoria Pública é fundamental para a efetivação da cidadania e para assegurar que as normas constitucionais sejam mais do que meras cartas de intenções, garantindo tratamento justo e a ressocialização dos apenados.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

2. A EXECUÇÃO PENAL NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO

Após a análise do desenvolvimento e das funções da Defensoria Pública no ordenamento jurídico nacional e da problemática do acesso à justiça, o presente capítulo tem como objetivo traçar um panorama da execução penal no país, analisando seus fundamentos, características e dificuldades na efetivação de seus princípios.

Fixada essa premissa, temos que o artigo 1º da Lei nº 7.210/1984 afirma que a execução penal é a fase do processo penal onde o estado faz valer a sua pretensão punitiva, ora convertida em pretensão executória.

Nas palavras de Marcão (2014, pp. 31-32):

A execução penal deve objetivar a integração social do condenado ou do internado, já que adotada a teoria mista ou eclética, segundo a qual a natureza retributiva da pena não busca apenas a prevenção, mas também a humanização. Objetiva-se, por meio da execução, punir e humanizar.

No que concerne a sua natureza jurídica, apesar de algumas divergências doutrinárias, e da sua caracterização como atividade complexa, desenvolvida simultaneamente nos planos jurisdicional e administrativo, tem-se que a execução penal possui natureza jurisdicional.

Tendo, pois, o processo de execução penal natureza jurisdicional, o apenado, aqui caracterizado como sujeito ou parte da relação processual, é titular de direitos, sendo-lhe garantido o direito a um processo de execução com todas as garantias a ele inerentes.

2.1 PRINCÍPIOS E GARANTIAS CONSTITUCIONAIS APLICÁVEIS À EXECUÇÃO DA PENA

Afirmar a natureza jurisdicional da execução penal implica admitir sua sujeição aos princípios e garantias constitucionais incidentes. Dessa forma, é indispensável que o processo de execução da pena observe os princípios e as garantias constitucionais, tais como: legalidade, devido processo legal, imparcialidade, igualdade, contraditório e ampla defesa, entre outros.

Nessa esteira, o artigo 3º da Lei de Execução Penal, no mesmo sentido do artigo 38 do Código Penal brasileiro, assevera que, salvo os casos obviamente incompatíveis com a condição peculiar de preso, devem ser assegurados aos custodiados a conservação de todos os direitos fundamentais reconhecidos à pessoa livre.

Dessa forma, observadas as limitações jurídicas e constitucionais da pena, todos os direitos não atingidos pela sentença criminal permanecem a salvo.

2.1.1 Princípio da legalidade

O princípio da legalidade possui assento constitucional no artigo 5º, XXXIX, entre os direitos e garantias fundamentais do cidadão. Nessa mesma esteira, o artigo 1º do Código Penal também prevê o referido princípio. Por sua vez, a Lei de Execução Penal o estabelece nos seus artigos 2º e 3º.

Dessa forma, o princípio da legalidade deve nortear a execução penal em todas as suas fases, dirigindo-se a todas as autoridades que participam do processo, sejam elas administrativas ou judiciais, de forma a impedir que o seu desvio ou excesso comprometa a dignidade e a humanidade na aplicação das penas.

2.1.2 Princípio da isonomia ou igualdade

O princípio da igualdade é um dos pilares da democracia e tem como finalidade garantir os direitos dos cidadãos de terem um tratamento igualitário perante a lei e a justiça, vedando-se a discriminação.

Dessa forma, o preceito do artigo 5º, caput, da Constituição Federal, não pode ser interpretado como uma mera igualdade formal, não considerando as peculiaridades de cada grupo humano. Não há dúvidas de que esse mandamento constitucional se dirige ao legislador e ao aplicador da lei, como forma de estabelecer tratamento justo e equânime entre os cidadãos.

É nesse sentido que o parágrafo único do artigo 3º da Lei de Execução Penal prevê:

Art. 3º Ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei.

Parágrafo único. Não haverá qualquer distinção de natureza racial, social, religiosa ou política.

Destarte, ninguém poderá sofrer tratamento discriminatório durante a execução de sua pena, salvo as distinções em face do mérito pessoal do sentenciado e das características individuais de cada procedimento executório.

2.1.3 Princípio do contraditório

O contraditório deve ser visto basicamente como o direito de participar, de manter uma contraposição em relação à acusação e de estar informado de todos os atos desenvolvidos durante o procedimento. Os dois polos da garantia do contraditório são: informação e reação.

O princípio em questão deve ser aplicado em todos os processos, sejam judiciais ou administrativos, consoante disposto no artigo 5º, LV, da Constituição Federal.

