RECURSO ESPECIAL Nº 1.108.345 - SC (2008/0279426-8)
RELATORA : MINISTRA DENISE ARRUDA
RECORRENTE : ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SEÇÃO DE SANTA
CATARINA - OAB/SC
ADVOGADO : CYNTHIA DA ROSA MELIM E OUTRO(S)
RECORRIDO : SÉRGIO LUIZ COELHO
ADVOGADO : MAURO JOSÉ DESCHAMPS
DECISÃO1. Trata-se de recurso especial interposto pela ORDEM DOS
ADVOGADOS DO BRASIL SEÇÃO DE SANTA CATARINA - OAB/SC - com fundamento
no art. 105, III, a e c, da Constituição Federal, contra acórdão, proferido pelo TRF da 4ª
Região, assim ementado:
"ADMINISTRATIVO. OAB. INSCRIÇÃO DE ADVOGADO.
INDEFERIMENTO ANTE INCIDENTE DE INIDONEIDADE. PROCESSO
CRIMINAL. AUSÊNCIA DE TRÂNSITO EM JULGADO. PRESUNÇÃO DE
INOCÊNCIA.
A ausência de condenação criminal transitada em julgado impede a OAB de
indeferir a inscrição definitiva de advogado, sob a alegação de instauração
de incidente de inidoneidade, ante o prestígio ao princípio constitucional da
presunção de inocência." (fl. 200)Ademais, o TRF da 4ª Região decidiu a controvérsia com base na
interpretação de normas constitucionais (arts. 5º, XIII e LVII, e 133 da CF/88) e
infraconstitucionais (§ 4º do art. 8º da Lei 8.906/94), concluindo que a ausência de condenação
criminal transitada em julgado impede a OAB de indeferir a inscrição definitiva de advogado,
sob a alegação de instauração de incidente de inidoneidade, in verbis :
"A matéria trazida a exame diz com a legalidade ou não da instauração de
incidente de inidoneidade moral que está a impedir o registro definitivo do impetrante
junto aos quadros de advogados da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de Santa
Catarina.
A esse respeito, de início trago à colação o que dispõe o § 4º do art. 8º da Lei
nº 8.906/94, que considero primordial à solução da controvérsia:
'Art. 8º Para inscrição como advogado é necessário:
(...)
§ 4º Não atende ao requisito de idoneidade moral aquele que tiver sido
condenado por crime infamante, salvo reabilitação judicial.' (grifei)
Segundo se depreende do dispositivo legal reproduzido, a inidoneidade
moral pressupõe a condenação, tese essa que foi muito bem defendida pelo juiz a quo ao
afirmar, na fundamentação da sentença, que 'o fato do impetrante não haver sido
condenado criminalmente por sentença transitada em julgado faz prevalecer o estado de
inocência'. Deste modo, não há inidoneidade, pelo menos nesse momento, a justificar a
instauração do incidente em questão.
E isso porque é princípio constitucional básico a presunção de inocência, até
que seja proferida sentença condenatória e seja operado seu trânsito em julgado, antes do
quê ninguém será considerado culpado (CF/88, art. 5º, LVII).
(...)
O que se colhe dos autos é exatamente uma afronta a tal preceito
constitucional, tendo em vista que a inscrição do impetrante, tal como requerida, está
sendo indeferida com base em inidoneidade que está sendo cogitada em razão de
processo criminal inacabado, não havendo, pois, razão a justificar seja ele restringido
quanto a sua atividade profissional devidamente legalizada.
Não pode a OAB/SC, sem argumentação plausível, que é o caso, negar ao
impetrante o seu direito, indo de encontro a outras questões decorrentes, segundo bem
lembrado pelo juiz a quo ao prolatar a sentença guerreada, no seguinte sentido:
Documento: 6177158 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJ: 03/02/2010 Página 3 de 5
Superior Tribunal de Justiça
'(...)
No caso dos autos, o impetrante foi considerado moralmente inidôneo pelo
simples fato de responder a processo criminal. Ora, ainda que a inidoneidade moral
não se restrinja aos casos em que o candidato tenha cometido crime, se o
fundamento da inidoneidade for a prática de ato típico previsto na legislação
criminal, a inidoneidade só pode ser declarada após o trânsito em julgado do
processo criminal, sob pena de infração ao princípio da presunção da inonência.
Nesse sentido, leia-se o seguinte acórdão do Supremo Tribunal Federal, proferido
em caso análogo ao dos autos: Recurso Extraordinário nº. 194.872/RS, Segunda
Turma, Relator Ministro Marco Aurélio, julgado por unanimidade, em 7 de
novembro de 2000, publicado no DJ, de 2 de fevereiro de 2002, p. 141.
10. Logo, não havendo trânsito em julgado de sentença criminal
condenatória contra o impetrante, a Ordem dos Advogados do Brasil não pode
restringir o exercício profissional do impetrante, ao argumento de haver
inidoneidade, sob pena de negativa de vigência dos vetores constitucionais da livre
iniciativa e da liberdade de trabalho e profissão, nos termos do inciso IV do artigo
1º. e do inciso XIII do artigo 5º. da Constituição Federal de 1988. Ainda que possa
ser legalmente limitado o exercício da atividade econômica, conforme dispõe o
parágrafo único do artigo 170 da Constituição Federal de 1988, entendo que essa
atuação estatal não pode anular o direito fundamental do estado de inocência, que
persiste enquanto não houver condenação em definitivo'." (fls. 198/199)