No que tange à execução penal, diversas decisões são tomadas em patente prejuízo ao reeducando, e devem ser postas em análise a partir do princípio do contraditório. Não se admite, por exemplo, a regressão de regime prisional, medida extremamente gravosa, sem que se proceda à oitiva do apenado, permitindo-lhe o exercício pleno de sua defesa. Nesse sentido, também deve ser o procedimento quando do processo de apuração para a perda ou não dos dias remidos. O desrespeito a esse princípio acarreta flagrante e odioso constrangimento ilegal.

2.1.4 Princípio da proporcionalidade

O princípio da proporcionalidade demanda um juízo de ponderação acerca da relação existente entre a gravidade do fato e a gravidade da reprimenda. Nesse sentido, rechaça o estabelecimento de cominações legais e a imposição de penas que não possuam relação valorativa com o fato cometido considerado de forma geral.

Sendo assim, o princípio da proporcionalidade desempenha papel fundamental no sentido de legitimar e limitar o poder de punir do Estado, atuando em diferentes momentos: primeiramente, quando da criação do tipo penal e da fixação dos patamares mínimo e máximo das penas. Em um segundo momento, destina-se ao magistrado quando da fixação da pena. Por fim, após a fixação do quantum da reprimenda e da natureza da sanção penal, dirige-se a adequada execução da pena.

Nesse último caso, a proporcionalidade será estabelecida a partir da classificação do condenado, devendo haver uma correlação no que se refere ao apenado e a forma como a sanção a ele cominada deve ser adequadamente executada.

2.1.5 Princípio da individualização da pena

O princípio em comento está insculpido no artigo 5º, XLVI, da Constituição Federal, consubstanciando-se numa garantia individual do condenado frente ao Estado quando do cumprimento da pena.

Vale ressaltar que a Lei de Execução Penal pormenoriza alguns aspectos referentes à individualização da pena, conforme se observa no seu artigo 5º: Os condenados serão classificados, segundo os seus antecedentes e personalidade, para orientar a individualização da execução penal.

Nas palavras de Marcão (2014, p. 43):

A classificação dos condenados é requisito fundamental para demarcar o início da execução científica das penas privativas de liberdade e da medida de segurança detentiva. Visa a assegurar os princípios da personalidade e da proporcionalidade da pena, elencados no rol dos direitos e garantias individuais. Adequada a classificação, cada sentenciado terá conhecida a sua personalidade, recebendo o tratamento penitenciário adequado, atendendo também ao princípio da individualização da pena e da medida de segurança.

2.1.6 Princípio da humanidade das penas

O princípio em questão tem como base a dignidade da pessoa humana e dele se originam não apenas normas limitadoras da atividade punitiva estatal, mas também normas de caráter positivo, que obrigam o Estado a agir.

Prevista no artigo 1º, III, da Constituição Federal, a dignidade da pessoa humana se caracteriza como um princípio relativo ao regime político e um valor supremo que engloba todos os direitos fundamentais, inclusive o direito à vida.

Dito isso, é importante ressaltar que o princípio da humanidade da pena encontra guarida não só na Constituição Federal, mas também junto a tratados internacionais e à Lei de Execução Penal.

A Lei de Execução Penal prevê o princípio em alguns de seus artigos relacionados à integração social do condenado, à assistência ao preso, ao respeito à integridade física e moral dos condenados, à vedação de sanções que possam colocar em perigo a integridade física e moral dos apenados, entre outros (artigos 1º, 10, 11, 40, 41, 45, 83, 88).

Nesse sentido, o princípio da humanidade das penas é fruto de um processo histórico de massificação de penas cruéis e degradantes, surgindo como forma de trazer racionalidade e proporcionalidade às penas aplicadas. Desta feita, tem-se que o supracitado princípio é a pedra basilar de todo o sistema punitivo.

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2.2 A DEFENSORIA PÚBLICA COMO ÓRGÃO DA EXECUÇÃO PENAL

Após a análise global da execução penal no país e dos seus princípios orientadores, chegamos à parte final do presente estudo, tecendo alguns comentários sobre o papel da Defensoria Pública como órgão da execução penal.

A Lei nº 12.313/2010, ao concretizar a Defensoria Pública como órgão da execução penal, consagra a garantia de pleno acesso à justiça aos presos, egressos e seus familiares, os quais não possuíam recursos financeiros para constituir advogado. A alteração demanda a prestação de serviços de assistência jurídica integral e gratuita pela Defensoria Pública dentro e fora dos estabelecimentos penais, reforça a necessidade de prestação de auxílio material, estrutural e pessoal à Instituição em todas as unidades federativas, além de reservar espaço próprio ao órgão no interior dos estabelecimentos prisionais.

Nesse sentido, os artigos 81-A e 81-B da Lei de Execução Penal estabelecem um rol de prerrogativas e atividades que devem ser desenvolvidas pela Defensoria Pública, tais como o acompanhado processual ordinário através de requerimentos de aplicação de lei posterior mais benéfica, declaração de extinção da punibilidade, unificação de penas, detração e remição das mesmas, progressão de regime, suspensão condicional da pena, livramento condicional, comutação da pena, indulto, saídas temporárias, entre outros. Além disso, incumbe à Defensoria Pública requerer a emissão anual do atestado de pena a cumprir, visitar os estabelecimentos penais, podendo, inclusive, requerer sua interdição, além de representar ao juiz da execução ou à autoridade administrativa para a instauração de sindicância ou procedimento administrativo em caso de violação das normas referentes à execução.

Desta forma, quis o legislador alçar a Instituição a um patamar em que possa ter poder de transformação mais evidente e efetivo. A atuação ampla e independente dos membros da Defensoria Pública é imprescindível à execução penal, tendo em vista seu poder de articulação, seu contato mais próximo com o reeducando e seus familiares, reduzindo, sobremaneira, os riscos de rebeliões, superlotações, corrupção, torturas e teratologias processuais. De fato, um grande passo para a Instituição e para nosso sistema de justiça.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho objetiva analisar o imprescindível papel da Defensoria Pública em sede de execução penal, especialmente após a publicação da Lei nº 12.313/2010, a qual prevê a assistência jurídica ao preso dentro do presídio e atribui competências à Defensoria Pública.

Desta feita, consoante as questões trabalhadas acima, verifica-se que a importância da Defensoria Pública reflete na sua evolução ao longo dos anos. De instituição meramente assistencialista a função essencial à justiça, responsável pela prestação de assistência jurídica integral e gratuita a todos os hipossuficientes.

Nesse contexto, o direito fundamental de acesso à justiça encontra na Defensoria Pública um dos principais instrumentos para sua efetiva concretização, uma vez que a instituição se insere num profundo projeto de reforma do sistema de justiça brasileiro, de cunho eminentemente socializador, a partir da promulgação da Constituição cidadã.

Especificamente em relação à execução penal, a Lei nº 12.313/2010, ao concretizar a Defensoria Pública como órgão da execução penal, consagrou a garantia de pleno acesso à justiça aos presos, egressos e seus familiares, os quais não possuíam recursos financeiros para constituir advogado. Nessa esteira, a Defensoria Pública assume um papel de protagonismo dentro e fora dos estabelecimentos penais, reforçando a necessidade de prestação de auxílio material, estrutural e pessoal à instituição em todas as unidades federativas, além de reservar espaço próprio ao órgão no interior dos estabelecimentos prisionais. O avanço trazido pela lei tem grande impacto na forma como os reeducandos são tratados, ao contarem agora com uma fiscalização efetiva de quem busca para eles não só punição por seus crimes, mas verdadeira ressocialização.

Contudo, muita coisa há de ser feita, tendo em vista que os direitos relativos aos hipossuficientes, especialmente na será criminal, são sempre os primeiros a serem questionados e marginalizados, ficando claro que o fortalecimento da Defensoria Pública anda lado a lado com a efetivação da cidadania.

Sendo assim, a Defensoria Pública, como instituição mais incipiente do sistema de justiça, deve ser valorizada e fortalecida, para que as normas constitucionais não possam ser vistas como mera carta de intenções.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

LIMA, Frederico Rodrigues Viana de. Defensoria Pública. 3. ed. Salvador: Jus Podivm, 2014.

LOPES JR., Aury. Direito processual penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

MARCÃO, Renato. Curso de Execução Penal. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

RÉ, Aluísio Iunes Monti Ruggeri. Manual Do Defensor Público. Teoria e Prática. Salvador: Jus Podivm, 2013.

______________. Temas aprofundados da Defensoria Pública, volume 1. 2. ed. Salvador: Jus Podivm, 2014.

______________. Temas aprofundados da Defensoria Pública, volume 2. Salvador: Jus Podivm, 2014.

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Sobre o autor
Victor Hugo Siqueira de Assis

Mestre em Direito. Especialista em Ciências Criminais. Defensor Público.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ASSIS, Victor Hugo Siqueira. O papel da Defensoria Pública como órgão da execução penal e a imprescindibilidade de sua atuação para a garantia dos direitos fundamentais dos reeducandos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 6890, 13 mai. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/97596. Acesso em: 22 dez. 2024.

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